Acórdão nº 882/03.4TBILH.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Dezembro de 2009

Magistrado ResponsávelDR. CARLOS MOREIRA
Data da Resolução15 de Dezembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: APELAÇÃO Decisão: CONFIRMADA Legislação Nacional: ARTº 690º-A Nº1 DO CPC E ART.º 428º, N.º 1, DO CC Sumário: I – A impugnação da decisão sobre a matéria de facto não pode implicar que o recorrente queira, pura e simplesmente, ver provada, in totum, a sua versão e improvada, outrossim na sua globalidade, a versão da parte contraria, pois que tal implicaria um novo julgamento pela Relação, com a completa desvalorização dos poderes do juiz da 1ª instancia e quasi um desrespeito pela sua qualidade e poderes, bem como a postergação dos benefícios dos princípios da imediação e oralidade, os quais, posto que mitigados pela reforma de 1995, continuam a ter, pela natureza das coisas, enorme relevância.

II- Assim, a legalidade de tal impugnação apenas se cumpre se se colocarem em crise concretos e determinados pontos de facto e se o recorrente especificar e valorar criticamente os meios probatórios em que se apoia, reportando cada um deles aos factos a que se referem e não já se apenas os invocar genérica, indiferenciada e acriticamente para todos aqueles pontos em bloco.

III- A exceptio non adimpleti contractus visa o equilíbrio das posições dos contraentes em que deve assentar o esquema do contrato bilateral com obrigações sinalagmáticas, mas a sua invocação apenas é admissível quando, razoavelmente, se torne necessária e proporcionada à garantia do direito do excipiente, o que, por este, vg. num contrato de cessão de exploração, deve ser inequivocamente provado.

IV – Se um contrato de cessão de exploração é celebrado entre duas empresas comerciais e a cessionária o outorga no âmbito do seu escopo social e com vista à obtenção de lucro, o acto é subjectiva e objectivamente comercial, ou, pelo menos, conexo com actividade desta jaez, pelo que a verba em que foi condenada pelo seu incumprimento não está sujeita à taxa do juro civil mas sim á taxa do juro comercial.

Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA.

  1. A....

    intentou contra B..., C.... e mulher D...., acção declarativa de condenação com processo ordinário.

    Pediu: Sejam os réus condenados, solidariamente, a pagar à autora a quantia de 409.839,73 €, acrescida de juros, à taxa legal máxima, a partir da citação.

    Alegou: Que em 01.03.01, a autora e a ré celebraram um contrato de cessão de exploração que teve por objecto o parque de campismo conhecido por E...

    .

    Que a ré não pagou algumas das prestações estabelecidas no contrato pelo que, nos termos do artigo 781° do Código Civil venceram-se todas as prestações contratualmente estabelecidas, ou seja: as prestações ainda em dívida do terceiro ano do contrato, isto é, de 01.03.03 a 28.02.04, no total de 109.810,36 € (118.713,9 (l18.713,90 €-8.903,54 €); a totalidade das prestações do quarto ano do contrato, isto é, de 01.03.04 a 28.02.05, no total de 130.585,29 €; a totalidade das prestações do quinto ano do c 28.02.06, no total de 142,456,68 €.

    Que pelo pagamento destas quantias estão pessoalmente e solidariamente obrigados, com a primeira ré, o réu e a terceira ré, nos termos da cláusula 13ª do contrato.

    Contestaram e reconviram os réus.

    Invocando que a A. não era titular de licença ou alvará válidos, em conformidade com as mesmas normas, para a sua exploração, nem o empreendimento reunia os requisitos legalmente exigíveis, como a Ré veio a saber, posteriormente à celebração do contrato, o que quer dizer que o contrato invocado pela A. é nulo, por impossibilidade legal e/ou ilicitude do seu objecto, nos termos do n° l do Art° 280° do Cód. Civil.

    Que a existência de licenciamento, de alvará e de classificação do estabelecimento em causa é imprescindível para a realização do fim a que o mesmo se destina.

    Que a existência daquele licenciamento foi expressamente afirmada pela A./locadora, que consignou expressamente no contrato a obrigação de o assegurar, o que a A., não cumpriu.

    Que o contrato em apreço é, um contrato sinalagmático, pelo que a 1ª Ré tem o direito de recusar o pagamento da contraprestação a que está obrigada, por incumprimento do contrato por parte da autora.

    Que a autora pede o pagamento da totalidade do preço estabelecido para a duração total do contrato, cujo prazo, ainda não atingiu o seu termo. O preço global (para a totalidade do prazo) foi dividido em anuidades, sendo que a previsão do art° 781°do Cód. Civil, não abarca «prestações que não representam fracções da dívida, mas dívidas distintas, a título de retribuições de um uso ou serviço, como sucede com as rendas ou salários: a falta do pagamento da renda de um mês não autoriza o locador a reclamar todas as rendas correspondentes ao período de duração do contrato.

    Que quando a 1ª Ré, depois de outorgado o contrato, tomou posse do empreendimento, veio a verificar que se encontrava muito mais degradado do que esperava e lhe fora dito pela A., necessitando de obras, para além da limpeza e desinfecção geral, no que despendeu o total de PTE 30.000.000$00/€ 150.000,00. Ao mesmo tempo necessitava dos projectos de electricidade, águas, saneamento e, mesmo, de arquitectura do empreendimento, que a A. nunca lhe forneceu, apesar de insistentemente instada para isso, o que inviabilizou uma reparação satisfatória, não tendo conseguido obtê-los também na CMI.

