Acórdão nº 5/06.8FBVRL.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelOLGA MAURÍCIO
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REC PENAL.

Decisão: PROVIDO.

Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO - LIVRO 411 - FLS 142.

Área Temática: .

Sumário: Preenche o elemento do tipo “puser em circulação” do crime de venda, circulação ou ocultação de produtos ou artigos (324º C. Propriedade Industrial) a conduta do agente que transporta produtos contrafeitos que destina vender.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Processo n.º 5/06.8FBVRL Tribunal judicial de Chaves Relatora: Olga Maurício Adjunto: Artur Oliveira Acordam na 2ª secção criminal (4ª secção judicial) do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO 1.

Nos presentes autos o arguido B………. foi absolvido de um crime de venda, circulação ou ocultação de produtos ou artigos, previsto e punível pelo artigo 324º do Código de Propriedade Industrial, com referência ao art. 323º, al. c), e de uma contra-ordenação ao art. 1º do D.L. nº 147/2003, de 11/7, e 117º, nº 1, RGIT, por cuja prática fora acusado.

Foi, ainda, absolvido do pedido de indemnização civil deduzido pela assistente "C……….".

  1. Inconformada, a assistente recorreu, retirando da motivação as seguintes conclusões: «a) A douta sentença preferida a fls. desconsiderou parte da matéria de facto objecto do presente processo e que foi provada no âmbito da audiência de discussão e julgamento, tendo por isso absolvido o arguido; b) O arguido confessou que o material apreendido se destinava à sua posterior comercialização (Cfr. 03:40 a 04:10 e 10:56 a 11:00 das declarações do arguido, registado no CD onde foi gravada a prova produzida em audiência de julgamento em 16m e 13ss - Cfr. acta da referida audiência constante nos actos a fls.); c) O arguido confessou uma actuação planeada e informada, já que o mesmo, pese embora resida em Espanha (……….), se deslocou até ao Porto para se encontrar com determinada pessoa para adquirir objectos no valor de € 4000,00 (quatro mil ouros) (Cfr. 11:00 a 11:25 das declarações do Arguido), (Cfr. 00:40 a 00:50 e 13:50 a 14:30 das declarações do arguido); d) O arguido reconheceu nas suas declarações que procedeu ao pagamento do montante de € 4000,00 (quatro mil euros) aquando da entrega dos produtos (Cfr. 11:00 a 12:00 e 12:50 a 13:30 das declarações do arguido) e que tal valor se afigurava barato face aos produtos em causa (15:00 a 15:25 das declarações do arguido); e) Estes elementos são reveladores de que o arguido, que se identificou como vendedor, possuía, aquando da prática dos factos pelos quais foi acusado, um amplo conhecimento do mercado do comércio de produtos contrafeitos - v.g. perfumes - e actuava de modo apenas natural a alguém com experiência na comercialização do tipo de material contrafeito em causa; f) Só quem se dedica a tal actividade poderá ter percepção da diferença de preços praticados e poderá ter um perfeito conhecimento das pessoas que podem proporcionar boas condições de negócio; 9) O arguido confessou ter previamente negociado com terceiro a aquisição dos produtos apreendidos, facto que demonstra uma prévia escolha dos mesmos e que, consequentemente, o arguido se dedica à venda de produtos idênticos aos apreendidos nos autos - vestuário e perfumes; h) O Tribunal a quo considerou que a conduta do arguido não preenche o tipo objectivo constante do artigo 324º do CPI, porquanto "O arguido não vendeu os produtos contrafeitos. Ele destinava-os a posterior venda. Não colocou esses bens em circulação, no sentido da norma de introduzi-los no circuito comercial. Limitava-se a transportar os bens consigo para, noutro dia, tentar a sua venda. Também não existe qualquer ocultação das mercadorias. Estavam no interior do veículo, mas para transporte."; i) A prova produzida em sede de audiência de julgamento impunha decisão diversa da preferida pelo tribunal a quo; j) O Mmo. Juiz do Tribunal a quo julgou provado que o arguido adquiriu para posterior comercialização um total de 438 artigos contrafeitos e que os transportava no interior de um automóvel ligeiro de mercadorias; k) Ficou também provado que os artigos transportados pelo arguido tinham como destino a sua comercialização e que este não ignorava a sua natureza ilícita; 1) Acresce que ficou ainda provado que o arguido se encontrava a exportar produtos contrafeitos de Portugal para Espanha; m) O Arguido agiu livre e voluntariamente, com pleno conhecimento de como actuar no âmbito do comércio de material contrafeito; n) A venda efectiva dos produtos apenas não se verificou porque o arguido foi surpreendido por uma acção de fiscalização, conduzida pelo Sub-Destacamento Fiscal de Chaves da Brigada Fiscal da GNR, da qual resultou a apreensão daqueles artigos, quando se encontrava a caminho de Espanha; o) O arguido praticou assim um crime de circulação de produtos contrafeitos, tendo tal conduta relevância penal, com estatuição própria, nos termos do artigo 324º do CPI; p) A venda de produtos contrafeitos e a colocação em circulação de produtos contrafeitos constituem distintos tipos de ilícito, pese embora ambos se encontrem previstos no artigo 324º do CPI; q) O Mmo. Juiz do Tribunal a quo andou mal quando decidiu que a aquisição de artigos contrafeitos e o seu transporte não devem integrar o conceito de "pôr em circulação"; r) O Tribunal da Relação do Porto, em douto acórdão, já defendeu que o legislador, ao falar em pôr em circulação produtos ou artigos com marca contrafeita, imitada ou usada, emprega uma fórmula ampla e genérica, de maneira a abarcar todos os modos possíveis de entrada de mercadorias nos circuitos económico-sociais, tais como expedir pelos CTT, transportar, trazer consigo; s) O Tribunal da Relação do Porto, em douto acórdão, já decidiu quanto ao âmbito de aplicação do artigo 324º do CPI, que a formulação deste tipo criminal, à semelhança do que acontece com a referente ao trafico de droga, por exemplo, é de tal maneira abrangente e compreensiva que nele cabem condutas que, não fora a extensão da previsão legal, cairiam na forma imperfeito, tentada, do crime; t) O desiderato do legislador foi o de tipificar como crime a maior parte das condutas relacionadas com produtos contrafeitos, nomeadamente, o transporte.

