Acórdão nº 1185/07.0TBPRD-H.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Março de 2009

Magistrado ResponsávelMÁRIO SERRANO
Data da Resolução10 de Março de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 1185/07.0TBPRD-H.P1 (2009) Apelação (Acto processado e revisto pelo relator signatário: artº 138º, nº 5-CPC) * ACORDAM NA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO: I - RELATÓRIO: No âmbito do processo de insolvência, que corre termos na comarca de Paredes, em que foi declarada insolvente «B.........., Lda.», por sentença datada de 18/3/2008, já transitada em julgado, foi proferida sentença de verificação e graduação de créditos, ao abrigo do artº 130º, nº 3, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), aprovado pelo Decreto-Lei nº 53/2004, de 18/3. Nessa sentença, homologou-se a lista de credores reconhecidos elaborada pelo administrador da insolvência e graduaram-se os créditos constantes dessa lista, estabelecendo duas ordens de graduação, uma quanto aos bens móveis (verbas 1 a 73 do auto de apreensão de bens) e outra quanto ao produto da venda de bem imóvel (descrito sob o nº 00399/101088, na Conservatória do Registo Predial de Paredes), ocorrida em execução fiscal e cujo valor se encontra apreendido nos autos (verba 74 do auto de apreensão de bens).

Quanto a esta segunda graduação, definiu-se a seguinte ordem: em 1º lugar, créditos laborais (dos trabalhadores da empresa), privilegiados; em 2º lugar, crédito reclamado por «C.........., SA», garantido por hipoteca voluntária (registada em 11/11/2003, sob a inscrição «Ap. 20/........», conforme documento de fls. 17-18); em 3º lugar, crédito reclamado pela Fazenda Nacional, até ao montante de 72.852,13 €, garantido por hipoteca voluntária; em 4º lugar, crédito reclamado pelo Instituto de Segurança Social, até ao montante de 476.360,13 €, garantido por hipoteca legal; em 5º lugar, créditos reclamados pela Fazenda Nacional e pelo Instituto de Segurança Social, de 7.825,25 € e de 8.494,01 €, respectivamente; em 6º lugar, restantes créditos comuns; em 7º lugar, crédito reclamado pelo Instituto de Segurança Social, de 5.426,46 €, subordinado. Para justificar a preferência dos créditos laborais, designadamente sobre a hipoteca constituída a favor do C.........., SA, argumentou-se com a atribuição àqueles de privilégio imobiliário geral pelo artº 4º da Lei nº 96/2001, de 20/8, e de privilégio imobiliário especial pelo artº 377º do Código do Trabalho (CT), e deu-se por assente, com base em informação prestada pelo administrador da insolvência (na lista de créditos reconhecidos, junta a fls. 3-14), segundo a qual «esse imóvel fazia parte do estabelecimento da devedora, sendo que os trabalhadores [aí] exerciam as suas funções».

Proferida essa sentença, veio o C.........., SA requerer (a fls. 60-61) a sua rectificação, de modo a ser o seu crédito graduado em 1º lugar (passando os créditos laborais para 2º lugar), com o argumento de que só por lapso se afirmou que o imóvel vendido fazia parte do estabelecimento da devedora, uma vez que, conforme havia antes declarado o administrador da insolvência, se tratava de terreno sito em frente das instalações fabris da empresa insolvente, pelo que inexistiria o privilégio atribuído aos créditos dos trabalhadores. Para a eventualidade de indeferimento, formulou-se logo pretensão de interposição de recurso.

Sobre esse requerimento recaiu despacho (de fls. 60-62) que indeferiu o pedido de rectificação. No essencial, sustentou-se que o Banco reclamante não deduziu tempestivamente (no prazo assinado no artº 130º, nº 1, do CIRE) impugnação da lista de credores desconhecidos apresentada pelo administrador da insolvência, pelo que o pedido de rectificação consubstanciaria uma impugnação extemporânea.