    Que a 1ª Ré chegou a realizar à sua custa trabalhos e despesas que competiam à A., como condição de licenciamento do parque e sua normal laboração, esperando ser posteriormente compensada dessas despesas.

    Consequentemente, e em reconvenção, pedem a condenação da autora: I – para a hipótese de ser declarada a nulidade do contrato: na restituição da 1ª Ré à situação patrimonial à data da celebração do contrato, restituindo-lhe a A. todas as rendas pagas, o dispêndio em obras, reparações, manutenção, descontos bancários e, resultados negativos do exercício, no total, de €335.118,00; II – para a hipótese de aquele pedido de declaração de nulidade ser julgado improcedente, pede, subsidiariamente, a condenação da A. a indemnizá-la, pagando-lhe, além das quantias interiormente invocadas, a indemnização de € 1.000.000,00, decorrente dos lucros normais que a 1º Ré ficou impedida de auferir, por incumprimento da A., ao longo do prazo de duração do contrato.

    Replicou a autora.

    Pugnando para que sejam julgados improcedentes as excepções invocadas e o pedido reconvencional deduzido.

    E alterando o pedido e a causa de pedir, peticionando, ex vi da resolução do contrato que diz ter operado em 27.09.03: a) que o pedido seja considerado reduzido para a quantia de 104.151,42 €, acrescida de juros de mora desde a data do vencimento das prestações até ao efectivo pagamento; b) se se entender que o contrato é nulo que os réus sejam condenados a pagar à autora a mesma quantia e os juros, com base nas regras do enriquecimento sem causa, nos termos do disposto nos artigos 473° e seguintes do C.C.; c) que, de 28.09.03 até à data da desocupação efectiva do parque, os réus sejam condenados a pagar à autora uma indemnização correspondente ao enriquecimento injusto que tiverem pela permanência no parque, equivalente ao correlativo empobrecimento da autora, a liquidar em execução de sentença 2.

    Prosseguiu o processo os seus legais termos, tendo, a final, sido proferida sentença que: A- Julgou a acção parcialmente procedente por provada e nessa conformidade: A1- condenou os RR. “B...”, C.... e D..., solidariamente, a efectuar o pagamento à autora “A...” da quantia de € 102.964,36 ( cento e dois mil novecentos e sessenta e quatro euros e trinta e seis cêntimos) acrescida de juros de mora contados desde a data de vencimento de cada uma das prestações em falta e até integral pagamento, às taxas de juro comercial sucessivamente em vigor.

    A2- Condenou os réus a pagar à autora a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, pelo período da ocupação do Parque de Campismo, desde a data da resolução do contrato (operada em 27.09.2003) até à data da efectiva entrega do Parque à autora.

    B- Julgou o pedido reconvencional formulado improcedente por não provado, dele absolvendo a autora.

  2. Inconformados recorreram os réus.

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: I. A matéria de facto constante dos pontos/quesitos 3.º, 4.º, 5.º, 7.º, 8.º, 9.º, 12.º, 13.º, 14.º, 15.º, 16.º, 26.º, 27.º, 28.º, 29.º, 30.º, 34.º, 36.º, 39.º, 40.º, 41.º, 42.º, 43.º, 44.º, 48.º, 49.º, 50.º, 51.º, 52.º, 53.º, 54.º, 55.º, 56.º, 57.º, 58.º, 59.º, 60.º, 61.º, 63.º e 64.º da douta Base Instrutória foi incorrectamente julgada, por erro na apreciação e valoração dos meios de prova produzidos; II. Assim, devem ser dados como provados os factos constantes dos pontos/quesitos 3.º, 4.º, 5.º, 7.º, 8.º, 9.º, 12.º, 13.º, 14.º, 15.º, 16.º, 26.º, 27.º, 28.º, 29.º, 30.º, 34.º, 36.º, 39.º, 40.º, 41.º, 42.º, 43.º, 44.º e 48.º, e não provados os factos constantes dos pontos/quesitos 49.º, 50.º, 51.º, 52.º, 53.º, 54.º, 55.º, 56.º, 57.º, 58.º, 59.º, 60.º, 61.º, 63.º e 64.º da douta Base Instrutória; III. Em consequência, deve ser revogada a douta Sentença recorrida, julgando-se improcedente a acção e procedente a reconvenção; IV. Mesmo que se entenda não dever ser revogada a douta Decisão de Facto, deve, não obstante, revogar-se a douta Decisão de Direito, porquanto a falta de licenciamento e de condições do parque de campismo objecto do contrato celebrado entre as partes ofendem as normas e requisitos estabelecidos no DL 167/97, de 04 de Julho, V. Estando, assim, ofendidas normas de interesse e ordem pública que não podem ser derrogadas por vontade das partes, VI. Decorrendo da ilicitude praticada a nulidade do contrato prevista no n.º 1 do Art.º 280.º do CCivil, que é de conhecimento oficioso, como decorre do disposto no Art.º 286.º do mesmo Diploma Legal, VII. Acrescendo que, apesar de no Despacho Saneador aquela nulidade não ter sido atendida, mas dada a natureza das normas infringidas, também aquele douto Despacho é nulo; VIII. Por outro lado, mesmo que assim não se entenda, houve incumprimento...

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