Acórdão nº 4724/2008-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 11 de Novembro de 2008

Magistrado ResponsávelRUI VOUGA
Data da Resolução11 de Novembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam na Secção Cível da Relação de Lisboa: A Administração do Condomínio do prédio sito em Almada, intentou acção declarativa de condenação, sob forma de processo comum sumário, contra B Lda.

, pedindo a condenação desta no pagamento à A. da quantia de € 8.029,65, (€ 7.675,50 relativos ao valor da reparação dos defeitos existentes + € 897,84 relativos aos honorários à mandatária da Autora), acrescida do valor das despesas que se vierem a apurar em resultado da notificação judicial avulsa do sócio gerente da Ré, requerida ao TJ de Almada em 15/10/2003, e relegadas para liquidação em execução de sentença.

Alegou, para tanto, que: a) a Ré é a empresa construtora do prédio aludido, no qual foram detectadas infiltrações, manchas de humidade e fissuras nas paredes, em várias fracções autónomas e nas partes comuns, tendo o sócio-gerente da Ré sido interpelado pelos representantes da Administração do condomínio, que lhe telefonaram reiteradamente pedindo-lhe que procedesse à resolução destes problemas; b) na sequência daquelas interpelações, a Ré, em Julho de 2002, enviou pessoas ao prédio, para procederem à correcção daquelas situações, designadamente o Sr. J, pessoa encarregue pela Ré de coordenar as obras; c) relativamente àquelas situações, a Ré, em Julho de 2002, apenas referiu que não foi possível proceder à reparação do algeroz, uma vez que os condóminos do rés-do-chão não se encontravam em casa e, portanto, não tinha sido possível aceder aos quintais; d) tendo conhecimento deste facto, os legais representantes da A. interpelaram uma vez mais o sócio gerente da Ré, dizendo-lhe que era imprescindível a reparação do referido algeroz; e) porque se constatou que as anomalias se mantinham, os condóminos do rés-do-chão, em reunião extraordinária de condóminos realizada no dia 04.10.2002, decidiram entre si e com conhecimento da Administração do prédio, acertar uma data para facultarem a entrada da Ré, a fim de esta proceder às reparações nos terraços; f) foi dado conhecimento à Ré da data a partir da qual poderia aceder aos referidos terraços para proceder às reparações, tendo a Ré sido contactada telefonicamente para o efeito aludido; g) na aludida reunião extraordinária do dia 04.10.2002, foi ainda deliberado requerer uma vistoria técnica à Câmara Municipal de Almada sobre as deficiências do prédio; h) no dia 19.02.2003, foi realizada uma vistoria ao prédio, pelos peritos da Câmara Municipal de Almada, e, por carta datada de 05.05.2003, a Administração do Condomínio do prédio foi notificada do referido auto de vistoria; i) a A. solicitou um orçamento para reparação das anomalias descritas no auto de vistoria à empresa L, a qual, em 26.11.2003, estimou o custo das obras em € 7.675,50, já com IVA incluído.

A Ré contestou, por excepção e por impugnação.

Defendendo-se por excepção, invocou a excepção dilatória da ilegitimidade da Autora, alegando que a Administração do condomínio carece de legitimidade para peticionar o pagamento duma quantia pecuniária destinada a custear a eliminação de defeitos alegadamente existentes no terraço do rés-do-chão direito e nos sótãos dos terceiros andares direito e esquerdo, porquanto aquele terraço e estes sótãos são partes integrantes das aludidas fracções autónomas, segundo a escritura de constituição da propriedade horizontal.

Defendendo-se por impugnação, alegou que: - A Ré, no Verão de 2003, tendo-lhe sido facultada a entrada nos terraços do rés-do-chão, mandou arranjar o algeroz e já antes tinha reparado outras anomalias que lhe foram comunicadas, nomeadamente fissuras.

- Os algerozes devem ser limpos, sob pena de entupimento.

- O local onde se verificam as escorrências e manchas de humidade situa-se no tecto comum da entrada das garagens, por baixo do terraço do rés-do-chão direito, bem como junto ao tubo da queda de águas pluviais.

- Os terraços dos rés-do-chão foram isolados com duas camadas de tela cruzada, isolante, e só depois foi colocado o mosaico.

- A Ré, antes de dar como concluídos os terraços, pôs estes à carga com água durante duas semanas, não se tendo verificado qualquer escorrência para as partes inferiores do edifício e de que os mesmos servem de tecto.

- Os condóminos dos rés-do-chão direito e esquerdo colocaram nos mesmos gradeamentos.

- Estes gradeamentos estão assentes no chão por perfuração do piso dos terraços.

- Esta perfuração pode permitir infiltrações da água.

- Os proprietários dos terraços têm cães que permanecem no terraço durante todo o dia, ali fazendo as suas necessidades.

- O tubo de queda das águas pluviais atravessa os terraços.

- A laje dos terraços teve, por isso, de ser furada para a passagem dos tubos e, depois, o resto do buraco cheio com argamassa de cimento.

- As escorrências e humidades na parte inferior da placa foram provocadas pela infiltração da água no local onde o tubo das águas pluviais a atravessa, por ser a parte menos resistente da placa.

- As escorrências do tecto do vestíbulo da entrada do prédio foram motivadas pelo ramal de abastecimento da coluna do prédio.

- O ramal de abastecimento da coluna de um prédio encontra-se sempre em carga.

A Autora respondeu à contestação, quanto à matéria da aludida excepção dilatória de ilegitimidade deduzida pela Ré.

Findos os articulados, foi proferido despacho a admitir a requerida intervenção principal provocada dos proprietários das fracções "P" e "Q", correspondentes ao 3º andar direito e esquerdo do prédio em questão, para se coligarem com a Autora, visto esta não ter legitimidade para demandar a Ré pelos defeitos de construção alegadamente verificados nas referidas fracções autónomas.

O processo foi saneado, com dispensa da realização de audiência preliminar, bem como da fixação da matéria assente (por acordo das partes e por documentos dotados de força probatória plena) e da matéria controvertida a incluir na Base Instrutória.

Instruída e discutida a causa em audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova testemunhal aí produzida, foi proferida sentença (datada de 3/9/2009) que julgou a acção parcialmente procedente, por provada, e, consequentemente: 1) Condenou a Ré B, Lda., a pagar ao Autor Administração do Condomínio do prédio sito na Charneca da Caparica, € 3.837,75; 2) Absolveu a Ré do pedido de pagamento dos honorários da Ilustre Mandatária dos AA.

.

Inconformada com o assim decidido, a Ré apelou da referida sentença, tendo rematado as concernentes alegações com as seguintes conclusões: "1) Face aos depoimentos supra identificados verifica-se manifesto erro na apreciação da prova e, consequentemente, na resposta dada a alguns pontos da matéria de facto; ASSIM, 2) A matéria dada como provada nos pontos 12. e 14. dos factos dados como provados, enfermam de erro na respectiva apreciação, quer face à prova testemunhal quer à prova documental, devendo as respostas serem alteradas e, CONSEQUENTEMENTE, 3) Ser dado como não provado que o custo das obras era de € 7.675, 50, já com IVA incluído; 4) Ser dado como provado que as escorrências e manchas de humidade no tecto da zona comum da entrada das garagens se encontravam solucionadas desde Abril/Maio de 2005, ou 5) Ser ampliada a matéria de facto com os factos atrás discriminados, sendo a resposta a dar, como resulta da prova testemunhal - não provado; 6) As alterações a esta matéria dada como assente tem uma influência decisiva na decisão da causa; 7) Consideram-se, assim, os referidos factos como impugnados (Artº 690º-A do Código de Processo Civil).

8) O terraço do rés-do-chão direito é parte integrante do mesmo, não sendo, pois, parte comum do prédio; 9) A administração do condomínio só pode agir em juízo, quer contra os condóminos quer contra terceiros, fora do elenco das funções constantes na alíneas do artigo 1436º do Código Civil, quando autorizada pela assembleia dos condóminos; 10) In casu a administração não estava autorizada pela assembleia dos condóminos a agir em juízo em representação do condómino do rés-do-chão direito; 11) Violou, assim, a douta sentença recorrida o disposto no artigo 1346º do Código Civil; 12) Verifica-se, assim, a ilegitimidade activa da A. de acordo com o estipulado no artigo 27º do Código de Processo Civil, violando a douta sentença recorrida o disposto nesse artigo; 13) A prova dos factos constitutivos do direito alegado, compete a quem invocar esse direito (Artº 342º, nº 1 do Código Civil); 14) A Apelada não fez a prova de que havia qualquer vício na construção que pudesse originar defeitos com os efeitos pretendidos; 15) A douta sentença recorrida violou o disposto no nº 1 do artigo 1225º do Código Civil.

Nestes termos e nos demais de Direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser a douta sentença recorrida revogada e substituída por acórdão da totalidade do pedido, com o que será feita JUSTIÇA !!!!" A Autora/Apelada contra-alegou, pugnando pelo não provimento da Apelação da Ré.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

O OBJECTO DO RECURSO Como se sabe, sem embargo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer ex officio, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintéctica, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 690º, nº 1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem [1] [2].

Efectivamente, muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 684º, nº 2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (nº 3 do mesmo art. 684º) [3] [4]. Por isso, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas...

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