Acórdão nº 145/07.6TAAGD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelCALVÁRIO ANTUNES
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: CONFIRMADA Legislação Nacional: ARTIGOS 108º, Nº1, 1º, 3º E 4º, Nº1, ALÍNEA G) DO DL 422/89 DE 02.12, COM A REDACÇÃO DO DL 10/95 DE 19.01, Sumário: Não estamos perante um crime de exploração ilícita de jogo quando, embora dependendo exclusivamente da sorte (consoante a senha que estivesse no interior da cápsula que viesse a sair - o que o “jogador” apenas tomava conhecimento quando abrisse a cápsula e procedesse à leitura da respectiva senha), o jogador sabe previamente que o prémio que irá receber é necessariamente um daqueles que está exposto no cartaz ,o que torna relativa ou até afasta a contingência do resultado.

Decisão Texto Integral: I. Relatório: 1.

No processo supra identificado, foram os arguidos: - J..., casado, comerciante, com residência na Rua do C…, em Águeda, - A...

, casado, com residência na Rua da E…, em Águeda, e - C...

, solteiro, com residência na F…, em Águeda, pronunciados pela prática dos factos que integram a co-autoria e em concurso real de um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108º, nº1, com referência aos artigos 1º, 3º e 4º, nº1, alínea g) do DL 422/89 de 02.12, com a redacção do DL 10/95 de 19.01, um crime de exposição de material de jogo, previsto e punido pelo artigo 115°, do Decreto-Lei nº422/89, de 2 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n° 40/2005, de 17 de Fevereiro (Lei do Jogo); - um crime de jogo fraudulento, previsto e punido pelo artigo 113°, n°1 do Decreto-Lei n°422/89, de 2 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n° 40/2005, de 17 de Fevereiro (Lei do Jogo).

Procedeu-se ao competente julgamento, tendo o tribunal recorrido decidido: - absolver os arguidos J..., A... e C..., da prática, em co-autoria e concurso real de um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108º, nº1, com referência aos artigos 1º, 3º e 4º, nº1, alínea g) do DL 422/89 de 02.12, com a redacção do DL 10/95 de 19.01, de um crime de exposição de material de jogo, previsto e punido pelo artigo 115°, do Decreto-Lei nº422/89, de 2 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n° 40/2005, de 17 de Fevereiro (Lei do Jogo) e de um crime de jogo fraudulento, previsto e punido pelo artigo 113°, n°1 do Decreto-Lei n°422/89, de 2 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n° 40/2005, de 17 de Fevereiro (Lei do Jogo).

*** 2.

Inconformado com a decisão final (de fls. 619/529), veio o Ministério Publico, interpor recurso da decisão final, (a fls. 633 e segts), formulando nas respectivas motivações as seguintes (transcritas) conclusões: “I. Nos presentes autos, os arguidos J..., A... e C... foram pronunciados pela prática em co-autoria, em concurso real e na forma consumada, de um crime de exploração ilícita de jogo, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 1°, 3°, 4°, n. ° 1, alínea g), e 108°, de um crime de exposição de material de jogo, previsto e punido pelo artigo 115° e de um crime de jogo fraudulento, previsto e punido pelo artigo 113°, nº 1, todos do Decreto-Lei nº 422/89, de 2 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 40/2005, de 17 de Fevereiro (Lei do Jogo).

  1. No caso dos autos, quanto ao funcionamento das máquinas, com relevo, que: - O jogo em causa era composto por um cartaz, no qual se encontravam afixados vários artigos, denominados por prémios, e por uma máquina de extracção.

    - Cada uma daquelas máquinas extractoras de cápsulas era constituída por dois corpos.

    - O seu conteúdo era constituído por um número indeterminado de pequenas cápsulas ovais em plástico opaco de várias cores, seccionadas ao meio, contendo no seu interior uma pequena senha.

    - Na parte frontal inferior, situava-se um dispositivo para introdução de moedas de 1 €, equipado com um manípulo rotativo, desbloqueado por uma só volta após a introdução da moeda.

    No cartaz de prémios, cada um deles tinha colada uma pequena etiqueta com a inscrição de um número.

    - Qualquer pessoa que estivesse interessada em jogar naquelas máquinas, introduzia uma moeda de 1 € (um euro) na ranhura existente na máquina extractora e rodava de seguida o manípulo rotativo até ao ponto de bloqueamento, fazendo desta forma actuar o mecanismo nela existente.

    - Após tal procedimento, a máquina extraía, de forma aleatória, uma pequena cápsula oval de plástico, dentro da qual se encontrava uma senha com inscrição de um número ou, em sua substituição, uma letra do alfabeto, compreendida entre A e - Depois da senha ser desdobrada e confrontada com o cartaz de prémios, o jogador tinha então direito ao prémio correspondente, de acordo com o número (em menor quantidade, correspondiam a prémios de valor mais elevado) ou a letra (em maior quantidade, correspondiam a prémios de valor diminuto), que constasse na senha.

  2. Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença que absolveu os arguidos, concluindo que os factos dados como provados não constituíam crime uma vez que integravam o conceito de modalidade afim de jogos de fortuna e azar.

