Acórdão nº 276/07.2TTOAZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelPAULA LEAL DE CARVALHO
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: NEGADO PROVIMENTO.

Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL) - LIVRO 96 - FLS 251.

Área Temática: .

Sumário: I - No domínio do Cód. Trabalho (CT), na versão aprovada pela Lei 99/2003, de 27/8, atento o disposto no seu art. 151º, nºs 2 e 3, a actividade contratada pode ter um conteúdo mais amplo do que a categoria profissional, não podendo o empregador, fora dos limites do exercício do ius variandi consagrado no art. 314º do mesmo, exigir do trabalhador o exercício de tarefas não compreendidas nessa actividade.

II - O exercício do iu variandi, consagrado na modalidade funcional prevista no citado art. 314º, depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos: (a) existência de um interesse legítimo do empregador; (b) transitoriedade da necessidade que determina a modificação; (c) inexistência de modificação substancial da posição do trabalhador; (d) indicação dos motivos que o justificam, por reporte ao interesse da empresa; (e) indicação da sua duração; (f) adequação do motivo invocado ao tempo de duração do ius variandi.

III - Cabe no âmbito da mobilidade funcional prevista no art. 314º a ordem do empregador (instituição bancária) que, invocando a concretização dos seus objectivos estratégicos de reforço das estruturas relacionadas com o crédito à habitação e financiamento à construção e a avaliação, no prazo previsível de seis meses, desse reforço, determina ao trabalhador (gerente de estabelecimento) o exercício, pelo referido prazo, das funções (em exclusividade) de gestor de mediadoras (que têm por objecto a angariação de clientes e negócios de concessão de crédito à construção e à habitação).

IV - Nos termos do art. 316º, n.º 3 do CT, na ordem de transferência temporária de local de trabalho devem constar a sua justificação e o seu tempo previsível, não se exigindo, porém, que dela também conste a regulamentação ou condições de pagamento de despesas a que o trabalhador, nos termos do n.º 4 desse preceito, possa ter direito.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Procº nº 276/07.2TTOAZ.P1 Apelação Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 275) Adjuntos: Des. André da Silva Des. Machado da Silva (Reg. nº 1350) Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B………. veio propor a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra C………., SA, pedindo a condenação deste no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais de valor não inferior a 15.000 €, danos esses alegadamente decorrentes da ilicitude, que quer ver reconhecida, da ordem de mudança de funções e de local de trabalho que lhe dirigiu. Mais pediu a fixação de sanção pecuniária compulsória de valor adequado à grande capacidade financeira da Ré e à ilicitude e censurabilidade do seu comportamento.

Para tanto, alega, em síntese, que: sendo, desde 12.01.2005, gerente de ………., aos 05.02.07, a Ré; por ordem datada de 05.02.07 e que lhe foi entregue aos 06.02.07, determinou a sua transferência para a Direcção Regional de ………. e o desempenho de funções de mediador de imobiliárias; tal ordem baseou-se em mera necessidade de reforço de quadros numa área de actividade da Ré, sendo tal necessidade duradoura e permanente e não temporária, não justificando o desvio funcional do A. e o período de tempo nela indicado (seis meses), assim violando o disposto nos arts. 314º e 316º do Código do Trabalho (de ora em diante designado por CT) e a clª 6ª do ACTV dos bancários; a Ré diz pagar as despesas, mas não as discrimina, nem indica o critério; a razão de facto na base de tal ordem foi de perseguição e sanção ao Autor provocando-lhe, de forma deliberada, os danos não patrimoniais que invoca, designadamente angústia e depressão.

Quanto à sanção pecuniária compulsória, alega receio de incumprimento da providência cautela que antecedeu esta acção, não devendo a sanção ser inferior a um milhão de euros por dia útil.

A ré contestou, alegando em síntese que: o A. tinha a categoria de gerente, estando integrado no Grupo I (cfr. Anexo I do ACTV), em cujo descritivo se enquadra a função de Gestor de Mediadoras, já que se trata de funções de elevada complexidade técnica, grande complexidade, responsabilidade e confiança, pelo que, nos termos do art. 151, nº2, do CT e clª 6ª, nº 1, do ACTV, tais funções integram-se na actividade contratada entre A. e Ré. Mas, ainda que assim se não entendesse, a atribuição ao A. justifica-se ao abrigo da “mobilidade funcional”, pelo que é lícita. Impugna ainda os alegados danos não patrimoniais, invoca a falta de justificação e a irrazoabilidade da sanção pecuniária compulsória e termina concluindo pela sua absolvição do pedido.

Proferido despacho saneador tabelar, com dispensa da selecção da matéria de facto, realizada a audiência de discussão e julgamento e decidida a matéria de facto, sem reclamações[1], foi proferida sentença julgando a acção totalmente improcedente, absolvendo a Ré do pedido.

