Acórdão nº 545/07.1TBOBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelGREG
Data da Resolução20 de Janeiro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I— RELATÓRIO No Processo Especial nº 545/07.1TBOBR que corre termos pelo Tribunal Judicial de Oliveira do Bairro, em que é requerente A..., sociedade comercial de direito italiano, com sede em Sassuolo – Modena, Itália, e requerida B..., com sede em Bustos, Oliveira do Bairro, agravou a requerida da decisão proferida pela Ex.ma Juiza que declarou executória a sentença proferida pelo Tribunal de Modena, Itália, que a condenou no pagamento da quantia de 1 198 636,17 €, da qual o montante de 120 940,19 € é relativo a juros de mora, além de outros aplicáveis ex vi art. 1283º CC, calculados desde a data de emissão do decreto de injunção até integral pagamento, e despesas do procedimento de injunção no montante de 3 451,00 €, além das despesas gerais de causa equivalentes a 12,50% e ónus fiscais, tudo como previsto na lei italiana.

Termina a sua alegação com as seguintes conclusões: 1- O presente agravo vem da sentença prolatada a fls. dos autos acima identificados, que concedeu provimento à pretensão da Recorrida, declarando a executoriedade da decisão proferida pelo Tribunal Italiano de Modena.

2- No que tange à concedida executoriedade, afigura-se-nos que Recorrida, A... se encontra a fazer um uso abusivo de um direito, porquanto requereu a declaração de executoriedade de uma decisão meramente provisória.

3- Pois, fê-lo no decurso do prazo legal para a Recorrente se opor ao pedido deduzido junto do Tribunal de Modena, designadamente, para se opor à declaração de executoriedade do Decreto Injuntivo em apreço.

4- Bem sabendo que, com a oposição à intimação a decisão proferida pelo Tribunal de Modena, de acordo com a lei italiana, pode ser requerida a suspensão ou a revogação de tal decisão.

5- É que a decisão que conceda a suspensão do Decreto Injuntivo não é passível de recurso.

6- Ora, o abuso do direito, nas sábias palavras do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa “ abrange o exercício de qualquer direito por forma anormal, quanto à sua intensidade, ou à execução de modo a poder comprometer o gozo de direitos de terceiros e criar uma desproporção objectiva entre a utilidade do exercício do direito, por parte do seu titular, e as consequências que os outros têm de suportar” (RL, 2-2-1982:CJ 1982, 1º- l66, in Abílio Neto, Código de Processo Civil Anotado, 14ª Ed. Actualizada).

7- Na verdade, há uma manifesta desproporção entre a utilidade que a Recorrida visa obter – execução imediata de uma decisão provisória - e as consequências que a Recorrente tem de suportar e que, in extremis, podem por em causa a viabilidade financeira da Recorrente.

8- Donde, salvo melhor opinião, in casu, a Recorrida encontra-se a exercer um alegado direito, com manifesto excesso dos limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim económico e social do direito (art. 334.°do Código Civil).

9- É patente que, o pedido para que seja declarada a executoriedade de uma decisão meramente provisória, e ainda dependente de uma apreciação do mérito, ofende o sentimento jurídico socialmente dominante na ordem jurídica portuguesa.

10- Mesmo que assim se não entenda, o que expressamente se refuta e apenas por mero dever de patrocínio se conjectura, o reconhecimento da declaração de executoriedade do Decreto Injuntivo interposto pela Recorrida, ao abrigo da legislação italiana, é manifestamente contrário à ordem publica portuguesa na sua vertente processual, conforme prevenido no nº 1 do artigo 34.° do Regulamento n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000.

11- Porquanto, a declaração de executoriedade do crédito cujo pagamento se reclama, foi concedida em clara violação do principio do contraditório (artigos 3º e 3°- A do C.PC.

12- Uma vez que, o Tribunal Italiano de Modena concedeu a execução provisória do decreto de injunção com base em documentos juntos pela aqui Recorrida, e sem que a mesma tenha sido ouvida em momento anterior à decisão proferida pelo Tribunal de Modena.

13- Encontrando-se a executoriedade definitiva dependente do exercício do contraditório e da apreciação do mérito de uma acção pendente.

14- Com as consequências nefastas da execução de tal decisão, quer para o património da Recorrente quer para o exercício da justiça, mais concretamente, para o princípio da economia processual.

