Acórdão nº 167/03.6GCLSA.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelESTEVES MARQUES
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: REVOGAÇÃO PARCIAL Legislação Nacional: 137º DO CP, 24º,25º35º DO CE, 483º,494º E 496º DO CC ,127º 412º,428º, 431º DO CPP Sumário: 1. Não era ao condutor do motociclo, que circulava na via onde o arguido pretendia entrar, cruzando-a, que estava obrigado a prever a falta de prudência ou inconsideração do arguido que, não obstante ter dois sinais de stop, sendo um vertical e outro pintado no pavimento, fosse capaz de desprezar tais avisos.

  1. Também o condutor do motociclo não estava obrigado a prever que o arguido avançasse para a via onde aquele circulava e sobre a qual tinha uma visibilidade reduzidíssima, sem tomar as devidas precauções já que era previsível que desse lado pudesse surgir uma viatura.

  2. Estando provado que a vítima circulava a velocidade superior a 47, 2 km/hora e sendo a velocidade permitida no local de 40 km/hora, bem como a gravidade e a quantidade de lesões que do embate para ela resultaram, dúvidas não há de que esse excesso de velocidade pese embora irrisório, traduzido em 7,2 km/hora contribuiu também para a eclosão do acidente.

  3. Naquelas condições era exigível à vítima igualmente uma maior prudência, pois todos os condutores tenham ou não prioridade de passagem, têm a obrigação de reduzir a velocidade nos entroncamentos 5.Verifica-se assim a concorrência de culpas com a vítima na produção do acidente, sendo que a do arguido, porque determinante no acidente, terá de considerar-se substancialmente superior, Por essa razão fixa-se em 4/5 a culpa do arguido, e em 1/5 a da vítima 6. Em caso de absolvição de um arguido pela prática de um crime de homicídio por negligência, aceite pelo Ministério Público, não interpondo recurso, o assistente carece de legitimidade para recorrer daquela decisão 7..Considerando que a vítima era casada à data da sua morte, os danos não patrimoniais a considerar para efeitos de indemnização são apenas os sofridos pela vítima e os sofridos pela viúva, que cabem apenas a esta, porque integrante do 1º grupo mencionado no artº 496º nº 2 CC. Assim não há pois lugar a indemnização aos ascendentes.

  4. Na indemnização devida pela perda do direito à vida, há que atender, não só ao valor do bem da vida, em si mesmo considerado, que é o mais valioso dos bens que integram os chamados direitos de personalidade, como ainda ao apego da vítima à vida, que pode ser aferido, à falta de outros elementos para o efeito relevantes, pela sua idade, o seu estado civil, a sua situação profissional e familiar, e a sua condição sócio-económica.

  5. Face ao acima exposto, tendo vítima à data do acidente 31 anos de idade, saudável e casado, a indemnização arbitrada 60.000,00 euros pela lesaão do direito á vida mostra-se equilibrada Decisão Texto Integral: Por sentença proferida em processo comum singular do Tribunal Judicial da Lousã, foi para além do mais, decidido: a) Absolver o arguido, C,, da prática do crime de homicídio por negligência, p. p. pelo art. 137º, nº1, do Cód. Penal, de que vinha acusado.

    1. Julgar parcialmente procedente o pedido cível e, consequentemente: - condenar a demandada, L… Seguros, S.A., a pagar: - à assistente, A, o valor de €30.000,00 (trinta mil euros) por danos não patrimoniais próprios sofridos por causa da morte de R, acrescido de juros de mora desde a data da presente sentença até efectivo e integral pagamento; - a cada um dos demais demandantes, MM e JJ (estando habilitados nos autos em seu lugar MM) o valor de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros) por danos não patrimoniais próprios sofridos por causa da morte de R, acrescido de juros de mora desde a data da presente sentença até efectivo e integral pagamento; - a todos os demandantes em conjunto o valor de €60.000,00 (sessenta mil euros) pela perda do direito à vida do falecido R e €2.500,00 (dois mil e quinhentos euros) pelos danos não patrimoniais sofridos pelo mesmo nos momentos que antecederam a sua morte, acrescidos de juros de mora desde a data da presente sentença até efectivo e integral pagamento; - a todos os demandantes em conjunto o valor de €4.519,90 (quatro mil, quinhentos e dezanove euros e noventa cêntimos) por danos emergentes, acrescido de juros de mora desde a data da citação da demandada até efectivo e integral pagamento; e - à assistente, o valor de €139.675,06 (cento e trinta e nove mil, seiscentos e setenta e cinco euros e seis cêntimos) por lucros cessantes, acrescido de juros de mora desde a data da citação da demandada até efectivo e integral pagamento.

    Tudo, perfaz o montante global de (duzentos e oitenta e seis mil, seiscentos e noventa e quatro euros e noventa e seis cêntimos) €286.694,96.

    Mais se determinou que os montantes que caberiam ao demandante JJ, entretanto falecido, sejam pagos a MM e a D por terem sido estes os sucessores habilitados a prosseguir no enxerto cível, no lugar de JJ.

