Acórdão nº 2202/08-2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelESTELITA MENDON
Data da Resolução12 de Janeiro de 2009
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes da Relação de Guimarães: TRIBUNAL RECORRIDO : Tribunal Judicial de Viana do Castelo (Comum Colectivo n.º 74/06.0GDVCT).

RECORRENTE : … (arguido) RECORRIDOS : - Ministério Público - Maria … OBJECTO DO RECURSO : Por acórdão de 30 de Junho de 2008 (fls. 199 a 212) foi decidido, além do mais: 1- Condenar o arguido …, como autor material de um crime de incêndio, p. e p. pelo art. 272° n.º 1, alínea a) do Código Penal, na pena de QUATRO ANOS DE PRISAO, a qual, nos termos do artigo 50° do código penal, atenta a personalidade do arguido suas condições pessoais e demais circunstâncias apuradas, foi suspensa na sua execução pelo período de quatro anos, bem como foi, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 53° n.°3 do código penal, ordenado regime de prova ao arguido de acordo com o definido pelo n.°2 do referido artigo 53 do código penal.

  1. Condenar o referido arguido aqui demandado, a pagar à demandante … a quantia peticionada de € 1150,00 devida a título de indemnização por danos patrimoniais.

    Inconformado veio o arguido recorrer, apresentando as seguintes Conclusões (transcrição): 1. No acórdão de fls... o Tribunal “a quo” não apreciou nem avaliou correctamente a matéria fáctica produzida em audiência de discussão e julgamento, devendo antes ter decidido pela absolvição do ora recorrente; 2. 0 Tribunal “a quo”, fez uma incorrecta valoração e apreciação da prova; 3. Assim como uma incorrecta subsunção dos factos provados ao direito aplicável.

  2. Procedeu-se a gravação de prova no programa Cícero, que consta de suportes magnéticos, mais concretamente de um único CD, donde constam os depoimentos do arguido e das testemunhas de acusação e defesa.

  3. As provas da fundamentação de facto da sentença, salvo o devido respeito, foram incorrectamente julgados pelo Tribunal “a quo “.

  4. As provas que impõe decisão diversa, são os depoimentos também constantes das gravações efectuadas, mais concretamente as declarações do arguido, e os depoimentos das testemunhas de defesa, e a prova documental constante dos autos, nomeadamente o Relatório de Ocorrência nº 1401, elaborado pelo Bombeiros Municipais de Viana do Castelo, e a Certidão emitida pelo Instituto de Meteorologia, I.P., bem como a acta da inspecção ao local, constante de fls. 183 dos autos, bem corno o Relatório Social elaborado pela Direcção Geral de Reinserção Social de Viana do Castelo, inserto nos autos a fls. 152 e seguintes, as declarações de depoimentos das testemunhas de acusação.

  5. 0 Tribunal “a quo” não tinha porque desconsiderar o depoimento do arguido, e das testemunhas de defesa, como fez e ao fazê-lo caiu em erro notório de apreciação da prova.

  6. 0 tribunal “a quo “, fez uma adesão à versão apresentada pelas duas primeiras testemunhas de acusação, mais pelas suas qualificações profissionais, em detrimento das do arguido e das testemunhas por si arroladas, ultrapassou a prova produzida em sede de audiência, e caiu em erro notório na apreciação da prova 9. Dai que o referido na matéria dada como provada fosse incorrectamente julgado devendo ter sido considerado como não provado.

  7. Numa leitura mais atenta, estas contradições imporiam a absolvição do arguido.

  8. A este respeito, invoca também o recorrente a violação do princípio in “dúbio pro reo.” 12. Este princípio é uma imposição dirigida ao Tribunal no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao arguido, quando não houver a certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa.

  9. Ao resultar existirem versões díspares sobre os factos relevantes, o arguido ora recorrente, devia ser absolvido em obediência a tal princípio.

  10. As provas que devem ser renovadas, são todas aquelas que na gravação se encontram imperceptíveis, ou parcialmente imperceptíveis, como se deixou referido na transcrição.

  11. Sem prescindir do acima exposto, mesmo que assim não seja considerado, salvo o devido respeito, no caso sub iudice, não se encontra demonstrado, que o arguido tivesse vontade de deitar fogo, muito menos que este tivesse consciência da criação de um perigo.

  12. Salvo o devido respeito não pode o Tribunal afirmar que o arguido ateou fogo, sem dizer com quê? De que forma e onde especificamente? 17. Também, não se apurou, face à prova produzida que o arguido tenha agido com dolo, com consciência ou intenção de incendiar bens.

  13. Pelo que ao contrário do defendido pelo Tribunal “a quo”, nenhum dos elementos integrantes do crime de incêndio concorrem no caso concreto.

  14. Pelo que face a estes elementos, não se mostram verificados os pressupostos ou requisitos do crime de incêndio, o arguido não agiu de forma a causar um dano - com lesão efectiva relevante - sobre bens juridicamente tutelados de natureza diversa; em bens patrimoniais em perigo que atingem “grande valor”.

  15. Nem actuou o arguido, com dolo, quer quanto ao incêndio quer quanto ao perigo.

  16. Ainda sem prescindir, face às circunstâncias dadas como provadas, ainda assim não devia aplicar, ao arguido uma pena superior ao mínimo legal (3 amos), fixado no Artigo 272° nº 1 n° a), por força do disposto no artigo 2°, n.º 4 do Código Penal, e suspensa na sua execução da pena, pois o regime actual é o que concretamente se mostra mais favorável permitindo a aplicação de medida de suspensão, por período superior a três anos e até cinco anos, ao que se aplicar em termos de pena efectiva, antes da sua suspensão.

  17. Sem prescindir, a culpa do arguido é diminuta, e devem portanto operar, todas circunstâncias atenuantes enumeradas no artigo 71 do Código Penal que possam ser de valorar favoravelmente, como sejam o facto de o arguido não ter antecedentes da mesma natureza ou ate outros, e estar socialmente bem inserido na sociedade, desempenhando com regularidade uma actividade profissional, devendo também atender ao seu comportamento anterior e posterior aos factos, sendo urna pessoa trabalhadora, honesta, bom pai de família, educado e considerado no meio onde vive, e beneficiar da consideração que lhe é atribuída pelos que com ele sempre lidaram e convivem, pessoa de trabalho e bem inserida socialmente, tendo inclusivamente desempenhado o cargo de …, procurando sempre trabalhar em prol do bem comum, revelando preocupações no desempenho como pai de três filhos consigo residentes e como marido.

  18. Pelo que a ser aplicada ao arguido uma pena, o que só por hipótese académica se admite, esta não deverá ser superior ao mínimo legal, ou seja, aos três anos de prisão suspensa na sua execução.

  19. No que respeita ao pedido de indemnização civil, conforme consta do depoimento da demandante …, pouca ou nenhuma prova foi produzida a esse respeito.

  20. Com o devido respeito, a prova produzida foi no sentido de atirar valores para o ar, mas sem qualquer precisão ou suporte, pois não se apurou quantas árvores de pequeno porte foram consumidas pelo fogo, nem quantas grandes, sendo que destas algumas já foram abatidas, não tendo sido feita nenhuma prova da necessidade do seu abate.

  21. Questionada a demandante, se não aproveitou os pinheiros, referiu que os deixou para as pessoas necessitadas. Ou seja não as aproveitou porque não quis.

  22. Nesse pressuposto, afigura-se desajustada a quantia fixada a título de danos patrimoniais.

  23. Violou assim, o tribunal “a quo”, o disposto nos artigos, 272° nº 1 alínea a) do Código Penal, 274 nº 1 alínea do actual Código Penal, e art. 40°, 47 n.º 1 e 2, e 71, 72° e 129° todos do Código Penal, assim como o disposto no artigo 483° n.º 1 e 563° ambos do Código Civil Termos em que se requer a V. Exas., dando provimento ao presente recurso, se dignem alterar a sentença conformidade com o supra exposto.

    Com o que se fará, como sempre, JUSTIÇA.

    *** Admitido o recurso, respondeu o magistrado do M.P.º nos termos de fls. 297 a 301, pugnando pela improcedência do recurso por não se verificarem os invocados vícios.

    *** Nesta Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso interposto seja julgado improcedente.

    *** Foi cumprido o art. 417, n.º 2 do CPP, não tendo sido apresentada resposta.

    *** Colhidos os vistos legais, nada obsta agora ao conhecimento da causa.

    *** Como é sabido, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação – cfr. Art. 412, n.º 1 do Código de Processo Penal.

    Assim, as questões suscitadas são: - Erro notório da apreciação da prova com violação do princípio do in dúbio pró reo - Errada subsunção jurídica.

    - Medida da pena excessiva.

    Cumpre agora decidir: Com interesse para a decisão dos autos foram os seguintes os factos dados como provados e não provados no acórdão recorrido, bem como a respectiva fundamentação: “Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos: No dia 07.06. 2006, no lugar de …, cerca das 15horas e 25 minutos, o arguido transitava pela estrada municipal n.º 550-1, aí existente, ao volante de um veículo automóvel.

    Em determinado local dessa via, tal como evidenciado na fotografia de fls. 28 dos autos, parou e estacionou, junto á berma do lado direito atento o sentido que trazia, tendo abandonado o mesmo veículo por alguns minutos, enquanto se embrenhava por um carreiro em terra batida até chegar a um lugar de vegetação densa, de arvoredo de mato, pinheiros e carvalhos.

    Durante o percurso o arguido procurou alcançar um lugar de recato e afastado de olhares curiosos.

    Aí lançou fogo ao mato e arvoredo secos existentes e em condições de se propagar imediatamente, atentas as condições climatéricas que naquela hora do dia se faziam sentir, montante de calor intenso e vento forte, à vegetação de mato e pinheiros altos e outras árvores.

    Logo após esse acto, o arguido afastou-se do local onde estivera, entrou no veículo que deixara estacionado e que conduzia e afastou-se pela estrada municipal.

    Momentos após essa actuação, o fogo iniciado começou a notar-se no lugar dessa estrada, pelo fumo produzido intenso e detonador de rápida progressão, tendo sido logo avistado por um...

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