Acórdão nº 176/12.4TBTMR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ANTUNES
Data da Resolução11 de Março de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: 1.

Relatório.

F… e cônjuge, M…, interpuseram recurso ordinário de apelação da sentença do Sra. Juíza de Direito do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Tomar que, julgando parcialmente procedente a acção de declarativa de condenação, com processo comum, sumário pelo valor, que intentaram contra Companhia de Seguros A.., SA, condenou esta a pagar-lhes a quantia de € 25.080,89 €, acrescido o IVA à taxa legal e ainda o pagamento dos juros de mora, os quais são devidos desde a data da citação para a presente acção, até integral e efectivo pagamento pela Ré, e de acordo com a taxa legal de 4 % para as relações civis.

Os recorrentes – que pedem no recurso a substituição desta sentença por outra que condene a ré no pagamento de uma indemnização de 250,00€/mês pela privação do uso do imóvel, nesta data já no montante de 6 250,00€, até que possam usar e fruir plenamente da sua casa de habitação – remataram a sua alegação com estas conclusões: … Não foi oferecida resposta.

  1. Factos provados.

    ...

  2. Fundamentos.

    3.1.

    Delimitação objectiva do âmbito do recurso.

    Além de delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito, subjectivo ou objectivo, do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Essa restrição pode ser realizada, mesmo que só tacitamente, no requerimento de interposição ou nas conclusões da alegação (artº 684 nºs 2, 1ª parte, e 3, do CPC de 1961).

    No caso, a sentença impugnada desamparou um dos pedidos dos recorrentes: o de condenação da apelada na indemnização no montante de 250 €/mês pela privação do uso do imóvel, nesta data já no montante de 1.250,00 € e ainda a indemnizar os AA, por todos os danos que se venham a verificar em consequência do sinistro e a liquidar em execução de sentença. E a esta decisão de improcedência – e só a esta - que os recorrentes se mostram hostis.

    Para julgar improcedente um tal pedido, a sentença apelada adiantou dois argumentos: por não ter sido contratada tal cobertura adicional, e como tal a Ré não ter assumido, contratualmente tal obrigação para com o A. marido; mas, sobretudo, por esse dano efectivamente não se ter verificado, pois que o que os AA, lograram provar foi que usaram a sua casa nomeadamente, tiveram de remover as mobílias e roupas e outros utensílios necessários ao seu dia-a-dia, para uma parte da sua casa: o seu sótão! Logo aqui, há ainda um uso do imóvel não obstante não ser nas melhores condições a que estavam habituados, e que, sendo verdade que eles sentiram incómodos, transtornos, sofreram mais constipações e sentiram um sentimento de arrelia por terem que se acomodar a uma situação temporária porquanto a sua Seguradora não assumiu as reparações exigidas pela situação, e isto, quando muito podia ser pedido a título de danos morais ou não patrimoniais nos termos do artigo 496º do CC, decorrentes simplesmente pela situação não reparada atempadamente pela Ré Seguradora! Mas os AA, não pediram assim esses danos morais, aliás, não pediram de todo o ressarcimento de quaisquer danos morais o que era lógico e normal que o fizessem.

    Maneira que, face à vinculação temática desta Relação ao conteúdo da decisão impugnada e da alegação do recorrente, a única questão que importa resolver é a de saber se a apelada está ou não adstrita ao dever de prestar aos apelantes a quantia de € 250,00 mensais, desde a data da verificação do sinistro - 21 de Junho de 2011.

    A resolução deste problema vincula, naturalmente, ao exame do conteúdo contrato de seguro e dos pressupostos do dever de reparação do dano da privação do uso da coisa segura.

    Se há realidade que se tem por indiscutível é a de que entre o recorrente e a apelada foi concluído um contrato, típico e nominado, de seguro.

    Importa, contudo, determinar o regime jurídico que lhe é aplicável.

    No dia 1 de Janeiro de 2009 entrou em vigor o Decreto-Lei nº 72/2008, de 16 de Abril, rectificado pelas Declarações de Rectificação nºs 32-A/2008, de 13 de Junho e 39/2008, de 23 de Julho, que aprovou o regime jurídico do contrato de seguro (artºs 1 e 7 daquele diploma legal). O mesmo diploma revogou expressamente, entre outras normas, as constantes dos artºs 425 a 462 do Código Comercial, aprovado por Carta de Lei de 28 de Junho de 1888 e dos artºs 1 a 5 e 8 a 25 do Decreto-Lei nº 176/95, de 26 de Julho (artº 6).

    De harmonia com as normas de direito transitório de que a nova lei se fez acompanhar, ela é aplicável, não, naturalmente, à formação do contrato, mas ao conteúdo – i.e., às questões relacionadas com a execução do vínculo - de contratos celebrados em data anterior que subsistam à data do seu início de vigência, e relativamente aos contratos de seguro com renovação periódica, a partir da primeira renovação posterior à data da sua entrada em vigor (artºs 2 nº 1 e 3 nº 1 do Decreto-Lei nº 72/2008, de 16 de Abril)[1].

    No caso, é patente, em face da apólice – designadamente da inserta a fls. 18 e 19 – que o contrato de seguro concluído entre o apelante e a apelada é, no tocante à sua duração, um contrato de duração anual e de renovação periódica, e que ele se renovou já depois da entrada em vigor da LCS.

    Por força das apontadas normas de direito transitório, a lei nova é aplicável ao contrato de seguro concluído entre o apelante e a apelada. E como o novo regime é aplicável àquele contrato de seguro, ele é também aplicável ao sinistro, dado que também este ocorreu depois do início de vigência da lei nova (artº 2 nº 2 do Decreto-Lei nº 72/2008, de 16 de Abril).

    3.2.

    Conteúdo contrato de seguro e pressupostos do dever de reparação do dano da privação do uso.

    Diz-se contrato de seguro o contrato pelo qual uma pessoa transfere para outra o risco de verificação de um dano, na esfera própria ou alheia, mediante o pagamento de uma remuneração. A pessoa que transfere o risco diz-se tomador ou subscritor do seguro, a que assume esse risco e percebe a remuneração – prémio – diz-se segurador; o dano eventual é o sinistro; a pessoa cuja esfera jurídica é protegida é o segurado – que pode ou não coincidir com o tomador do seguro (artºs 426 e 427 do Código Comercial).

    Enquanto o segurador e o tomador do seguro assumem, por definição, a posição de partes num contrato de seguro, outras pessoas podem ocupar a posição de parte ou de terceiro...

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