Acórdão nº 618/06.8TCGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelANTERO VEIGA
Data da Resolução22 de Março de 2011
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

Autor: L Ré: Companhia de Seguros …, S.A.

O Autor instaurou a presente acção declarativa emergente de acidente de viação sob a forma de processo ordinário, pedindo a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 453.032,09, declarando pretender optar por juros de mora a partir da citação.

Alega em síntese, que cerca das 20h50 do dia 16 de Junho de 2002 conduzia o seu motociclo matrícula ...PS na EN 101, no sentido Braga – Taipas, pela respectiva metade direita, a velocidade que não excedia 50 km/h e que o veículo automóvel ligeiro de passageiros, matrícula SI..., conduzido pelo segurado da Ré, Fernando…, circulava na Rua da Ribeira em direcção à referida EN, onde entronca pelo lado esquerdo, atento o referido sentido.

Na concordância das suas vias existe um sinal de stop, junto do qual o condutor do “SI” não parou, entrando na EN no sentido Braga - Taipas quando o “PS” era perfeitamente visível e se encontrava a mão mais de 25 metros de distância, barrando-lhe completamente a passagem.

Como manobra de recurso ainda travou e desviou-se para a direita, mas não conseguiu evitar o embate entre a parte da frente do seu motociclo e a parte lateral direita, sensivelmente a meio do veículo ligeiro.

Em consequência do embate sofreu diversos traumatismos, ficou internado no serviço de ortopedia, em Julho foi orientado para consultas externas daquela especialidade, assim como de medicina física e de reabilitação e cirurgia plástica, recolhendo a casa com repouso.

No início de Setembro passou a ser seguido no Instituto de Cirurgia Reconstrutiva onde esteve internado e foi operado nesse mês, assim como em Fevereiro, Setembro de 2004 e Março de 2005, com os subsequentes tratamentos fisiátricos e períodos de repouso em casa.

Apesar dos tratamentos ficou a padecer de cicatrizes diversas, monoplegia flácida proximal do membro superior esquerdo, atrofia dos músculos peitorais, bícipe, trícipe, do antebraço e da mão esquerda e limitação significativa da mobilidade do ombro esquerdo, sequelas que determinam uma IPP de 40% e o tornam totalmente incapaz para o exercício da sua profissão de montador de estruturas de postos de abastecimento de combustíveis.

Sofreu um “quantum doloris” de 5/6 na escala de 1 a 7 e um dano estético de grau 5 na mesma escala. As sequelas continuam a provocar-lhe dores, incómodo e mal-estar, exacerbados com as mudanças de tempo.

À data do acidente tinha 22 anos, era saudável, fisicamente bem constituído, dinâmico, trabalhador, alegre e jovial, sentindo, agora, profundo desgosto pelas limitações da mobilidade do braço esquerda, por não conseguir efectuar o trabalho que fazia e praticar desporto com os amigos. As cicatrizes provocam-lhe incómodo, mal-estar e fizeram com que deixasse de frequentar a praia ou a piscina. Isola-se, tendo deixado de conviver com os amigos e sente-se um fardo para a família. Pretende € 100.000 a título de compensação.

Auferia o vencimento de € 508 catorze vezes por ano, acrescido de uma média de € 150 onze vezes por ano. Aos fins-de-semana pintava motas tendo um rendimento mensal de € 350 doze vezes por ano.

Por causa das lesões, tratamentos e sequelas não voltou a trabalhar tendo deixado de auferir receber € 51.886,36, apenas recebendo € 5.559,42 da Ré e € 13.479,96 da Segurança Social.

As poucas habilitações literárias, o meio onde se insere e o actual estado do mercado de trabalho não lhe permitem encontrar uma ocupação remunerada compatível com a capacidade restante. Pretende ser ressarcido pela perda futura de ganho no montante de € 314.383,90.

Teve ainda despesas no valor global de € 5.792,21 em honorários médicos, meios de diagnóstico, medicamentos, taxas moderadoras, transportes, ligaduras e numa intervenção cirúrgica.

A demandada contestou contrapondo que o condutor do “SI”, depois de se certificar que não se avistava na EN 101 nos dois sentidos de trânsito qualquer veículo, atravessou toda a metade direita da faixa de rodagem e, quando já se encontrava na faixa do sentido Braga-Taipas, foi embatido pelo motociclo que rodava a velocidade superior a 90 km/h.

Antes do local do acidente existia um sinal de limitação de velocidade a 50 km/h e de ambos os lados da via existiam edificações a dar directamente para a faixa de rodagem, bem como o sinal a assinalar a localidade de Sande.

O motociclo deixou sinais de travagem de 22 metros, iniciados antes do entroncamento e afastados 2 metros da berma direita, atento o sentido que levava.

