Acórdão nº 519/08.5TBSRE.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelALBERTO RU
Data da Resolução03 de Novembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2.ª secção): * Recorrente…………………A...

, representada por B....

, advogado, requerente da apresentação n.º 15, do dia 3 de Novembro de 2008, da Conservatória do Registo Predial de Soure; e Recorrido…………………..Instituto dos Registos e Notariado, I.P..

* I. Relatório:

  1. A... instaurou no Tribunal Judicial da Comarca de Soure, em 14 de Maio de 2008, uma acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra C...

    , à qual coube o n.º 201/08.3TBSRE, pedindo, no confronto com este, a condenação do mesmo a reconhecer que ela era proprietária do «prédio rústico composto por terra de cultura, com três oliveiras e vinha, com cerca de 550 videiras, com a área aproximada de 1300 m2, sita na Serra do Casal, freguesia de Vinha da Rainha, concelho de Soure, a confrontar do Norte com Rosalina dos Santos, do Sul com António Nunes Alexandre, do Nascente com João Alves e do Poente com caminho público, inscrita na matriz sob o artigo 2518 (parte)»; a reconhecer que do mesmo prédio faz parte integrante a faixa de terreno referida no artigo 35.º da petição; a arrancar os pilares, ferros e vigotas que implantou no prédio da Autora, retirando todos os materiais, bem como a retirar todos os resíduos, e, por fim, a pagar à Autora a quantia de €500,00 euros, a título de indemnização pelos prejuízos sofridos.

    O pedido foi fundamentado na posse e na aquisição da propriedade por usucapião.

    A acção não foi contestada e o Réu foi condenado nos termos pedidos pela Autora, tendo a sentença transitado em julgado no dia 10 de Setembro de 2008.

    Posteriormente, a Autora, por intermédio do seu advogado, requereu o registo desta aquisição com base nesta decisão judicial (Apresentação n.º 15 de 2008-11-03 – Decisão Judicial).

    A Sr.ª Conservadora deu início ao registo, atribuindo-lhe a ficha n.º 6336 da freguesia de Vinha da Rainha, concelho de Soure, que lavrou como «Provisório por dúvidas por não se haver provado a intervenção do comproprietário inscrito no registo, o casal D...

    e E...

    – artigos 68.º, 70.º, 73.º e 34.º, n.º 2 do C. R. Predial».

    O Ex.mo Sr. advogado da Autora interpôs recurso deste despacho para o Tribunal Judicial da Comarca de Soure, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 140.º do C. R. Predial.

    A Sr.ª Conservadora sustentou a sua decisão fundamentando-a no princípio do trato sucessivo, previsto no n.º 2 do artigo 34.º do C. R. Predial, referindo que o princípio em causa promove a continuidade das inscrições, com o fim de proteger o titular inscrito, o qual goza da presunção de que o direito existe na sua esfera jurídica, nos termos definidos pelo registo, o que implica a necessidade da sua intervenção, para que possa ser feita uma inscrição nova e definitiva.

    Foi proferida sentença que julgou o recurso improcedente, a qual manteve a decisão que qualificou o registo como provisório.

    Considerou-se na sentença que o princípio do trato sucessivo exige, na altura de ser lavrada nova inscrição, a intervenção do titular inscrito no registo, pelo que, se este não foi demandado na acção, cuja sentença serve de base ao registo, dado que este não é abrangido pelo caso julgado, o registo tem de ser lavrado como provisório.

    É quanto a esta decisão que vem interposto o presente recurso.

  2. O recorrente alega que a sentença recorrida fez errada aplicação do disposto nos artigos 95.º, n.º 1, alínea g) e 34.º, n.º 2 do C. R. Predial, incorrendo num equívoco que é a referência à compropriedade, que não existe.

    Concluiu: 1- A sentença transitada em julgado, que julgou procedente a acção declarativa de reconhecimento de direito de propriedade, adquirido por usucapião, constitui título para registo da sua parte dispositiva, introduzindo modificação no que está registado, e pode fundamentar um novo registo – artigos 3.°, n.º 1, alínea a) e c) e 95.º, n.º 1, al. g) do C. R. Predial.

    2 - O direito de propriedade sobre o prédio registando foi adquirido originariamente, por usucapião, pelo que, no caso vertente, não há lugar a trato sucessivo.

    3 - Tendo sido adquirido originariamente um direito de propriedade, as inscrições em vigor no «prédio-mãe», não se arrastam ao prédio usucapido.

    4 - Tendo sido reconhecido pela sentença que o prédio objecto do registo é autónomo e distinto do «prédio-mãe», não existe compropriedade.

