Acórdão nº 2500/10.5TVLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Fevereiro de 2014
Magistrado Responsável | MARIA JOSÉ MOURO |
Data da Resolução | 27 de Fevereiro de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam na Secção Cível (2ª Secção) do Tribunal da Relação de Lisboa: * I - “A” intentou a presente acção declarativa com processo ordinário contra «“B” – Seguros Gerais, SA».
Alegou a A., em resumo: No dia 12-5-2007, no cruzamento da Av. dos Combatentes com a Av. Professor Egas Moniz e a Av. Lusíada, em Lisboa, ocorreu um acidente de viação causado exclusivamente por “C” que, não respeitando as regras e sinais de trânsito, passou com o sinal vermelho num entroncamento, fê-lo a mais de 180 km/hora e conduzia com uma TAS de 1,64g/l o veículo de matrícula 00-00-ST. Embateu com este, então, violentamente, na parte lateral direita do veículo de matrícula 00-00-TM conduzido pela A. o qual, em consequência da colisão, foi projectado a mais de 20 m do local, ficando totalmente destruído.
Aquele “C” transferira para a R. a responsabilidade civil decorrente de danos causados pelo veículo 00-00-ST.
Como consequência directa e necessária do acidente a A. foi internada no HSM politraumatizada, sendo depois transferida para o Hospital .... Fez diversos exames e foi operada a fractura oblíqua do 4º metacarpo da mão esquerda, tendo alta hospitalar em 17-5-2007 e continuando os tratamentos em regime externo.
Das lesões sofridas no acidente resultou para a A., como consequência permanente, cicatriz pigmentada sobre o quarto metacarpo da mão esquerda, longitudinal, medindo 4 cm de comprimento, com perda de sensibilidade e de mobilidade. Ficou marcada com cicatrizes na mão direita e em todo o corpo e, para além das fortes dores por que passou, sofre de insónias, cefaleias, ataques de pânico e receia que as lesões e problemas psicológicos se agravem, o que lhe provoca angústia e sofrimento.
Devido ao acidente ficou impossibilitada de concluir a licenciatura em Direito em 2007, só conseguindo reunir forças para tal dois anos depois. Sendo uma pessoa alegre, bem disposta, cheia de energia, perdeu o relacionamento com o seu grupo de amigos, deixou de sair de casa e até rompeu com o namorado. Sofreu medo e angústia, tendo temido pela vida, padeceu dores e incómodos, as cicatrizes causam-lhe profundo desgosto, tudo isto lhe implicando tristeza, depressão, desespero, apatia e isolamento.
Na ocasião do acidente vinha de uma Gala de Finalistas, ficando perdidos ou danificados devido ao acidente bens no valor total de 725,00 €.
Suportou despesas com exames e consultas no montante de 111,10 €, com medicação no montante de 80,80 €, com transportes no montante de 353,45 €.
O ano escolar ficou perdido e todo o investimento feito se perdeu – inscrição anual e propinas, livros e material escolar, transportes, refeições escolares, mesadas, despesas extra curriculares e vestuário, tudo no valor de 12.280,00 €.
Em 15-2-2007 a A. recebeu da R. a quantia de 5.417,77 € referente a despesas de ensino, consultas médicas, farmácia e tratamentos.
A A. não conseguiu fazer até agora um seguro de saúde por as seguradoras não quererem correr riscos acrescidos.
A A. ficou com sequelas que correspondem a uma incapacidade geral de 5%, pelo menos, sendo equilibrada pela diminuição da capacidade de ganho e vindo a A. a dispor de uma licenciatura em direito, uma indemnização por danos patrimoniais futuros de 85.000,00 €.
Tendo em conta a compensação das dores físicas, desgostos morais e complexos de ordem estética a A. aponta para a quantia de 120.000,00 € a título de indemnização por danos não patrimoniais.
Formulou a A. o pedido de condenação da R. a pagar-lhe: a) a importância global de 7.779,13 por danos patrimoniais emergentes presentes, «acrescida do valor correspondente à frustração do não investimento desse valor e das expectativas de rendimento desse investimento, a título de lucros cessantes, valor que deve ser fixado em dobro…» b) a indemnização no valor de 85.000,00 € por danos patrimoniais futuros; c) a indemnização no valor de 120.000,00 € por danos não patrimoniais.
Na contestação a R. apresentou como questão prévia a circunstância de estarem pendentes outras acções contra ela intentadas por outras ocupantes do veículo conduzido pela A. e que sofreram danos no mesmo acidente, referindo que a soma do montante dos pedidos em acções emergentes do acidente dos autos excede o capital seguro de 600.000,00 € por sinistro e mencionando que iria requerer a apensação destes autos à acção primeiramente intentada.
Alegou que, de qualquer modo, existirá sempre a possibilidade de o capital seguro ter de ser rateado por todos os lesados no acidente, nos termos do art. 16, nº 1, do dl 522/85, de 31-12.
Impugnou, ainda, factos alegados pela A., grande parte dos quais referiu desconhecer, afirmou tê-la reembolsado das despesas com consultas médicas, farmácia, tratamentos e propinas, num total de 5.417,77 €, mencionou que a A. inflaciona a extensão das lesões sofridas e as suas reais consequências, não sendo, aliás, portadora de qualquer incapacidade permanente e que os montantes peticionados pela A. são exagerados e desconformes com a real extensão das lesões sofridas.
