Acórdão nº 208/2000.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: APELAÇÃO Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA Legislação Nacional: ARTº 2123º Nº1 DO CC Sumário: Arguindo a autora a nulidade de partilha de bens hereditários, ao abrigo do artº 2123º nº1 do CC, com o fundamento de que alguns desses bens pertenciam a uma anterior herança de que é herdeira, e provando este facto, tal basta para a procedência da acção, maxime se os réus alegaram a aquisição de tais bens posteriormente à abertura da primitiva herança, mas não lograram prová-la.

Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA.

  1. A...., intentou contra B.... e esposa C..., D... e esposa E..., e F... e esposa G...

    acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária.

    Alegou, em síntese: Que, por escritura de 11 de Agosto de 1980, os RR. efectuaram partilha de bens deixados por óbito dos pais, na qual incluíram e partilharam os quatro prédios que identificaram, os quais não integravam essa herança, antes a do avô da A., H...

    , sendo, por isso, nula essa partilha na parte que recaiu sobre os bens deste.

    Assim pediu: a) Se reconheça à A. a sua qualidade de herdeira legitimaria de H... e, como tal, interessada nos bens e na sua partilha; b) Seja declarada nula a escritura de partilhas lavrada a 11 de Agosto de 1980, de fls. 70 v.º a fls. 74, do livro de notas para “Escritura Diversas” n.º 103-B do 1.º Cartório Notarial da ..., na parte em que recaiu sobre os bens imóveis que foram de H... (bens que identificou), e, em consequência, os bens restituídos à herança deste.

    Contestaram os réus.

    Por impugnação negando os factos aduzidos pela autora.

    Em reconvenção, dizendo, no essencial, que estão na posse pública dos imóveis desde a morte de I...

    , mulher do J...

    ocorrida em 1963, pelo que, mesmo que o título translativo não fosse válido, sempre os RR. adquiriram os prédios por via de usucapião.

    Pugnando no sentido da improcedência da acção e, na procedência da reconvenção, pela condenação da A. a reconhecer que os prédios em causa pertencem aos RR., com exclusão de outrem, por os terem adquirido por sucessão hereditária e usucapião.

  2. Prosseguiu o processo os seus legais termos, tendo, a final, sido proferida sentença que: 1 - Reconheçeu à A. a sua qualidade de herdeira legitimaria de H... e, como tal, interessada nos bens e na sua partilha; 2 - Absolveu os RR. do demais que contra si foi peticionado; 3 - Julgou a reconvenção improcedente por não provada, absolvendo os AA. dos pedidos contra eles formulados.

  3. Inconformada recorreu a autora.

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1ª – Deve ser rectificada a data de 1996, do ponto 27. da fundamentação da decisão recorrida, para a data de 1966.

    1. – Deve ser considerado provado o ponto 1) da base instrutória e alterados os pontos 5. e 6. da decisão recorrida, e, em consequência, considerar que do acervo da herança do falecido casal constituído por H... e I... fazia parte o prédio rústico situado em Fornos de Castel, inscrito na matriz predial rústica da freguesia de Sebal Grande, concelho de ...., sob o artigo ... e omisso na Conservatória do Registo Predial de .....

    2. - Deve ser alterado o ponto 26. da fundamentação da decisão recorrida para a seguinte redacção: “Entre 1965 e 1966 M.... e marido L... emigraram para o Brasil”.

    3. - Deve ser alterado o ponto 27. da fundamentação da decisão recorrida para a seguinte redacção: “Durante cerca de 8 anos, após a ausência de M... e marido L..., N.... habitou na casa referida em (U) 20 e cuidou das terras que eram pertença da herança de H... e de I...”.

    4. - Deve ser aditado um ponto 28. à fundamentação da sentença, com a seguinte redacção: “Quando L.... faleceu, todos os réus se encontravam a viver no Brasil, assim como a sua mãe, M...”.

    5. - Os bens referidos no art.º 5º da p.i., pertenciam a herdeiros de H.... A propriedade de três imóveis foi reconhecida pelos Réus, aqui Apelados, como sendo da herança de H..., na sua contestação, no art.º 10º, tendo, como tal, passado para a matéria assente, e a propriedade do quarto imóvel – a do referido artigo ... deve ser reconhecida em correcta apreciação da matéria de facto.

