Acórdão nº 1218/12.9TJVNF-W.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelJUDITE PIRES
Data da Resolução27 de Março de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 1218/12.9TJVNF-W.P1 Juízos de Competência Cível de Vila Nova de Famalicão 2º Juízo Cível Relatora: Judite Pires 1ª Adjunta: Des. Teresa Santos 2º Adjunto: Des. Aristides Rodrigues de Almeida Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I.RELATÓRIO 1. Com benefício de Apoio Judiciário, em 07-06-2013, B… instaurou, por apenso ao processo de insolvência de “C…, SA”, Acção de Verificação Ulterior de Créditos, pedindo que lhe seja verificado, reconhecido e graduado, no lugar que lhe competir, um crédito no valor de € 12.519,28, acrescida da quantia de € 1.250,70 de juros vencidos à taxa legal.

Alegou, para tanto, que, tendo sido trabalhador da sociedade comercial insolvente até 31.08.2009, data em que rescindiu com justa causa o respectivo contrato de trabalho, no âmbito do processo nº 3234/09.9TJVNF que correu termos no 4º Juízo Cível do Tribunal de VN de Famalicão, reclamou, na referida qualidade, créditos laborais no valor global de € 15.733,99, conforme declaração anexa passada pelo respectivo Administrador. Contudo, apesar de reconhecidos e aprovados, do seu valor apenas recebeu a quantia de € 3.214,71, paga pelo Fundo de Garantia Salarial, permanecendo credor da diferença.

Liminarmente, em 08-06-2013, foi proferido o seguinte despacho judicial: “De acordo com o artigo 146º, nº 2, alínea b) do CIRE, a reclamação de créditos só pode ser feita nos seis meses subsequentes ao trânsito em julgado da sentença de declaração da insolvência.

No caso dos autos, a sentença que declarou a insolvência foi proferida em 24/5/2012, transitou em julgado e a presente ação foi proposta no dia de hoje, isto é, em 7/6/2013.

Por conseguinte, decorrido que está o aludido prazo de seis meses, entendo que o requerente perdeu o direito de praticar o ato em causa.

Em conformidade, é extemporâneo o seu articulado, pelo que me abstenho de o apreciar.

Notifique.

Custas pelo requerente, pelo mínimo legal, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário.

Oportunamente, arquive.” 2. Não se conformando com tal decisão, dela interpôs o Autor recurso de apelação para esta Relação, formulando com as suas alegações as seguintes conclusões: “- O prazo para intentar a acção “sub Júdice” é um prazo de caducidade (art. 298º, nº 2 CC).

- Por isso, não pode ser do conhecimento oficioso.

- Pois o regime previsto no art. 333º, nº 1 do CPC apenas se aplica às matérias excluídas da vontade das Partes, dispondo o seu nº 2 que, quando se trate de matéria sujeita á disponibilidade das Partes, aplica-se o regime do artigo 303ºCC, isto é, “o Tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição”.

- Por isso, a caducidade é de conhecimento oficioso apenas, e só, em matéria de direitos indisponíveis (como bem ensinam Pires de Lima e Antunes Varela e, de resto, como é Jurisprudência corrente neste Tribunal, seguindo–se –por todos– o douto Acórdão de 21.10.2008, no processo 0822995, in www.dgsi.pt/jtrp) .

Acresce que, e sem prescindir, - Nos termos do art. 12º CC (Código Civil), a lei apenas regula as situações futuras, ou seja, “in casu“, a alteração do prazo de seis meses apenas se aplica a acções de Insolvência (e respectivos Apensos) que deram entrada em juízo a partir do dia 20.05.2012 (data da sua entrada em vigor).

- A acção principal e apensos formam um todo, uma unidade coerente e, portanto, sujeita às mesmas regras e, concretamente, à aplicação da mesma lei no tempo.

- A decisão recorrida violou os artgs. 12º, 298º, 333º, nºs 1 e 2 e 303º, nº 2, todos do CC.

Termos em que deve ser revogada, como é de Justiça!” Não foram apresentadas contra-alegações.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

II.OBJECTO DO RECURSO 1. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito.

  1. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pelo recorrente, no caso dos autos cumprirá apreciar: - Se é de caducidade o prazo fixado no artigo 146º, nº2, b) do CIRE e, sendo-o, se a mesma é de conhecimento oficioso; - Se a alteração introduzida ao artigo 146º, nº2, alínea b) do CIRE pela Lei nº 16/2012, de 20 de Abril, que procedeu à redução do prazo antes fixado naquele normativo para a propositura da acção é ou não aplicável à acção de verificação ulterior de créditos instaurada pelo apelante.

    1. FUNDAMENTOS DE FACTO A factualidade e incidências processuais relevantes ao conhecimento do objecto do recurso são, além dos descritos no antecedente relatório, os seguintes: 1. O processo de insolvência a que se refere esta acção de verificação ulterior de créditos entrou em juízo em 06.04.2012; 2. A sentença que declarou a insolvência foi proferida a 24.05.2012; 3. O respectivo trânsito em julgado ocorreu em 18.06.2012; 4. A acção de verificação ulterior de créditos entrou em juízo em 07.06.2013.

    2. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO 1.De acordo com o artigo 1º do CIRE, “o processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a liquidação do património de um devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores, ou a satisfação destes pela forma prevista num plano de insolvência, que nomeadamente se baseie na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente”.

    Já do Preâmbulo do Decreto-Lei nº 53/2004, de 18 de Março, que aprovou o CIRE, (pontos 3 e 6) se podia retirar: “o objectivo precípuo de qualquer processo de insolvência é a satisfação, pela forma mais eficiente possível, dos direitos dos credores”.

    É, assim, objectivo fundamental do processo de insolvência assegurar a satisfação, tão eficiente quanto possível, dos direitos dos credores.

    A regra “par conditio creditorum” que caracteriza o processo de insolvência enquanto execução universal, e que encontra arrimo no citado artigo 1º do CIRE, garantindo a participação de todos os credores no processo, assegura um tratamento igualitário dos mesmos, mas de acordo com a qualidade dos créditos de que são titulares[1], constituindo a reclamação de créditos, a liquidação dos bens apreendidos para a massa insolvente e o pagamento aos credores as manifestações processuais mais significativas dos objectivos prosseguidos pelo processo de insolvência, enquanto tramitação unitária (processo principal onde é decretada a insolvência, e seus incidentes e apensos, todos regulados no CIRE).

    A verificação de créditos[2], integrando a epígrafe genérica do Título V do mencionado diploma, compreende os vários procedimentos destinados ao apuramento do passivo do devedor, cujo pagamento se há-de processar no âmbito da liquidação do activo.

    No Capítulo I do aludido título, denominado “Verificação de Créditos”, acha-se regulamentada, nos artigos 128º a 140º, a primeira fase, tida por inicial ou ordinária, da reclamação, reconhecimento e graduação de créditos, direccionada para todos os créditos sobre a insolvência, independentemente do seu fundamento ou natureza.

    No espaço temporal fixado na sentença declaratória da...

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