Acórdão nº 5/13.1T4AGD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Abril de 2014

Magistrado ResponsávelJORGE LOUREIRO
Data da Resolução03 de Abril de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

O autor propôs contra as rés a presente acção emergente de contrato de trabalho e com a forma de processo comum, pedindo: I. Que sejam declarados nulos os contratos de prestação de serviço que celebrou com as rés; II. Que se reconheça que os contratos que vincularam o autor e as rés entre Janeiro de 2006 e Dezembro de 2012, mais não foram do que um artifício jurídico com vista a encobrir uma verdadeira relação laboral entre o autor e a 1ª ré, sujeito a subordinação jurídica e normas de direito privado: III. A condenação da 1ª ré a reconhecer que a relação laboral estabelecida com o autor é a de um verdadeiro contrato de trabalho, com início em Janeiro de 2006; IV. Que seja declarado ilícito o despedimento do autor pela 1ª ré, por não ter sido precedido de procedimento disciplinar; V. A sua reintegração na 1ª ré, voltando a ocupar o posto de trabalho e a desempenhar as funções que vem desenvolvendo desde Janeiro de 2006; VI. A condenação da 1ª ré a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento (31 de Dezembro de 2012) até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, nos termos do disposto no artigo 390º do Código do Trabalho; VII. A condenação solidária das rés a pagarem-lhe: - € 20.428,86, respeitantes aos subsídios de férias e de Natal desde Janeiro de 2006 a 31 de Dezembro de 2012; - € 5.350,65, respeitantes a subsídio de alimentação, desde Janeiro de 2006 a 31 de Dezembro de 2012; - € 949,68, respeitante a diuturnidades, desde Janeiro de 2006 a 31 de Dezembro de 2012; - € 2.071,30, a título de formação profissional não recebida; - As diferenças dos descontos efectivamente pagos pelo autor, na medida em que foram efectuados como se de trabalhador independente se tratasse; - Juros de mora, até integral e efectivo pagamento.

Alegou, em resumo, que a 1ª ré sucedeu ao Hospital Distrital de F... (HDA), de quem o autor era realmente trabalhador subordinado e sem termo, sendo que essa relação de trabalho subordinado foi encoberta através de diferentes contratos celebrados com o Hospital Distrital de F... (HDA) e com a rés – um contrato de trabalho a termo e diversos contratos de prestação de serviço.

Com efeitos reportados a 31/12/12, a 1ª ré despediu ilicitamente o autor porque não houve qualquer procedimento disciplinar.

Com excepção do período compreendido entre 1/6/2007 e 30/11/2007, o autor nunca recebeu subsídio de férias, subsídio de Natal ou subsídio de alimentação, nem diuturnidades, do mesmo modo que lhe não foram concedidas horas de formação.

Sempre procedeu aos descontos para a Segurança Social como se de um trabalhador independente se tratasse, excepto no período entre 1/6/2007 e 30/11/2007, sendo que por ser trabalhador subordinado deveria apenas proceder mensalmente ao desconto para a Segurança Social de 11%, percentagem inferior àquela por referência à qual procedeu aos ditos descontos.

É, assim, titular dos direitos correspondentes aos pedidos que formulou na conclusão da petição.

A 1ª ré contestou, pugnando pela improcedência da acção.

Em resumo, negou a existência de uma relação de trabalho subordinado entre o autor e o HDA, na qual a 1ª ré tivesse sucedido, razão pela qual nunca se registou qualquer despedimento do autor.

A segunda ré também contestou, excepcionando a sua ilegitimidade para a acção, arguindo a incompetência do Tribunal do Trabalho em relação ao pedido reportado aos descontos para a Segurança Social, e invocando a prescrição dos créditos peticionados.

Por outro lado, sustenta que o autor prestou a sua actividade a essa ré ao abrigo de um real contrato de prestação de serviço.

As demais rés também contestaram, sustentando que o autor celebrou com elas, no real interesse dele, verdadeiros contratos de prestação de serviço ao abrigo dos quais prestou a sua actividade no HDA e depois na 1ª ré, razão pela qual não existiu contrato de trabalho, nem despedimento, actuando o autor em abuso de direito ao invocar a existência da relação de trabalho subordinado aludida na petição inicial.

O autor respondeu às excepções da ilegitimidade e do abuso de direito invocadas pelas rés, concluindo pela sua improcedência.

Saneado o processo, com improcedência da excepção de ilegitimidade arguida pela segunda ré, procedeu-se a julgamento, com observância dos legais formalismos, logo após o que foi proferida sentença de cujo dispositivo consta, designadamente, o seguinte: “Em face de todo o exposto, julgando a acção parcialmente procedente, decide-se: I. Declarar nulos os contratos denominados de prestação de serviços celebrados entre o A. e os RR..

  1. Reconhecer que desde Janeiro de 2006 até 31 de Dezembro de 2012, vigorou um contrato de trabalho entre o A. e o R. Centro Hospitalar B..., E.P.E. (em que se veio a fundir o Hospital Distrital de F..., sucedendo-lhe o referido R. em todos os direitos e obrigações, a partir de 03/03/2011).

