Acórdão nº 362/09.4GDSNT.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Maio de 2014

Magistrado ResponsávelFILIPA COSTA LOURENÇO
Data da Resolução15 de Maio de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACÓRDÃO EM CONFERÊNCIA, NA 9ª SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA RELATÓRIO O arguido M...devidamente identificado nos autos, foi condenado pela prática como autor material e na forma consumada de dois crimes de abuso sexual de crianças, pp. ambos pelo artigo 171º nº 1 do Código Penal, na pena de doze (12) meses de prisão para cada um deles.

Em cúmulo jurídico foi condenado na pena única de (dezoito) 18 meses de prisão, a qual foi suspensa na sua execução pelo período de dezoito (18) meses.

Inconformado com tal decisão interpôs o arguido supra identificado, em 30 de Setembro de 2013 o presente recurso, “extraindo” e “ipsis verbis” das suas motivações as seguintes conclusões: 1ª- O presente recurso versa sobre as matérias de facto e de direito com os fundamentos previstos no art. 410 do CPP, nomeadamente, insuficiência para a decisão da matéria de facto, erro notório da apreciação da prova quanto aos crimes imputados ao arguido.

  1. -A douta decisão recorrida errou notoriamente na apreciação da prova testemunhal e documental produzida em audiência de julgamento.

  2. - O arguido nunca prestou declarações sobre os factos que lhe são imputados.

  3. - A menor J...(cujo depoimento se encontra gravado no sistema integrado de gravação digital existente no Tribunal em 8.04.2013, não se indicando na acta o inicio e o termo da gravação) confrontada pela M.ª Juiz com a foto do arguido a fls13 dos autos referiu não o reconhecer como autor dos factos que relatou (cfr.acta do dia 8.04.2013).

  4. -Os factos constantes da acusação e respeitantes a esta menor, pese embora os mesmos possam ter ocorrido, não se podem imputar com toda a certeza ao arguido, tendo em conta, nomeadamente, o principio “in dúbio pro reo”.

  5. -Mesmo que, por mera hipótese de raciocínio, se considerasse que o arguido era autor material dos factos que lhe são imputados quanto á menor Joana, sempre se diria que, apalpar uma mama, por si só, não constitui acto sexual de relevo, porquanto, tal acção não reveste gravidade objectiva. Os toques de gravidade sexual relativa não integram o acto sexual de relevo, pois, não são suficientemente ofensivos e condicionantes da liberdade e autonomia sexual da menor.

  6. -A conduta do arguido nunca integraria o tipo de crime que lhe é imputado atendendo á inexistência dos pressupostos objectivos e subjectivos de tal tipo de crime pelo que o arguido teria sempre de ser absolvido.

  7. -O arguido pensava que a menor A...era um rapaz (cfr. Facto provado no ponto 6 dos factos provados da douta sentença recorrida), e quando soube que se tratava de uma rapariga referiu-lhe: “Então as tuas maminhas vão crescer” ao mesmo tempo que estendeu uma das mãos e lhe apalpou uma das mamas (cfr. Ponto 8 dos factos dados por provados).

  8. -Tal acto não constitui acto sexual de relevo, porquanto a referida acção não reveste gravidade objectiva. Os toques de gravidade sexual relativa não integram o conceito de acto sexual de relevo, pois, não são suficientemente ofensivos e condicionantes da liberdade e autonomia sexual da menor, pelo que atendendo á inexistência dos pressupostos objectivos e subjectivos do tipo de crime que é imputado ao arguido este, também teria sempre de ser absolvido.

  9. - O teor do ponto 13 dos factos provados na douta sentença recorrida é meramente conclusivo não se baseando em quaisquer factos concretos que tivessem resultado provados no decurso da audiência de julgamento.

  10. -O dolo não se presume, tendo de resultar dos factos concretos considerados provados, o que neste caso não se verificou.

  11. -Como resulta da própria acusação pública os factos imputados ao arguido não teve quaisquer consequências físicas, nem parecem ter tido consequências psicológicas graves ou duradouras para as menores.

  12. -O relatório social do arguido, bem como os relatórios médicos juntos por este aos autos referem que este é pessoa doente, sendo que no relatório social refere-se ainda que o arguido aparenta frequentes perdas de memória e raciocínio, não percebendo o porquê de ter de ir a Tribunal, sabendo apenas que é por causa de umas raparigas, não se recordando de ter cometido qualquer crime relativamente ás mesmas.

  13. -O arguido tem 74 anos de idade não tem quaisquer antecedentes criminais, encontra-se socialmente integrado tendo um bom relacionamento e apoio familiar (cfr. Factos dados como provados nos pontos 15 a 21 dos factos provados na douta sentença proferido).

  14. -A douta sentença recorrida, ao não absolver o arguido da pratica dos crimes que lhe são imputados, violou, nomeadamente, os critérios legais de apreciação vinculada da prova documental que vigoram em processo penal, em face dos documentos juntos aos autos supra mencionados (artº 169º do CPP), bem como as normas constantes dos artigos 203º nº 1 e 212 nº 1 ambos do CP ao considerar erradamente provados os crimes imputados ao arguido na douta acusação publica, face á prova documental e testemunhal produzida em audiência de julgamento.

