Acórdão nº 275/08.7GBVNO-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelDR. VASQUES OSÓRIO
Data da Resolução21 de Janeiro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. RELATÓRIO.

    Corre termos nos Serviços do Ministério Público junto do Tribunal Judicial da comarca de Ourém, o Inquérito nº 275/08.7GBVNO em que é arguido ..., cidadão croata, solteiro, nascido a 20 de Maio de 1988, sem residência fixa e actualmente, detido preventivamente à ordem dos autos desde 1 de Agosto de 2008.

    No dia 1 de Agosto de 2008 o cidadão ... foi submetido a uma revista e foi efectuada uma busca ao veículo automóvel, marca Kia, modelo Rio, cor azul clara, com a matrícula espanhola 4125DTP, tendo sido apreendidos diversos objectos, alguns dos quais foram reconhecidos pelos respectivos proprietários.

    No dia 2 de Agosto de 2008, já constituído arguido foi o mesmo cidadão submetido a 1º interrogatório judicial, no seguimento do qual o Mmo. Juiz de Instrução proferiu o despacho no qual, além do mais, validou a sua detenção, validou as buscas e apreensões efectuadas e, considerando existirem fortes indícios de ser o arguido co-autor de três crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º, nº 1 e 204º, nº 2, e), do C. Penal, existir perigo de fuga, de perturbação da ordem e tranquilidade públicas, de continuação da actividade criminosa e de ter entrado e permanecido ilegalmente em território nacional, determinou que este aguardasse os ulteriores termos do processo sujeito a termo de identidade e residência e a prisão preventiva.

    Por requerimento entrado em juízo a 19 de Setembro de 2008 veio o arguido alegar, em síntese, que: - Tendo menos de 21 anos de idade e desconhecendo a língua portuguesa, quer na busca realizada à viatura, quer na revista a que foi sujeito, não lhe foi nomeado advogado; - Foi coagido a assinar o auto de busca escrito em língua que desconhece; - As pessoas que consigo alinharam no reconhecimento efectuado para além de serem militares da GNR, provavelmente conhecidos da pessoa que efectuou o reconhecimento, não têm características, físicas e de vestuário, consigo; - Estas provas enfermam de nulidade, nos termos dos arts. 64º, nº 1, c), 92º, nº 2, 119º, c) e 120º, nºs 2, c) e 3, c), do C. Processo Penal, e nelas se baseou o despacho que determinou a sua prisão preventiva.

    Concluiu, pedindo a declaração de nulidade da busca, da revista e do reconhecimento e consequente invalidade das provas obtidas, bem como, que seja o despacho que aplicou a prisão preventiva considerado igualmente inválido, devendo ser notificado o Ministério Público para se pronunciar sobre as medidas de coacção a aplicar sem consideração das provas a declarar inválidas.

    Cumprido o contraditório, a Mma. Juíza de Instrução proferiu então o seguinte despacho (transcrição): " (...).

    I - Das Diligências Realizadas Compulsados os presentes autos constata-se que, e na sequência, da apresentação de várias queixas-crime por furto ocorridos em residências, pelo NIC de Tomar foram encetadas várias diligências no sentido de apurar o(s) autor(es) dos ilícitos participados.

    Assim, foi montada vigilância com vista a visualizar que indivíduos se faziam transportar no veículo 4125DTP, por tal veículo corresponder à descrição que ia sendo dada pelos participantes e populares.

    Nessa sequência surgiu o arguido que não possuía qualquer documento que o identificasse. Após, e porque as características físicas do arguido correspondiam às que iam sendo descritas pelos populares quanto às pessoas responsáveis pela autoria dos furtos, foi passada revista ao arguido e à viatura, e nessa sequência vieram a ser apreendidos objectos que se encontravam no interior da viatura e, bem assim, na posse do arguido. (vide fls. 5-6; 28) Os artigos em ouro que foram apreendidos no interior do veículo correspondiam aos objectos em ouro que haviam sido subtraídos do interior de duas residências (vide auto de reconhecimento de objectos).

    Dos autos consta ainda uma autorização, assinada pelo arguido, para a realização de revista ou perícia (fls. 27).

    Mais consta o auto da busca efectuada à viatura supra identificada, que se encontra assinado pelo OPC e pelo arguido (fls. 30-32).

    Nos termos constantes de fls. 51-52 procedeu-se à realização de reconhecimento de pessoas.

    Após, procedeu o OPC à constituição de arguido de NM..., e foi o mesmo apresentado ao Juiz de Instrução para primeiro interrogatório judicial (vide fls. 56 e 63-73).

    II - Das nulidades invocadas: Ora, dispõe o artigo 251.º, do CPP que: "1. Para além dos casos previstos no n.º 5, do artigo 174.°, os órgão de polícia criminal podem proceder, sem prévia autorização da autoridade judiciária:

    1. A revista de suspeitos (...) e a buscas no lugar em que se encontrarem, salvo tratando-se de busca domiciliária, sempre que tiverem fundada razão para crer que neles se ocultam objectos relacionados com o crime, susceptíveis de servirem a prova e que de outra forma poderiam perder-se; b) (...)".

      Por seu turno, nos termos do disposto no artigo 176.º, n.º 4, aplicável por força do artigo 251.º, n.º 2, a realização da diligência é, sob pena de nulidade, imediatamente comunicada ao juiz de instrução e por este apreciada em ordem à sua validação.

