Acórdão nº 311-A/1997.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Março de 2009
Magistrado Responsável | JOSÉ EDUARDO SAPATEIRO |
Data da Resolução | 12 de Março de 2009 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam neste Tribunal da Relação de Lisboa: I - RELATÓRIO A, suscitou, em 22/03/2004, o incidente de incumprimento da sentença de regulação do poder paternal do seu filho menor M, com a Requerente residente, sendo Requerido J, pai do referido menor, residente em Vendas Novas, alegando, em síntese, que o pai do menor e aqui Requerido não pagou a pensão de alimentos fixada pelo tribunal.
Conclui pedindo ao tribunal que "se digne ordenar as diligências necessárias ao pagamento das quantias em dívida".
*Notificado pessoalmente e por mandado judicial o Requerido, nos termos e para os efeitos do artigo 181.º, número 4 da OTM (fls. 18), o mesmo nada veio dizer dentro do prazo legal.
*Foi obtida junto da Segurança Social informação acerca da situação contributiva do Requerido e de eventuais descontos efectuados em nome deste último, conforme ressalta de fls. 26 (último descontos em Setembro de 1996).
*Depois de inúmeras diligências tendentes à localização da Requerente (fls. 13 a 43), foi designada Conferência de Pais (fls. 47 a 50), a que não compareceu o Requerido, apesar de notificado (fls. 45 e 46), aí tendo sido inquirida a Requerente acerca dos fundamentos para o presente incidente de incumprimento e sua subsistência à data da diligência, tendo a mesma declarado o seguinte: "O requerido, desde a sentença proferida a 21.07.1999, que não pagou a título a alimentos, as quantias fixadas na mesma sentença até à presente data, ou seja, a quantia mensal de 75 euros, bem como a quantia de 25 euros, correspondente às prestações vencidas desde Outubro 97 a 21 de Julho de 1999.
A declarante recebe mensalmente o abono de família no montante cerca de 25 Euros prestado pela segurança social. --- Não dispõe de mais nenhuma apoio financeiro. --- Aufere um vencimento mensal de cerca de 420 euros líquidos com os quais faz às despesas do seu agregado familiar, composto por si e pelo seu filho.
O requerido trabalha como vendedor ambulante. --- Pese embora as diligências por si tentadas não reconhece ao requerido quaisquer bens para satisfazer o crédito." Foi, nessa mesma conferência e na sequência de promoção do Ministério Público nesse sentido, judicialmente reconhecida a verificação de uma situação de incumprimento por parte do Requerido (despacho de fls. 48 e 49) e equacionada, desde logo, a hipótese dos alimentos devidos ao menor passarem a ser liquidados pelo Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores, conforme se mostra previsto na Lei n.º 75/98 de 19/11 e Decreto-Lei n.º 164/99, de 13/5 (despacho de fls. 49 e 50), tendo, nessa sequência, sido determinado que se solicitasse ao CRSS a realização de Inquérito para apuramento das necessidades da menor e da situação económica de sua mãe (artigo 3.º, número 2 da Lei 75/98, de 19/02).
*Tais elementos da Segurança Social relativos ao menor e à sua mãe mostram-se juntos a fls. 55 a 60, podendo aí ler-se, de relevante, o seguinte: (...)*Foi proferida, a fls. 87 e seguintes e com data de 7/12/2006, sentença que decidiu, em síntese e na parte que nos importa, o seguinte: " (...) Por todo o exposto, decide-se: Para os efeitos do disposto na Lei nº 75/98, de 19 de Novembro, e tendo presentes as disposições conjugadas dos arts. 2.º a 4.º, do Decreto-Lei nº 164/99, de 13 de Maio, fixo a prestação alimentar devida ao menor M, no montante mensal de 1 UC (uma unidade de conta), a suportar pelo Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores.
A prestação é devida desde Julho de 2006, cfr. fls. 47 e segs, - data do despacho a reconhecer a constatação de efectivar o mecanismo do Fundo de Garantia de Alimentos devidos a Menores e a inviabilidade de obtenção de cumprimento da prestação de alimentos pelos meios previstos no art.º 189º da OTM.
Não são devidas custas.
Notifique a presente decisão ao M.ºP.º, à mãe do menor (sendo esta com a advertência de que deverá comunicar ao Tribunal ou à entidade responsável pelo pagamento das prestações a cessação ou qualquer alteração da situação de incumprimento ou da situação do menor, bem como deverá efectuar a renovação anual da prova de que se mantêm os pressupostos subjacentes à atribuição da garantia de alimentos), ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (artigos 2.º, n.º 3 e 4.º, n.º 3 do DL 164/99).
Oportunamente cumpra o disposto nos art.º 9.º, n.º 5 do DL 164/99, de 13 de Maio." Registe e notifique.".