  15. -A douta decisão violou ainda o princípio in dúbio pro reo consagrado no art. 32º da Constituição da República Portuguesa ao não absolver o arguido da imputação da prática dos referidos crimes como resulta do supra exposto.

  16. -Ainda que assim não se entendesse, o ora recorrente foi, condenado pela pratica como autor material, de dois crimes previstos e punidos pelo artigo 171º nº 1 do CP em cumulo jurídico na pena única de 18 meses de prisão, o que é manifestamente excessivo face á escassa relevância da factualidade dada como provada e á ausência de prova de dolo na alegada conduta do arguido.

  17. -Na determinação da medida da pena deve o Tribunal atender, para além do mais, às condições pessoais do agente e sua situação económica (71º CP), o que não ocorreu. Assim a pena a atribuir ao arguido deveria ter sido atenuada, não devendo exceder em cúmulo jurídico 12 meses de pena de prisão suspensa por igual período.

O recurso foi admitido e fixados os seus efeitos legais pelo Tribunal de primeira instância.

O MºPº respondeu a folhas 494 a 517 dos autos, terminando concluindo detalhadamente que deverá ser a sentença recorrida mantida nos seus precisos termos.

Neste Tribunal o Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto, proferiu, elaborado parecer o qual se encontra junto a folhas 549 a 557, terminando pugnando que o presente recurso não merecerá e no seu entender, qualquer provimento.

Foi dado cumprimento ao artº 417º nº 2 do CPP.

O arguido silenciou.

Efectuado o exame preliminar, determinou-se que o presente recurso fosse julgado em conferência.

Colhidos os vistos legais foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º 3, alínea c) do mesmo diploma, cumprindo agora apreciar e decidir.

Poderes de cognição do tribunal ad quem e delimitação do objecto do recurso: FUNDAMENTAÇÃO De acordo com o disposto no artigo 412° do Código de Processo Penal e com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de Outubro de 1995, o objecto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.

As possibilidades de conhecimento oficioso, por parte deste Tribunal da Relação, decorrem da necessidade de indagação da verificação de algum dos vícios da decisão recorrida, previstos no n.º 2 do artigo 410º do Código de Processo Penal, ou de alguma das causas de nulidade dessa decisão, consagradas no n.º 1 do artigo 379° do mesmo diploma legal.

Por outro lado, e como é sobejamente conhecido, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões da respectiva motivação (art. 412.º, n.º 1 do CPP).

O objecto do recurso interposto pelo arguido M..., o qual é delimitado pelo teor das suas conclusões, suscita em suma, o conhecimento das seguintes questões: -Violação do principio in dúbio pro reo contido no artigo 32 nº 5 da C.R. P., ao não absolver o arguido na imputação da pratica dos crimes pelo quais foi condenado; -A sentença recorrida enferma os vícios contidos nas alíneas a) e c) do nº 3 do artigo 410 do CPP e concretamente, insuficiência para a decisão da matéria de facto, e erro notório na apreciação da prova; - Medida da pena.

A sentença sob censura tem o seguinte teor ( nos segmentos que importam e de acordo com o suporte digital enviado) (…) II. FUNDAMENTAÇÃO Produzida a prova e discutida a causa resultam os seguintes: FACTOS PROVADOS: 1 J... nasceu no dia 10 de Fevereiro de 1999.

2 No dia 22 de Agosto de 2009, pelas 14:00 horas, no Largo do Moinho em Ulgueira, na localidade de Colares, o arguido encontrava-se a passear dois cães quando avistou a menor Joana.

3 De seguida o arguido dirigiu-se à menor e perguntou-lhe o nome e a idade, após o que se aproximou daquela e colocou uma das suas mãos sobre uma das mamas da menor J..., apalpando-a.

4 A menor ao se aperceber de tal facto assustou-se e disse que ia dar uma volta, tendo-lhe ainda o arguido perguntado se já sabia fazer bebés, após o que fugiu do local.

NUIPC 611/11.9JBLSB: 5 A...nasceu no dia 3 de Abril de 2000.

6 No dia 05 de Agosto de 2011, a hora não apurada mas que se situa entre as 14h00m e as 15h00, na localidade da Urgueira em Colares o arguido encetou conversa com a menor A... tratando-a nomeadamente por "rapaz".

7 A... disse ao arguido que era uma rapariga tendo-lhe aquele respondido" Ah és uma rapariga? Então dá cá um beijinho" e de imediato deu-lhe um beijo na cara.

8 Após o que lhe disse "Então as tuas maminhas vão crescer", ao mesmo tempo que estendeu uma das mãos e colocou-a sobre uma das mamas da menor A... exercendo pressão e acariciando-a.

9 O arguido ainda perguntou à menor A... se tinha namorado, tendo após fugido do local.

10 O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente.

11 Ao atuar da forma descrita, o arguido quis praticar sobre as menores J...e A... actos de natureza e conteúdo sexual, o que fez.

12 O arguido agiu deliberada, livre e...

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