Acórdão nº 2107/03.3TBPMS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelCARVALHO MARTINS
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: APELAÇÃO Decisão: CONFIRMADA Legislação Nacional: ARTS. 224, 428, 432, 434, 436, 566 CC, 661 Nº2 CPC Sumário: I - O Cód. Civil vigente, nos seus arts. 224.° e seguintes, consagrou a teoria da recepção, ainda que temperada pela teoria do conhecimento. Em tais termos, pressupõe-se, circunstancialmente, um tipo de declaração receptícia ou recipienda - declaração que carece de ser dada a conhecer a um destinatário; e não uma declaração não receptícia (declaração que não carece para a sua completa relevância ou eficácia, de ser dada a conhecer a um destinatário, valendo logo que a vontade do declarante, se manifesta em forma legal).

  1. A «exceptio» do art. 428º do Código Civil é aplicável a todos os contratos bilaterais, independentemente da estrutura particular assumida pelo sinalagma em algumas categorias desses contratos. Apenas não pode ser invocada entre obrigações não abrangidas pela relação sinalagmática.

    III A falta de pagamento do prémio por parte dos autores não legitima a recusa da seguradora em pagar o capital seguro (tal como não seria legítima a recusa do segurado em pagar o prémio por falta de pagamento de qualquer indemnização por parte da seguradora). Pois que, se não existe interdependência entre as duas prestações, não pode a falta de cumprimento de uma servir de fundamento para a recusa no cumprimento da outra.

    IV Da conjugação do preceituado nos arts. 566°, n.° 2, do Cód. Civil e 661°, n°2, do Cód. Proc. Civil resulta que só cabe a aplicação do estabelecido neste último (relegando-se para o incidente de liquidação na acção executiva a fixação do quantum da condenação, se não houver elementos para o fazer na acção declarativa) nos casos em que a lei não imponha ou permita ao julgador o recurso à equidade para fixar a quantidade da condenação ou quando nem mesmo com recurso à equidade for possível a condenação em quantia certa.

    Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I - A Causa: A....

    viúvo, residente ..., B....

    , solteira, maior, residente ..., e C....

    solteiro, maior, residente .....

    instauraram a presente acção declarativa de condenação sob a forma ordinária contra Companhia de Seguros D....

    (por lapso de escrita inicialmente identificada como .....), pessoa colectiva n.° ...., com sede na ...., e Banco E....

    . com sede ....(entretanto incorporado por fusão no Banco F...

    pessoa colectiva n.° ..., com sede na ...., que lhe sucedeu nos autos — fls. 321 e ss.), pedindo: a) a condenação da ré seguradora a pagar ao segundo réu a quantia de 54.520,14€ (cinquenta e quatro mil, quinhentos e vinte euros e catorze cêntimos), acrescida de juros de mora desde a data de 28/01/2003, relativa ao capital do seguro de vida celebrado; b) a condenação do segundo réu a reconhecer que em consequência desse pagamento fica liquidada na totalidade a dívida dos autores relativa a um contrato de concessão de crédito imobiliário celebrado com o primeiro autor e a sua falecida esposa; c) a condenação da ré seguradora a reembolsar aos autores as prestações que desde 28/01/2003 pagaram e venham a pagar ao segundo réu (que até 18/09/2003 atingiam o montante de 2.783,64€ - dois mil, setecentos e oitenta e três euros e sessenta e quatro cêntimos), acrescido de juros contados desde a data dos respectivos pagamentos; d) a condenação solidária de ambos os réus a pagarem aos autores as quantias de 5.000,00€ (cinco mil euros) para compensação de danos não patrimoniais e de 250,00€ (duzentos e cinquenta euros) para indemnização de danos patrimoniais sofridos em consequência do incumprimento contratual, tudo acrescido de juros de mora à taxa legal, contados desde a data da citação.

    Alegam, em síntese, que o primeiro autor e a sua falecida esposa G.....

    (de quem os autores - viúvo e filhos - são os únicos herdeiros) contraíram junto do segundo réu um mútuo no valor de 12.000.000$00, para cuja concessão o segundo réu exigiu que celebrassem com a primeira ré um seguro de vida destinado a cobrir o pagamento da quantia ainda em dívida no caso de morte de qualquer deles. Sucede que a esposa do primeiro autor veio a falecer em 28/01/2003 mas a ré seguradora não procedeu ao pagamento ao réu banco da quantia então em dívida. Questionada pelo primeiro autor, veio a ré seguradora informar que considerou o seguro anulado por falta de pagamento do prémio, alegando ter enviado uma carta a advertir o primeiro autor e a sua esposa da falta de pagamento e das consequências da não regularização da situação no prazo concedido. Os autores negam alguma vez ter recebido esta carta e afirmam desconhecer a anulação do seguro, mais negando que tenha havido qualquer falta de pagamento do prémio, tanto mais que esse pagamento era feito por débito em conta bancária e o primeiro autor deu instruções ao banco para que fossem feitas transferências de outras contas de que também era titular para provisionar aquela através da qual era feito o pagamento. Alegam que o primeiro autor após a morte da esposa continuou a pagar as prestações devidas pelo empréstimo bancário e que toda a situação lhe causou preocupação, desgosto e incerteza, além de ter tido de percorrer mais de 500 km e de gastar 250,00€ em chamadas telefónicas para tentar resolver a situação.

