Acórdão nº 4651/04.6TBVFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelAMARAL FERREIRA
Data da Resolução11 de Novembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: CONFIRMADA.

Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO - LIVRO 809 - FLS. 126.

Área Temática: .

Sumário: I – Constitui acidente pessoal, abrangido pela previsão constante da respectiva apólice de seguro, a morte de um futebolista amador, de 17 anos de idade, que caiu no chão, inanimado, na sequência do esforço físico a que foi submetido em treino de preparação para os jogos do fim de semana, não obstante o relatório da respectiva autópsia revelar – o que não era do conhecimento da vítima – que o coração apresentava graves malformações, vegetações de todas as válvulas, nomeadamente da aorta, que apresentava ligeira estenose, ocorrendo tromba fibrinótica da coronária e concluindo-se que a morte ocorreu em consequência de degenerescência mixomatosa valvular global, afectando de forma grave a válvula aórtica.

II – Em contrato de seguro do ramo acidentes pessoais, o carácter involuntário do evento que consubstancia o sinistro não pretende excluir os actos voluntários, mas apenas os intencionais, devendo considerar-se cobertas as lesões que se produzam como consequência imprevista de actos voluntários.

Reclamações: Decisão Texto Integral: TRPorto.

Apelação nº 4651/04.6TBVFR.P1 - 2009.

Relator: Amaral Ferreira (484).

Adj.: Des. Ana Paula Lobo.

Adj.: Des. Deolinda Varão.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. RELATÓRIO.

  1. B…………….., beneficiando de apoio judiciário, nas modalidades de dispensa total do pagamento de taxas de justiça e demais encargos e de nomeação e pagamento de honorários ao patrono e deduzindo o incidente de intervenção principal provocada de C…………….., instaurou, no Tribunal da Comarca de Santa Maria da Feira, contra “D……………., S.A.”, acção declarativa, com forma de processo ordinário, pedindo a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de 21.000 Euros, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento.

    Alega para tanto, em síntese, que ele e a mulher, a interveniente C……………., de quem se encontra separado de facto, são os pais, e únicos herdeiros, de E……………., falecido em consequência da actividade desportiva que desenvolvia enquanto futebolista amador federado do «F……………», filiado na Associação de Futebol de Aveiro, que, por sua vez, é filiada da Federação Portuguesa de Futebol, a qual celebrou com a R. um por contrato de seguro de acidentes pessoais destinado a cobrir os riscos de morte e invalidez permanente, despesas de tratamento e repatriamento, garantindo, em caso de morte do futebolista amador maior de 14 anos, o pagamento da quantia de 21.000 €.

  2. Contestou a R. que, não deduzindo oposição ao incidente de intervenção de terceiros e concluindo pela sua absolvição do pedido, impugna parcialmente os factos articulados pelo A., aduzindo que, como resulta do relatório de autópsia do malogrado E………….., o seu coração apresentava graves malformações/vegetações de todas as válvulas, nomeadamente da aorta, o que, associado ao grande esforço físico provocado pela realização do teste de «Cooper», que o atleta desenvolvia, lhe veio a provocar a morte, que foi consequência directa e necessária da doença cardíaca.

  3. Replicou o A. que, reafirmando o alegado e concluindo como na petição inicial, sustenta que a morte do filho ocorreu devido ao esforço físico que desenvolvia e após um choque com um colega, apesar de patologia pré-existente, encontrando-se, por isso, o sinistro coberto pelo contrato de seguro.

  4. Após tréplica da R., admitido o incidente de intervenção principal provocada de C………….., veio a chamada, na sequência da sua citação, e com apoio judiciário nas modalidades de que beneficia o A., apresentar articulado em que adere integralmente à posição assumida pelo A..

  5. Com dispensa de audiência preliminar, foi proferido despacho saneador que, depois de afirmar a validade e regularidade da instância, seleccionou a matéria de facto assente e elaborou base instrutória, que se fixaram sem reclamações.

