Acórdão nº 0815162 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Novembro de 2008

Magistrado ResponsávelLUÍS RAMOS
Data da Resolução19 de Novembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso n.º 5162/08 Processo n.º .../08.2PASTS-A do ..º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Santo Tirso Acordam em conferência na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto O Ministério Público determinou a aplicação do segredo de justiça nos autos supra referidos e apresentou-os ao juiz de instrução para validação (art.º 86º, n.º 3 do Código de Processo Penal).

"Na sequência, o M.mo Juiz de Instrução Criminal proferiu o seguinte despacho: "Despacho proferido a fls. 20 pelo Ministério Público de sujeição dos presentes autos a segredo de justiça: O Ministério Público veio determinar a sujeição dos presentes autos a segredo de justiça, com fundamento numa Directiva da PGR, atendendo ao tipo legal que integra o objecto da investigação (crime previsto e punido pelo art.º 152.º-A, do Código Penal), o qual se insere no contexto de criminalidade violenta, sendo certo que a publicidade dos autos seria, em concreto lesiva para os interesses da investigação e da ofendida.

Cumpre proferir despacho, ao abrigo do art.º 86.º, n.º 3, parte final, do Código de Processo Penal.

Não se vislumbra qualquer motivação factual concreta procedente para o despacho proferido pelo Ministério Público.

Não é pela simples circunstância de o objecto dos autos se reportar a um determinado tipo legal, ainda que o mesmo se integre no conceito de criminalidade violenta que se justifica a sujeição dos autos a segredo de justiça, já que com tal assunção por parte do Ministério Público, está a partir-se do abstracto e a não ponderar o concreto; já por referência ao que em "concreto", o Ministério Público alegou, subsequentemente: interesses da ofendida e interesses da investigação: relativamente aos interesses da ofendida, nada nos autos nos permite concluir que o interesse da ofendida seja o de que o Inquérito fique em segredo de justiça, podendo, até, ter o interesse oposto; quanto ao interesse da investigação, o Ministério Público nada alega em concreto, sendo que das diligências de Inquérito determinadas, não se vislumbra em que medida se torna necessário abranger os autos em situação de segredo de justiça.

Em conformidade com o exposto e nos termos do art.º 86.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, não julgo válido o despacho proferido pelo Ministério Público a fls. 20.

Notifique o Ministério Público." Inconformado com o decidido, vem o Ministério Público impugná-lo, concluindo assim a respectiva motivação: 1º- A Lei n.º 48/2007 de 29 de Agosto, com as alterações introduzidas na discussão na Assembleia da República, mudou radicalmente o paradigma anterior e constitucionalmente adequado no que se refere à conformação do segredo de justiça.

  1. - Designadamente quando passou a dispor que, por regra, o inquérito é público, salvo decisão irrecorrível do juiz de instrução que ordene o segredo externo do processo e que no caso excepcional da determinação da submissão do segredo de justiça pelo M.P., esta fica sujeita à validação pelo juiz de instrução.

  2. - O segredo de justiça tutela(va) a integridade e a eficácia da investigação, do ponto de vista do CPP e do interesse público no exercício da acção penal que transporta, prescrevendo então (e agora) o n.º 1 do art. 355.° do CPP que «não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção dó tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em julgamento» 4°- A exclusão da publicidade do processo preliminar (o segredo de justiça), num processo de natureza acusatória, mas nessa fase sujeita ao princípio do inquisitório, protegia, pois, do ponto de vista da estrutura, dos conceitos e dos fins, a investigação.

  3. - E foi esse o sistema quando foi constitucionalizado expressamente o segredo de justiça, com a LC n.º 1/97, do segredo de justiça no n.º 3 do art.º 20º («3. A lei define e assegura a adequada protecção do segredo de justiça»). Essa era a matriz do segredo de justiça ao tempo da sua constitucionalização.

  4. - A adopção pela Lei n.º 48/2007 de um regime que só, por excepção, admite salvaguardar a relevância primordial da exclusão da publicidade para a integridade da investigação e que faz depender essa excepção não só do responsável funcionalmente pelo inquérito, o Ministério Público, com grave prejuízo da sua função constitucional mas sim pelo juiz de instrução, desenquadrado das suas funções de garantia e protecção de direitos fundamentais a que está vinculado, na procura de equilíbrio entre valores em conflito e que, portanto deveria estar afastado dos resultados da investigação, da sua eficácia, viola a adequada protecção do segredo de justiça (n.º 3 do art. 20º) e a função constitucional do Ministério Público (art.º 219º) 7°- É, pois, a norma do n.º 3 do art. 86.° do CPP, inconstitucional por desrespeito do n.º 3 do art. 20.° da CRP, por não constituir adequada protecção do segredo de justiça, na medida em que faz depender a validade da sua determinação pelo Ministério Público dá concordância do juiz de instrução, o que viola igualmente os art.ºs 219.° e 32.°, n.º 5 da CRP: o princípio do acusatório e o papel constitucional do Ministério Público.

  5. - Deve, assim, desaplicar-se a parte final da norma do n.º 3 do art. 86.° do CPP, quando sujeita a validação pelo juiz da determinação pelo Ministério Público da aplicação ao processo do segredo de justiça, quando os interesses da investigação ou os direitos dos sujeitos processuais o justifiquem, por inconstitucional.

  6. - Tratando-se de um inquérito por...

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