  3. Nos termos do artigo 1° da Lei do Jogo, jogos de fortuna ou azar são aqueles cujo resultado é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte.

  4. Modalidades afins dos jogos de fortuna ou azar são as operações oferecidas ao público em que a esperança de ganho reside conjuntamente na sorte e perícia do jogador, ou somente da sorte, e que atribuem como prémios coisas com valor económico (artigo 59°, n° 1, do mesmo diploma legal).

  5. Pelos argumentos atrás aduzidos, as máquinas em questão nos autos devem ser qualificadas como de fortuna ou azar, já que assentam exclusivamente na sorte e porque de forma aleatória os jogadores obtêm determinada senha, depois convertida em prémio.

  6. Pelo que, face à factualidade como provada, se verificam, em concreto, todos os pressupostos típicos objectivos do crime de exploração ilícita de jogo, previsto e punido pelo artigo 108° da Lei do Jogo.

  7. Acresce que, integrando o material de jogo apreendido nos autos a previsão de jogo de fortuna ou azar da g) do n° 1 do artigo 40 da Lei do Jogo, face a toda a factualidade dada como provada, os arguidos cometeram também, dessa forma, um crime de exposição de material de jogo, previsto e punido pelo artigo 115º daquele diploma legal.

  8. Na sentença deu-se também como provado que: - Em todas as máquinas, no interior do cofre da máquina, encontrava-se um saco plástico, que continha três cápsulas que, deste modo, estavam apartadas das restantes e fora do circuito normal do funcionamento do jogo.

    - No interior das três cápsulas, estavam as senhas que continham os números 38, 39 e 1, que correspondiam aos três prémios de maior valor.

    - Os arguidos, na qualidade de representantes legais da sociedade "D…, Lda.", sabiam ainda que as máquinas se encontravam viciadas e que as senhas que correspondiam aos prémios de maior valor se encontram no interior do cofre de cada uma das máquinas, separadas das restantes e, portanto, fora do circuito normal do funcionamento do jogo.

    - Com esta conduta, os arguidos queriam, de forma consciente, iludir o carácter aleatório do jogo e induzir em erro as pessoas que acedessem a tal modalidade de jogo, fazendo-as crer que, por acção da sorte, poderiam ganhar prémios de valor mais elevado, o que de facto nunca poderia acontecer, obtendo dessa forma um beneficio a que sabiam não ter direito.

  9. Pese embora esta factualidade provada, o Tribunal a quo considerou não estarmos perante um crime de jogo fraudulento, porquanto o referido tipo legal se refere tão-somente ao jogo fraudulento de jogos qualificados como de fortuna ou azar e não de modalidades afins.

  10. Ora, como vimos, integrando o material de jogo apreendido nos autos a previsão de jogo de fortuna ou azar da g) do nº 1 do artigo 4° da Lei do Jogo, face a toda a factualidade dada como provada, os arguidos cometeram também, dessa forma, um crime de jogo fraudulento, previsto e punido pelo artigo 113 ° daquele diploma legal.

  11. Mesmo que se defenda que o jogo em causa nos autos é uma modalidade afim dos jogos de fortuna e azar, a interpretação feita pelo Tribunal a quo não encontra qualquer suporte na letra da norma, porquanto o tipo legal se reporta tão sómente ao jogo em sentido lato, sendo que o crime de jogo fraudulento é um tipo legal autónomo que não se refere apenas ao jogo fraudulento de jogos qualificados como de fortuna ou azar.

  12. Ao decidir de forma diferente, o Tribunal a quo fez errada interpretação dos normativos constantes dos artigos 108°, 115° e 113° da Lei do Jogo, tendo considerado que os factos dados como provados e imputados aos arguidos não constituíam qualquer tipo de crime, quando na verdade se mostram preenchidos todos os elementos típicos objectivos dos crimes de exploração ilícita de jogo, de exposição de material de jogo e de jogo fraudulento.

  13. Logo, a sentença recorrida violou o disposto nos artigos 108º, 115º e 113º da Lei do Jogo.

  14. Além do mais, em sede de recurso da matéria de facto, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 412°, nºs 3 e 4, do Código de Processo Penal, entendemos que se mostram incorrectamente julgados os seguintes pontos da matéria de facto dados como não provados: - A máquina de jogo foi instalada no Café T ..., em Janeiro de 2006, pelo arguido J..., com conhecimento dos restantes arguidos.

    - Os arguidos, na qualidade de representantes legais da sociedade "D…, Lda.", em comunhão de esforços e intenções, dedicavam-se à exploração de máquinas de fortuna e azar, que colocavam em diversos estabelecimentos comerciais, e dedicavam-se a expor e a divulgar material e utensílios destinados à prática desse mesmo tipo de jogo, sem que a sociedade ou eles individualmente possuíssem qualquer autorização ou licença de exploração emitida pela Inspecção-Geral de Jogos para esse efeito.

    - Sabiam que a destreza ou perícia do jogador não tinham qualquer influência no...

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