Acrescentou que entregou ao Autor € 6.120 a título de salários perdidos e para tratamentos pagou directamente a estabelecimentos de saúde ou entregou-lhe € 24.615,20.

Realizado o julgamento o Mmº juiz respondeu à matéria constante da base instrutória e proferiu decisão nos seguintes termos: “ Em face do exposto, o Tribunal, julgando a acção parcialmente provada e procedente, condena a Ré Companhia de Seguros…, S.A. a pagar ao Autor… o seguinte: a) a quantia de € 7.818,88 a título de indemnização pelos danos patrimoniais respeitantes a perdas salariais e despesas com tratamentos e deslocações, acrescida de juros à taxa legal de 4% desde 29 de Setembro de 2006 até integral e efectivo cumprimento; b) o que vier a ser liquidado relativamente aos montantes que deixou de auferir a título de trabalho extraordinário como pintor de estruturas de postos de abastecimento de combustíveis e executado nas horas vagas como pintor de motas; c) o que vier a ser liquidado relativamente à perda da capacidade futura de ganho; d) a quantia de € 35.000 a título de compensação por danos não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal de 4% desde a presente data até integral e efectivo cumprimento…” Inconformado o autor interpôs recurso de apelação.

Conclusões da apelação: … 9ª Perante esta matéria de facto dada como provada, perante a actuação de cada um dos condutores o Tribunal decidiu repartir as culpas na produção do acidente na proporção de 30% para o demandante condutor do ciclomotor e 70% para o condutor do veículo ligeiro de passageiros.

  1. Apesar do muito respeito e consideração que temos pela Mmª Juíza a quo discordamos frontalmente deste julgamento, por o excesso de velocidade não ter sido a causa adequada do acidente. Senão vejamos: 11ª O condutor do veículo ligeiro de passageiros tinha pela sua frente um sinal de stop que o obrigava a parar mas não só, também a ceder a passagem a todos os veículos que transitassem na via em que ia entrar.

  2. Não sabemos se parou ou não. Mas sabemos, porque ficou provado, que não deixou passar o motociclo tripulado pelo demandante. E quando penetrou bruscamente na estrada podia avistá-lo. Mas não avistou porque apenas olhou para o seu lado esquerdo. Esqueceu por completo o trânsito que se apresentava pela sua direita, ou seja, mesmo que não houvesse o sinal de stop o motociclo teria prioridade de passagem.

  3. Não obstante tudo isso o condutor do veículo ligeiro penetrou na estrada bruscamente para mudar de direcção para a sua esquerda e passar a circular pela E.N. 101 no sentido Braga – Guimarães, barrando a passagem do motociclo conduzido pelo demandante, tendo a colisão entre os dois veículos ocorrido na hemi-faixa por onde circulava o motociclo.

  4. Chegados aqui, ocorre perguntar qual foi a causa adequada do acidente. E afigura-se-nos que foi, sem margem para qualquer dúvida, a conduta do condutor do veículo ligeiro de passageiros, por sua culpa única e grosseira, por não ter respeitado a prescrição do sinal de stop.

  5. O relativo excesso de velocidade – 70 a 75 Kms/hora – embora os rastos de travagem de 22 metros não apontam nesse sentido não foi a causa adequada, nem remota do acidente.

  6. O aparecimento brusco do veículo ligeiro de passageiros a barrar a passagem do motociclo é, para o condutor do motociclo uma ocorrência anómala ou excepcional que ele não podia prever. Ele não contribuiu para o deflagrar do acidente. Sofreu, isso sim, as consequências do acidente.

  7. A douta sentença recorrida não se pronunciou quanto à quantia indemnizatória relativa à perda futura de ganho, que deve vencer juros a contar da citação.

  8. Quanto à indemnização a liquidar em execução de sentença, afigura-se-nos que se deverá dizer, quanto à incapacidade, que o demandante ficou a padecer de sequelas que lhe provocam uma IPP de 40% e o tornam totalmente incapaz para a sua profissão habitual, em vez de dizer que ficou a padecer de sequelas... que o incapacitam para o exercício da sua profissão habitual... e representam uma IPP de 40%.

    Evitará entendimentos oportunistas.

  9. A douta sentença recorrida violou o disposto nos artigos e 44º do Cód. da Estrada, art. 21º, sinal B2 do Reg. da Sinalização de Trânsito e os artigos 563º e 805 do Cód. Civil.

    Nas contra-alegações a recorrida defende a manutenção do julgado.

    Colhidos os vistos dos Ex.mos Srs. Adjuntos há que conhecer do recurso.

    * Vêm considerados provados os seguintes factos pelo Tribunal “a quo”: 1. Cerca das 20h50 do dia 16...

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