  2. Declarar que tal contrato de trabalho cessou em virtude de despedimento ilícito, por parte do R. Centro Hospitalar B..., E.P.E..

  3. Declarar nulo o referido contrato de trabalho.

  4. Condenar o R. Centro Hospitalar B..., E.P.E. a pagar ao A.: a) € 3.509,70 (três mil, quinhentos e nove euros e setenta cêntimos), correspondentes às retribuições que o A. deixou de auferir desde o seu despedimento, em 31 de Dezembro de 2012, até à data em que lhe foi notificada a contestação do R. Centro Hospitalar B..., E.P.E. (3 de Março de 2013), onde foi pela primeira vez invocada a nulidade do contrato; b) € 20.428,86 (vinte mil, quatrocentos e vinte e oito euros e oitenta e seis cêntimos), respeitantes aos subsídios de férias e de Natal desde Janeiro de 2006 até 31 de Dezembro de 2012; c) € 983,88 (novecentos e oitenta e três euros e oitenta e oito cêntimos), de diuturnidades; d) € 5.350,65 (cinco mil, trezentos e cinquenta euros e sessenta e cinco cêntimos), a título de subsídio de refeição, desde Janeiro de 2006 até 31 de Dezembro de 2012; e) € 2.071,30 (dois mil, setenta e um euros e trinta cêntimos), de retribuição por formação profissional não proporcionada; f) Juros de mora à taxa legal (actualmente de 4%) sobre as quantias referenciadas supra em V. a), b), c), d) e e), até integral pagamento, contabilizados desde a data do vencimento de cada uma das retribuições, no que se refere às quantias aludidas nas als. a), b), c) e d), e desde 31 de Dezembro de 2012, no que respeita à mencionada na al. e).

  5. Absolver as RR. da instância, no que concerne aos pedidos de condenação na devolução da diferença entre as contribuições que o A. pagou para a Segurança Social, como trabalhador independente e as que teria que pagar, se a relação tivesse sido encarada como de contrato de trabalho por tempo indeterminado; e para que se proceda à regularização do seu enquadramento contributivo junto do sistema da Segurança Social.

  6. No mais, absolver as RR. do pedido.

”.

É dessa sentença que a 1ª ré recorreu, apresentando as seguintes conclusões: […] O autor e a segunda ré contra-alegaram, pugnando pela improcedência do recurso.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto desta Relação emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.

Colhidos os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do mérito, cumpre decidir.

*II - Principais questões a decidir Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso, são as seguintes as questões a decidir: 1ª) saber se a relação contratual constituída entre o autor e o HDA, na qual sucedeu a ré Centro Hospitalar B..., E. P. E. (CHBV, E. P. E.) era de trabalho subordinado ou, ao invés, de prestação de serviço; 2ª) se o autor tem direito a receber do réu CHBV as retribuições intercalares entre a data do seu despedimento (31 de Dezembro de 2012) e a data em que lhe foi notificada a contestação do réu (4/3/2013).

*III – Fundamentação A) De facto A primeira instância descreveu como factos provados os que a seguir se deixam transcritos: […] *B) De direito Primeira questão: saber se a relação contratual constituída entre o autor e o HDA, na qual sucedeu a ré Centro Hospitalar B..., E. P. E. (CHBV, E. P. E.) era de trabalho subordinado ou, ao invés, de prestação de serviço.

Importa apurar, em primeiro lugar, se a relação contratual entre o autor e o HDA, na qual sucedeu o CBHV pode ou não qualificar-se como sendo de trabalho subordinado, sendo certo que era sobre o autor que impendia, neste domínio, o correspondente ónus da prova (art. 342º/1 do CC).

Importa traçar, assim, ainda que sumariamente, a distinção entre esses dois institutos.

A distinção entre contrato de trabalho e contrato de prestação de serviço, definidos, respectivamente, nos artigos 1152.º e 1154.º do CC, assenta em dois elementos essenciais: o objecto do contrato (prestação de actividade ou obtenção de um resultado) e o relacionamento entre as partes (subordinação ou autonomia).

Assim, o contrato de trabalho tem como objecto a prestação de uma actividade e, como elemento típico e distintivo, a subordinação jurídica do trabalhador, traduzida no poder do empregador de conformar através de ordens, directivas e instruções, a prestação a que o trabalhador se obrigou.

Diversamente, no contrato de prestação de serviço, o prestador obriga-se à obtenção de um resultado, que efectiva por si, com autonomia, sem subordinação à direcção da outra parte.

Porém, através do critério do objecto do contrato, nem sempre surge com nitidez a distinção entre as duas figuras, já que, frequentemente, não se consegue determinar se a obrigação assumida foi a de “prestar uma actividade intelectual ou manual”, própria do contrato de trabalho, ou se obrigação consiste em “proporcionar certo resultado do trabalho intelectual ou manual”, própria do contrato de prestação de serviço – todo o trabalho visa a obtenção de um resultado e este não existe sem aquele.

Por isso, em última...

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