Acórdão nº 2419/05.1TJVNF-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Maio de 2009

Magistrado ResponsávelSOUSA LAMEIRA
Data da Resolução25 de Maio de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

RECURSO DE APELAÇÃO Nº 2419/05.1TJVNF-B.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto I-RELATÓRIO

  1. No Tribunal Judicial da Comarca de Famalicão, por apenso ao processo de Insolvência da sociedade "B.........., Lda", veio a credora "C.........., S.A." requerer que o Incidente de Qualificação da Insolvência, seja qualificado como culposa.

  2. O Administrador da Insolvência emitiu parecer, nos termos do art. l88, nº 2 do C.I.R.E., entendendo que a presente insolvência deveria ser qualificada como culposa.

    O processo foi com vista ao Ministério Público, o qual concordou com o parecer emitido pelo Administrador da Insolvência.

    Defendeu ainda que por ela deveriam também ser afectados os anteriores sócios D.......... e E.......... e a actual sócia F.......... .

  3. Notificada a insolvente e citados os sócios acima enunciados, vieram os dois primeiros responder, opondo-se a essa qualificação, concluindo pela sua absolvição e a qualificação da Insolvência como fortuita.

    Face à oposição deduzida foi cumprido o preceituado pelo n.º 6 do art. 188° do CIRE, tendo a credora "C.........., S.A." respondido nos termos de fls. 79 e ss.

  4. Realizada tentativa de conciliação, pelos presentes foi mantida a sua posição.

    Observado o legal formalismo realizou-se a audiência de discussão e julgamento, tendo a matéria de facto merecido as respostas que constam de fls. 334 a 338, que não sofreram qualquer reclamação.

    De seguida foi proferida sentença que decidiu: "- qualificar a insolvência, como culposa - artigo 189 n.º 2 do CIRE.

    - declarar afectado pela qualificação de insolvência culposa o sócio gerente D.......... - artigo 189 n.º 2 al. a) do CIRE.

    - decretar a sua inabilitação pelo período de quatro anos - artigo 189 n.º 2 al. b) do CIRE e 152 e ss do CC.

    - declarar que, durante esse mesmo período, fica ele inibido para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa - artigo 189 n.º 2 al. c) do CIRE - determinar a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos pelo D.......... .

    - absolver a E.......... e F.........., da qualificação de insolvência culposa".

  5. Apelou o D.........., nos termos de fls. 374 e ss, formulando as seguintes conclusões: 1. O instituto da qualificação da insolvência como culposa ou fortuita configura um instituto verdadeiramente novo, sem qualquer paralelismo no ordenamento jurídico português, todas as presunções de culpa previstas no art. 186.º do CIRE, capazes de conduzir à qualificação da insolvência como culposa.

    1. "Só regem para factos ocorridos e actos praticados após 15.09.2004, data da entrada em vigor do instituto em mérito, sendo estes instantâneos, ou, sendo os factos relevantes duradouros e não meramente instantâneos, prolongando-se no tempo, produzindo os seus efeitos durante longo período de tempo, mesmo que iniciados antes da entrada em vigor do CIRE, mas permanecendo os seus efeitos para além desta entrada em vigor, não se esgotando num momento anterior".

    2. Da matéria dada como assente não resultam factos que permitam, com segurança, distinguir os factos ocorridos / actos praticados susceptíveis de originar ou contribuir para a situação de insolvência da insolvente "B........., Lda", pelo ora recorrente antes e após a entrada em vigor do CIRE (15.09.2004).

    3. Os factos dados como provados não se encontram devidamente circunstancializados em termos de tempo, modo e lugar, factos esses que para a douta decisão em crise apenas poderiam ser atendidos quando temporalmente localizados em data posterior à entrada em vigor do CIRE.

    4. Não basta dar-se como assente que "mesmo após a cessão de quotas o senhor D.......... se continuou a apresentar perante os credores da requerida como o seu sócio gerente", ou que "houve dissipação de bens, nomeadamente bens móveis de mobiliário de tipo comercial", pois não se provou perante que credores se apresentou o recorrente intitulando-se sócio gerente da insolvente após a cessão de quotas, bem como não se logrou provar em que circunstâncias de tempo e lugar tal se verificou.

    5. A factualidade dada como provada não permite afirmar de forma precisa acerca de um único bem que tenha sido alvo de dissipação pelo recorrente, limitando-se a dar como provado que houve a dissipação de bens móveis de mobiliário de tipo comercial, para além de que, também em relação à dissipação não ficou provado que mesma tenha ocorrido antes ou depois da entrada em vigor do CIRE.