    6. - Qualquer que seja a data em que se faça a partilha por óbito de L..., Pai dos Apelados, esses bens são sempre alheios se não foram, efectivamente e antes dessa partilha, adquiridos pelo Pai dos Réus.

    7. - Uma vez reconhecida a propriedade, que o foi em relação a três imóveis e deverá sê-lo em relação ao artigo ..., não bastam possibilidades para aniquilar ou extinguir o direito de propriedade dos herdeiros de H....

    8. - O direito de propriedade é um direito absoluto, imprescritível e só se extingue pelo seu não uso nos casos especialmente previstos na lei, nos termos do disposto no artigo 298º, nº 3, do CC de 1966.

    9. - Para que haja extinção do direito de propriedade e da acção de reivindicação, é necessário, nos termos do artigo 1313º do CC, que alguém adquira aquele direito por usucapião.

    10. - Os Réus, aqui Apelados, alegaram uma partilha verbal, que, ainda que não seja título bastante para adquirir, não lograram demonstrar que existiu e com que efeitos.

    11. - Os Apelados invocaram a aquisição dos bens da herança de H... por usucapião.

    12. - Só o podiam fazer por excepção, cabendo-lhes o ónus da prova nos termos do disposto no artigo 342º, nº 2 do C C de 1966, tal como é reconhecido na doutrina e na jurisprudência de forma unânime.

    13. – A prova da alegada usucapião foi apreciada em sede de reconvenção, que os Apelados apresentaram e nem sequer foi produzida prova sobre esses factos.

    14. – A reconvenção foi, assim, e bem, julgada improcedente e a Apelante absolvida do pedido de reconhecimento do direito de propriedade dos Apelados relativamente aos imóveis em causa, encontrando-se, nesta parte, transitada em julgado a sentença recorrida.

    15. - Não tendo os Apelados feito prova em sede de reconvenção dos mesmos factos de que procederia a excepção da aquisição por usucapião, logo se terá de concluir que tendo sido reconhecido o direito de propriedade dos bens à herança de H..., esses bens terão de ser restituídos e os Apelados condenados a essa restituição à herança de H....

    16. - Para a aquisição do direito de propriedade de imóveis por usucapião é necessário serem praticados actos materiais de posse em relação com esses imóveis, da chamada posse prescricional e não basta o decurso do tempo.

    17. - Constam dos autos elementos mais do que suficientes para se concluir que os actos materiais de posse alegados pelos Apelados não poderiam ter sido exercidos por eles nem pelos seus Pais, estando eles no Brasil, como estiveram a partir de 1963 em relação a M... e a L..., e antes, em relação a cada um dos Apelados.

    18. - Seria sempre aplicavel o art.º 318º, alínea c), do CC, por remissão do art.º 1292º do mesmo diploma, e, em consequencia, a usucapião ou prescrição aquisitiva nunca teria começado enquanto L... não prestasse contas da administração da herança como cabeça de casal, administração que teria, nos termos do art.º 2079º, até à sua liquidação e partilha.

    19. - E considerando o Doc. nº 9 a fls 798 e 798vº, e não só, nunca houve partilha entre os herdeiros de H....

  4. Sendo que, por via de regra: artºs 684º e 690º do CPC - de que o presente caso não constitui excepção - o teor das conclusões define o objecto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes: 1ª Alteração da decisão sobre a matéria de facto.

    1. (Im)procedência do pedido da autora: nulidade da partilha feita pelos réus por incidir sobre bens alheios, perante os factos apurados e a lei aplicável.

  5. Apreciando.

    5.1.

    Primeira questão.

    5.1.1.

    Há que considerar que no nosso ordenamento vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da livre convicção segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização, e fixa a matéria de facto em sintonia com a sua prudente convicção firmada acerca de cada facto controvertido -artº655º do CPC.

    Perante o estatuído neste artigo pode concluir-se, por um lado, que a lei não considera o juiz como um autómato que se limita a aplicar critérios legais apriorísticos de valoração.

    Mas, por outro lado, também não lhe permite julgar apenas pela impressão que as provas produzidas pelos litigantes produziram no seu espírito.

    Antes lhe exigindo que julgue conforme a convicção que aquela prova determinou e cujo carácter racional se deve...

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