Inconformado, veio o A. apelar da referida sentença, formulando, a final das suas alegações, as seguintes conclusões: 1ª Um gestor de mediadoras imobiliárias não é um empregado bancário (como é o A., facto provado nº 1), mas um trabalhador da actividade imobiliária ou de venda de imóveis, sujeito a regime próprio, de acesso a essa actividade (DL 77/99, de 16.3, alterado pelo DL 258/2001, de 25.9 3 depois pelo novo regime do DL 211/04, de 20.8 e das Portarias nº 1324/04, de 19.10, nº 1326/04, de 19.10, e nº 66/05, de 25.1); 2ª Um empregado bancário obedece a regras próprias da actividade bancária, sob a égide do Banco de Portugal e, ao invés, a actividade imobiliária não tem qualquer controlo do Banco de Portugal; 3ª A clª 6ª do ACTV veda ao Banco R. a alteração funcional do A. -gerente do sector bancário, Anexo I -, e o R. não pode derrogar essas regras bancárias insertas na convenção colectiva como normas regulamentares da actividade bancária, fazendo uma montagem de organização própria e mista ad libitum, ao sabor dos seus interesses económicos; 4ª A ordem não visava a satisfação de um interesse temporário, mas duradouro; 5ª E era contrário aos interesses do Banco R. no sector bancário, como resulta do quadro de pessoal da Agência de ………., com um gerente (o A.) e duas assistentes de vendas, pelo que, claramente, visava tirar de lá o A. para colocar outro, desvirtuando os interesses em jogo, por represália, de má fé; 6ª O R. tinha obrigação de ter regulamentado a deslocação do A., como entidade empregadora sensata e prudente, e não usar de sofismas, em repetição do mesmo artifício já usado na acção anterior, de desconhecer o tipo de deslocação e desculpar-se com a falta de autorização para o uso de transporte próprio; 7ª Ao fazer como fez na acção anterior, não preenche também o requisito do pagamento da deslocação.

8ª A decisão recorrida violou os artºs 314º, 316º e 317º, do CT, além das normas jurídicas supra citadas.

Nestes termos, ..Deve o recurso proceder e reconhecer-se como ilícita, senão abusiva, a ordem dada e, em consequência, ser o R. condenado no pagamento ao A. da indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos e ser decretada uma astreinte (artº 829º-A CC).

A ré contra-alegou, concluindo no sentido do não provimento do recurso.

O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso, sobre o qual as partes, notificadas, não se pronunciaram.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

***II. Matéria de Facto Provada Na 1ª instância, foi dado como provada a seguinte factualidade: 1 – O Autor foi admitido pela Ré em 06-09-1999 para lhe prestar serviço, sob a sua autoridade, direcção e fiscalização, como empregado bancário; 2 -Em 12-01-2005, foi colocado como gerente na agência de ………. .

3 – Pelo proc. nº …/06.5TTOAZ requereu uma providência cautelar contra a Ré pela qual pediu a suspensão de uma ordem de 05-05-2006, que, na sequência de uma sanção disciplinar lhe determinou a transferência para a Direcção Regional de ………. sob a designação de gestor de mediadoras.

4 – A providência foi decretada por decisão de 22-08-2006, transitada em julgado, que suspendeu a ordem de mudança de funções e de local de trabalho, dando-se aqui por reproduzido o respectivo teor.

5 – A acção proposta na sequência da referida providência corre termos sob o proc. nº …/06 deste Tribunal e nela o Autor, entre outros pedidos, pretende a anulação da ordem suspensa datada de 05-05-2006.

6 – Tal acção teve julgamento marcado para 07-03-2007, tendo, nessa data, as partes requerido a suspensão da instância de tal processo com vista à solução extrajudicial do litígio que não se concretizou.

7 – No dia 06-02-2007, a Ré entregou em mão ao Autor a carta inserta de fls. 14 a 16 cujo teor, por economia, aqui se dá por integralmente reproduzido.

8 – O quadro de pessoal da agência de ………. é constituído pelo gerente e por duas assistentes de vendas (D………. e E……….).

9 – O Autor esteve afastado das suas funções na agência de ………. desde 05-05-2006 em cumprimento de uma sanção disciplinar de suspensão por 60 dias e em meados de Agosto de 2006 foi aí colocado o funcionário F………., assistente administrativo, proveniente da agência da Ré em ………., o qual durante a ausência do Autor foi o responsável da agência, exercendo algumas das funções de gerência mas não tinha poderes de crédito sendo as operações de aprovação de crédito submetidas à Direcção Regional de ……… .

10 – O Autor regressou à agência de ………. em 20-11-2006 e a partir de então tem exercido normalmente as suas funções tendo-lhe o Banco requerido concedido o gozo de férias fora do período habitual.

11 – O funcionário F……… manteve-se a trabalhar na agência de ………. após o regresso do Autor.

12 – Após receber a comunicação datada de 05-02-2007, nos dois dias de trabalho seguintes, o Autor esteve com baixa médica e, desde então, mantém-se normalmente ao serviço, nada tendo comunicado à Ré relativamente à ordem recebida.

13 – No período anterior à colocação como...

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