Acórdão nº 220/07.7GCACB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução10 de Dezembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

9 I. RELATÓRIO.

No 2º Juízo do Tribunal Judicial da comarca de Alcobaça, o arguido …, com os demais sinais nos autos, foi submetido a julgamento em processo comum com intervenção do tribunal singular, pronunciado pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143º, nº 1, do C. Penal, pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts. 143º, nº 1 e 146º, nº 1, do C. Penal, e pela prática de um crime de ameaça, p. e p. pelo art. 153º, nº 1, do C. Penal (redacção da Lei nº 59/2007, de 4 de Setembro).

Pela ofendida …, por si e em representação de sua filha menor, …, foi deduzido pedido de indemnização contra o arguido com vista à sua condenação no pagamento às demandantes das quantias de € 1.000 e € 2.000, respectivamente, pelos danos não patrimoniais sofridos.

A ofendida … desistiu da queixa, desistência que foi aceite pelo arguido, e que foi homologada por decisão proferida em acta, tendo os autos prosseguido para conhecimento do crime de ofensa à integridade física qualificada que tem por ofendida a menor ….

A ofendida … desistiu da instância relativamente ao pedido de indemnização civil por si apresentado, desistência que foi igualmente homologada por sentença oportunamente proferida.

Em audiência foi comunicada ao arguido uma alteração da qualificação jurídica relativamente do imputado crime de ofensa à integridade física qualificado para o crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143º, nº 1, do C. Penal.

A ofendida … declarou então desistir da queixa apresentada em representação de sua filha, desistência que o arguido aceitou, bem como declarou desistir da instância relativamente ao correspectivo pedido de indemnização civil.

Por decisão oportunamente proferida, foi homologada a desistência da instância do pedido de indemnização civil.

Por sentença de 30 de Junho de 2008, foi o arguido absolvido da prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts. 143º, nº 1 e 146º, nºs 1 e 2, com referência ao art. 132º, nº 2, b), todos do C. Penal (na redacção em vigor na data da prática dos factos), e foi homologada a desistência da queixa apresentada pela ofendida …, em representação de sua filha menor, …, relativamente ao crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143º, nº 1, do C. Penal, resultante da convolação do imputado crime de ofensa à integridade física qualificada, e determinado o arquivamento dos autos.

Inconformado com a sentença, dela recorre o Digno Magistrado do Ministério Público, formulando no termo da respectiva motivação as seguintes conclusões, que se transcrevem: “ (…).

1 – O acto do arguido revela especial censurabilidade ou perversidade; 2 – Ao não considerar a especial censurabilidade ou perversidade, violou a douta sentença recorrida as disposições dos artigos 143º, 146º, nºs 1 e 2 e 132º, nº 2, alíneas a) e b), todos do C. Penal; 3 – Com efeito as referidas normas deverão ser apreciadas segundo o caso concreto, com base na factualidade provada e com base na atitude não conforme com os valores fundamentais defendidos pelo ordenamento jurídico-penal e atendendo ao desvalor social derivado da violação de um dever ético de especial respeito pelos descendentes e pela fragilidade física da menor em apreço.

Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis, deverá o recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta sentença e substituindo-a por outra que condene o arguido pela prática do crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos artigos 143º, nº 1 e 146º, nºs 1 e 2, do Código Penal (na redacção anterior à Lei nº 59/2007, de 4 de Setembro) conjugados com o artº 132º, nº 2, do mesmo Código.

(…)”.

O recorrido não respondeu ao recurso.

Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no qual se pronunciou pela improcedência do recurso.

Foi cumprido ao disposto no art. 417º, nº 2 do C. Processo Penal.

Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

  1. FUNDAMENTAÇÃO.

    Dispõe o art. 412º, nº 1 do C. Processo Penal que a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido.

    Por isso é entendimento unânime que as conclusões da motivação constituem o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso (cfr. Prof. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, 2ª Ed., 335, Cons. Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª Ed., 2007, 103, e Acs. do STJ de 24/03/1999, CJ, S, VII, I, 247 e de 17/09/1997, CJ, S, V, III, 173).

    Assim, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente, a questão a decidir, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, é a de saber se a conduta do arguido, tal como foi fixada na matéria de facto provada da sentença em crise, preenche ou não, os elementos típicos do crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts. 143º, nº 1 e 146º, nºs 1 e 2, com referência ao art. 132º, nº 2, todos do C. Penal.

    Para a resolução desta questão importa ter presente o que de relevante consta da decisão objecto do recurso. Assim:

    1. Na sentença foram considerados provados os seguintes factos (transcrição): “ (…).

      1. No dia 27 de Maio de 2007, pelas 22.30 horas, …, na companhia de sua mãe, passeava pela Rua dos Casais de Tintos, Carvalhal, Turquel, levando pela mão a sua filha …, nascida a 17-04-2006.

      2. A referida … é filha do arguido.

      3. Naquele momento, o arguido, que ali passava de automóvel, parou-o e saiu do mesmo.

      4. De seguida, foi em direcção à … e agarrou na menor …, começando a desferir-lhe bofetadas no rosto.

      5. A … conseguiu agarrar novamente a menor e puxou-a para si.

      6. Logo de imediato, o arguido agarrou na orelha esquerda da filha e apertou-lha com força, provocando-lhe uma equimose.

      7. Com a sua conduta, o arguido produziu à menor … os ferimentos examinados a fls. 12 e 13, os quais se dão aqui por integralmente reproduzidos, nomeadamente "equimose do rebordo superior do pavilhão auricular esquerdo com 2,5 centímetros por 5 milímetros de coloração avermelhada e violácia'' e que foram a causa directa e necessária de 8 dias de doença.

      8. O arguido agiu deliberada, livre e conscientemente, com a intenção concretizada de lesar a integridade física da sua filha menor e de lhe provocar dores e lesões.

      9. Sabia o arguido que tal conduta não era permitida por lei.

      10. O arguido trabalha como pedreiro, auferindo o vencimento mensal de € 500,00 (quinhentos euros).

      11. Vive em casa própria e paga duas prestações mensais de € 100,00 (cem euros) e € 120,00 (cento e vinte euros).

      12. Tem como habilitações literárias o 6º ano de escolaridade.

      13. O arguido não tem antecedentes criminais.

      (…)”.

    2. E foram considerados não provados os seguintes factos (transcrição): “ (…).

      - que nas circunstâncias de tempo e local mencionadas em 1., M… levasse a sua filha ao colo; - que não ignorasse o arguido que a conduta levou a efeito contra a sua filha era altamente censurável atendendo à idade da mesma; - que na hora e no dia a que remontam os factos o...

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