Acórdão nº 159/00.7JAGRD.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelBELMIRO ANDRADE
Data da Resolução03 de Dezembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I.

Após realização do julgamento, o tribunal colectivo decidiu: 1 – Absolver o arguido JJ..., da prática de um crime de peculato, p. e p. pelo art. 375º, n.º 1, do C. Penal, de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo art. 256º, n.º 1, al. b), e n.º 4, do C. Penal, e de um crime de denegação de justiça e prevaricação, p. e p. pelo art. 369º, n.ºs 1 e 2, do C. Penal, que lhe vinham imputados; 2 – Condenar o arguido, JJ..., pela prática de um crime de participação económica em negócio, p. e p. pelo art. 377º, n.º 1, do Código Penal, na pena de um ano de prisão cuja execução se suspende pelo período de 1 (um) ano.

Em recurso interposto daquele acórdão este Tribunal da Relação de Coimbra declarou-o nulo por falta de fundamentação da matéria dada como não provada, determinando a prolação de novo acórdão que suprisse a apontada nulidade.

Remetidos os autos à 1ª instância, foi então proferido novo acórdão que, suprindo a nulidade apontada pelo tribunal da relação, decidiu condenar o arguido nos mesmos termos da primeira condenação, supra reproduzidos.

* Recorrem novamente do acórdão quer o arguido quer o MºPº.

* A motivação do recurso do MºPº tem as seguintes CONCLUSÕES: I – A douta decisão tomada em matéria de facto e objecto deste recurso, não julgou correctamente a seguinte matéria de facto: 1. A constante do n.º32 da enumeração dos factos provados no que respeita à pessoa que procedeu à devolução da quantia aí mencionada.

2- A estabelecida na parte final do n.º37 dessa enumeração, no que tange à consideração do arguido como «pessoa séria».

3- A elencada no ponto 38º, também dessa enumeração e no que respeita à «confissão» e à «colaboração activa» 4- A reportada, no ponto 39°, ainda dessa enumeração, à atitude tomada por contrita.

5- A integradora das alíneas a) a g) da enumeração dos factos não provados.

II- Por simplicidade de escrita e de leitura e como é próprio da natureza das conclusões, damos por reproduzidas aqui as razões aduzidas na motivação. No entanto e procurando observar plenamente o exigido pelo artigo 412°, n.os 3 e 4, do Código de Processo Penal, mantendo-se a ordem pela qual foi agora especificada a factualidade tida por incorrectamente julgada, passaremos a referenciar, relativamente a cada facto ou a cada conjunto de factos, as provas (com indicação do respectivo suporte técnico) que, em nosso entender, impunham e impõem decisão diversa da recorrida: 1- Sobre o ponto 32° (devolução da quantia à L...): a prova documental (v.g. o recibo de fls. 49 e o talão de depósito bancário de fls. 266) conjugada com o depoimento da testemunha JM... (registado na cassete n.o 1, lado B, rotações 0165 a 1226), impunha decisão conforme o alegado em 1.4 da motivação.

2- Sobre o ponto 37° (««pessoa séria»): as declarações do arguido (registadas na cassete n.o 2, Lado A, 000 a 1553) impunham e impõem decisão consonante o alegado em 2.5 da motivação.

3- Sobre o ponto 38°: quanto à confissão (declarações do arguido, em suporte técnico antes especificado, confrontadas com peças processuais reveladoras de ausência de confissão ou esclarecimento, por parte do arguido, quer em inquérito, quer em instrução, quer na oportunidade prevista para o oferecimento de contestação) e quanto à colaboração (depoimento das testemunhas LA... - gravado na cassete n.o 1, Lado A, 000 a 0781 - e MA... - cassete n.o 1, Lado A, 0783 a 1011 - conjugado com os documentos de fls. 69,71, 99, 100, 283 a 287 e 310 a 327), a impor decisão conforme se alega em 3.2 e em 3.2.6 da motivação deste recurso.

4- Sobre o ponto 39º (atitude contrita): as apontadas declarações do arguido, apreciadas em cotejo com a tramitação da acção de execução e, nomeadamente, com o incidente de remoção da encarregada da venda e com a reacção de «veemente repúdio» e de «profunda indignação», registada no requerimento de fls. 46/47, para se concluir como alegado em 4.3.3 e 4.3.4.

5- Sobre a matéria das referidas alíneas a), b), c) e f) (apropriação): declarações do arguído, contrariadas pelo documentado a fls. 28 a 31 e 49, pela prova testemunhal resultante da inquirição de JG... (cassete n.o 1, Lado A, de 1013 até final, e Lado B, de 000 a 0163) e de JM... (cassete n.o 1, Lado B, de 0165 a 1226) e pelas regras da experiência, a impor se estabeleça como provada a realizada intenção de apropriação, pelo arguido (conforme alegado em 5.3.17).

6- Sobre a matéria das identificadas alíneas d), e) e g): os meios de prova, especificados para demonstração da factualidade relacionada com a apropriação, servem precisamente aqui, para impor a enumeração daquela como provada.

III- A conduta do arguído, além de consubstanciar a prática do já censurado crime de participação económica em negócio, preenche todos os elementos constitutivos do crime de falsificação de documento (por funcionário) e do crime de peculato.