Concluiu pela improcedência do pedido formulado pela A. e pela sua absolvição do mesmo.
Os presentes autos foram solicitados para apensação ao processo 2499/10.8TVLSB, com envio de cópia de despacho ali proferido em que se determinava a apensação àqueles autos dos processos nºs 2500/10.5TVLSB, 2501/10.3TVLSB e 220/11.2TVLSB, tendo em conta que naquelas acções eram peticionadas indemnizações por danos sofridos pelas várias AA. em consequência do mesmo acidente de viação (fls. 234-235). Teve lugar a remessa e apensação, mas, posteriormente, vieram estes autos a ser devolvidos à secção da Vara Cível a que haviam originalmente sido distribuídos.
O processo prosseguiu sendo que a final foi proferida sentença que decidiu «…julgar a acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, condenar a ré, Companhia de Seguros “B” – Seguros Gerais, S.A., a pagar à autora, a titulo de indemnização pelos danos sofridos em consequência do acidente, a quantia já apurada de 35.140,35 euros, a que acrescerá a quantia a apurar em execução de sentença, nos termos preditos supra, deduzida a quantia já paga pela ré, tudo acrescido de juros à taxa legal desde a citação até efectivo pagamento».
Desta sentença apelaram A. e R..
Concluiu a R. nos seguintes termos a respectiva alegação de recurso: (…) Já a A. concluiu nos seguintes termos a respectiva alegação de recurso: (…) Ambas as partes apresentaram contra alegações.
* II - O Tribunal de 1ª instância julgou provados os seguintes factos:
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No dia 12 de Maio de 2007, pelas 06h25m, no cruzamento da Av. dos Combatentes com a Av. Prof. Egas Moniz e Av. Lusíada, nesta cidade de Lisboa, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes o veículo automóvel Mercedes-Benz C200, com a matrícula 00-00-ST, e o veiculo ligeiro de passageiros de matricula 00-00-TM.
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O ST era conduzido por “C” e o TM pela ora autora.
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O ST circulava pela Avenida dos Combatentes, no sentido Sul - Norte, na 2.ª via de trânsito a contar da direita para a esquerda em relação ao seu sentido de marcha.
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O veículo conduzido pela autora circulava na Av. Lusíada, no sentido de Oeste para Este, na 1.° via de trânsito a contar da direita para a esquerda em relação ao seu sentido de marcha, em direcção à Av. Prof. Egas Moniz (Hospital de Santa Maria).
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O acidente referido em A) consubstanciou-se num embate entre a frente do ST e a parte lateral direita do TM.
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Na viatura da autora seguiam como passageiras “D”, “E” e “F”.
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Em consequência da colisão referida em E), o veículo conduzido pela autora foi projectado a mais de 20 metros do local onde se deu a colisão, imobilizando-se numa zona de terra, exterior às faixas de rodagem, depois de rodopiar sobre si mesmo diversas vezes, ficando totalmente destruído.
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A autora teve que ser desencarcerada, para poder ser socorrida.
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“C” havia transferido a responsabilidade civil decorrente da circulação do veículo de matricula 00-00-ST para a ora Ré “B” - Seguros Gerais, S.A., através de contrato de seguro titulado pela apólice ....
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A seguradora “B” assumiu por escrito, a responsabilidade total do acidente, reconhecendo expressamente que “a responsabilidade no evento pertence exclusivamente ao condutor da viatura”, seu segurado.
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O acidente referido em A) foi objecto de participação criminal pela ora autora e demais acidentadas dando origem a 2 processos-crime onde o condutor do ST foi constituído arguido, tendo-lhe sido imputada a prática de um crime de condução sob a influência do álcool, no processo com o n° 33/07.6SRLSB-02, e um crime de ofensa à integridade física por negligência na pessoa da autora, no processo com o n° 7058/07.0TDLSB.
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À data do acidente “C” conduzia com um TAS de 1,64g/l.
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A autora deu entrada nos serviços de urgência do HSM, pela 7h25m.
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Como consequência directa e necessária do acidente referido em A) a autora sofreu: Fractura na mão esquerda, com apagamento da cabeça de M4 esquerda, com colocação de uma placa na M4; • Traumatismo craniano com hemorragia sub-aracnoideia; • Traumatismo vertebro-medular.
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Em 15.05.2007, a autora foi transferida para o Hospital ..., onde foi internada.
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Em 16.05.2007, a autora foi operada a fractura oblíqua do 4.° metacarpo da mão esquerda.
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Em 17.05.2007, a autora teve alta hospitalar.
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Das lesões sofridas no acidente referido em A) resultou como consequência permanente, cicatriz pigmentada sobre o quarto metacarpo da mão esquerda, longitudinal, medindo 6 cm de comprimento.
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À data do acidente a autora frequentava o último ano do curso de Direito na Universidade ... em Lisboa.
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Em 15.02.2008 a autora recebeu da Companhia de Seguros “B” – Seguros Gerais, S.A, a quantia de € 5.417,77, relativa ao reembolso parcial das despesas de ensino, consultas médicas, farmácia e tratamentos.
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Ao chegar ao cruzamento identificado em A), o condutor do ST “C” não respeitou a sinalização semafórica que para si estava vermelha e entrou no...
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