      Assim, e revertendo tais dispositivos legais à situação em apreço, óbvio se mostra que a busca e revista que foram efectuadas pelos OPC não estão afectadas de qualquer nulidade.

      Com efeito, tais revistas e buscas inserem-se no âmbito das medidas cautelares e de polícia relativamente às quais não tem que existir autorização prévia da autoridade judiciária ou consentimento do visado, nem tão pouco é legalmente exigível em tais diligências investigatórias a presença de defensor ou intérprete.

      Por seu turno, e compulsado o teor do Auto de 1.º Interrogatório Judicial, constata-se que o M.º Juiz de Instrução, em obediência ao disposto no artigo 176.º, n.º 4, procedeu à validação das buscas e apreensões efectuadas.

      Termos em que, e reiterando o já afirmando, as diligências de busca, revista e apreensão efectuadas não padecem de qualquer nulidade que as invalidem.

      A latere sempre se dirá que além de não ser minimamente verosímil que o arguido tenha sido coagido a assinar os autos de revista e busca; tal assinatura, face às disposições legais que se deixaram citadas, é de todo inócua em termos de afectar a validade do acto, pois que para a realização das mesmas não era exigível consentimento prévio do visado.

      Por último sempre diremos que, ainda que por mera hipótese se admitisse que a revista, a busca e as apreensões efectuadas estavam inquinadas de nulidade, jamais estaríamos diante de uma nulidade insanável. Pelo que a sua arguição neste momento sempre teria que ser considerada intempestiva.

      No que tange à constituição como arguido de NM..., impõe-se igualmente considerar que a mesma não padece de qualquer nulidade.

      Com efeito, e nos termos do preceituado no artigo 64.º, nº l, al. c) do CPP, não é obrigatória a assistência de defensor.

      Por último, e no que concerne ao reconhecimento efectuado, compulsado o teor de fls. 51-52, resulta, com efeito, que as duas pessoas intervenientes nessa diligência não têm as maiores semelhanças possíveis, tanto a nível físico como de vestuário, com arguido, NM..., não tendo, a nosso ver, sido observadas as formalidades prescritas no artigo 147.°.

      Porém, a consequência dessa situação é apenas a prevista no artigo 147.º, n.º 7, do CPP, ou seja, o reconhecimento efectuado não valer como meio de prova.

      III - Decisão Nos termos e pelos fundamentos expostos, indeferem-se as nulidades invocadas no que toca à revista, apreensão e buscas efectuadas, mantendo-se, igualmente válido o reconhecimento de objectos que foi efectuado.

      Os pressupostos que estiveram subjacentes à aplicação da medida de coacção de prisão preventiva mantêm-se inalterados, nada mais cumprindo determinar a este propósito.

      Notifique.

      (...)".

      Inconformado com a decisão, dela interpôs recurso o arguido, formulando no termo da respectiva motivação as seguintes conclusões, que se transcrevem: " (...).

      Nulidade da busca e da revista 1. A busca efectuada ao veículo do arguido e a revista que lhe foi passada são nulas porquanto, fruto da idade do arguido (menor de 21 anos) e do seu desconhecimento da língua portuguesa, deveria ter-lhe sido nomeado defensor para aqueles actos processuais - cf. artigos 64.º, n.º 1, al. c), nulidade essa insanável - cf. artigo 119.º, alínea c) do CPP.

      1. É igualmente nula a busca e a revista porquanto o arguido assinou os respectivos autos, autos esses redigidos em língua que aquele não conhece (e muito menos domina), não tendo sido fornecidas cópias em língua que aquele conhecesse nem tão pouco foi nomeado intérprete - cf. artigos 92.º, n.º 2; art. 120.º n.º 1 e n.º 2, al. c).

      2. A nulidade referente à falta de intérprete deve igualmente ser considerada insanável pois que o entendimento contrário viola o artigo art. 11.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, aplicável com força de lei constitucional por força do art.º 16.º, n.º 2 da CRP que, por se tratar de direitos, liberdades e garantias é de aplicação directa e vincula entidades públicas e privadas, nelas se incluindo o Tribunal cf. art. 18.º, n.º 1 da CRP.

      3. Violou o meritíssimo Juiz de Instrução Criminal o comando ínsito no artigo 119.º do CPP, pois deveria ter oficiosamente declarado a nulidade insanável da busca e da revista, nulidades de conhecimento oficioso.

        Nulidade do reconhecimento de pessoas 5. O reconhecimento de pessoas a que o arguido foi sujeito é nulo porque, fruto da idade do arguido (menor de 21 anos) deveria ter-lhe sido nomeado defensor para aquele acto processual cf. artigos 64.º, n.º 1, al. c), nulidade essa insanável - cf. artigo 119.º, alínea c) do CPP.

      4. A tudo isto acresce que, não pode o reconhecimento de pessoas ser utilizado como meio de prova, nos termos do n.º 7 do artigo 147.º do CPP, por não ter obedecido ao estatuído no n.º 2 do mesmo preceito legal; ou seja, não foram escolhidas pessoas com as maiores semelhanças possíveis, inclusive de vestuário.

      5. Impossibilidade essa que deve ser expressamente declarada na decisão e não apenas...

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