    Inconformada, a assistente A. interpôs recurso da sentença, concluindo na sua motivação: “ I. Em caso de manobra de mudança de direcção, existem circunstâncias, nomeadamente a falta de visibilidade, que tornam insuficiente a observância estrita de comandos legais de sentido específico como por exemplo a paragem ao sinal de STOP.

    1. Com efeito, o condutor, confrontado com essas circunstâncias, só poderia efectuar a manobra de mudança de direcção (entre outras) em local e de forma que da sua realização não resulte perigo ou embaraço para o trânsito (art. 35º, nº 1 do Código da Estrada).

    2. No caso dos autos, o conteúdo normativo autónomo do art. 35º, nº 1 impunha que o arguido, não apenas imobilizasse o veículo no STOP, mas ainda que fosse avançando intermitentemente, sempre atento à aproximação de veículos vindos de Miranda do Corvo, ganhando progressivamente maior visibilidade até que estivesse certo da segurança da manobra.

    3. Nada disso foi feito pelo arguido uma vez que o mesmo nem sequer no STOP parou.

    4. O próprio arguido, apesar de referir que parou, defende que a imobilização ocorreu num local em que a visibilidade oscilava entre os 20 e os 30 metros, que avançou sem voltar a parar, a velocidade moderada e sem voltar a olhar para o lado de onde vinha o motociclo.

    5. Esta versão de factos não deixa de constituir a descrição de uma manobra efectuada sem o cuidado exigível e que constitui causa do acidente e da morte do motociclista.

    6. A recorrente entende que deveriam ter sido dados como provados os factos identificados na sentença como factos não provados 4,5,6,7,16,17 e 18.

    7. Quanto a estes factos, a impugnação da recorrente é sustentada pela análise conjugada dos depoimentos das testemunhas MD, PA e MG IX. Estes depoimentos são indicados nas actas de audiência de discussão e julgamento por referência ao registo magnético Habilus Media Studio.

    8. Na primeira audiência de discussão e julgamento o depoimento da testemunha M D foi gravado na cassete nº 2, lado A, de 555 até 607 e na cassete 3, lado A, de 001 a 350 e o depoimento da testemunha PA foi gravado na cassete 3, lado A, de 351 a 528.

    9. Têm particular interesse para a impugnação as partes dos depoimentos que supra se transcreveram e cujo teor se dá por integralmente reproduzido nas conclusões.

    10. A recorrente entende que deveria ter sido dado como provado o facto identificado na sentença como facto não provado 27.

    11. Quanto a este facto, a impugnação da recorrente é sustentada pela análise conjugada dos depoimentos das testemunhas F e RM e pelo croqui do acidente.

    12. Os depoimentos das testemunhas F e RM são indicados na acta por referência ao registo magnético Habilus Media Studio.

    13. Têm particular interesse para a impugnação as partes dos depoimentos que supra se transcreveram e cujo teor se dá por integralmente reproduzido nas conclusões.

    14. A recorrente entende que deveria ter sido dado como não provado o facto identificado na sentença como facto provado 19.

    15. Quanto a este facto, não existe qualquer elemento probatório que permita sustentar a posição do Tribunal a quo uma vez que nenhuma prova foi produzida sobre o tema.

    16. A procedência do recurso da matéria de facto impõe que o arguido seja condenado pela prática do crime de homicídio negligente.

    17. Mas impõe igualmente que dessa condenação sejam extraídas consequências no que diz respeito à decisão da parte cível de tal modo que a condenação da seguradora ocorra à luz da responsabilidade extracontratual subjectiva do condutor demandado.”.

      Também os demandantes MM e JJ interpuseram recurso da sentença, concluindo: “ I. Os demandantes conformam-se com os valores indemnizatórios fixados pelo Tribunal a quo.

    18. Contudo, a possibilidade de procedência de um eventual recurso da demandada L… quanto ao acerto do enquadramento jurídico ali feito constar responsabilidade objectiva - coloca os demandantes na posição de pretenderem desde já fazer valer a responsabilidade subjectiva do segurado.

    19. Foi à luz desse tipo de responsabilidade que os demandantes formularam o pedido cível.

    20. Por outro lado, os demandantes entendem que essa é a conformação de direito que melhor se adequa à prova que foi produzida nos autos.

    21. Nessa medida, assiste aos recorrentes legitimidade e interesse em agir.

    22. Em caso de manobra de mudança de direcção, existem circunstâncias, nomeadamente a falta de visibilidade, que tornam insuficiente a observância estrita de comandos legais de sentido específico como por exemplo a paragem ao sinal de STOP.

    23. Com efeito, o condutor, confrontado com essas circunstâncias, só poderia efectuar a manobra de mudança de direcção (entre outras) em local e de forma que da sua realização não resulte perigo ou embaraço para o trânsito (art. 35º, nº 1 do Código da Estrada).

    24. No caso dos autos, o conteúdo normativo autónomo do art. 35º, nº 1 impunha que o arguido, não apenas imobilizasse o veículo no STOP, mas ainda que fosse avançando intermitentemente, sempre atento à aproximação de veículos vindos de Miranda do Corvo, ganhando progressivamente maior visibilidade até que estivesse certo da segurança da manobra.

    25. Nada disso foi feito...

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