Acórdão nº 375/08.3TTGDM.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 22 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelFERREIRA DA COSTA
Data da Resolução22 de Fevereiro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: PROVIDO.

Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL) - LIVRO 97 - FLS 02.

Área Temática: .

Sumário: I - Tendo um hospital público celebrado com uma trabalhadora, vários contratos a termo, sem indicação concreta de motivo, estamos face a contratos a termo sucessivos e sem justificação.

II - A Directiva 1990/70/CE, de 28 de Junho de 1999, respeitante ao acordo quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho visa evitar os abusos decorrentes da utilização de sucessivos contratos a termo.

III - Para o efeito, os Estados membros, caso ainda não o tenham feito, deverão adoptar medidas conducentes à fixação de razões objectivas que justifiquem as renovações dos contratos, de duração máxima total dos sucessivos contratos ou do número máximo das suas renovações.

IV - Tendo o Estado Português transposto tal Directiva para o direito interno, no que respeita aos contratos de trabalho a termo do sector privado, não o fez para os contratos a termo celebrados com pessoas colectivas públicas.

V - Assim e no seguimento do decidido no acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, de 2006-07-04, processo n.º C-212/04 in www.curia.europa.eu consultado em 2010-02-06 e in Colectânea de Jurisprudência, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, Ano XIV-2006, Tomo II, pág. 11 ss, devem os contratos a termo, imotivados e sucessivos, celebrados com pessoas colectivas públicas, ser considerados contratos sem termo.

VI - A aplicação do direito interno, nesta acepção da Directiva, não é inconstitucional, por violação do art. 47º, n.º 2 da CRP, tanto mais que o contrato sem prazo é hoje uma das modalidades regra de prestar trabalho na Administração pública, embora sem adquirir a qualidade de funcionário.

VII - Ao contrário, a norma que proíbe absolutamente, apenas na Administração Pública, a conversão do contrato a termo em contrato sem termo, nas apontadas circunstâncias, é inconstitucional, por violação do princípio da segurança no emprego, ínsito no art. 53º da CRP, pois não permite a reintegração no posto de trabalho.

VIII - O acórdão do TJCE dando cabal cumprimento aos objectivos do acordo quadro e da Directiva, proporciona a harmonização do direito mínimo relativo a contratos a termo em cada um dos Estados Membros da Comunidade Europeia sendo que, no nosso caso, tal harmonização é conforme à CRP, não existindo assim qualquer dissonância entre os dois ordenamentos jurídicos: nacional e comunitário.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Reg. N.º 654 Proc. N.º 375/08.3TTGDM.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B………. deduziu em 2008-09-01 a presente acção declarativa, emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra o Hospital ………., E.P.E., pedindo que se: I – Declare: a) - Que entre A. e R. vigora um contrato de trabalho sem termo, com início a 2002-07-15 e cuja cessação foi feita operar ilicitamente pela R. a 2008-01-31; b) - Ilícita a caducidade operada a 2008-01-31, por se tratar de um contrato sem termo e c) - O despedimento da A. como ilícito por não ter sido precedido de prévio procedimento para o efeito e, consequentemente, ser a A. readmitida ao serviço da R., vigorando entre ambas um contrato de trabalho sem termo; II – Condene a R. a pagar à A. a retribuição integral, respectivos suplementos e subsídios, desde a data da cessação até efectivo e integral pagamento, acrescida de juros à taxa legal.

Alega a A., para tanto e em síntese, que foi admitida como auxiliar de acção médica ao serviço do Hospital ………., Unidade de Saúde do Ministério da Saúde, sob a autoridade e direcção deste, em 2002-07-15, mediante contrato escrito a termo certo, ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de Janeiro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 53/98, de 11 de Março, que foi renovado até 2003-01-15, data em que cessou por caducidade.

O mesmo aconteceu nas datas de, respectivamente: a) - 2003-01-22 e 2003-07-22, como auxiliar de acção médica; b) - 2003-07-30 e 2004-01-30, como auxiliar de apoio e vigilância, mas continuando a executar as mesmas funções anteriores; c) - 2004-03-01 e 2004-09-01, como auxiliar de acção médica; d) - 2004-11-13 e 2005-05-13, desta feita como auxiliar de apoio e vigilância e e) - 2005-05-13 e 2005-11-11, como auxiliar de acção médica.

Mais alega a A. que foi admitida como auxiliar de acção médica ao serviço da R., sob a autoridade e direcção deste, em 2006-02-01, mediante contrato escrito a termo certo por 12 meses, agora ao abrigo do Código do Trabalho, por força do Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de Dezembro, que foi renovado até 2008-01-31, data em que cessou por caducidade, dele constando que é celebrado a termo certo considerada a criação do Hospital como entidade pública empresarial [E.P.E.] pelo referido diploma, com a consequente adopção de um novo modelo de gestão e verificadas as oscilações e insuficiências de pessoal no sector de serviços gerais, decorrentes desse mesmo início de actividade e até consolidação do modelo de gestão que lhe é inerente.

