Acórdão nº 413/06.4JAFAR-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Julho de 2009

Magistrado ResponsávelALBERTO BORGES
Data da Resolução14 de Julho de 2009
EmissorTribunal da Relação de Évora

S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: NEGADO PROVIMENTO Sumário: 1- À deficiente fundamentação do despacho que, nos termos do art. 213.º do CPP, procede ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva não é aplicável o disposto no art.º 379 do CPP, pois trata-se de uma norma especial apenas aplicável à sentença; tal deficiente fundamentação, não tendo tratamento específico previsto na lei, constituiria uma mera irregularidade processual, submetida ao regime do art.º 123 do CPP.

  1. Encontrando-se o arguido já pronunciado, por crimes mais graves dos que inicialmente se indiciavam, tal facto - conjugado com a natureza, quantidade e gravidade dos crimes pelos quais foi pronunciado e as razões que justificaram o receio de fuga que fundamentou a aplicação da medida de coacção - permite concluir, de acordo com os critérios da normalidade da vida, que maior será o receio de que o arguido, sobre quem recai tal acusação, e confrontado com a probabilidade de vir a ser condenado em elevada pena, ante a facilidade de fuga que a sua condição lhe proporciona, até pela ligação aos países da América Latina, maior propensão terá para se furtar à acção da justiça, caso tal oportunidade lhe seja dada.

  2. O receio de que o arguido de furte à acção da justiça está bem demonstrado no despacho que aplicou tal medida, concretamente: i) pela utilização de identidade falsa, com sucesso, circunstância que, objectivamente, dificulta a localização de qualquer arguido (seja em Espanha, em Portugal ou qualquer outra parte do mundo); ii) pela oposição à transferência para Portugal (no âmbito do mandado de detenção europeu), que permite concluir, objectivamente, que não se apresentaria se não fosse forçado a tal; iii) pelas elevadas quantias de que, com outros, se apropriou, que lhe permitiriam ausentar-se para qualquer parte do globo, designadamente para a América Latina, pela ligação do arguido a outros envolvidos nos autos de nacionalidade venezuelana e colombiana.

    Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção Criminal da Relação de Évora: 1. No Tribunal Judicial da Comarca de Loulé (2.º Juízo Criminal) corre termos o Processo n.º …, no qual foi decidido, por despacho de 3.04.2009 (fol.ªs 7244 a 7245), manter a medida de coacção aplicada ao arguido J.V. – de prisão preventiva - a qual lhe fora aplicada por despacho de 19.12.2007, na sequência do interrogatório judicial a que foi submetido.

  3. Recorreu o arguido desse despacho, concluindo a motivação do seu recurso formulando as seguintes conclusões: a) O recorrente fundamenta a necessidade de ver alterada a medida de coacção a que está sujeito por outra medida menos gravosa com base na atenuação das exigências cautelares que determinaram a sua sujeição à medida de coacção de prisão preventiva.

    1. Desde logo, porque à data é o único arguido que se encontra em situação de reclusão.

    2. Já foi deduzida acusação.

    3. Aquando do Mandado de Detenção Europeu emitido para captura do mesmo, tal foi “encontrado” sem qualquer dificuldade acrescida relativamente a um qualquer cidadão português, é cidadão da União Europeia, espaço comum a todos os cidadãos das referidas nações, onde a cooperação internacional é notória e relevante, caindo por base o malfadado fundamento do perigo de fuga, sendo que, e relativamente aos outros pressupostos de aplicação referidos no art.º 204 do CPP; em concreto, de todo se verificam.

    4. Para mais, encontra-se já com 18 meses de reclusão, não lhe tendo sido sequer possibilitado o direito ao contraditório no que concerne à decretada especial complexidade processual, a qual hoje, na prática, muito o está a prejudicar, circunstâncias estas que foram completamente ignoradas e desatendidas pela decisão recorrida, a qual, aliás, carece de uma total falta de fundamentação.

    5. A nossa lei, no art.º 193 do CPP, dispõe que à aplicação das medidas de coacção devem presidir os princípios da adequação, proporcionalidade e subsidiariedade, pelo que se afigura manifestamente excessiva e desadequada a sujeição do arguido à mais gravosa das medidas de coacção existentes: a prisão preventiva.

    6. A situação dos presentes autos preenche os pressupostos de que depende o recurso à medida de obrigação de apresentação periódica, prevista no art.º 198 do CPP, e, eventualmente, prestação de caução com valor a fixar, medidas que serão claramente adequadas a acautelar as exigências cautelares que ainda assim se considerem persistir.

    7. Deve revogar-se a decisão recorrida e substituir-se por outra – menos gravosa - que considere atenuados os perigos que determinaram a colocação do arguido em prisão preventiva, no limite, pela obrigação de prestação de caução, de valor a fixar de acordo com o douto critério do tribunal.

    8. Não se fez a melhor justiça na aplicação da lei penal, quando se tornou patente que no despacho recorrido o tribunal não considerou, em concreto e em conjunto, os pressupostos de facto e de direito que fundamentaram a manutenção da medida de coacção aplicada, não existindo sequer a referência aos factos e/ou à personalidade do recorrente, bastando-se pela invocação abstracta de uma anterior decisão que à data já tem mais de um ano, violando o disposto no art.º 77 n.º 1 do CP e 374 n.º 2 do CPP.

    9. Deve revogar-se a decisão que indeferiu o requerimento do arguido em que solicitava a revogação da medida de coacção de prisão preventiva, devendo esta ser substituída por outra que determine que seja aplicada uma medida de coacção menos gravosa, a qual, no limite, poderá ser a obrigação de prestação de uma caução.

  4. Respondeu o M.º P.º junto da 1.ª instância, concluindo, em síntese: a) O presente recurso tem como objecto a revogação do douto despacho de fol.ª 7244, que decidiu manter a medida de coacção aplicada ao arguido recorrente - a prisão preventiva - a que o mesmo se encontra actualmente sujeito, e a sua substituição por outra medida de coacção menos gravosa, a qual, no limite, poderá passar pela obrigação de prestação de uma caução.

    1. Segundo a douta decisão instrutória proferida nestes autos foram pronunciados, para além do recorrente, os arguidos J.R. e Y.A.

    2. Considerou a pronúncia que os autos indiciam suficientemente que os arguidos J.R. e Y.A., com um plano prévia e rigorosamente traçado, com o fito de “formar um grupo de colaboradores, atribuições específicas de actuação, tendo em vista elaborar processos de obtenção de financiamentos bancários que formalmente respeitassem todos os requisitos e exigências legais, com base em documentação aparentemente autêntica e pretensamente emitida por quem tinha legitimidade para o efeito”.

    3. E que, “Para além de outros, os arguidos (aqui J.R. e Y.A.) admitiram na sua organização o arguido J.V., tendo todos eles tomado conhecimento dos propósitos e finalidades do agrupamento, que anuíram na concretização do projecto, bem assim, ficaram bem cientes do papel que a cada um era exigido”.

    4. “Ao arguido J.V. caberia desempenhar a função de pretenso adquirente de moradias e requerente de financiamento bancário para a sua aquisição”.

    5. O arguido J.V. encontra-se pronunciado, em concurso efectivo e em autoria material: - pela prática de um crime de associação criminosa, p. e p. pelo art.º 299 n.º 2 do CP; - pela prática de três crimes de burla qualificada, p. e p. pelos art.ºs 217 n.º 1 e 218 n.º 2 al.ª a), ambos do CP; - pela prática de um crime de burla qualificada, na forma tentada, p. e p. pelos art.ºs 217 n.º 1 e 218 n.º 2 al.ª a), conjugados...

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