Acórdão nº 3570/05.3TBVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Outubro de 2009

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ANTUNES
Data da Resolução13 de Outubro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: NEGADO PROVIMENTO.

Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO - LIVRO 325 - FLS. 81.

Área Temática: .

Sumário: I- A privação de uso de um bem pode dar origem tanto a um dano patrimonial como a um dano não patrimonial; II- Quando ocorra esta última espécie de dano, ele será indemnizável de harmonia com os critérios específicos de valoração e mensurabilidade desse tipo de dano.

III- A privação do uso de um bem constitui, por si, dano patrimonial, visto que constitui lesão do direito real de propriedade correspondente, traduzida na exclusão de uma das faculdades de que ao proprietário é lícito gozar: a de uso e fruição da coisa (art° 1305 do Código Civil).

IV- O acto de terceiro que torne materialmente indisponíveis as utilidades que é possível extrair desse bem — que têm, naturalmente, uma expressão pecuniária - deve ser encarado como um dano que, como tal, deve ser objecto de reparação adequada (art° 483 no 1 do Código Civil).

Reclamações: Decisão Texto Integral: Proc. nº 3570/05 Acordam no Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório.

B…………., por si e como cabeça-de-casal da herança jacente aberta por óbito de C……………, propôs, na …ª Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, contra D…………. e cônjuge, E…………., acção declarativa de condenação, com processo comum, ordinário pelo valor, pedindo: a) A declaração de que autora e aquela herança são legítimas proprietárias da fracção autónoma designada pelas letras AB, correspondente ao rés-do-chão esquerdo, corpo II, com entrada pela Rua ……….., e garagem na cave, com entrada pelo nº …., da mesma rua, do prédio, em regime de propriedade horizontal, sito na Rua …… e Rua do ………, Vila Nova de Gaia; b) A condenação dos réus a desocupá-la imediatamente, deixando-a devoluta de pessoas e coisas e a pagar, à autora e àquela herança, a quantia de € 1 252.44 e a quantia mensal de € 448.92, desde Maio de 2005, até efectiva entrega daquela fracção, livre de pessoas e coisas.

Fundamentou a sua pretensão no facto de B…………… e o seu cônjuge, C…………, que faleceu em Junho de 1999 e deixou como únicas herdeiras a primeira e a filha de ambos, F……………., nascida em 31 de Outubro de 1999, haverem adquirido, por escritura pública celebrada no dia 19 de Agosto de 1998, aquela fracção a Construções G…………. Lda., que adquiriu o terreno ou foi edificado o prédio por usucapião, encontra aquela aquisição registada na conservatória competente a favor dos primeiros, de, por contrato de Outubro de 1999, a autora ter prometido vender aos réus aquela fracção, por preço igual à divida daquela contraída junto da CG de Depósitos para a sua aquisição, tendo-se convencionado que na data da sua celebração os réus pagariam a quantia de 807 892$00, referentes às 13 primeiras prestações do empréstimo já vencidas, que o remanescente do preço seria pago, como sinal e princípio de pagamento, através da liquidação das sucessivas prestações, por transferência bancária para a conta da autora no CP Português, implicando o não pagamento de qualquer prestação a resolução imediata do contrato e a perda das quantias entregues, de ter autorizado os réus a ocupar a fracção a partir de 16 de Outubro de 1999, tendo-se estipulado que se faltassem ao pagamento das prestações aqueles se constituíram na obrigação de indemnizar a autora pela ocupação abusiva do andar à razão mensal de 90 000$00, e de os réus não haverem pago as prestações de Maio a Julho de 2004, no valor de € 900.00, tendo apenas pago, em 23 d Julho de 2004, a quantia de € 450.00, não tendo pago as prestações dos meses de Agosto e Setembro de 2004, pelo que lhes enviou uma carta, que aqueles receberam em 23 de Setembro do mesmo ano, declarando a resolução do contrato, mas os réus, que lhe desde Novembro de 2004, lhe fizeram entregas no valor de € 1 890.00, se recusarem a deixar a fracção, sendo por isso responsáveis pelo pagamento da indemnização mensal de € 448.92, desde Outubro de 2004 até à entrega da fracção, Os réus, admitindo a veracidade do facto relativo à aquisição, pela autora e pelo falecido cônjuge, da fracção, defenderam-se alegando que pagaram as prestações, e pediram, em reconvenção, a condenação da autora a pagar-lhes, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 5 000.00.

Fundamentaram a pretensão reconvencional no facto de a autora, sem justificação, lhe haver cortado a água e a luz, encontrando-se há mais de um ano sem água, vivendo, em condições desumanas, num permanente sobressalto, numa total de decadência emocional, tristes pelos infelizes comportamentos públicos da autora que não se inibe de, em qualquer lugar os insultar.

A autora pediu, na réplica, a condenação dos réus, por litigância de má fé em multa, e em indemnização a seu favor.