    6. A insolvência culposa pressupõe uma actuação dolosa ou com culpa grave por parte do recorrente, nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência.

    7. Inexiste uma possibilidade real de, a partir da matéria dada como provada, delimitar os factos ocorridos antes e depois da entrada em vigor do CIRE que demonstrem ser essenciais para a qualificação da insolvência como culposa.

    8. Deverá ser desconsiderada para efeitos do incidente da qualificação da insolvência, da mesma forma que deverá ser desconsiderada toda a factualidade dada como provada que haja sido considerada relevante para aferir a qualificação de insolvência em data posterior à entrada do CIRE.

    9. As presunções de culpa só valem para o futuro, pelo que não se poderá, com base nelas, avaliar comportamentos que ocorreram quando elas ainda não existiam.

    10. O CPEREF não tem qualquer norma que penalize, com o sentido e os efeitos previstos na LN (CIRE), os factos traduzidos nas alíneas a), d), e h) do n.º 2 do art.º 186º do CIRE, nomeadamente, factos a que esteja subjacente a destruição, danificação, inutilização, ocultação ou desaparecimento do património do devedor; disposição de bens do devedor em proveito pessoal ou de terceiros; incumprimento em termos substanciais da obrigação de manter contabilidade organizada, mantido uma contabilidade fictícia ou uma dupla contabilidade ou praticado irregularidade com prejuízo relevante para a compreensão da situação patrimonial e financeira do devedor.

    11. No caso dos autos, quaisquer factos que hajam de ser imputados ao apelante, foram praticados na vigência do CPEREF e não do actual código da insolvência (CIRE), por isso, dizer-se que ao caso dos autos se aplicam as presunções previstas nas als. a), d) e h) do n.º 2 do art.º 186° do CIRE, porquanto só a partir de 14/09/2004 passaram as mesmas a constituir presunções de culpa susceptíveis de qualificarem a insolvência como culposa. ii) n.º 1 e al. i), n.º 2° do art.º 186°do CIRE 13. Desde Agosto de 2004 - e sem prejuízo da colaboração prestada à sociedade insolvente até finais do referido ano, conforme resultou, de resto, da prova testemunhal carreada aos autos - não mais deteve, de direito ou de facto as qualidades de sócio e gerente da sociedade devedora.

    12. A actuação do apelante em nada relevou para a situação em que a sociedade devedora veio a culminar, encontrando-se a mesma desprovida de dolo ou mera culpa.

    13. A conduta do apelante, não é, desta feita, compatível com a situação económica em que a sociedade veio a culminar, não tendo o mesmo contribuído, por qualquer via, para a sua criação ou agravamento.

    14. Toda a contabilidade da devedora que se encontrava em seu poder foi entregue à sócia-gerente F.......... .

    15. O Sr. Administrador de insolvência contactou com o recorrente ou diligenciou no sentido de o contactar com vista a que o mesmo prestasse a necessária colaboração, conforme resultou das declarações do Sr. Administrador de Insolvência no decurso da audiência de discussão e julgamento.

    16. Já à luz do CPEREF (cf. art. 6°) o devedor tinha a obrigação de se apresentar à falência no prazo de 60 dias contados a partir dos factos que fundamentavam a respectiva declaração.

    17. Os factos dos autos reportam-se, quando muito, até Agosto de 2004, o que faz com que o devedor tenha incumprido já essa obrigação face à LA; uma vez incumprida essa obrigação não pode ela agora renascer, para voltar a ser novamente incumprida, agora nos 60 dias após a entrada em vigor do CIRE.

    18. O CPEREF não contém qualquer norma que penalize, com o sentido e os efeitos previstos na LN (CIRE), o incumprimento pelo devedor a obrigatoriedade de publicitação dos actos sociais e omissão da obrigação de elaboração de escrituração comercial e apuramento dos resultados de exercício.

    19. A qualificação da insolvência como culposa exige uma relação de causalidade entre a conduta do devedor e o estado declarado da insolvência, uma vez que o devedor pode ter actuado dolosa ou negligentemente mas em nada ter contribuído para a criação ou agravamento da insolvência. Deve, pois, ser provada a culpa - salvo existindo presunção - e o nexo de causalidade.

    20. Para que a insolvência...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT