Acórdão nº 9318/2008-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Novembro de 2008
Magistrado Responsável | JOSÉ EDUARDO SAPATEIRO |
Data da Resolução | 27 de Novembro de 2008 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam neste Tribunal da Relação de Lisboa: I - RELATÓRIO MARIA, residente na Sede da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), situada na..., suscitou, em 06/10/2006, o incidente de incumprimento da sentença de regulação do poder paternal dos seus filhos menores A e O, com a Requerente residentes, sendo Requerido M, pai dos referidos menores, residente em Lisboa, alegando, em síntese, que, tendo sido fixado, por sentença judicial de 04/12/2003, já transitada em julgado, o montante de Euros 150,00 a título de pensão de alimentos para os mesmos, o pai e aqui Requerido destes últimos deixou de pagar essa prestação de alimentos desde Janeiro de 2004, estando em dívida o montante global de Euros 4.950,00 e respectivos juros, ignorando a Requerente o motivo de tal atitude omissiva, sendo impossível à Requerente, com os rendimentos anuais de Euros 4.888,59 e com uma renda mensal habitacional de Euros 325,00, fazer face sozinha às necessidades do agregado familiar formado por ela própria e pelos dois filhos.
Conclui pedindo ao tribunal que "se digne mandar efectuar as diligências necessárias à cobrança das prestações de alimentos em dívida bem como respectivos juros até integral pagamento, nos termos do artigo 189.º da OTM, ou em alternativa, seja fixada uma prestação substitutiva a pagar pelo Estado, nos termos da Lei n.º 75/98 de 19/11 e do Decreto-Lei n.º 164/99 de 13/05".
*Notificado pessoalmente e por mandado judicial o Requerido, nos termos e para os efeitos do artigo 181.º, número 4 da OTM (fls. 18), o mesmo veio, através da carta que se mostra junta a fls. 2 1 e 22, dizer, dentro do prazo legal, o seguinte: - Queixa-se de só ter visto os filhos 8 ou 9 meses após a separação do casal e porque o requereu ao tribunal; - Na altura em que o Requerido e a Requerente se apresentaram em tribunal para a fixação da pensão de alimentos e do direito de visitas, encontrava-se o exponente desempregado há 1 mês e meio, situação que se manteve até Junho de 2006; - No ano de 2003, viu somente os filhos no Natal, Páscoa e Agosto, por falta de meios monetários, tendo conseguido, ainda assim, estar com elas nas referidas épocas, com a ajuda de familiares; - A Requerente, nessa altura, disse ao Requerido que este não era o pai biológico dos menores, mas que iria sempre ser tratado como tal, porque era assim socialmente considerado e tinha assistido aos partos e se preocupado com alimentação daqueles, achando-se hoje o Requerido convencido da verdade dessa revelação; - Por causa desse convencimento, ficou psicologicamente afectado e não quis ver mais os menores pois não os quis magoar com olhares ou palavras irreflectidas; - Toda a sua situação de vida o levou a procurar apoio psicológico no Hospital Miguel Bombarda; - Deixou de pagar renda (que tem sido liquidada, primeiro por um tio e fiador, ao longo de 1 ano e meio, e depois pela mãe do Requerido, desde há 1 ano para cá), água, luz, tendo vendido alguns bens para ser alimentar, muito embora vindo ainda a passar fome e requerido ao Estado a concessão do Rendimento Mínimo Garantido; - Alega não ter rendimentos que lhe permitam liquidar a pensão de alimentos aos menores, sendo certo que não se sente obrigado a fazê-lo, até que a Requerente lhe prove que eles são efectivamente seus filhos; - A Requerente faz da casa do Requerido armazém dos seus pertences, devendo pagara ao Requerido uma renda por tal utilização do espaço da sua habitação.
*Foi solicitada à Segurança Social informação acerca da identificação da entidade patronal do Requerido e de eventuais descontos efectuados em nome deste último, elementos esses que se mostram juntos a fls. 26 a 30 (descontos entre Maio de 2000 e Maio de 2002).
*Sendo tais elementos da Segurança Social inconclusivos, foi convidada a Requerente a vir indicar fontes de rendimento do Requerido ou requerer o que tivesse por conveniente, vindo a mesma, através do patrono oficioso entretanto nomeado, requereu (fls. 33 a 40) que os autos fossem remetidos para o Tribunal Judicial da área da sua residência, o que, com promoção desfavorável do Ministério Público (fls. 41), veio a ser indeferido por despacho judicial de fls. 42, sendo solicitado à Segurança Social nova informação (recebimento pelo Requerido de subsídio de desemprego) e à autoridade policial relatório pormenorizado sobre as condições sócio-económicas do progenitor, que se encontram juntos a fls. 47 a 50 (Segurança Social) e que são iguais às anteriormente prestadas, e 57 a 59 (PSP), sem grande conteúdo útil (só condições habitacionais).
