Acórdão nº 12/08.6JAPRT.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelEDUARDA LOBO
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REC PENAL.

Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE.

Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO - LIVRO 617 - FLS 189.

Área Temática: .

Sumário: I - Provado que o arguido privou o ofendido da sua liberdade, obrigando-o a permanecer no veículo, agredindo-o, para o efeito, na face e na cabeça, no que lhe provocou lesões que lhe afectam de maneira grave o sentido da audição, mostra-se aquele incurso na prática de um crime de sequestro agravado nos termos do Artigo 158º/2 al. b) do CP.

II - A condenação simultânea do arguido pelo referido crime de sequestro agravado e por um crime de ofensa à integridade física grave, constituiria violação do princípio ne bis in idem.

III - Por força do princípio da reformatio in melius, pode o arguido ser absolvido, no Tribunal de recurso, de um crime por que vinha condenado, não obstante não ter havido recurso dessa matéria.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Proc. nº 12/08.6JAPRT-P2 1ª secção Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO No âmbito do Processo Comum Colectivo que correu termos no .º Juízo do Tribunal Judicial de Vila Real com o nº 12/08.6JAPRT foi submetido a julgamento o arguido B………., tendo a final sido proferido acórdão que condenou o arguido pela autoria material e em concurso real de: - um crime de dano p. e p. no artº 212º nº 1 do Cód. Penal na pena de 10 meses de prisão; - um crime de sequestro p. e p. no artº 158º nºs 1 e 2 al. b) do C. Penal na pena de 3 anos de prisão; - cada um de dois crimes de ameaças p. e p. no artº 153º nº 1 e 155º nº 1 al. a) do C. Penal, na pena de dez meses e prisão; - um crime de ofensa à integridade física grave p. e p. nos artºs. 143º e 144º al. b) do Cód. Penal, na pena de 3 anos de prisão; - cada um de dois crimes de roubo p. e p. no 210º nº 1 do C. Penal, na pena de 18 meses de prisão; ● Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de sete meses de prisão.

Inconformado com a decisão condenatória, dela veio o arguido interpor o presente recurso, extraindo das respectivas motivações as seguintes conclusões: 1. Não ficou provado que a conduta do arguido seja subsumível à previsão do artº 210º do Código Penal uma vez que não resultou provado ter havido intenção de apropriação, nem violência na obtenção dos mesmos, ao condenar o arguido por dois crimes de roubo o Tribunal Colectivo violou o artº 210º do Cód. Penal e o princípio da legalidade; 2. O Tribunal a quo deveria ter considerado, pelos depoimentos quer do ofendido quer do arguido, que os crimes não foram praticados, absolvendo o arguido dos mesmos; 3. Também não ficou provada a prática dos crimes de ameaças, quer em relação à D………. quer quanto ao ofendido C………., quem diz que nunca levou a sério as frases que foram proferidas para a pressionar a voltar para ele, não pode ter tido medo ou inquietação, as palavras proferidas não foram idóneas a provocar medo ou inquietação na D……….; 4. Como é uniformemente aceite, o mal que integra o conceito de ameaça, tem de ser futuro. Ora, as palavras proferidas pelo arguido ao ofendido enquanto o maltratava, nomeadamente “fala ou mato-te” “é melhor falar ou eu te mato” não configuram um crime de ameaças, uma vez que havia uma iminência da prática do acto; 5. Por isso, o tribunal colectivo deveria ter absolvido o arguido dos crimes de ameaças; não o fazendo, violou os arts. 153º nº 1 e 155º nº 1 al. a) do Cód. Penal; 6. O Tribunal Colectivo procedeu inadequadamente na determinação da medida da pena atentos os limites máximos e mínimos para cada tipo de crime, circunstâncias em que os mesmos foram praticados, prova produzida e factos que podiam e deviam ter concorrido a formar um juízo de prognose mais favorável ao arguido; 7. Os Juízes não valoraram devidamente a prova produzida, bem como na apreciação dos critérios que devem nortear o julgador na escolha e determinação da pena e sua medida, violaram de forma clara, o que estabelece o legislador penal, a propósito de tais operações; 8. A esse respeito resulta do douto acórdão recorrido, que não consideraram convenientemente, os seguintes factos a favor do arguido: a) confissão livre e sem reservas; b) arrependimento; c) ausência de antecedentes criminais; d) bom comportamento no estabelecimento prisional; e) bom enquadramento familiar, social e profissional; 9. Foi violado o princípio da medida da culpa como barreira inultrapassável na determinação da medida da pena; 10. Pois a apurada culpa do recorrente, conjugada com os pressupostos fácticos que determinaram a sua conduta, bem como atendendo às condições pessoais e ausência de antecedentes criminais mostra-se exagerada a pena de prisão de 7 (sete) anos aplicada ao arguido; 11. Na ponderação concreta da pena, tendo em atenção os critérios do artº 71º do Código Penal, cumpre determinar a medida da sanção tendo como limite e suporte axiológico a culpa do agente e em função das exigências da prevenção de futuros crimes, sem esquecer que a finalidade última da intervenção penal é a reinserção penal do delinquente; 12. No modelo que enforma o regime penal vigente, norteado, como decorre do artº 40º do Cód. Penal, pelo binómio prevenção/culpa, cumpre encontrar primeiro uma moldura de prevenção geral positiva, determinada em função da necessidade de tutela das expectativas comunitárias na manutenção e reforço da validade da norma violada; 13. Fixada esta, deve o julgador encontrar a medida concreta da pena em conjugação com as exigências de prevenção especial de socialização do agente, sem ultrapassar a culpa revelada na conduta antijurídica; 14. Efectivamente excede em larguíssima medida o quantum da pena aplicada ao recorrente, quando observados os critérios acima expostos; 15. O recorrente coloca em crise a medida da pena que lhe foi sentenciada, entendendo que a mesma é excessiva e violadora do artº 71º do Código Penal para o que invoca a circunstância de se encontrar a trabalhar como operador de máquinas, ser bem considerado entre os amigos, quer socialmente quer profissionalmente, ter um comportamento adequado no estabelecimento prisional, pelo que a respectiva pena a aplicar, (deveria) ter-se contido próximo do limite mínimo previsto na lei.