    u) A decisão do douto tribunal a quo alicerçou-se numa errada apreciação dos factos confessados pelo arguido, de um errada interpretação da matéria de facto dada provada nos presentes autos e de uma incorrecta subsunção e interpretação jurídica do artigo 324º do CPI, pelo que a mesma não poderá deixar de merecer a censura de V. Exas».

    Termina pedindo a condenação do arguido pela prática do crime previsto e punível pelo artigo 324º do Código da Propriedade industrial.

  2. O recurso foi admitido.

  3. O Ministério Público junto do tribunal recorrido respondeu defendendo a manutenção do decidido no que ao pedido de alteração da matéria de facto respeita. Quanto ao mais, entende, também, que o arguido deve ser condenado pelo crime de que foi acusado.

    O arguido também respondeu aderindo, em substância, à tese defendida na douta decisão recorrida.

    O Exmº P.G.A. apôs visto no processo.

  4. Proferido despacho preliminar foram colhidos os vistos legais.

    Realizou-se a audiência, com observância do formalismo legal. Nas alegações finais mantiveram-se as teses já defendidas no processo.

    Cumpre decidir.

    * *FACTOS PROVADOS 6.

    Na decisão recorrida julgaram-se provados os seguintes factos: «1 - No dia 16/6/2006, pelas 23h00m, em ………., Chaves, no decurso de uma acção de fiscalização de rotina, efectuada através de operação Stop, realizada por agentes pertencentes ao Sub-Destacamento Fiscal de Chaves da Brigada Fiscal da GNR, foi fiscalizado o veículo automóvel ligeiro de mercadorias, marca Nissan, cor branca, matrícula ….DBG, propriedade de D………., SL, na altura conduzido pelo arguido que o havia alugado naquela sociedade.

    2 - No interior de tal veículo o arguido transportava diversos artigos de vestuário, calçado e perfumes que lhe pertenciam, os quais destinava à comercialização.

    3 - De entre tais artigos encontravam-se 324 ténis (sapatilhas) que ostentavam a marca "Puma", 42 perfumes que ostentavam a marca "Giorgio Armani", 48 perfumes que ostentavam a marca Chanel e 24 perfumes que ostentavam a marca "Cacharel", as quais estão registadas no instituto Nacional de Propriedade Industrial.

    4 - O arguido não possuía quaisquer documentos de aquisição de tais artigos de calçado e perfumaria, os quais havia comprado a um indivíduo não identificado no Porto.

    5 - Os exames periciais a que foram submetidos revelaram tratar-se de produtos contrafeitos, não sendo modelos de colecções originais, próprios ou...

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