Por despacho de 28 de Fevereiro de 2006, convidou-se a autora, para suprir a ilegitimidade activa por preterição de litisconsórcio necessário, a fazer intervir na acção os demais titulares da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de C………….. e, por despacho de 6 de Junho do mesmo ano admitiu-se a intervenção principal espontânea, ao lado da autora, da filha desta e de C…………..

Realizada a audiência de discussão e julgamento, com registo sonoro dos actos de prova levados a cabo oralmente, decidiu-se, sem reclamação, a matéria de facto.

A sentença final da causa - ponderando, designadamente, que não se tendo os réus provado o pagamento das prestações dos meses de Maio a Setembro de 2004, a autora ficou legitimada a resolver o contrato promessa - julgou a acção parcialmente procedente e condenou os réus a reconhecer que a autora e a herança de C…………….. são legítimos proprietários da referida fracção, e a pagar-lhes a quantia de € 1 124.48 - quantia depois rectificada para € 5 114.48 – acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, desde a citação até integral pagamento, e a reconvenção improcedente, mas não se pronunciou sobre o pedido de condenação dos apelantes como litigantes de mãe fé.

Os réus apelaram, pedindo a revogação desta sentença e a sua substituição por acórdão que julgue a acção improcedente.

Com o escopo de demonstrar o mal fundado da decisão recorrida, os apelantes extraíram da sua alegação estas conclusões: 1. É um facto que a autora, por carta datada de 22 de Setembro de 2004, recebida pelos R.R. em 23.04.2004, comunicou aos Réus que em virtude de estes não terem procedido ao pagamento de diversas prestações do preço estipulado no contrato promessa, declarava a resolução do contrato promessa, nos termos e com os efeitos previstos na respectiva clausula 5.°, Porém; 2. O Tribunal "à quo" refere que; " Por fim, o documento de fls., 33, apenas prova que a autora enviou uma declaração aos réus para resolver o contrato que os liga, não se sabendo se com ou sem razão." - o sublinhado e o negrito são nossos. Ora; 3. Se é/foi assim, ou seja, se não se soube a sabe se o contrato foi ou não resolvido com ou sem razão, também não se poderá concluir que os Réus incumpriram o referido contrato. Assim; 4. E consequentemente não podem (iam) os RR ser condenados a pagar à autora uma indemnização por uma "pretensa" ocupação abusiva do andar, desde logo porque não conseguiram os Autores provar que resolveram aquele contrato com razão, o que seria pressuposto fazerem para poderem lançar mão da indemnização peticionada.

  1. Neste circunstancialismo são os RR do modesto entendimento e salvo o devido respeito por melhor opinião, que os fundamentos da Douta Sentença estarão em oposição com a presente decisão o que nos termos do disposto no Art.° 668 n.° 1 alínea c) do CPC, deverá determinar a sua nulidade.

  2. É verdade que em caso de dúvida, os factos devem ser considerados como constitutivos de direito, competindo assim à autora fazer a sua prova, ou seja, da celabração do contrato "in casu". Porém; 7. Não resulta do contrato promessa de compra e venda junto aos autos pela autora que esta o tenha celebrado na qualidade de cabeça de casal da herança jacente aberta por óbito do seu falecido marido C……………., resultando - isso - sim que " Clausula primeira: A primeira outorgante é dona e legitima possuidora de uma fracção autonoma designada pelas letras "AB" (....)", facto esse - que na verdade - não correspondia à realidade jurídica, desde logo, porque aquela imóvel - ainda que hipotecado - era propriedade de uma herança jacente, isto é, sem titular determinado.

  3. À data da outorga do aludido contrato promessa de compra e venda já a Autora mulher se encontrava no estado de viúva. Ora; 9. Se assim era - ou melhor: foi - quem ali - celebração do contrato - e aqui - nesta acção - deveria ter assumido a posição de vendedora e parte activa, deveria ter sido a Herança Jacente e não a Autora.

  4. Não se pode assim concluir que a mesma - autora - tenha conseguido fazer prova do respectivo facto constituitvo do direito daquela herança, desde logo, porque esta última nem sequer foi parte nesta acção. Na verdade; 11. Quem ali - celebração do contrato - e aqui - nesta acção - deveria ter assumido a posição de vendedora e parte activa, deveria ter sido a Herança Jacente e não a Autora, não se podendo assim concluir que a mesma tenha conseguido fazer prova do respectivo facto constituitvo do direito daquela herança. Por outro lado; 12. Ao considerar como não provada a matéria de facto vertida no quesito 8.° da Base Intrutória o Tribunal recorrido fez uma errada apreciação da prova; 13. Já que no modesto entendimento dos RR, foi produzida prova suficiente que permite dar como provado que estes RR efectuaram o pagamento de todas as "prestações" estipuladas.

  5. Sobre esta matéria os RR indicaram várias testemunhas, chamando-se a especial atenção para o depoimento a Sr.' D.a H………….., cujo respectivo depoimento se encontra gravado no CD junto a estes autos.

  6. Referindo-se à correspondente matéria de facto em causa esta testemunha soube dizer - de forma peremptória - que conhecia toda a situação pois por muitas/diversas vezes terá sido...

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