*O INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, notificado da sentença (fls. 86 - ofício de 28/03/2008), interpôs recurso da mesma, que foi correctamente admitido como de agravo, a subir de imediato, nos próprios autos e com o efeito meramente devolutivo (fls. 93 e 96).
*O Agravante apresentou alegações de recurso (fls. 100 a 113), tendo formulado as correspondentes conclusões nos seguintes moldes: "1) A douta decisão ora recorrida interpretou e aplicou de forma errónea, ao caso sub judice, o art.º 1.º da Lei n.º 75/98 de 19/11 e o art.º 4.º, n.ºs 4 e 5 do D.L. n.º 164/99 de 13/05; 2) Com efeito, o entendimento do Meritíssimo Juiz "a quo", de que no montante a suportar pelo FGADM devem ser abrangidas as prestações já vencidas e não pagas pelos progenitores (judicialmente obrigados a prestar alimentos) não tem, salvo o devido respeito, suporte legal; 3) O D.L. n.º 164/99 de 13/05 é taxativo quanto ao início da responsabilidade do Fundo pelo pagamento das prestações; 4) No n.º 5 do art.º 4.º do citado diploma, é explicitamente estipulado que "o centro regional de segurança social inicia o pagamento das prestações por conta do Fundo, no mês seguinte ao da notificação da decisão do Tribunal, nada sendo dito quanto às prestações em dívida pelo obrigado a prestar alimentos; 5) Existe uma delimitação temporal expressa que estabelece o momento a partir do qual o Fundo deve prestar alimentos ao menor necessitado; 6) Não foi intenção do legislador dos supra mencionados diplomas legais, impor ao Estado o pagamento do débito acumulado pelo obrigado a prestar alimentos; 7) Tendo presente o preceituado no art.º 9.º do Código Civil, ressalta ter sido intenção do legislador, expressamente consagrada, ficar a cargo do Estado apenas o pagamento de uma nova prestação de alimentos a fixar pelo Tribunal dentro de determinados parâmetros - art.º 3.º, n.º3 e art.º 4.º, n.º1 do D.L. n.º 164/99 de 13/05 e art.º 2.º da Lei n.º 75/98 de 19/11; 8) A prestação que recai sobre o Estado é, pois, uma prestação autónoma, que não visa substituir definitivamente a obrigação de alimentos do devedor mas, antes, proporcionar aos menores a satisfação de uma necessidade actual de alimentos, que pode ser diversa da que determinou a primitiva prestação.
9) O FGADM não garante o pagamento da prestação de alimentos não satisfeita pela pessoa judicialmente obrigada a prestá-los, antes assegurando, face À verificação cumulativa de vários requisitos, o pagamento de uma prestação "a forfait" de um montante por regra equivalente - ou menor - ao que fora judicialmente fixado.
10) Só ao devedor originário é possível exigir o pagamento das prestações já fixadas, como decorre do disposto no art.º 2006.º do Código Civil, constatação que é reforçada pelo disposto no art.º 7.º do D.L. n.º 164/99, ao estabelecer que a obrigação principal se mantém, mesmo que reembolso haja a favor do Fundo.
11) Não há qualquer semelhança entre a razão de ser da prestação de alimentos fixada ao abrigo das disposições do Código Civil e a fixada no âmbito do Fundo. A primeira consubstancia a forma de concretização de um dos deveres em que se desdobra o exercício do poder paternal; a última visa assegurar, no desenvolvimento da política social do Estado, a protecção do menor, proporcionando-lhe as necessárias condições de subsistência; 12) Enquanto o art.º 2006.º do Código Civil está intimamente ligado ao vínculo familiar - art.º 2009.º do Código Civil - e daí que quando a acção é proposta, já os alimentos seriam devidos, por um princípio de Direito Natural, o D.L. n.º 164/99 "cria" uma obrigação nova, imposta a uma entidade que antes da sentença, não tinha qualquer obrigação de os prestar; 13) A obrigação de prestação de alimentos pelo FGADM (autónoma da prestação alimentícia decorrente do poder paternal) não decorre automaticamente da Lei, sendo necessária uma decisão judicial que a imponha, ou seja, até essa decisão não existe qualquer obrigação; 14) Se é diferente a natureza das duas prestações, diferente é também o momento a partir do qual se começam a vencer; 15) A prestação de alimentos, visto haver norma substantiva que o prevê, começa a vencer-se a partir da propositura da acção que fixou o quantitativo a satisfazer pelos progenitores do menor; 16) Já a prestação a satisfazer pelo FGADM, tendo em conta o regime geral aplicável à generalidade das acções, começa a vencer-se após o trânsito em julgado da decisão judicial que fixa o seu montante; 17) Muito bem decidiu o douto Acórdão do tribunal da Relação de Coimbra - Agravo n.º 1386/01 de 26/06/2001 - no sentido de o Estado não responder pelo débito acumulado do obrigado a alimentos, tratando-se de prestações de diversa natureza. No mesmo sentido...
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