Perante esse indeferimento, admitiu-se o recurso interposto, como apelação, a subir imediatamente, no apenso de reclamação de créditos e com efeito meramente devolutivo.

Pelo C.........., SA foram então apresentadas alegações de recurso, que culminam com as seguintes conclusões: «I. O Tribunal a quo fundamenta esta sua decisão, em substância, no seguinte facto: "Esse imóvel fazia parte do estabelecimento da devedora, sendo que os trabalhadores exerciam as suas funções".

  1. Este facto é falso e não foi objecto de contraditório em virtude de o Sr. administrador de insolvência não ter dado, como devia, cumprimento ao n° 4 do art. 129° do CIRE.

  2. Porque o prédio constante da verba 74 não se trata do imóvel onde a firma laborava e/ou os seus trabalhadores exerciam as suas funções.

  3. E este facto foi expressamente explicado ao Tribunal e aos credores pelo senhor administrador de insolvência aquando da apresentação do relatório previsto no artigo 154° do CIRE.

  4. O administrador de insolvência alterou a sua posição aquando da apresentação da lista prevista no artigo 129° do CIRE e, desse facto não notificou o ora recorrente, impossibilitando a impugnação da lista apresentada nos termos do art. 130° do mesmo diploma.

  5. Deve assim a douta sentença em crise ser revogada na parte em que gradua o crédito do banco em segundo lugar, atrás dos créditos dos trabalhadores devendo, em conformidade, o Tribunal a quo ordenar ao administrador de insolvência que dê cumprimento ao n° 4 do art. 129° do CIRE, permitindo assim ao banco recorrente a impugnação dos créditos constantes da lista de credores reconhecidos.

  6. E, em conformidade, deverá o Tribunal a quo proferir sentença de graduação de créditos nos presentes autos após ser dada a possibilidade do exercício do contraditório ao recorrente nos termos do art. 130° do CIRE, após ser dado cumprimento ao n° 4 do art. 129° do mesmo diploma.

    Sem prescindir e na eventualidade de entendimento diverso: VIII. A sentença de graduação de créditos graduou incorrectamente os créditos dos ex-trabalhadores, ao considerá-los com preferência sobre o produto da venda do imóvel dado de hipoteca, em detrimento dos créditos garantidos pela hipoteca constituída sobre o prédio constante da verba 74.

  7. A hipoteca sobre o dito imóvel foi registada em 13/11/2003.

  8. Desta forma, o artigo 377° do Código do Trabalho não é aplicável aos presentes autos.

  9. Paralelamente, a segunda parte do n° 1 do artigo 8° do diploma preambular da Lei n° 99/2003, de 27 de Agosto, estatui que o Código de Trabalho não é aplicável quanto "aos efeitos de factos ou situações totalmente passados anteriormente àquele momento" (leia-se momento de entrada em vigor do Código do Trabalho).

  10. Deste modo, tendo a constituição da garantia ocorrido em data anterior à data da entrada em vigor do Código do Trabalho este, designadamente o seu artigo 377°, não é aplicável aos presentes autos.

  11. Assim sendo, por não ser aplicável aos presentes autos o artigo 377° do Código do Trabalho, deve ser revogada a douta sentença de graduação de créditos recorrida e substituída por outra que gradue o crédito hipotecário do recorrente à frente dos créditos reclamados pelos ex-trabalhadores da "B.........., Lda".

    XlV. E que deveria a douta sentença em crise ter feito uma análise dos factos à luz do direito vigente anteriormente - leia-se as Leis n° 17/86, de 14 de Junho, e n° 96/2001, de 20 de Agosto.

  12. Pois o artigo 751° do Código Civil contém um princípio insusceptível de aplicação ao privilégio imobiliário geral, por este não incidir sobre bens determinados, e pelo facto de os privilégios imobiliários gerais não serem conhecidos aquando do início da vigência do actual Código Civil.

  13. O que implica que, dizendo o n° 3 do artigo 735° do Código Civil que os privilégios imobiliários são especiais, só a...

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