Acórdão nº 0825686 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Dezembro de 2008
Magistrado Responsável | CARLOS MOREIRA |
Data da Resolução | 09 de Dezembro de 2008 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo nº5686/08-2 ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO 1.
B.........., SA, instaurou contra C.........., Lda e D.........., sociedade de direito italiano, acção declarativa, de condenação, com processo ordinário.
Pediu a condenação das rés a: Verem declarado nulo o contrato de compra e venda celebrado entre si por ser legalmente impossível, por contrario a normas imperativas e, consequentemente, sejam as rés condenadas a devolverem-lhe a quantia de 70.000 euros correspondente ao preço pago, bem como a pagarem-lhe a quantia de 589.614,00 euros a título de indemnização por danos emergentes e lucros cessantes decorrentes da celebração do contrato; Ou, em alternativa: Se declare resolvido o contrato, por incumprimento definitivo do mesmo por parte das rés, que acarretou, de sua parte, a definitiva perda de interesse no seu cumprimento, com pagamento das aludidas quantias.
Alegou, para tanto e em síntese: Que contratou com as rés a aquisição à Ré "D.........." de uma máquina marca Montresor, modelo Lara 80 S, usada, com cerca de cinco anos de laboração, equipada com 8 cabeças frontais, 4 cabeças de bisel, calibrador, tapete guiado e com certificado CE, que seria totalmente recondicionada e com garantia de nova.
Que o modelo da máquina entregue (Lara 80) não corresponde ao modelo da máquina encomendada e contratada (Lara 80 S).
Que a máquina que foi fornecida é mais antiga (data de 1987) do que a máquina que efectivamente foi encomendada e adquirida (que deveria ter 5/6 anos) Que a Ré "D.........." lhe entregou uma máquina não possuía certificado CE.
Que a máquina fornecida não possuía ferramenta e montagem de abrasivos e que não possuía sequer placa de identificação da matrícula.
Que as respectivas partes eléctricas não se encontravam protegidas do contacto com a água.
Que o tapete rolante avariou-se e encravou no momento da montagem e experimentação da máquina a cargo da Ré C.........., Lda - alínea S) e que desde a data da sua entrega a máquina nunca funcionou nas suas instalações.
Que em face de a máquina fornecida não ser do modelo "Lara 80 S"e perante as deficiências que apresentava, a Autora não tem interesse na mesma.
Que após a máquina ter sido montada e na sequência do técnico da Ré se ter deslocado às instalações da Autora na sequência do relatado em Q, a Autora, através do seu administrador declarou ao Engº E.........., representante da C.........., Lda, que não aceitava a máquina entregue.
Contestaram as rés.
Por excepção invocaram: A ineptidão da petição por contradição entre o pedido e a causa de pedir já que, pela tese da autora estar-se-ia perante uma venda de coisa defeituosa o que implicaria a sua anulabilidade e não a sua nulidade.
A incompetência internacional dos tribunais portugueses e a incompetência em razão do território, sustentando que a acção deveria ser instaurada ou em tribunal italiano ou em tribunal de Lisboa.
A ilegitimidade da ré C.........., Lda, porque tendo a venda sido feita pela 2ª ré, aquela não tem interesse em agir.
A caducidade do direito da autora pois que alegando que adquiriu a máquina em 19.02.2003 nunca denunciou quaisquer defeitos às rés, tendo instaurado a presente acção apenas em 15.11.2004.
Por impugnação alegam que informaram a autora das características da máquina, tendo esta perfeito conhecimento que a comprada e instalada era uma Lara 80 a qual tem qualidade e produção idênticas às dos modelos mais recentes.
Pediram a improcedência da acção e a condenação da autora como litigante de má fé.
Replicou a autora mantendo a sua posição inicial.
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Prosseguiu o processo os seus legais termos, tendo sido desatendidas as excepções dilatórias.
Discutida a causa foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, por não provada e absolveu as rés do pedido, bem como a autora da invocada má fé.
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Inconformada apelou a autora.
Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões, em síntese: ... 1. ... o devedor tem de realizar a prestação a que está adstrito respeitando os três princípios que informam o cumprimento das obrigações e no cumprimento da sua obrigação o solvens terá de agir nos termos impostos pela boa fé (artº 762, nº 2 do Código Civil), de forma a que a sua actuação não venha a causar prejuízos ao credor; 2. Sempre que o devedor não cumpra a prestação ou a tenha realizado em desrespeito de qualquer dos princípios referidos estar-se-á perante uma situação de não cumprimento do dever obrigacional; 3. Em caso de inexecução, independentemente da responsabilidade pelo prejuízo (artº 798º do Código Civil), o credor pode optar pela realização coactiva da prestação, nomeadamente intentando uma acção de incumprimento (artºs 817º e segs. do Código Civil), ou de execução específica (artºs 827º e segs. do Código Civil), sempre que pretenda manter o contrato; 4. Não tendo interesse na subsistência do contrato, em vez de exigir o cumprimento e realização da prestação incumprida o credor pode optar por resolver o contrato; 5. A responsabilidade contratual tal como em geral a responsabilidade civil em que se insere assenta num comportamento culposo, sendo portanto subjectiva (artºs 483º e 798º do Código Civil). Nos artºs 798º e 799º do Código Civil estabelece-se, por um lado, a responsabilidade (contratual) culposa do devedor pelo prejuízo causado ao credor e, por outro lado, a presunção e apreciação da culpa do devedor; 6. A resolução legal por incumprimento só se pode efectivar nas hipóteses tipificados na lei, mas trata-se de uma tipicidade aberta na qual se inclui uma multiplicidade de situações, exige-se que o incumprimento seja definitivo e que haja adequação entre a gravidade do incumprimento e a pretensão de extinção do vínculo; 7. Estar-se-á perante uma hipótese de incumprimento definitivo sempre que a prestação não tenha sido realizada e já não possa sê-lo posteriormente e, segundo o artº 808º, n.º 1 do Código Civil, são duas as causas que podem estar na origem de tal situação: o credor perdeu objectivamente o interesse no cumprimento da prestação ou decorreu o prazo suplementar (admonitório) de cumprimento estabelecido pelo accipiens.
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A perda do interesse na prestação é apreciada objectivamente - artº 808º n.º 2 do Código Civil.
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É ao credor que incumbe a prova da perda do interesse na prestação - cfr. artº 342º do Código Civil, prova que a A. logrou efectuar; 10. Uma das situações em que se verifica a perda objectiva do interesse do credor na realização da prestação quando ocorre incumprimento do devedor é a que ocorre quando o interesse do credor foi posto em causa por frustração de planos e perda de oportunidades - cfr. Ac. da RC de 11-05-1999, in BMJ 487, pág. 372 e "Da Cessação do Contrato" de Pedro Romano Martinez, ed. Almedina, pág. 138 e segs.
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A A. alegou e provou, que adquiriu à Ré "D........." uma máquina marca Montresor, modelo Lara 80 S, usada, equipada com 8 cabeças frontais, 4 cabeças de bisel, calibrador, tapete guiado e com certificado CE, que seria totalmente recondicionada e com garantia de nova - Factos provados sob as alíneas N) e O); que a Ré "D.........." lhe entregou uma máquina não possuía certificado CE; que o modelo da máquina entregue (Lara 80) não corresponde ao modelo da máquina encomendada e contratada (Lara 80 S) - alíneas G) e N); que a máquina fornecida é mais antiga (data de 1987) do que a máquina que efectivamente foi encomendada e adquirida (que deveria ter 5/6 anos) - alínea R; eu a máquina fornecida não possuía ferramenta e montagem de abrasivos - alínea P; que tal máquina não possuía sequer placa de identificação da matrícula - alínea P; que as respectivas partes eléctricas não se encontravam protegidas do contacto com a água - alíneas H) e I); que o tapete rolante avariou-se e encravou no momento da montagem e experimentação da máquina a cargo da Ré C.........., Lda - alínea S) e que a máquina nunca funcionou nas instalações da A. desde a data da sua entrega - alínea T), e finalmente que em face do facto de a máquina fornecida não ser do modelo "Lara 80 S" e face ao constante das alíneas P, Q e R, a Autora não tem interesse na máquina que lhe foi fornecida - alínea X) e que após a máquina ter sido montada e na sequência do técnico da Ré se ter deslocado às instalações da Autora na sequência do relatado em Q, a Autora, através do seu administrador declarou ao Engº E.........., representante da C.........., Lda, que não aceitava a máquina entregue - alínea S).
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Assim, é indubitável que ocorreu um incumprimento definitivo porque a Ré "D.........." incumpriu definitivamente o contrato celebrado, não se tratando de um mero cumprimento defeituoso, já que ficou demonstrado que a máquina fornecida não só não correspondia ao contratado mas também não funcionou, o tapete rolante encravou, e está demonstrado que a mesma máquina nunca funcionou desde que está na posse da A.
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Está igualmente demonstrado, por assim ter resultado provado, que a A. perdeu o interesse na aquisição da máquina que lhe foi fornecida e que comunicou essa perda de interesse ao Engº E.........., representante da Ré C.........., Lda, agente intermediária da Ré "D.........." no negócio de compra e venda - cfr. factos provados S e X.
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A resolução constituiu, por isso, o mecanismo a que a Autora em contrato de execução instantânea, como é o caso dos autos, podia recorrer depois de já se ter vencido e tornado definitivamente incumprida a prestação da outra parte.
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A resolução justifica-se porque atendendo à relevância do incumprimento não se permite a subsistência do vínculo.
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Não pode senão concluir-se que ocorreu incumprimento definitivo e culposo do contrato por parte da Ré D.......... e que, como já supra se referiu, em face da máquina que veio a ser entregue com características diversas das encomendadas, não foi aceite pela A. como expressamente foi comunicado às Rés e aos representantes das mesmas.
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A circunstância de apenas em relação ao facto alegado de que a máquina encomendada dever ter entre 5 e 6 anos de idade não...
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