IV- A pena determinada, no douto acórdão recorrido, para o crime de participação económica em negócio (um ano de prisão, declarada suspensa na sua execução), não garante, a realização, de forma adequada e suficiente, das finalidades da punição. Pelo que reclama agravação.

V- Atentando-se na moldura penal correspondente a cada um dos referidos tipos legais de crimes, aferida a culpa do arguído e ponderadas as exigências de prevenção, levando-se concretamente em linha de conta a intensidade do dolo, que é directo, o grau de ilicitude do facto, que é elevado e todas as demais circunstâncias que depõem contra e a favor do arguído, mostram-se adequadas as seguintes penas parcelares: - um (l) ano e nove (9) meses de prisão, pela prática do crime de falsificação de documento; - dois (2) anos e três (3) meses de prisão, pela autoria de um crime do peculato; - um (1) ano e seis (6) meses de prisão, pela comissão do crime de participação económica em negócio.

VI- Em cúmulo jurídico, como o impõe o disposto no artigo 77°, n.os 1 e 2, do Código Penal, afigura-se adequado fixar a pena única em três (3) anos e nove (9) meses de prisão.

VII- Pena que, em qualquer caso e por insuficiência da simples censura do facto e da ameaça da prisão, para realizar as finalidades da punição, não deve ser suspensa na sua execução.

VIII- O douto acórdão recorrido não fez correcta aplicação do disposto nos artigos 40°, n.o 1,50°,71°, n.o 1, 255°, aI. a), 256°, n.o 1, aI. b), e n.o 4, 375°, n.o 1, e 377°, n.o 1, todos do Código Penal, e no artigo 127°, do Código de Processo Penal.

Nestes termos, concedendo-se provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogando-se o acórdão recorrido, a substituir por um outro que: - decida diversamente e como aqui pugnado, em matéria de facto; - agrave a medida da pena imposta ao arguído JJ... pela autoria do crime de participação económica em negócio e o condene, também, pela prática, em concurso efectivo, de um crime de falsificação de documento e de um crime de peculato, operando cúmulo jurídico das respectivas penas parcelares e fixando pena única, em prisão efectiva, nos termos aqui peticionados.

* No recurso interposto pelo arguido são formuladas as seguintes CONCLUSÕES: I. Resultou provado que «o arguido, através da sua descrita conduta, pretendia adquirir os bens de cuja venda tinha sido encarregada a “Agência de Leilões” que representava, para a sua outra sociedade “E...”, vendendo-os esta, posteriormente, à “L...”, pelo preço que esta havia oferecido – 5.000.000$00 – e entregue ao arguido».

  1. O recorrente obteve assim para a sociedade E..., Lda. uma vantagem patrimonial resultante de um acto (negócio jurídico) celebrado entre ele, recorrente, e um terceiro (L..., S.A.), relativo aos interesses que, por força da sua qualidade de encarregado da venda, tinha à sua disposição; III. Para que se mostre preenchido o elemento objectivo “participação económica ilícita” do tipo legal de crime previsto no n.º1 do artigo 377º do C. Penal, exige-se que a ilicitude da participação económica “...deva reportar-se ao próprio acto praticado pelo funcionário, estando em causa, deste modo, uma invalidade do acto ao nível do direito administrativo”; IV. A factualidade dada como provada no caso vertente não é de molde a demonstrar a existência de qualquer invalidade do acto praticado pelo recorrente, à luz do direito administrativo; V. A conduta do recorrente não pode ser enquadrada no nº 1 do artigo 377° do Código Penal, deve antes ser subsumida ao tipo legal de crime p. e p. pelo nº 2 da mesma disposição legal; VI. As necessidades de punição e as de prevenção geral e especial ficarão devidamente acauteladas no caso sub specie se se aplicar ao recorrente uma pena de prisão não superior a dois meses, a qual, nos termos do preceituado no artigo 43°, nº 1 do Código Penal, deverá ser substituída por uma pena de multa; VII. O Tribunal a quo deveria ter feito operar in casu uma atenuação especial da pena a aplicar ao recorrente, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 72°, nºs 1 e 2 - alíneas c) e d) e 73° do Código Penal; VIII. Assim, e ainda que se considere que a conduta do arguido é subsumível ao tipo previsto no nº 1 do artigo 377° do Código Penal, teríamos uma moldura abstracta da pena, especialmente atenuada, de prisão de 1 mês a 3 anos e 4 meses, pelo que, atentas a medida da culpa, o grau de ilicitude e as necessidades de prevenção geral e especial no caso sub specie, afigura-se ajustado aplicar ao recorrente uma pena de prisão não superior a seis meses, devendo a mesma ser substituída por pena de multa, nos termos do preceituado no artigo 43°, nº 1 do Código Penal; IX. O Acórdão recorrido violou, designadamente, as disposições legais dos artigos 377°, nºs 1 e 2, 72°, nºs 1 e 2 - alíneas c) e d), 73° e 43°, n° 1, todos do Código Penal.

Nestes termos, nos mais de direito aplicáveis, deve conceder-se provimento ao presente recurso e, por via disso, ser o Acórdão recorrido parcialmente revogado nos termos sobreditos, com as legais consequências.

** Respondeu o digno magistrado do MºPº ao recurso interposto pelo arguido sustentando a sua...

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