15- Com efeito, a execução da decisão proferida pelo Tribunal Italiano, implica a re legação para a acção executiva do conhecimento e definição dos direitos das partes, ao arrepio do estabelecido no Código de Processo Civil.

16- Note-se que, conforme preceitua o artigo 3.° do Código de Processo Civil, só nos casos excepcionais previstos na lei se podem tomar providências contra determinada pessoa sem que esta seja previamente ouvida, nem o juiz pode decidir quaisquer questões de direito ou de facto sem que as partes tenham tido oportunidade de se pronunciar.

17- Saliente-se ainda que, a declaração de executoriedade do Decreto Injuntivo viola ainda o princípio da igualdade das partes ínsito no artigo 3º do Código de Processo Civil, que mais não é que uma decorrência do principio constitucional da igualdade dos cidadãos perante a lei.

18- Face ao exposto, deve a decisão recorrida ser revogada, por ser manifestamente contrária à ordem pública portuguesa, tanto na vertente dos princípios de direito substantivo, designadamente por consubstanciar uma actuação em manifesto abuso de direito, como na perspectiva do direito adjectivo, porquanto ofende os princípios do contraditório e da igualdade das partes.

19- A estrita observância, e respeito pelos princípios de direito processual civil português, impõe que se aguarde pela discussão do mérito da acção que se encontra pendente em Modena, dando assim cumprimento dos aludidos preceitos normativos.

20- Ademais, encontrando-se a executoriedade definitiva do Decreto Injuntivo sujeita a apreciação judicial, a requerimento da Recorrente e, na eventualidade de tal decisão ser desfavorável à Recorrente, a decisão proferida é ainda susceptível de recurso.

21- Face ao exposto cumpre requerer, ao abrigo do disposto no artigo 46º do aludido Regulamento, que seja decretada a suspensão da instância até ao trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida pelo Tribunal de Modena, ou, 22- Caso assim não se entenda, requer-se que seja decretada a suspensão da instância até à pronúncia, pelo referido Tribunal, de decisão de mérito que declare a executoriedade definitiva ao Decreto Injuntivo.

Foram apresentadas contra-alegações pugnando pela manutenção da decisão recorrida e não suspensão da instância.

Estão colhidos os vistos. Cumpre conhecer e decidir.

● O objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 684º, nºs 3 e 690º, nº 1, do Código de Processo Civil.

São duas as questões suscitadas pela agravante e que se reconduzem a saber: 1- Se há razões para ser negado o reconhecimento da sentença do Tribunal de Modena, Itália, conferindo-lhe força executiva, por a declaração de executoriedade ser manifestamente contrária à ordem pública Portuguesa; 2- Se se justifica suspender a instância ao abrigo da faculdade concedida pelo art. 46º, nº1, do Regulamento Nº 44/2001 do Conselho de 22/12/2000.

II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Com interesse para a decisão a proferir importa alinhar o seguinte quadro factual: 1.Em 8/06/2007, no Tribunal Judicial da Comarca de Oliveira do Bairro, veio A..., sociedade comercial de direito italiano, com sede em Sassuolo – Modena, Itália, ao abrigo do disposto no Regulamento (CE) nº 44/2001 do Conselho, de 22.12.2000, requerer contra B..., com sede em Bustos, Oliveira do Bairro, a Declaração de Executoriedade da sentença proferida em 17/04/.2007, pelo Tribunal de Modena, em Itália, que condenou a requerida a pagar à requerente as quantias na sentença discriminadas.

Juntou certidão daquela decisão condenatória e respectiva tradução, bem assim procuração forense; 2. Nessa sentença de Modena foi concedida à requerente a sua execução provisória de acordo com o estabelecido no art. 642, II parágrafo do CPC italiano; 3. Assim como se advertiu a devedora/ recorrente que de acordo com o art. 641, II parágrafo do CPC, no prazo de 50 dias decorrentes da notificação do requerido e da decisão poderia deduzir oposição e na falta desta a decisão tornar-se ia definitiva; 4. A requerida B..., foi notificada da decisão do Tribunal de Modena através de carta registada, com aviso de recepção, expedida em 18/05/07, de acordo com o estabelecido no art. 14º do Regulamento CE nº 1384/2000, para pagar a quantia em que foi condenada, da sua executoriedade provisória, e da cominação de que se não deduzisse oposição no prazo de 50 dias aquela decisão se tornava definitiva; 5. A decisão é exequível em...

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