Acórdão nº 10693/2008-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelCARLOS ALMEIDA
Data da Resolução07 de Janeiro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa I - RELATÓRIO 1 - O arguido T... foi julgado, juntamente com outros, no 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Mafra e aí condenado, por acórdão de 29 de Julho de 2008, pela prática de oito crimes de falsificação de notação técnica, p. e p. pelo artigo 258.º, n.º 2, por referência à alínea c) do n.º 1, em conjugação com os artigos 255.º, alínea b), e 26.º, todos do Código Penal, na pena, por cada um deles, de 200 dias de multa à razão diária de 8 euros.

Em cúmulo, este arguido foi condenado na pena única de 700 dias de multa à taxa diária de 8 euros, o que perfaz a quantia de 5600 euros.

Nessa peça processual o tribunal considerou provado que: 1. O arguido T... exerce a profissão de técnico de electrónica, actividade que vinha desenvolvendo desde há alguns anos, e pelo menos até 2004, por conta própria e com carácter esporádico.

  1. No âmbito dos conhecimentos de electrónica por si detidos o arguido aprendeu, em data concretamente não apurada, a viciar aparelhos de tacógrafo instalados nos veículos pesados de mercadorias, neles colocando um dispositivo vulgarmente denominado "alentejano" ou "morto".

  2. O mencionado dispositivo encontra-se ligado por um fio condutor ao tacógrafo e pode ser ligado ou desligado através de um interruptor instalado por detrás de um botão de um comando.

  3. Quando ligado, o "alentejano" bloqueia o tacógrafo, o qual deixa de registar no disco a velocidade, horas de condução e os quilómetros percorridos pelo veículo.

  4. Para levar a efeito a modificação da leitura dos tacógrafos o arguido T... desactivava o "chip" original instalado na placa electrónica do aparelho tacógrafo, substituindo-o por outro de marca "ATMEL", com a referência AT89C2051-24 PI, e procedendo à instalação de um receptor da marca "AUREL", com a referência BC-NBK.

  5. O "chip" anulava as funções originais do tacógrafo, fazendo com que este funcionasse segundo a vontade do utilizador do comando à distância.

  6. O arguido T... não estava então habilitado como aferidor ou reparador de tacógrafos.

  7. Os comandos fornecidos pelo arguido T... eram da marca "AUREL", com duas referências: "TX2" (dois botões) e " TX3" (três botões), sendo que o "TX3" permitia efectuar mais funções.

  8. O referido sistema viciador é de grande utilidade para os condutores e suas empresas, uma vez que permite anular o registo da velocidade, horas de condução e quilómetros percorridos, sendo os maiores beneficiados do sistema as sociedades de transportes, uma vez que as autuações por incumprimento de horários são da sua responsabilidade.

  9. O veículo tractor de mercadorias com a matrícula NR é propriedade da sociedade "N..., Lda.", com sede na Rua da ...,...., sociedade de que são sócios-gerentes os arguidos U... e V..., irmão do primeiro.

  10. Em data não concretamente apurada, mas posterior a 28/12/2000, data da aquisição da viatura pela sociedade N..., Lda., e anterior a 5 de Fevereiro de 2002, a solicitação de um dos arguidos V...ou U..., o arguido T... procedeu à viciação do aparelho de tacógrafo instalado no veículo NR, o que fez mediante a aplicação no mesmo de um aparato activado por controlo remoto, procedendo depois à sua reinstalação.

  11. Pela viciação do tacógrafo instalado na viatura NR recebeu o arguido T... quantia não apurada.

  12. No dia 5 de Fevereiro de 2002, no âmbito de uma operação de fiscalização de trânsito, foi o veículo mandado parar e sujeito a fiscalização, tendo sido detectado o aparelho tacógrafo viciado nos termos descritos em 11., sendo a viatura conduzida por AG..., que desconhecia a existência da aludida viciação.

  13. O mencionado aparelho de tacógrafo tinha em si instalado um aparato que, activado por controlo remoto, inibia a velocidade, impulsos e quilómetros.

  14. Os selos mandatórios do tacógrafo haviam sido removidos por alguém não autorizado para o fazer, em ordem a permitir a sua viciação.

  15. O veículo pesado de mercadorias de matrícula KC é propriedade da sociedade "A..., Lda.", com sede na ...,...,..., sendo sócio-gerente da mesma C....

  16. O referido C... travou conhecimento com o arguido T... por modo não apurado, vindo a encontrar-se com este no dia 28 de Fevereiro de 2003, pelas 11:10 horas, nas proximidades de um café sito em ..., área desta comarca.

  17. Os veículos tractores de mercadorias com as matrículas ME e ND foram ambos adquiridos pela sociedade "B..., Lda.", com sede em ...,...,..., cujo sócio-gerente é o arguido B..., ali trabalhando como motoristas, com referência a Agosto de 2003, os arguidos A... e D....

  18. Em data não concretamente apurada, mas posterior a Janeiro de 2001, data da aquisição da viatura ME, e anterior a 11 de Agosto de 2003, o arguido T..., a solicitação do arguido B..., procedeu à instalação de um sistema viciador, nos termos descritos em 5. e 6., nos aparelhos de tacógrafo que equipavam os veículos ME e ND, mediante o recebimento de quantias não apuradas.