A Requerente veio, na sequência de convites formulados pelo tribunal, comprovar o salário mensal que auferia e informar que não possuía quaisquer elementos acerca da situação sócio-económica do Requerido, com quem não mantém quaisquer contactos (até porque se encontra a ser apoiada pela APAV na sequência de vários anos de violência doméstica a que foi sujeita por parte do Requerido), reiterando a sua necessidade de recebimento da pensão de alimentos em dívida e reforçando, face à ausência de rendimentos por parte do pai dos menores, o pedido subsidiário formulado (FGADM).
Foi, finalmente, ordenada, na sequência de promoção nesse sentido do Ministério Público, a realização de inquérito social sobre as necessidades da Requerente e dos menores, que se mostra junto a fls. 80 e seguintes, concluindo este último, depois de resumir a situação da mãe dos menores e destes últimos e os seus contactos com o Requerido, da forma seguinte: "Face ao exposto, o caso em apreço surge potencialmente enquadrável nos pressupostos subjacentes à activação do Fundo de Garantia de Alimentos a Menores, remetendo-se, por conseguintes, à consideração desse Tribunal eventual decisão em conformidade".
*O magistrado do Ministério Público colocado no 1.º Juízo do Tribunal de Família e Menores de Lisboa emitiu o parecer constante de fls. 85 e que foi no sentido de se verificarem os pressupostos de accionamento do Fundo de Garantia de alimentos devidos a menores, nos termos dos artigos 1.º, 2.º, 3.º, número 1 da Lei n.º 75/89, de 19/11 e 3.º e 4.º do Decreto-Lei n.º 164/99 de 13/05, devendo ser fixado um montante não inferior a 100,00 Euros para cada menor, a título de pensão de alimentos a suportar por aquela entidade, a actualizar anualmente conforme os índices de inflação.
*Foi proferida, a fls. 87 e seguintes, sentença que decidiu, em síntese, o seguinte: "Tendo em conta os factos dados como provados, disposições legais citadas, e considerações expendidas decido; - Declarar o incumprimento da obrigação de alimentos, por parte do requerido, a favor dos menores, desde Janeiro de 2004 a Abril de 2008, inclusive, no valor global de €6266,14 (seis mil e sessenta e seis euros e catorze cêntimos), valor acrescido de juros às taxas legais, em vigor nas respectivas datas nas de vencimento das pensões alimentares respectivas; - Declarar a inviabilidade de recurso ao disposto no art. 189º, da O.T.M; - Condenar o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores a suportar, por conta das prestações alimentícias vincendas, a partir do mês seguinte à notificação desta decisão, à quantia de €100, 00 mensais, para cada menor, num total de 200,00 euros, actualizável anualmente de acordo com a evolução do índice de inflação para o ano anterior, e, por conta das prestações alimentícias vencidas, até perfazer o valor global de €6266,14 (seis mil duzentos e sessenta e seis euros e catorzes cêntimos) acrescido de juros à taxa legal contados sobre a prestações alimentares vencidas até à data de Abril de 2008, o valor mensal de €200, 00 (duzentos euros), a entregar à requerente MARIA, sem quaisquer encargos para esta.
Mais decido condenar o requerido em multa a favor do Estado, que se fixa em €200,00. (duzentos euros) Custas a cargo do requerido, reduzindo-se a taxa de justiça a metade (cf. os artigos 446º, n.º 1, do C.P.C., e 14º, n.º 1, alínea o), do C.C.J.).
Valor tributário - o mínimo legal.
Registe e notifique, também nos termos e para os efeitos do art. 4º, nºs 3, 4 e 5, do citado D.L. n.º 164/99.".
*O INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, notificado da sentença, interpôs recurso da mesma, que foi correctamente admitido como de agravo, a subir de imediato, nos próprios autos e com o efeito meramente devolutivo (fls. 105 e 110).
*O Agravante apresentou alegações de recurso (fls. 115 a 124), tendo formulado as correspondentes conclusões nos seguintes moldes: "1.
A douta decisão de fls. de 02/05/2008, do 1. ° Juízo de Família e Menores de Lisboa, condena o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores (FGADM) "a suportar, por conta das prestações alimentícias vincendas (...) a quantia de €100,00 mensais, para cada menor, num total de 200,00 euros (...) e, por conta das prestações alimentícias vencidas, até perfazer o valor global de € 6266,14 (...) acrescido de juros à taxa legal contados sobre as prestações alimentares vencidas até à data de Abril de 2008, o valor mensal de €200,00 (...)".
-
Salvo o devido respeito, não pode o ora recorrente concordar com tal entendimento, pelos fundamentos seguintes: 3.
A douta decisão condena o FGADM a assegurar, entre prestações vencidas, juros de mora, e prestações vincendas, a quantia global de € 400,00 mensais.
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O valor estipulado excede o limite quantitativo mensal, estipulado por lei, à prestação substitutiva a assegurar pelo FGADM, uma vez que os artigos 2.º, n.º 1, da Lei n.º 75/98, de 19/11 e 3.º, n.º 3, primeira parte, do D.L. n.º 164/99, de 13/05, referem expressamente que "As prestações atribuídas nos termos da presente lei não podem exceder, mensalmente, por cada devedor, o montante de 4 UC.".
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Quanto à condenação do FGADM a assegurar a...
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