*Na 1ª instância o Mº Público respondeu às motivações do recorrente alegando em suma que a matéria de facto provada integra os elementos típicos dos ilícitos pelos quais o arguido foi condenado, designadamente os crimes de roubo e de ameaças, relativamente aos quais o recorrente pugna pela respectiva absolvição.

Quanto à medida das penas, parcelares e única, aplicadas pelo tribunal recorrido, entende que as mesmas se mostram adequadas e equilibradas, não se justificando a intervenção correctiva pretendida pelo recorrente.

*O assistente C………. respondeu igualmente ao recurso do arguido, alegando que não assiste razão ao recorrente, tendo ficado provado que a sua conduta integra a previsão do artº 210º do C.P., tendo cometido dois crimes de roubo, os quais, em sua opinião integram a previsão do artº 210º nº 2 do C.P., para além de dois crimes de ameaças p. e p. pelos artºs. 153º nº 1 e 155º nº 1 al.a) do C.P.

Mais alega que a pena única resultante do cúmulo jurídico não merece censura, concluindo que deverá ser negado provimento ao recurso.

*Neste Tribunal da Relação, o Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido de que, versando o recurso matéria de facto, como está implícito no corpo da motivação e não tendo sido cumprido o disposto no artº 412º nºs 3 e 4 do C.P.P., deverá ser o recorrente convidado a completar as conclusões, sob pena de o recurso não ser conhecido nessa parte.

*Cumprido o disposto no artº 417º nº 2 do C.P.P., não foi apresentada resposta.

*Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência.

* *II – FUNDAMENTAÇÃO O acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos (transcrição): 1) O arguido B………. e D………., mantiveram entre si um relacionamento amoroso, do qual resultou uma filha, nascida em 31 de Dezembro de 2004, passando ambos após o nascimento da criança, a viver juntos em ………., perto de ………. .

2) Entretanto a mãe da D………. foi operada e face a tal facto a D………. regressou a casa dos seus pais, sita em ………., Sabrosa.

3) Já em Agosto de 2007, a D………. foi passar alguns dias de férias a Espanha com o arguido B………., tendo ficado em ………., perto de Barcelona, altura em que a D………. recebeu uma chamada no telemóvel, o que deu origem a uma altercação entre ambos, acabando o arguido B………. por desferir-lhe bofetadas e murros, factos pelos quais não apresentou queixa.

4) Voltou então a D………. para casa dos seus pais, trazida pelo arguido B………., e já ali, disse-lhe que não queria continuar com a relação entre ambos, por não haver condições para tal, tendo ele, aparentemente, aceite tal decisão.

5) No entanto, o fim do relacionamento amoroso com a D………. não foi do agrado do arguido B………., que pese embora tenha regressado a Espanha, de imediato começou a enviar insistentemente mensagens para a D………., na tentativa de convence-la continuar a relação entre ambos.

6) Como a D………., por sua vez, não se deixava demover pelo arguido e insistia em acabar com a relação amorosa, o arguido passou então a telefonar-lhe e em tom agressivo, dizia-lhe que “mataria qualquer indivíduo com quem ela se envolvesse e que a ela, a mataria igualmente e que a torturaria, e que a filha de ambos a levaria para o Brasil.” 7) Em Portugal, a D………. tentava seguir com a sua vida longe do arguido B………. e passou a frequentar um curso de Técnica Administrativa no E………., estagiando na empresa F………., desde Julho de 2007, local onde também desempenhava funções o C………., e naturalmente passaram estes a relacionar-se enquanto colegas de trabalho.

8) No âmbito de tal relacionamento laboral, foi de igual forma surgindo um relacionamento de amizade entre a D………. e o C………., o que os levava por vezes tomarem café ou almoçarem juntos.

9) No dia 31 de Dezembro de 2007, o arguido B………. levou a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT