Acórdão nº 2796/04.1JAPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelPINTO MONTEIRO
Data da Resolução13 de Novembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REC PENAL.

Decisão: PROVIDO.

Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO - LIVRO 386 - FLS 302.

Área Temática: .

Sumário: A criminalização da detenção de arma de defesa não manifestada ou registada ou sem a necessária licença respeita quer às armas de defesa originariamente fabricadas como tal, quer às que apresentem as mesmas características em resultado de uma transformação posterior ao seu fabrico.

Reclamações: Decisão Texto Integral: P.º n.º 2796/04.1JAPRT.P1 Acordam, em conferência, na 4.ª sec. (2.ª sec. criminal) do Tribunal da Relação do Porto: No Tribunal Judicial da Póvoa do Varzim, pelo M.º P.º foi deduzida acusação contra o arguido B………., na qual lhe imputou a prática, para além de outros, de um crime de detenção ilegal de arma de fogo p.p. nos termos do art. 2.º da Lei n.º 98/2001, de 25/08, e actualmente pelos arts. 3.º, n.º 4, al. a), 12.º, al. g), 73.º e 86.º, n.º 1, al. c), da Lei n.º 5/2006, de 23/02.

Efectuado o julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: III – DECISÃO Pelo exposto, e ao abrigo das referidas disposições legais: Julgo a acusação parcialmente provada e nessa medida procedente e em consequência condeno B……….: -Pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada – previsto e punido pelo artº 146º, nºs 1 e 2, reportado ao artº 143º, nº 1, e com referência ao artº 132º, nº 2, al. g), do Código Penal – na pena de 280 dias de multa, à taxa diária de € 5; - Pela prática de um crime de ameaça, na forma continuada (contra C……….) – previsto e punido pelo artº 153º, nºs 1 e 2, do Código Penal –, na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de € 5; - Pela prática de um crime de ameaça (contra D……….) – previsto e punido pelo artº 153º, nºs 1 e 2, do Código Penal – na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 5; - Em cúmulo jurídico dessas penas parcelares, na pena unitária de 400 dias de multa, à taxa diária de € 5, o que perfaz o montante global de € 2.000 (Dois mil Euros); Quanto ao mais, julgo a acusação não provada e por isso na parte restante improcedente e em consequência absolvo B………. da prática de actos integrantes do crime de ameaça, na forma continuada, contra C………., reportados a 23 de Setembro e 9 de Outubro de 2004 e da prática de actos constitutivos de um crime de ameaça, contra D………., reportados a 16 de Novembro de 2004.

X X XInconformado com a decisão na parte em que absolveu o arguido da acusação pelo crime de detenção ilegal de arma de fogo, dela interpôs recurso o M.º P.º, cuja motivação concluiu nos termos seguintes: 1. Na douta sentença de fls. 450 e segs. ficou provado que o arguido, no dia 30-9-04, voluntária e conscientemente, retirou do seu veículo automóvel uma pistola da marca ………., modelo ……, com o calibre nominal de 8 mm, originariamente destinada a deflagrar munições de alarme, que tinha sido adaptada para disparar munições com projécteis de 6,35mm, e que detinha tal arma sabendo que não estava registada nem manifestada nem o podia ser por se tratar de uma arma ilegal, por ter sido adaptada, e que a sua conduta violava preceitos legais; 2. Tal comportamento integra a prática do crime p.p., à data da prática dos factos, pelo art. 6/1 da Lei nº 22/97 de 27-6, pelo qual o arguido vinha acusado e não foi condenado, não se podendo objectar com a impossibilidade do manifesto e registo de tal arma nem com a impossibilidade de obtenção de licença para a sua detenção, uso ou porte; 3. Resulta de forma evidente da letra da lei que a detenção de arma de defesa não manifestada ou registada ou sem a necessária licença, ao abrigo do art. 6º da Lei nº 22/97, respeita quer às armas de defesa originariamente fabricadas como tal quer às armas de defesa que apresentam as mesmas características em resultado de uma transformação posterior ao seu fabrico; 4. Assim sendo, e atenta a referida matéria fáctica provada, deveria o arguido ter sido condenado também pela prática do citado crime; 5. - Ao assim não proceder e ao não condenar o arguido por tal crime por entender que a pistola que o mesmo possuía, por ser insusceptível de legalização, e, portanto, ilegal, não está abrangida naquele normativo, violou o Mmº Juiz “a quo” o art. 6º/1 da Lei nº 22/97 de 27-6.