    * Regularmente citadas, ambas as rés contestaram.

    A ré Companhia de Seguros D... contestou a fls. 57 e ss., negando ter celebrado qualquer contrato com o primeiro autor e com a esposa, antes tendo esse contrato sido celebrado com a sociedade Companhia de Seguros D...., pessoa colectiva distinta e autónoma. Termina pedindo a improcedência da acção em relação a si e a sua absolvição do pedido.

    O segundo réu contestou a fls. 100 e ss., arguindo a incompetência territorial deste tribunal (por violação de cláusula de atribuição de competência inserta no contrato de mútuo) e a sua ilegitimidade para a acção (dizendo que do modo como os autores configuram a acção apenas a primeira ré tem interesse em contradizer, pois está apenas em apreciação o contrato de seguro celebrado e não o de mútuo). Impugna os factos alegados pelos autores, dizendo: que as cartas enviadas o foram para a morada do imóvel adquirido e que os autores declararam na escritura que o mesmo se destinaria a sua habitação própria; que a conta bancária não estava efectivamente provisionada na data de pagamento do prémio do seguro; e ainda que qualquer que seja o desfecho da presente acção, o primeiro autor nunca se desvincularia do crédito que tem perante si, pois o banco é alheio ao contrato de seguro celebrado com a primeira ré. Termina pedindo a declaração de incompetência do tribunal e a procedência da excepção de ilegitimidade (e a sua consequente absolvição da instância) ou, subsidiariamente, a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.

    * Replicaram os autores a fls. 121 e ss., alegando que a identificação da ré seguradora no cabeçalho se deveu a erro de escrita (cuja rectificação requerem), mas que a companhia seguradora com a qual foi celebrado o contrato faz parte do mesmo grupo e tem a mesma sede que aquela contestante, pelo que a ré contestante compreendeu perfeitamente o sentido da citação. Pugnam pela improcedência da excepção de incompetência territorial, alegando que a cláusula invocada pelo segundo réu é nula por não identificar as questões concretas que abrange, e defendem também a improcedência da excepção de ilegitimidade por terem pedido a condenação do segundo réu no pagamento de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, tendo ele, portanto, interesse em contradizer.

    * Na sequência de aceitação por parte da ré contestante (fls. 126), foi admitida a fls. 131 a correcção do lapso de escrita na identificação da primeira ré e ordenada a repetição da citação.

    * Regularmente efectuada a citação, a ré Companhia de Seguros D.... contestou a fls. 137 e ss.. Confirma a celebração do contrato de seguro mas alega que o primeiro autor e a sua falecida esposa não pagaram os prémios vencidos em 01 / 01/1997 e 01/01/1998, pois a conta bancária não tinha saldo que permitisse tal pagamento. Diz ter enviado ao autor e à sua esposa uma carta a conceder-lhes um prazo adicional de oito dias para regularizarem o pagamento mas que estes apesar de a terem recebido não o fizeram, pelo que considerou o contrato de seguro resolvido. Impugna os danos que os autores alegam ter sofrido e termina pedindo a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.

    * Replicaram os autores a fls. 187 e ss., negando o recebimento da carta alegada pela ré seguradora e reafirmando o alegado na petição inicial, concluindo como nesta.

    * Nenhum dos réus apresentou tréplica.

    * Oportunamente, foi proferida decisão onde se consagrou que Nos termos expostos, julgo a acção parcialmente procedente por provada e, consequentemente: a) condeno a ré Companhia de Seguros D.... - em cumprimento do contrato de seguro de vida celebrado com A...e mulher G... para garantia do mútuo contraído em 11/1011996 junto do Banco F... — a pagar ao réu Banco F... a quantia de 54.520,14€ (cinquenta e quatro mil, quinhentos e vinte euros e catorze cêntimos), correspondente ao capital daquele mútuo ainda em dívida à data do falecimento de G... (28.01.2003) deduzida do montante das prestações que desde essa data tenham sido pagas ao Banco F... pelos autores, acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde a data do último pagamento efectuado pelos autores; b) condeno o réu Banco F... a reconhecer que na sequência do pagamento que seja efectuado nos termos da alínea anterior pela ré Companhia de Seguros D.... fica liquidada na totalidade a dívida dos autores relativa ao contrato de mútuo celebrado por A...e mulher G... com o Banco E...., titulado na escritura pública de 11 de Outubro de 1996, lavrada a folhas.... do Livro .... das escrituras diversas do 1.º Cartório Notarial de K...; c) condeno a ré Companhia de Seguros D.... a pagar aos autores A...., B... e C... a quantia...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT