Acórdão nº 76/06.7TAILH.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelJOÃO GOMES DE SOUSA
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: RECURSO CRIMINAL Decisão: REVOGADA Legislação Nacional: ARTIGOS 410º, Nº 2 AL. A) CPP, 661º CPC Sumário: 1. A liquidação em execução de sentença visa a economia processual relacionada com o tempo dos factos e o tempo da decisão.

  1. Se no momento da decisão os danos existentes não estão quantificáveis porque circunstâncias várias só permitem a sua quantificação em momento posterior, aí justifica-se a sua liquidação em execução de sentença.

  2. Se tais danos apenas não estão quantificáveis por inércia do requerente cível não se justifica a liquidação em execução de sentença. Não cabe ao tribunal beneficiar o infractor das regras processuais.

  3. Ocorre o vício previsto no artigo 410º, nº 2, al. a) do Código de Processo Penal, de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, quando se não consegue saber, com um mínimo de objectividade, se a razão diária fixada para a multa é justa ou não é justa e se os danos não patrimoniais estão fixados com equidade.

Decisão Texto Integral: A - Relatório: No âmbito do processo comum singular supra numerado do Tribunal Judicial da comarca de Ílhavo, foi o arguido C…, projectista e decorador de interiores, residente na Av. … , Ílhavo, condenado pela prática em autoria material e em concurso real: - de crime de falsificação de documento, p. e p. pelo art° 256°, n° l, al. a) e b) e 3 do Código Penal, na pena de 180 dias de multa; - de um crime de burla, previsto e punido pelo artigo 217º do Código Penal, na pena de 200 dias de multa; - de um crime de usurpação de funções p. e p. pelo artigo 358º al. b) do C. Penal conjugado com o disposto no artigo 42º n.s 1 a 4 do Dec. Lei n. 176/98 de 3.07, na pena de 120 dias de multa.

- na pena única de 300 (trezentos) dias de multa à taxa diária de 6,00€, o que perfaz a multa global de 1.800,00€.

*** CM...

e P...

, ofendidos nos autos, vieram deduzir contra o arguido Pedido de Indemnização Civil, peticionando que o mesmo seja condenado a pagar aos demandantes a quantia 7.919,14 (sete mil, novecentos e dezanove euros e catorze cêntimos) a título de indemnização pelos danos patrimoniais e danos morais acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento à taxa legal.

A final decidiu a tribunal recorrido julgar parcialmente procedente por provado o pedido de indemnização civil deduzido e, consequentemente, condenar o demandado C… no pagamento aos demandantes P... e CM...; - da quantia de 1.500,00 (mil e quinhentos euros) a titulo de prejuízos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% contados desde a presente sentença e até integral pagamento; - no pagamento aos demandantes da quantia de 3.000,00€ a título de prejuízos patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, contados da notificação ao demandado do pedido de indemnização civil até integral pagamento; - a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, nos termos do disposto pelo artigo 661º nº 2 do CPC, relativa aos prejuízos por estes sofridos atinente ao montante dispendido com os juros e despesas do crédito mais dispendioso que tiveram de contratar, nos termos e limites que acima ficaram explanados.

* O arguido, não se conformando com a decisão, interpôs o presente recurso e formulando as seguintes (transcritas) conclusões: 1 - O recorrente foi condenado, pela prática de um crime de falsificação de documento, p.p. pelo artigo 256°, n° 1, alínea a) e b) e 3 do Cód. Penal, de um crime de burla, p.p. pelo artigo 271 ° do Cód. Penal e de um crime de usurpação de funções, p.p. pelo artigo 358°, alínea b) do Cód. Penal, conjugado com o disposto no artigo 42°, nºs 1 a 4 do Decreto-lei n° 176/98, de 03.07, na pena unitária de 300 (trezentos) dias de multa à taxa diária de €: 6,00 (seis euros), o que perfaz a quantia global de € 1.800,00 (mil e oitocentos euros].

2 - O recorrente foi ainda condenado no pagamento aos ofendidos da quantia de € 3.000,00 (tês mil euros) a título de danos patrimoniais, da quantia de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros) a título de danos não patrimoniais, relegando-se para liquidação em execução de sentença o valor acrescido dos juros e despesas bancárias alegadamente dispendido pelos ofendidos com a contracção de um crédito diferente do inicialmente previsto.

3 - Através do presente recurso pretende-se impugnar a douta decisão prolatada não só quanto à matéria de facto dada como provada, mas também quanto às consequências jurídicas daí extraídas, isto é a condenação do arguido.

4 - Pretende-se ainda impugnar, para a eventualidade de se vir a considerar que o Douto Tribunal "a quo" decidiu bem ao condenar o arguido pela prática dos citados crimes, a medida da pena que lhe foi aplicada, discordando-se ainda do montante indemnizatório a que foi condenado a pagar a titulo de danos não patrimoniais e do valor cuja quantificação foi relegada para liquidação em execução de sentença.