    5 - A inscrição por decisão judicial do prédio objecto de registo é, nos termos da legislação registral em vigor, primeira inscrição.

  3. O Ministério Público contra-alegou pugnando pela manutenção da decisão, sustentando, em síntese, que, efectivamente, o princípio do trato sucessivo implica a demanda na acção dos titulares inscritos no registo predial, sob pena do registo ser lavrado como provisório por dúvidas, nos termos do artigo 70.º do C. R. Predial.

  4. O objecto do recurso consiste, por conseguinte, nisto: Saber se é legal qualificar como «provisório por dúvidas» um registo relativo à aquisição de propriedade, com fundamento no instituto da usucapião, quando: (1) O facto a registar respeita à aquisição de parte de um prédio já objecto de descrição predial em vigor; (2) Na acção judicial onde foi proferida a sentença que declarou a aquisição da propriedade, com base na usucapião, não interveio o comproprietário inscrito no registo.

    1. Fundamentação. Matéria de facto.

  5. A matéria provada, relevante para a questão a decidir, é esta: 1 – Na Conservatória do Registo Predial de Soure encontra-se descrito, sob o n.º 4335/19970429 – freguesia de Vinha da Rainha/Descrição em livro n.º 29469, Livro n.º 77, um prédio rústico, sito em Serra do Casal, com a área de total de 2460 m2, inscrito na matriz predial rústica sob o n.º 2518.

    2 – Este prédio está inscrito: Na proporção de ½ a favor de E... casada com D... e de D... casado com E..., sendo a causa a partilha da herança de F...

    e a doação da meação de D....

    Na proporção de ½ a favor de A..., viúva, sendo a causa da aquisição uma doação e sujeitos passivos da transmissão G...

    e H...

    , em relação aos quais consta um registo prévio de aquisição, na proporção de ½, tendo como causa a partilha da herança de F... e a doação da meação de D....

    3 - A... instaurou no Tribunal Judicial da Comarca de Soure, em 14 de Maio de 2008, uma acção declarativa de condenação, com processo sumário, à qual coube o n.º 201/08.3TBSRE, contra C..., pedindo, no confronto com este, a condenação do mesmo «A reconhecer que ela era proprietária do «prédio rústico composto por terra de cultura com três oliveiras e vinha com cerca de 550 videiras, com a área aproximada de 1300 m2, sita na Serra do Casal, freguesia de Vinha da Rainha, concelho de Soure, a confrontar do Norte com Rosalina dos Santos, do Sul com António Nunes Alexandre, do Nascente com João Alves e do Poente com caminho público, inscrito na matriz sob o artigo 2518 (parte)»; e ainda «A reconhecer que do mesmo prédio faz parte integrante a faixa de terreno referida no artigo 35.º desta Petição»; «A arrancar os pilares, ferros e vigotas que implantou no prédio da A., retirando todos os materiais bem como retirar todos os resíduos»; e, por fim, «A pagar à A. a quantia de 500€ a título de indemnização pelos prejuízos sofridos».

    4 - O pedido de declaração do direito de propriedade sobre este prédio, assim identificado, foi fundamentado em actos de posse conducentes à usucapião.

    5 - A acção não foi contestada e o réu C...foi condenado nos termos pedidos pela Autora, tendo a sentença transitado em julgado em 10 de Setembro de 2008.

    6 – Posteriormente, A... requereu, na Conservatória do Registo Predial de Soure, o registo desta aquisição com base nesta decisão judicial (Apresentação n.º 15 de 2008-11-03 – Decisão Judicial).

    7 - A Sr.ª Conservadora deu seguimento ao registo, atribuindo-lhe a ficha n.º 6336, da freguesia de Vinha da Rainha, que lavrou como «provisório por dúvidas por não se haver provado a intervenção do comproprietário inscrito no registo, o casal D... e E... – artigos 68.º, 70.º, 73.º e 34.º, n.º 2 do C. R. Predial.

  6. Passando à análise da questão objecto do recurso, que, recapitulando, passa por indagar se na aquisição por usucapião, declarada por sentença judicial, de parte de prédio já descrito no registo predial, é necessária a intervenção, nessa acção, dos titulares inscritos no registo, sob pena do registo ser lavrado como provisório.

    1 – A decisão de qualificar o registo como provisório, como resulta do despacho de sustentação da a Sr.ª Conservadora, baseou-se nas exigências resultantes do princípio do trato sucessivo previsto no n.º 2 do artigo 34.º do C. R. Predial.

    Vejamos, por conseguinte, se este princípio cobre a situação em apreço.

    O registo...

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