X X XTerminou pedindo a revogação da sentença recorrida e a sua substituição por outra que condene o arguido, também, pela prática de um crime p.p. pelo art. 6.º, n.º 1, da Lei n.º 22/97, de 27/06.

X X XNa 1.ª instância não houve resposta.

Neste tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso merece provimento.

Cumprido o disposto no n.º 2 do art. 417.º do C. P. Penal, não foi junta qualquer resposta ao processo.

Foram colhidos os vistos legais.

Cumpre decidir.

X X XEste tribunal conhece de facto e de direito.

Face às conclusões da motivação do recurso, que delimitam o seu objecto, a única questão suscitada pelo M.º P.º a merecer apreciação diz respeito à qualificação jurídica da matéria de facto provada relacionada com a detenção de uma arma de fogo por que o arguido havia sido acusado e de que foi absolvido.

Antes de passarmos à apreciação da questão suscitada no recurso importa proceder à sanação de uma omissão contida na sentença recorrida e que, no fundo, corresponde a uma aclaração, o que se faz ao abrigo do disposto no n.º 2 do art. 380.º do C. P. Penal.

Vejamos.

O arguido foi acusado da prática, para além de outros que, para já, não vêm ao caso, do crime de detenção ilegal da arma de fogo supra referido.

Escreveu-se no dispositivo da sentença recorrida, na parte referente aos crimes de que o arguido foi absolvido, o seguinte: “Quanto ao mais, julgo a acusação não provada e por isso na parte restante improcedente e em consequência absolvo B………. da prática de actos integrantes do crime de ameaça na forma continuada, contra C………., reportados a 23 de Setembro e 9 de Outubro de 2004, e da prática de actos constitutivos de um crime de ameaça, contra D………., reportados a 16 de Novembro de 2004.” Como resulta desta parte do dispositivo da sentença, nela não se refere expressamente a absolvição do arguido do crime de detenção ilegal de arma de fogo. Do conjunto da decisão, nomeadamente da qualificação jurídico-penal da matéria de facto considerada provada, resulta, no entanto, de forma clara, que foi essa a intenção do senhor juiz, na medida em que julgou improcedente a parte restante da acusação, nela incluído, portanto, o crime de detenção ilegal de arma de fogo, pela prática do qual não lhe aplicou qualquer pena, assim tendo sido entendido pelo M.º P.º, que recorreu da sentença quanto ao crime em causa, por o arguido dele ter sido absolvido. Assim sendo, supre-se a omissão da referência a tal crime, consignando-se agora que o arguido foi absolvido também da prática do crime de detenção ilegal de arma de fogo por que havia sido acusado.

É a seguinte a matéria de facto considerada provada na sentença recorrida: 1.B………., aqui arguido, e D………., nas circunstâncias temporais que a seguir se descrevem, encontravam-se desavindos por questões relacionadas com a exploração do restaurante E………., do qual eram donos, estabelecimento esse sito na Rua ………., nesta Cidade e Comarca da Póvoa de Varzim.

  1. No dia 30 de Setembro de 2004, cerca das 22.00 horas, o arguido deslocou-se ao referido restaurante, onde se gerou uma discussão entre o arguido e D………. e C………., pessoa que na altura prestava serviços no restaurante.

  2. No meio da confusão, quando já se encontravam na rua, o arguido foi a um veículo automóvel que ali tinha estacionado e dele retirou uma pistola de...

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