  6. Instruída a causa, com realização de prova pericial, teve lugar audiência de discussão e julgamento com gravação e observância do formalismo legal e, sem que as respostas dadas à matéria de facto controvertida tivessem sido objecto de censura, foi proferida sentença a julgar a acção procedente, condenando a R. a pagar aos demandantes a quantia de € 20.849,75, acrescida de juros legais desde a citação até efectivo e integral pagamento.

  7. Inconformada, apelou a R. que nas respectivas alegações formulou as seguintes conclusões: 1ª: Decorre da prova vertida nos autos que o sinistrado E………….., durante uma corrida, no âmbito de um treino de futebol, sentiu-se indisposto, caiu ao solo, tendo falecido.

    1. : Os exames periciais que constam dos autos apontam para a existência de uma degenerescência ao nível do sistema cardíaco, que só foi detectada, ao que parece, na autópsia do desportista.

    2. : Perante a matéria que está provada não estamos perante uma situação de acidente.

    3. : O que sucedeu a esse atleta nada teve de fortuito, súbito ou anormal, já que da sua condição física decorreria necessariamente o que infelizmente veio a suceder.

    4. : A lesão do foro cardíaco, no caso, do jovem E…………. não foi súbita, pois já era preexistente ao esforço físico que foi despendido naquele dia, o que sobreveio a essa lesão foi a morte, facto este que ocorre devido a uma situação que não pode ser considerada, no rigor dos princípios, um acidente.

    5. : O atleta não faleceu exclusivamente devido a um esforço físico decorrente da prática desportiva.

    6. : O apelo que o douto Tribunal faz à exclusão explícita das hérnias do contrato de seguro em apreço, não deve ser entendido como se todas as outras lesões endógenas estivessem cobertas pelo aludido contrato 8ª: No relatório médico-legal constante dos autos, designadamente na resposta ao quesito 5º indicado pela então ré, vem referido que o desditoso futebolista nunca deveria ter sido considerado apto para a prática de desporto, no caso de futebol, pela ausência de condições físicas para a prática do mesmo.

    7. : Atento o constante da supra enunciada conclusão do relatório médico-legal, resulta que foram as condições prévias à prática desportiva que ocasionaram a morte do jovem Hélder e não a prática desportiva de “per si”.

    8. : Sem nunca conceder, dir-se-á que não foram peticionadas despesas de funeral, e por isso, a ora Apelante deveria ter sido condenada a pagar apenas 3.800.000$00 de capital por morte, no seu contravalor em euros.

    9. : Verifica-se a violação, designadamente, do nº 4 do artº 1º das Condições Gerais da Apólice, o que se alega, para todos os devidos e legais efeitos.

    Nestes termos e nos melhores de Direito, que Vª Exª doutamente suprirá, deve a mui douta sentença ser revogada, como é de inteira Justiça! 8. Contra-alegou o A. no sentido da improcedência da apelação e da manutenção da sentença recorrida.

  8. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    1. FUNDAMENTAÇÃO.

  9. Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos: 1) E………… nasceu em 11 de Maio de 1984.

    2) O E………… faleceu, no estado de solteiro, em 17 de Setembro de 2001.

    3) O A. e a Interveniente C…………. são os pais do falecido E…………...

    4) O A. e a Interveniente C…………… são os únicos e universais herdeiros do E…………...

    5) Na época de 2001/2002, o E…………. era futebolista amador federado, na categoria de júnior, do “F…………”, com sede na Rua do ……., ….., desta comarca.

    6) O “F……………” é um clube filiado na Associação de Futebol de Aveiro e esta, por sua vez, encontra-se filiada na Federação Portuguesa de Futebol.

    7) A Federação Portuguesa de Futebol e a R. celebraram um contrato de seguro, titulado pela apólice nº 70101136, relativo a acidentes pessoais de futebolistas amadores, clausulando que era estabelecido para cobrir os riscos de morte e invalidez permanente, despesas de tratamento e repatriamento, desde que em representação ou sob patrocínio da Federação, Associações, Clubes ou Entidades Oficiais.

    8) Ficaram cobertas pelas garantias conferidas pelo dito contrato todas as pessoas constantes da relação dos futebolistas...

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