Acórdão nº 3940/07.2TAVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Maio de 2009

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO SILVA DIAS
Data da Resolução20 de Maio de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

(proc. n º 3940/07.2TAVNG.P1)*Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:*I- RELATÓRIO No Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, no processo comum (Tribunal Singular) nº 3940/07.2TAVNG do ...º Juízo Criminal, foi proferida a seguinte decisão em 29/1/2009 (fls. 115 a 119):"*Autue como processo comum com a intervenção do Tribunal Singular.

*Vem o arguido B............. acusado pela prática, como autor material, de um crime de exploração ilícita de jogo de fortuna ou azar, p. e p. pelo art. 108º, nºs 1 e 2 do DL nº 422/89, de 2 de Dezembro.

Preceitua o art. 108º, no seu nº 1, que: Quem, por qualquer forma, fizer a exploração de jogos de fortuna ou azar fora dos locais legalmente autorizados será punido com prisão até 2 anos e multa até 200 dias".

Por jogos de fortuna ou azar deve entender-se "aqueles cujo resultado é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte" - art. 1º do referido diploma legal - e são jogos de fortuna ou azar "os jogos em máquinas que, não pagando directamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvem temas próprios dos jogos de fortuna ou azar, ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte" - art. 4º, nº 1, al. g).

Diferentes destes são as modalidades afins do jogo de fortuna ou azar, ou seja, "as operações oferecidas ao público em que a esperança de ganho reside conjuntamente na sorte e perícia do jogador, ou somente na sorte, e que atribuem como prémios coisas com valor económico" (v. g. rifas, tômbolas, sorteios, concursos publicitários, concursos de conhecimentos e passatempos) - cfr. art. 159º, n.º 1 e 2 do mesmo diploma legal.

A questão que se coloca no caso concreto é a de saber se a máquina com a denominação "SAI SEMPRE BRINDE" descrita na acusação e o cartaz com a exposição dos prémios, que foram apreendidas nestes autos, não serão modalidades afins dos jogos de fortuna ou azar e não jogos de fortuna ou azar, conforme defende a acusação.

A questão tem sido muito debatida na jurisprudência, sendo certo que a letra da lei não é suficientemente esclarecedora.

Entendemos ser de definir, antes de mais e com uma maior precisão, o que se entende por jogo de fortuna e azar.

No âmbito do DL nº 48912, de 18 de Março de 1969, a distinção entre jogo de fortuna e azar e modalidade afim era clara, porquanto definia o primeiro como aquele "cujos resultados são contingentes, por dependerem exclusivamente da sorte", por contraposição as modalidades afins eram definidas como "as operações oferecidas ao público em que a esperança de ganho reside essencialmente na sorte". Existia, assim, uma distinção clara entre estes dois conceitos: os resultados dos jogos de fortuna ou azar dependiam exclusivamente da sorte ao passo que os das operações consideradas como modalidades afins dependiam essencialmente da sorte.

A clareza desta distinção foi alterada logo com a publicação da versão originária do DL nº 422/89, de 2 de Dezembro, uma vez que definiu os jogos de fortuna ou azar como "aqueles cujo resultado é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte", o que significou que o conceito foi alargado em termos de abranger parte das modalidades afins, pelo menos aquelas que podiam ser consideradas como jogos.

E a situação complicou-se ainda mais com a redacção dada a este diploma pelo DL nº 10/95, de 19 de Janeiro, uma vez que definiu modalidades afins dos jogos de fortuna ou azar como "as operações oferecidas ao público em que a esperança de ganho reside conjuntamente na sorte e perícia do jogador, ou somente na sorte, e que atribuem como prémio coisas com valor económico". Assim, alterou-se o cerne da distinção entre os dois conceitos, que deixou de assentar na relevância da sorte ou do azar para o resultado, já que tanto num caso como noutro a contingência do resultado pode derivar apenas da sorte.

Face a esta alteração legislativa multiplicaram-se os critérios jurisprudenciais de distinção entre os jogos de fortuna ou azar e as modalidades afins.

Um dos critérios situa a linha de fronteira na natureza dos prémios atribuídos: quando estes consistissem em dinheiro estar-se-ia perante jogo de fortuna ou azar, ao passo que a atribuição de prémios de outra natureza caracterizaria a modalidade afim. Neste sentido, cfr. Ac. da RP de 08/07/1998, proferido no processo nº 9840524 e publicado em http://www.dgsi.pt/jtrp. A este critério há a opor três argumentos: em primeiro lugar, a lei não se refere a ele para distinguir os jogos de fortuna e azar das modalidades afins; em segundo lugar, de entre as modalidades de jogos de fortuna e azar especificamente previstas no art. 4º há algumas em que os prémios podem consistir, pelo menos imediatamente, em fichas e o resultado ser apresentado como pontuações; em terceiro lugar, constitui contra-ordenação a substituição por dinheiro ou fichas dos prémios atribuídos pelas modalidades afins dos jogos de fortuna ou azar. No sentido de que este critério não pode ser utilizado, cfr. Ac. da RP de 16/09/1998, proferido no processo nº 9840555, Ac. da RP de 23/06/1999, proferido no processo nº 9940369, Ac. da RP de 10/11/1999, proferido no processo nº 9940494 e publicados em http://www.dgsi.pt/jtrp e Ac. da RL de 26/10/2005, proferido no processo nº 7610/2005-3 e publicado em http://www.dgsi.pt/jtrpl.

Um segundo critério entende que o que distingue o jogo de fortuna ou azar das modalidades afins é o facto de no primeiro o jogador poder auferir uma vantagem de valor indeterminado, em função da "aposta", que pode multiplicar, de uma única vez, por forma a que entra num certo "risco", auferindo uma vantagem em proporção não controlável por si, enquanto que no jogo afim o jogador praticamente nada arrisca, a sua "entrada" não se reveste da característica da "aposta", mas apenas do "preço" da jogada, que é simples, sem possibilidade de ela mesmo multiplicar-se e o prémio que pode obter é fixo e pré-determinado. Neste sentido, cfr. Ac. da RP de 14/07/1999, proferido no processo nº 9910385 e publicado em http://www.dgsi.pt/jtrp.

Um outro critério mais recente e com o qual concordámos, concluindo que não existe distinção material entre os conceitos de jogo de fortuna ou azar e modalidades afins, defende que a distinção tem de ser formal, sendo considerados jogos de fortuna ou azar apenas aqueles cuja exploração nos termos dos nºs 1 e 3 do art. 4º da actual redacção do DL nº 422/89, de 2 de Dezembro, é autorizada nos casinos, ou seja, o campo de aplicação dos ilícitos criminais restringe-se à exploração e outras actividades ilícitas que tenham como objecto esses jogos de...

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