Acórdão nº 97/06.0PTCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelORLANDO GON
Data da Resolução17 de Dezembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Relatório Pelo 3.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Coimbra, sob acusação do Ministério Público, foi submetido a julgamento em processo comum singular, com intervenção do Tribunal Singular, o arguido NM...

, solteiro, formador, nascido a 06.10.1978, residente na Rua …., Subcave, Guimarães; imputando-se-lhe a prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art. 292.º, n.º 1, do Código Penal.

Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal Singular, por sentença proferida a 10 de Julho de 2008, decidiu julgar a acusação procedente, por provada e: - condenar o arguido NM... pela prática, como autor material, na forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art. 292.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de oitenta e um dias de multa à taxa diária de dez euros, o que perfaz o montante de oitocentos e dez euros ou, subsidiariamente, nos termos do artigo 49.º do Código Penal, cinquenta e quatro dias de prisão; e - condenar o arguido na proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de três meses, nos termos do art. 69.º, nº 1, al. a), do Código Penal.

Inconformado com a douta sentença dela interpôs recurso o arguido NM..., concluindo a sua motivação do modo seguinte: 1.ª - Decorre claramente do depoimento prestado pela única Testemunha ouvida nos presentes autos que o arguido não foi visto a conduzir o veiculo automóvel ligeiro de passageiros de marca Volkswagen, modelo Jetta, de matricula XX-00-00 no dia 10.06.2006, por volta das 08:00 horas, o arguido conduzia o veiculo automóvel ligeiro de passageiros, na Rua carolina Micaellis em Coimbra quando entrou em despiste e foi embater num poste de suporte do trólei; 2.ª - Não obstante, o Tribunal deu como provado tal facto e ainda que o arguido conduzia o veículo em estado de embriaguez com uma TAS igual a 1.55g/1; 3.ª - Não tendo o arguido sido visto a conduzir o automóvel jamais poderá ser condenado pela prática de um crime de condução sob o efeito do álcool, como foi, 4.ª - É manifesto que houve erro na valoração da prova produzia em audiência de julgamento, uma vez que das declarações da testemunha não é possível extrair a certeza de que era o arguido quem conduzia o automóvel, na verdade o facto de se estar perto do automóvel e deste se encontrar a verter água pelo radiador não podem nunca determinar sem mais que o acidente ocorreu há muito ou há pouco tempo e muito menos que era o arguido quem conduzia o automóvel; 5.ª - É igualmente manifesto que mesmo que se entendesse que era o arguido quem conduzia o automóvel, é impossível determinar quando é que este ingeriu as bebidas alcoólicas, como alias muito bem refere a testemunha ouvida nos presentes autos; 6.ª - Na verdade, mesmo que fosse o arguido a conduzir, seria perfeitamente possível que tivesse bebido álcool apenas após a produção do acidente, pelo menos em quantidade suficiente para tornar a sua conduta criminalmente punível; 7.ª - O Meritíssimo Juiz a quo valorou opiniões e não factos e fê-lo sempre em desfavor do arguido partindo de uma ideia de culpabilidade da qual nunca se logrou afastar ao longo de todo o processo de valoração da prova; 8.ª - As declarações da testemunha ouvida nos autos devem portanto ser valoradas precisamente ao contrário do que foram e sempre no sentido de criar dúvida ao Tribunal e nunca de fomentar certezas inabaláveis acerca da culpabilidade do arguido; 9.ª - Tais circunstancias interpretadas no seu conjunto deverão determinar sem sombra de duvidas que se dê como não provado que o arguido conduzia o veiculo automóvel nas circunstâncias de tempo lugar e modo narradas na acusação, por ter havido manifesto erro na apreciação da prova produzida, o que deverá levar à absolvição do arguido; 10.ª - Ao interpretar a prova como fez, violou o Tribunal do disposto no artigo 32.º n.º 5 da Constituição portuguesa, na exacta medida em que toda a prova foi valorada contra a presunção de inocência do arguido e portanto em clara violação do disposto naquele normativo; 11.ª - A sentença recorrida violou igualmente do disposto no artigo 129.º do CPP na medida em que valorou de forma decisiva testemunhos de ouvir dizer dos quais lançou mão ainda que de forma indirecta para motivar a sentença recorrida, facto que deve determinar a completa desconsideração do depoimento da única testemunha, no seu todo, pois mesmo que não fosse valorado indirectamente e foi, sempre o teria sido de forma indirecta uma vez que determinou que toda a produção de prova fosse valorada tendo por base um juízo de culpabilidade que determinou uma "condenação antecipada do arguido"; 12.ª- Por fim, a sentença violou o disposto no artigo 127.º do CPP, porquanto ao juiz é dada a possibilidade de valorar livremente a prova, e não de conjecturar acerca do que é dito pelas testemunhas extraindo dai conclusões e ideias que constituem verdadeiros preconceitos, ao actuar desse modo, passa o normativo a ser interpretado e utilizado por excesso, foi o que sucedeu nos presentes autos e o que terá que ser considerado como uma grosseira violação do disposto no artigo 127.º do CPP; 13.ª - Ao não apurar em concreto a real condição económica do arguido, o Tribunal presumiu erradamente um rendimento muito superior ao que este tem na realidade e ao faze-lo violou os Princípios que devem nortear a fixação concreta da medida da multa, impondo dessa forma um sacrifício desmedido ao arguido, devendo portanto tal quantitativo ser alterado para o mínimo legal.

Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente e sentença recorrida revogada na parte afectada pelo presente recurso e substituída por outra que: a) julgue como não provados os factos enunciados na conclusões l.ª e 2.ª , absolvendo dessa forma o arguido da pratica do crime pelo qual vem acusado, b) julgue que forma violados os artigos 32.º n.º 2 da CRP, 129.º do CPP e 127.º do mesmo diploma legal, com todos os devidos e legais efeitos; c) altere a pena de multa concretamente fixada ao arguido para o mínimo legal.

Por despacho de 10 de Julho de 2008, proferida na audiência de julgamento, o Ex.mo Juiz considerou que a declaração apresentada pelo arguido no dia 7-07-2008, por fax, não demonstra a impossibilidade deste ter podido comparecer em Tribunal na audiência de julgamento realizada a 3-07-2008 e, nos termos do art. 117.º, n.ºs 1e 2 do Código de Processo Penal, julgou injustificada a falta do arguido e condenou-o no pagamento de quatro UC´s, nos termos do art.116.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.

Inconformado com o despacho de 10 de Julho de 2008, na parte em que o condenou no pagamento de 4 UC´s, dele interpôs recurso o arguido, concluindo a sua motivação do modo seguinte: 1.ª- O facto de o Arguido juntar aos autos uma declaração emitida pelos serviços de urgência de um hospital que atesta que o mesmo lá esteve presente durante as horas a que decorreu a audiência de julgamento na qual deveria estar presente deve ser considerado como documento bastante para justificar a falta; 2.ª- Dispõe o n.º 5 do artigo 117.º do CPP que, não podendo obter atestado médico para justificar a ausência, é admissível qualquer outro meio de prova; 3.ª- Os serviços de urgência emitem, apenas, declarações análogas à junta pelo Arguido, donde apenas é possível extrair a hora e data de entrada do doente naquele serviço, e não tipo de tratamento a que foi sujeito, bem como se a doença era ou não incapacitante, tais facto podem apenas ser atestado pelo médico que tratou o Arguido naquela altura; 4.ª - Atenta a natureza urgente do internamento bem como a gravidade dos males que sofria, não é expectável que o Arguido obtivesse a identificação do médico que o tratou nem tão pouco a indicação por escrito dos tratamentos a que teve que ser sujeito, tanto mais que se encontrava desacompanhado nas urgências; 5.ª - Conjugados tais factos com a circunstancia de o Arguido ter sido atendido nas Urgências do Porto, sendo o Julgamento em Coimbra, é possível concluir que sob circunstancia alguma podia ter estado no tribunal à hora justificada, e que tal ausência se deu por motivo que lhe não é imputável.

6.ª- Donde se mostra cumprido o disposto no n.º 5 do artigo 117.º do CPP, devendo a falta ser julgada justificada com base na interpretação conjugada do teor do documento com o facto de os serviços médicos terem sido prestados no Porto e ainda com a circunstancia de o Arguido não ter residência em Coimbra, local do Julgamento.

Sem prescindir, 8.ª - A aplicação concreta de uma multa, deve obedecer a critérios orientadores que tenham por base a culpa e censura que o facto gerador da responsabilidade, em concreto, mereçam e não serem aplicadas de forma totalmente discricionária e sem qualquer justificação ou fundamentação de facto e de direito- 9.ª - Tendo sido aplicada uma multa de valor igual o dobro do mínimo legal, sem que para tanto tenham sido oferecidas justificações ou fundamentação que tenham por base uma conduta que merece critica, reparo ou sentença, é algo que se não pode admitir no processo penal; 10.ª - O facto de o Arguido ter oferecida meios de prova documental para justificar a sua falta conjugado com o facto de se ter apresentado voluntariamente na segunda sessão da audiência de julgamento, são factos bastante para se desta conduta se extraia que houve total colaboração com o Tribunal e que o Arguido agiu sem culpa ou de qualquer outra forma que mereça censura ou reprovação por parte do Tribunal; 11.ª - Não tendo o despacho sido alicerçado em quaisquer factos que revelem que a falta do Arguido derive de um qualquer comportamento culposo, deve a multa aplicável ser fixada no mínimo legal, ou seja no montante de 2 UCs.

Assim, revogando o despacho proferido e substituindo-o por outro que julgue justificada a falta do Arguido, ou assim não entendendo, diminuindo a pena de multa aplicada para o mínimo legal, farão V. Exas. Justiça.

O Ministério Público na Comarca de Coimbra...

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