Acórdão nº 586/08.1TBOAZ-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Outubro de 2009
Magistrado Responsável | JOSÉ FERRAZ |
Data da Resolução | 15 de Outubro de 2009 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA.
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO - LIVRO 810 - FLS 118.
Área Temática: .
Sumário: I – A exigência estatutária da intervenção de dois administradores para obrigar a sociedade anónima não é oponível a terceiro legítimo portador de livrança em que, por essa sociedade e como subscritora da mesma, apenas assina um seu administrador, a não ser que actue fora do objecto social e essa situação seja conhecida ou cognoscível (tendo em conta as circunstâncias) do terceiro portador.
II – Tal facto não constitui vício de forma despoletador da nulidade do aval dado, por terceiro, à sociedade subscritora.
Reclamações: Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1) –
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B………., S.A., instaurou execução comum, para pagamento da quantia de € 102.337,40 e juros, contra C………. e D………., com domicílio na Rua ………., em ………., Oliveira de Azeméis.
O exequente deu à execução, como título executivo, uma livrança, que, no seu verso, contem o aval dos executados (além de outros).
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Citados, os mencionados executados deduziram oposição à execução, alegando que, como lhes foi solicitado, deram o seu aval à sociedade “E………., S.A.”, que possuía e possui um vasto património, considerando os oponentes que o seu aval serviria como mera garantia formal já que a subscritora teria condições de pagar ao exequente o valor mutuado.
Mas – acrescentam - a livrança encontra-se subscrita não pela referida sociedade mas por F……….., única pessoa que a assina e que não possuía os poderes necessários para vincular a sociedade que assumiu representar.
Pois, embora os oponentes desconhecessem, à data da emissão do título, que só a assinatura dos três administradores da sociedade seria suficiente para a vincular, sabem agora, pelo teor dos estatutos e registo da matrícula dessa necessidade, dessa exigência.
Dizem que os oponentes jamais quiseram responsabilizar-se por F………. .
“Prejudicada a pessoa colectiva em honra da qual os ora oponentes prestaram o aval, prejudicado ficou, também, um eventual direito de regresso destes sobre o património daquela”, pois, não estando a sociedade vinculada, não podem ficar sub-rogados contra aquela nos direitos emergentes do título.
Pedem que se declare extinta a execução contra os oponentes.
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O BANCO contestou a oposição.
Afirma a validade do aval dos oponentes.
Acrescenta que bem sabem os oponentes que o crédito causa da emissão da livrança beneficiou a sociedade de que são accionistas, tendo para o efeito, eles mesmos, assinado o contrato de abertura de crédito em conta caucionada caucionada, sendo a livrança accionada decorre da cláusula 10ª da “Alteração ao Contrato de Abertura de Crédito”, assinado pelos oponentes.
Os oponentes litigam de má fé.
Pede a improcedência da oposição e a condenação dos oponentes, como litigantes de má fé, em multa e indemnização, em valor não inferior a € 5.000,00.
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Na sequência do pedido de condenação como litigantes de má fé, vêm os oponentes responder refutando litigar de má fé.
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No despacho saneador/sentença, em decisão de mérito, foi a oposição julgada improcedente (prosseguindo o processo apenas para conhecimento da alegada má fé).
2) – Inconformados com a decisão, recorrem os oponentes.
Concluem nos seguintes termos: 1. Os apelantes avalizaram, a favor do B………., S.A, uma livrança, na qual era identificada como subscritora a sociedade E………., S.A.
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Acontece que, no local destinado à assinatura do subscritor consta apenas a assinatura de F………. .
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Nos termos do pacto social e das respectivas inscrições comerciais, vigentes à data de subscrição da referida livrança, a referida sociedade só seria obrigada pela assinatura de dois membros do conselho de administração.
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Sendo exigível duas assinaturas para obrigar a dita sociedade, a falta de uma não permite a vinculação da E………., S.A.
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Mesmo como presidente do conselho de administração, F………. não tinha poderes para subscrever, em nome e em representação da dita sociedade, a referida livrança.
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Com efeito, dispõe o artigo 408°, n.° 1 do CSC que «Os poderes de representação do conselho de administração são exercidos conjuntamente pelos administradores, ficando a sociedade vinculada pelos negócios jurídicos concluídos pela maioria dos administradores ou por eles ratificados, ou por número menor destes fixado no contrato de sociedade.
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In casu, quer o contrato subjacente à livrança quer este título foram subscritos única e exclusivamente por um administrador, quando face ao contrato da sociedade em vigor àquela data, esta era obrigada pela assinatura de dois administradores.
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Só os actos praticados pelos administradores, em nome da sociedade e dentro dos poderes que a lei lhes confere, vinculam a sociedade (CSC, art.. 409°, n.° 1).
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O subscritor da livrança, F………., agiu fora dos poderes de representação que lhe foram conferidos pelo pacto social, na medida em que, não podia, sozinho, decidir e subscrever quer o contrato de alteração de crédito quer a respectiva livrança a favor do B………. .
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Não dispondo o subscritor da livrança dos necessários poderes de representação da pseuda sociedade representada, é ele o obrigado e não esta. Neste sentido, Ac. do STJ, de 01.04.2008, in www.dgsi._pt[isJ.
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Por outro lado, é sabido que é inválido o aceite prestado por outrem que não o sacado. Trata-se de um vício de forma, gerador de nulidade da obrigação cambiária. - Neste sentido, Ac. do T RG, de 17.03.2004, in www.dgsi.pt 12. Sendo aplicáveis às livranças as disposições relativas às letras (LULL, art. 77°-), forçoso será concluir, que o título executivo junto aos autos padece de vício de forma por não haver correspondência entre a entidade identificada como subscritora e a que efectivamente subscreve.
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É, pois, inexistente a obrigação da sociedade E………., S.A, ocorrendo, por via disso, a questão de avaliar a situação dos avalistas face ao cumprimento da livrança.
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Embora os recorrentes tenham assumido, mediante o aval, a responsabilidade abstracta e objectiva pelo pagamento da livrança, fizeram-no em honra da entidade avalizada.
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Os recorrentes pretenderam garantir o pagamento por parte da E………., S.A e não por parte de F………. .
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«O dador do aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada, pelo que a medida da responsabilidade do avalista se mede pela do avalizado». - Ac. de STJ, de 13.03.2007, in www.dgsi.pt/isti.
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Sendo inexistente a obrigação da entidade avalizada por falta de poderes de representação do subscritor, é nulo o aval que àquela foi prestado.
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Conforme refere a douta decisão recorrida, «a obrigação do avalista é subsidiária ou acessória de outra obrigação cambiária ou da obrigação de outro signatário».
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«Sendo o aval uma garantia pessoal que reveste verdadeira natureza de acto cambiário (fonte de uma obrigação cambiária autónoma), desde que o avalista possa ser responsabilizado pela pessoa por honra de quem prestou a garantia, não faria sentido que subsistisse se a obrigação desta última é inexistente». -Ac. de TRP, de 19.04.1990, in CJSTJ, TOMO II, Ano 1990.
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Embora resulte do art. 32° LULL que a obrigação do avalista se mantém mesmo no caso de a obrigação que ele garante ser nula por qualquer razão que não seja um vicio de forma, certo é que os princípios que regem o instituto do aval, e o aproximam em termos complementares com a fiança, exigem que, em certos casos, se considerem...
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