Alega também que trabalhou no referido hospital desde 2002-07-05 até 2008-01-31, ininterruptamente, não se encontrando cada um dos contratos justificados legalmente, nem sendo verdadeiros os motivos invocados, sendo certo que foi abusiva a utilização de contratos de trabalho a termo sucessivos, face ao direito e jurisprudência nacionais e europeus.

Alega por último que a invocada caducidade do último contrato de trabalho a termo configura um despedimento ilícito, com as legais consequências.

Contestou a R., por impugnação, alegando que os contratos de trabalho celebrado entre as partes o foram a termo, legalmente justificados, sendo verdadeiros os motivos indicados em cada um deles e que, por outro lado, se verificaram, entre quase todos eles, os legais hiatos temporais de inactividade, infringindo o entendimento oposto, tanto a lei, como a jurisprudência, quer nacionais, quer comunitárias.

Na data designada para julgamento o douto Mandatário da R. disse que prescindia da inquirição das suas testemunhas e, “Aberta a audiência, o Mmº. Juiz [a quo] deu a palavra aos ilustres Mandatários para alegações, os quais no seu uso as fizeram” e “Findas as alegações, o Mmº. Juiz deu por encerrada esta audiência.”, conforme ipsis verbis consta da acta de fls. 95 e 96, seguindo-se a sentença a fls. 97 ss.

Proferida sentença, o Tribunal a quo: I – Declarou o Tribunal do Trabalho incompetente em razão da matéria para conhecer do pedido no que respeita aos contratos de trabalho celebrados entre as partes no período compreendido entre Julho de 2002 e 2005-12-31, por serem administrativos e II – Quanto ao mais, julgou a acção improcedente e absolveu a R. do pedido.

Inconformada com o assim decidido, veio a A. interpôr recurso de apelação, invocando nulidades da sentença no respectivo requerimento e pedindo a revogação da mesma decisão, tendo formulado, a final, as seguintes conclusões: 1. A sentença recorrida viola de forma clara e frontal o disposto no art. 2º do DL 233/2005, de 29 de Dezembro, na medida em que procede à análise dos contratos em vigor antes da sua entrada em vigor, apenas e só pelo disposto no DL 427/89, de 7 de Dezembro.

  1. Tais contratos, ainda que celebrados ao abrigo de tal diploma, não podem deixar de ser enquadrados como uma responsabilidade assumida pelo recorrido nos termos do normativo vindo de citar do DL 233/2005, de 29 de Dezembro.

  2. Não pode olvidar-se que o recorrido podia, a 31 de Dezembro de 2005, expressamente deixar claro que não pretendia prorrogar ou contratar a recorrente.

  3. Não tendo usado tal prerrogativa, não pode a posteriori alegar que o passado não é seu, como se não tivesse de pagar as dívidas contraídas pelo seu antecessor.

  4. O art. 2º do DL 233/2005, não deixa qualquer excepção. Ou seja, todas os direitos e obrigações assumidas pela entidade cessante são assumidas pela nova entidade agora criada.

  5. Se é bom por um lado passar a assumir-se como entidade privada no que tange, entre outros, à facilidade de contratação, não deixará também de sobre si pender o ónus de tais contratações e respectivas regras.

  6. Desta sorte a sentença recorrida erra ao entender que não pode pronunciar-se sobre os contratos celebrados pela recorrente em data anterior à prolação do diploma vindo de citar, pelo que por tal facto se declara incompetente em razão da matéria.

  7. Maior erro não podia ser assumido pela sentença recorrida, já que por aplicação do art. 2° do DL 233/2005, tal desiderato passou de facto e de direito para a alçada dos tribunais civis, desde logo, do tribunal de trabalho de Gondomar.

  8. Ora, tudo visto neste prisma, surge a sentença recorrida inquinada com erro na fundamentação jurídica da decisão (erro de direito), nos termos do Art. 668°, n.º 1, aI. b) CPC, vício este, que sanciona com nulidade a sentença recorrida.

  9. Ainda relativamente à considerada incompetência em razão da matéria, deve ser entendido que à data da celebração do contrato com o recorrido, em 1 de Fevereiro de 2006, a ora recorrente já tinha com o recorrido um contrato sem termo nos termos do art. 141° do CT por excesso de renovações.

  10. Contudo, tendo o recorrido imposto a celebração de um contrato em 1 de Fevereiro de 2006, tal significa que entre 31 de Dezembro de 2005 e aquela data a recorrente esteve com um contrato de trabalho sem termo, tal como o determina o art. 145° do CT.

  11. Ao não ser dessa forma analisada a sentença recorrida viola o disposto nos art. 141º e 145º do CT.

  12. Por outro lado, as circunstâncias que estiveram subjacentes em todas as contratações são exactamente as mesmas, quer quando o recorrido estava integrado no SNS, quer quando alterou o seu estatuto jurídico para EPE (aqui também integrado no SNS).

  13. Não pode a alteração da natureza jurídica do recorrido, ou a transição para empresa pública prejudicar os trabalhadores contratados aquando hospital do SNS, como, efectivamente aqui se coloca.

  14. Posição adoptada...

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