  19. Após instalação do aludido sistema o arguido T... reinstalou os aparelhos de tacógrafo nas aludidas viaturas, que passaram a circular com os mesmos viciados, sendo o sistema viciador accionado por um comando de controlo remoto.

  20. Com referência a 11 de Agosto de 2003 o arguido A... conduzia a viatura com a matrícula ME pela EN 1, na localidade de ...., quando foi interceptado pelos militares da GNR E... e F....

  21. Com referência a 11 de Agosto de 2003 o tacógrafo instalado naquela viatura ME, com o modelo 1318/27 e o n.º 0306889, continha no seu interior um dispositivo completamente estranho à sua configuração original, tratando-se de um receptor acoplado a um circuito integrado, tendo este por função introduzir no funcionamento do tacógrafo significativas alterações, permitindo a quem o utilizasse manipular o registo efectuado nas folhas respectivas, dispositivo esse a justificar a existência do controlo remoto mediante cuja manipulação era accionado.

  22. Sem que se pressionasse qualquer um dos botões do controlo remoto não era possível detectar alguma anomalia no funcionamento do aparelho mas premindo a tecla inferior do comando o resultado obtido consistia na alteração do registo dos tempos de trabalho, sendo possível em plena condução obter na folha de registo um período correspondente a período de descanso e na velocidade instantânea valor igual a 0 km/hora. Premindo os botões de comando numa sequência diferente - botão superior uma vez, seguido de botão inferior - o sistema permitia a memorização do valor correspondente à velocidade instantânea a que o veículo se deslocasse no momento, sendo neste caso possível alterar também o registo da velocidade instantânea, fazendo com que a velocidade registada na folha de registo nunca fosse superior ao valor previamente memorizado, isto é, se a velocidade instantânea fosse inferior ou igual a este valor, o registo correspondia à velocidade correcta a que se deslocava o veículo; se a velocidade instantânea do veículo fosse superior, o registo mantinha-se na marca previamente memorizada.

    A reposição do registo correcto era obtida desligando a chave da ignição, uma vez que ao voltar a ligá-la o tacógrafo passava a funcionar de forma correcta, não denunciando a existência de qualquer anomalia.

    O tacógrafo assim alterado permitia o registo de tempo de descanso durante o tempo de condução e que a velocidade instantânea do veículo fosse controlada pelo motorista de forma a que o registo efectuado na folha respectiva nunca fosse superior ao valor definido por lei, sendo possível repor o funcionamento correcto do tacógrafo sem denunciar na folha de registo a presença do dispositivo adulterador.

  23. O arguido A... tinha conhecimento da existência do mencionado dispositivo viciador e sua forma de funcionamento, mantendo em seu poder o controle remoto que o accionava.

  24. Com referência a Agosto de 2003 o tacógrafo instalado no veículo ND, modelo 1318/26, com o n.º 0273738, continha no seu interior um dispositivo completamente estranho à sua configuração original, tratando-se de um receptor acoplado a um circuito integrado, tendo este por função introduzir no funcionamento do tacógrafo significativas alterações, permitindo ao seu utilizador manipular o registo efectuado nas folhas respectivas, dispositivo esse accionado por controlo remoto.

    Assim, sem que se pressionasse algum dos botões do controlo remoto, não era detectada nenhuma anomalia no funcionamento do tacógrafo; premindo os botões de comando em sequência (botão superior durante 3 segundos activava o dispositivo, botão inferior durante 3 segundos procedia à sua desactivação), obtinha-se alteração do registo dos tempos de trabalho sendo possível em plena condução obter na folha de registo um tempo correspondente a período de descanso e na velocidade instantânea valor igual a 0 km/hora.

    A reposição do registo correcto era obtida desligando a chave da ignição, uma vez que ao voltar a ligar a ignição o tacógrafo passava a funcionar de forma correcta, não denunciando a existência de qualquer anomalia.

  25. O veículo tractor de mercadorias de matrícula RM é propriedade da sociedade "C..., Lda.", com sede na Rua ...,..., sendo seu sócio gerente G....

  26. Em data não concretamente apurada, mas posterior a Julho de 2001 e anterior a Outubro de 2003, o arguido T... procedeu à adulteração do aparelho de tacógrafo instalado naquela viatura nos termos descritos em 5. e 6. mediante o recebimento de quantia não apurada.

  27. Na sequência do referido em 27. o arguido T...fez entrega ao G... do comando de controlo remoto com três botões e de uma disquete com o manual de instruções denominado "XPTO", no qual se descrevia de forma detalhada o funcionamento do sistema de viciação.

  28. Com referência a Outubro de 2003 o aparelho de tacógrafo instalado na viatura RM, marca VDO-Kienzle, modelo 1318-27 80, com o n.º 3863872, continha no seu interior um dispositivo completamente estranho à sua configuração original, tratando-se de um receptor acoplado a um circuito integrado, tendo este por função introduzir no funcionamento do...

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