5 - Para fundar a sua convicção o Tribunal atendeu à admissão parcial que o arguido fez de alguma factualidade, aos depoimentos prestados pelos ofendidos P… e CM..., aos documentos juntos aos autos a fls. 6, 7, 28 a 32, 39 a 41, 42 a 52, 60 a 105, 144 a 149, 327 a 333, 338 a 342, aos depoimentos prestados pelas testemunhas R..., M..., A…, R…, N… e M…, e ainda aos documentos de fls., 217 a 227 e 283.

6 - Ora, apesar de em direito processual penal não existir um verdadeiro ónus da prova que recaia sobre o acusador ou sob o arguido, a verdade é que para haver uma condenação, a matéria da acusação tem de se verificar provada sem quaisquer margens para dúvidas.

7 - Porém, salvo o devido respeito, a prova produzida em audiência de discussão e julgamento não foi devidamente ponderada, já que se não teve em conta o depoimento do arguido, ora recorrente (que procurou desde o início esclarecer a verdade dos factos), valorizando-se, em detrimento do mesmo, as declarações prestadas pelos ofendidos, partes interessadas no presente processo.

8 - A ponderação e análise crítica de toda a prova produzida, na sua conjugação e valoração com as regras da experiência comum nas inferências que perante os dados objectivos delas se podem retirar, impunha que pelo menos o Tribunal "a quo" ficasse num estado de dúvida razoável que o impedisse de condenar o arguido.

9 - Assim, tendo em consideração o supra exposto, o Tribunal "a quo" não poderia ter decidido como decidiu, sendo seu dever, atendendo ao depoimento do arguido e aos demais elementos constantes do processo, absolvê-lo com recurso ao princípio do in dúbio pro reo, o que não fez, tendo, por isso, violado o citado princípio legal.

10 - Desta forma, o recorrente entende que os pontos 1, 2, 3, 5, 8, 9, 10, 11, 12, 15, 16, 17, 26, 27 e 28 da matéria de facto provada se encontram incorrectamente julgados, o que resulta dos depoimentos do arguido, ofendidos e testemunhas, todos gravados em CD através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso no Tribunal "a quo".

11 - Para se compreender os concretos pontos de facto que o recorrente considerou incorrectamente julgados, têm de se analisar os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida.

12 - Antes porém de o fazer, convém referir que o Douto acórdão, salvo o devido respeito, peca logo no seu início por omissão de factos que deveria ter dado como provados e o não fez, designadamente que o recorrente exerce a profissão de desenhador há cerca de trinta e seis anos, sem que tenha tido qualquer tipo de problema, que é prática comum um desenhador fazer projectos e, depois, dá-los a assinar a um arquitecto ou a um engenheiro, bem como que é usual as pessoas confundirem o desenhador com o arquitecto e com o engenheiro, factos que foram não só confirmados pelo recorrente, mas também pela Arquitecta R... nas suas declarações gravadas em CD através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso no Tribunal "a quo".

13 - No entanto, o Douto Acórdão fez "tábua rasa" dos mesmos, em prejuízo do recorrente, quando, tendo em consideração designadamente as passagens transcritas, deveria ter dado como provada esta matéria que foi apurada em sede de audiência de discussão e julgamento e que não foi contraditada.

14 - Analisados os depoimentos prestados em sede de audiência de discussão c julgamento, designadamente o depoimento do recorrente, constata-se que o Tribunal "a quo" para decidir conforme decidiu desvalorizou o depoimento do mesmo (quando aquele depôs com clareza, sinceridade e com manifesta colaborado com a justiça no sentido de repor a verdade dos factos), em beneficio dos depoimentos dos ofendidos c das demais testemunhas de acusação.

15 - Contudo, não deixa de ser curioso que o depoimento do recorrente já tenha sido valorizado (embora de forma deturpada) em relação a determinados aspectos convenientes à prova dos factos alegados.

16 - Para tanto, basta atentar na parte em que o Douto Acórdão de que se recorre refere, na sua motivação, que o recorrente admitiu alguma factualidade, a saber: a) a circunstância de ser conhecido como arquitecto e não fazer nada para alterar essa situação, nem sequer negar essa situação quando é qualificado como tal; b) não ter dado conhecimento aos ofendidos de não ter entrado na Câmara com o primeiro projecto; c) não lhes ter dito que o projecto ia ser assinado por um engenheiro; d) ter rubricado na zona do projectista as cópias dos projectos entregues aos ofendidos.

17 - Ora, a verdade é que a alegada admissão parcial dos factos não existiu, pois que, analisado o depoimento do recorrente constata-se que o mesmo: a) nada fez para o qualificarem como arquitecto; de facto, o arguido refere no seu depoimento que nunca se identificou como arquitecto, que não apresentava quaisquer sinais exteriores de o ser e que nunca foi apelidado de tal; b) nega peremptoriamente ter informado os ofendidos que o processo já tinha dado entrada na Câmara; c) refere que não achou necessário dizer que o projecto...

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