Acórdão nº 3859/2008-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelARNALDO SILVA
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam os juízes, em conferência, na 7.ª Secção Cível, do Tribunal da Relação de Lisboa: I.

Relatório: 1. Na sua contestação, a ré arguiu a excepção de preterição do tribunal arbitral dizendo que a presente acção tem por objecto a interpretação da cláusula 2.ª, n.º 5, do Acordo-Quadro, celebrado entre as partes em 24 de Junho de 1999, visando afinal ao condenação da ré no pagamento de determinada quantia que resultará do não cumprimento desse mesmo acordo, na óptica da autor, e, que no âmbito do referido acordo foi acordado submeter este litígio a arbitragem, seguindo os tramites estabelecidos na cláusula 9.ª do referido Acordo-Quadro.

E concluiu pela preterição de tribunal arbitral voluntário, e pela sua absolvição da instancia.

Na réplica, a autora disse que a ré revogou a convenção de arbitragem quando na carta de 25 de Janeiro de 2007, junta a fls. 195 e em resposta à carta da autora de 12-01-2007, junta a fls. 193, refere que "Deste modo, tal como já vos tinha sido comunicado pelos nossos advogados __ mais precisamente, pelo Ex.mo Senhor "A" __ e na linha do que ficou referido atrás, não parece à "B" pertinente o recurso aos institutos da mediação ou da arbitragem". Referiu também que tal revogação foi aceite pela autora através da interposição da presente acção, e que a cláusula de arbitragem é alternativa não tendo por efeito excluir a jurisdição dos tribunais comuns. Invocou ainda a caducidade e a nulidade da convenção arbitral. A caducidade por ter decorrido o prazo de 15 dias referido na mencionada cláusula e a nulidade porquanto o estabelecimento de um prazo de caducidade violaria os direitos que a lei confere ao credor, o qual ficaria, desta forma, privado do recorrer a qualquer meio judicial de efectivação dos seus direitos.

E concluiu pela competência do tribunal comum.

* 2. No despacho saneador foi julgada procedente a excepção a excepção de preterição do tribunal arbitral e, em consequência, absolveu a ré da instância e condenou a autora em custas, em síntese, com base nos seguintes fundamentos: «A violação da convenção de arbitragem, através da qual as partes se tenham obrigado a recorrer a árbitros para composição dos litígios que entre elas existam (cfr. o art.º 1º, n.º 1 da Lei n.º 31/86, de 29-08), mediante a propositura de acção em tribunal judicial, constitui um excepção dilatória, que implica a absolvição da instância [art.ºs 494º al. j); 493º, n.º 2 e 288º do Cód. Proc. Civil]. Excepção esta que só pode ser arguida por quem for parte na convenção de arbitragem e na acção proposta no tribunal comum, e que não é de conhecimento oficioso.

De acordo com o art.º 2º, n.º 4 do da LAV (Lei n.º 36/86, de 29-08) admite-se a revogação da convenção de arbitragem, por escrito assinado pelas partes até à pronúncia da decisão arbitral. Quanto à autora, não há dúvidas de que renunciou à convenção de arbitragem. Quanto à ré não nos parece que tenha renunciado, porque, quer na apontada carta de 25-01-2007, em resposta à carta da autora de 12-01, quer nesta, nenhuma das partes faz referência à convenção de arbitragem fixada no contrato. Pelo contrário, das referidas cartas parece transparecer que as partes puseram a hipótese de recurso a uma entidade diferente que mediasse o diferendo e sugerisse ou determinasse uma solução para o caso. Ora, daqui transparece que não se trata da mesma entidade estabelecida na cláusula nona do Acordo-Quadro, uma vez que nesta tudo ficou estabelecido quanta a sua composição e funcionamento.

Por outro lado, da cláusula nona do referido Acordo resulta que a decisão do tribunal arbitral seria vinculativa enquanto, de acordo com as referidas missivas, a decisão desta outra entidade podia ou não ser vinculativa, ou ter penas a natureza de recomendação, conforme tal viesse a ser convencionado entre a G e a "B". Por outro, importa ter presente, que de acordo com o art.º 11°, n.º 1 da LAV, "a parte que pretenda instaurar o litígio no tribunal arbitral deve notificar desse facto a parte contrária", notificação essa que não ocorreu no caso dos autos.

Entendemos pois que, quando a ré diz na sua carta de 25 de Janeiro de 2007, "(...) não parece à "B" pertinente o recurso aos institutos da mediação ou da arbitragem" esta a referir-se a sugestão apresentada pela autora de nomeação de entidade diversa daquela que havia sido acordada na convenção de arbitragem, não podendo dai ser retirada a conclusão de que procedeu a revogação da convenção de arbitragem estipulada na cláusula nona do Acordo-Quadro.

Atendendo às questões invocadas pela autora, coloca-se a questão de saber se, para decidir sobre a procedência ou improcedência da excepção de preterição do tribunal arbitral, o tribunal comum tem de apreciar a validade e eficácia da convenção de arbitragem ou se, basta a prova da existência de uma convenção de arbitragem que não seja manifestamente nula. Das duas teses em confronto, a que melhor se ajusta à lei portuguesa vigente em matéria de arbitragem (art.º 21º da LAV) é aquela que se basta com a prova da existência de uma convenção de arbitragem que não seja manifestamente nula. Assim, no domínio da LAV e concretamente de acordo com o art.º 21º, n.º 4, da referida Lei, o juízo sobre a questão de saber se a convenção de arbitragem é inoperante, quer por ser inválida, quer por ser ou se ter tornado ineficaz, compete, antes de mais, ao árbitro. Só depois de ele se pronunciar, julgando-se incompetente ou conhecendo de mérito, é que o tribunal comum pode conhecer da questão da competência do árbitro e, só em sede de impugnação da decisão arbitral.

Para que se verifique a excepção dilatória da preterição do tribunal arbitral basta que se alegue e prove ao tribunal judicial a existência de convenção de arbitragem que não seja manifestamente nula ou ineficaz e que seja apenas susceptível de vincular as partes no litígio e de conter tal litígio no seu objecto.

Tendo em conta o sobredito, as questões invocadas pela autora e relativas a caducidade da cláusula e a validade desta estão subtraídas à jurisdição do juiz, devendo ser apreciadas pelo árbitro, excepto se for manifesta a nulidade, ou a inaplicabilidade da convenção de arbitragem por caducidade, caso em que o juiz pode declara-lo e, consequentemente, julgar improcedente a excepção, de acordo com o disposto no art.º 12°, n.º 5 da LAV.

Volvendo ao caso em apreço, e tendo em consideração o que precede, forçoso é concluir que não existe qualquer nulidade manifesta da cláusula de arbitragem estabelecida no Acordo-Quadro uma vez que o litígio em causa não esta submetido por lei especial ao tribunal judicial ou a arbitragem necessária e também não respeita a direitos indisponíveis (art.º 1º, n.º 1 da Lei n.º 31/86).

Assim, e uma vez que no Acordo-Quadro foi fixada uma cláusula de arbitragem forçoso é concluir pela procedência da excepção dilatória de preterição do tribunal arbitral, o que implica a absolvição da instância de acordo com os art.ºs 493°, n.ºs 1 e 2, e 494°, al. j), do Cód. Proc. Civil».

* 3. Inconformadas agravaram as autoras. Nas suas alegações, em síntese, e sistematização nossa, concluem: 1.ª O Tribunal a quo apenas conheceu da questão da revogabilidade da convenção arbitral e não apreciou questões prévias relativas à apreciação da validade ou eficácia da convenção arbitral, e que deveria ter conhecido antes de se ter julgado incompetente para conhecer da validade ou eficácia da mesma; 2.ª Ainda que se admitisse que a consagração do princípio geral da Kompetenz-Kompetenz no âmbito do art.º 21º da LAV obstava ao conhecimento das questões relativas à apreciação da validade e eficácia da convenção arbitral, este princípio não obstava a que fossem conhecidas as questões prévias à apreciação da mesma validade e eficácia, como eram, no caso em apreço, o exercício abusivo da invocação da excepção de preterição de tribunal arbitral, a mera interpretação da natureza concorrencial ou exclusiva da competência do tribunal arbitral, uma vez que as autoras invocaram estas questões na réplica, bem como a caducidade da cláusula 9.ª do Acordo-Quadro, bem como da sua nulidade; 3.ª Quanto ao apuramento da natureza exclusiva ou concorrencial da Convenção Arbitral, não estando aqui em causa a arguição de qualquer vicio enformador da referida cláusula mas tão somente a apreciação da vontade das partes em atribuir à jurisdição comum a faculdade de também ela ser competente para apreciar a questão, era lícito às partes, por acção ou omissão, atribuir-lhe esse carácter ao abrigo do princípio da autonomia da vontade. Direito este que ficaria absolutamente esvaziado se se entendesse __ como o entendeu o Tribunal a quo __ que o princípio da competência do Tribunal Arbitral para decidir da sua própria competência implicaria a insusceptibilidade de conhecer esta questão, já que obrigaria a parte que pretendesse ver o litígio submetido à jurisdição comum a constituir previamente um Tribunal Arbitral para que se lhe reconhecesse essa faculdade; 4.ª Desta forma, efectuou uma errada interpretação das declarações negociais proferidas pelas partes e, bem assim, omitindo pronúncia sobre questões que, nos termos dos art.ºs 659º, n.º 1 e 668º, n.º 1 al. d) do Cód. Proc. Civil, lhe conhecer. O que a lei comina com nulidade da sentença [art.º 668º, n.º 1 al. d) do Cód. Proc. Civil]; 5.ª Da leitura atenta do teor das cartas datadas de 12-01-2007 e 25-01-2007, respectivamente, a carta da recorrente "C" e resposta à mesma carta da recorrida "B", constata-se que não procedem os argumentos de que as declarações da ré "B" se referiam somente a uma terceira entidade com poderes distintos dos consagrados na cláusula...

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