Acórdão nº 154/11.0GBCVL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA PILAR DE OLIVEIRA
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Relatório No processo comum singular 154/11.0GBCVL do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Covilhã, após realização da audiência de discussão e julgamento com documentação da prova oral, em 3 de Dezembro de 2012 foi proferida sentença como o seguinte dispositivo: Pelo exposto, e em face do que fica dito, decide-se:

  1. PARTE CRIMINAL: I - Condenar o arguido A...

    , pela prática de um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 200 (duzentos) dias de multa à taxa diária de 7€ (sete euros), o que perfaz o montante global de 1400€ (mil e quatrocentos euros); II - Condenar o arguido A...

    nas custas do processo crime, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC.

  2. Parte Cível: I - Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido nos autos pelo demandante e, em consequência, condenar o arguido A...

    a pagar-lhe a quantia de €6.000 (seis mil euros), sendo que sobre a quantia de 5.000€ acrescem juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação; II - Condenar demandante e demandado nas custas do pedido cível, na proporção dos respectivos decaimentos.

    Inconformado com esta decisão dela recorreu o arguido A...

    , rematando a correspondente motivação com as seguintes conclusões: 1) O arguido suscitou a questão prévia de ver declarada a ilegitimidade do Ministério Público para deduzir a acusação pública no momento em que a proferiu devendo ter sido declarado extinto o procedimento criminal contra o arguido, uma vez que tal ilegitimidade gera uma nulidade insanável.

    2) Uma vez que não tendo sido apresentada queixa pelo crime de furto pelo legítimo titular não podia o MP, no momento em que o fez, deduzir acusação pública como não podia o Tribunal receber tal acusação nem tão pouco conhecer da sua existência, devendo ter procedido à sua rejeição.

    3) A ratificação da queixa junta aos autos não tem e não podia ter tido, a virtualidade da sanar a falta de um pressuposto processual que tem de estar verificado no momento em que o MP deduz a acusação pública, pelo que não pode ter efeitos retroactivos.

    4) O que equivale à sua falta e implica a nulidade do processo (Cfr. Germano Marques da Silva, in Curso de Processo Penal. III. 2ª ed, pág.34, nulidade esta insanável e consequentemente invocável por qualquer interessado e do conhecimento oficioso até ao trânsito da decisão final - artº 119º alínea b) do Código de Processo Penal.

    5) A sentença recorrida, ao decidir-se pela improcedência da questão prévia da falta de legitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal levantada previamente pelo arguido, da forma explanada na douta decisão recorrida, violou entre outros, os artigos 203º, nº 3 do CP e arts 48º, 49º, 50º, 51º, 52º, 11º al. b), 358º e 359º todos do CPP.

    6) Sem prescindir, também a sentença recorrida, no que à apreciação da prova foi decidido, apreciou erradamente boa parte das provas produzidas, quer documentais, quer no que concerne às testemunhas ouvidas em sede de audiência de julgamento.

    7) Efectivamente, o arguido ao invocar c provar através de testemunha idónea - B...

    - gravado através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, prestadas no dia 08-10-2012 das 16.23.47 às 17.02.17. que tinha autorização para mandar limpar a estrema da sua propriedade que confina com a propriedade do demandante, ao tribunal incumbia afastar tal prova, chamando a depor o próprio demandante, pois só este poderia contrariar tal facto, assim o ónus da prova de que tal autorização não existia, incumbia ao Ministério Público e não ao arguido que goza da presunção de inocência.

    8) A sentença recorrida desvalorizou cm absoluto um depoimento directo prestado pela testemunha B... gravado nas coordenadas do dia 08-10-2012 das 16:23:47 às 17:02:17 que alega claramente ter recebido consentimento do proprietário do imóvel - demandante - para proceder a limpeza do prédio na estrema a fim de evitar a ocorrência de incêndios, impunha-se determinantemente a inquirição do demandante a fim de ficar assente tal facto. O que não aconteceu 9) Face à prova produzida o tribunal a quo deveria dar como não provados os factos elencados nas alíneas 1) e 2) dos tactos provados e como provado o facto susceptível de influir na decisão da causa - que o ofendido autorizou o arguido ou a sua mãe a proceder a limpeza da estrema da sua propriedade.

    10) O Tribunal "a quo não apreciou devidamente todas as provas carreadas para os autos e errou na apreciação que fez das mesmas, por violação das regras da experiência comum.

    11) Tal erro consubstancia vício de erro de julgamento de facto, constante do nº 2 do Artº 410º do CPP. conforme foi decidido pelo Ac do STJ de 97-09-18, Proc. nº 48230-A.

    12) Pelo que a prova produzida nos presentes autos impunha ao tribunal a quo uma decisão oposta à que resulta da sentença recorrida, considerando o arguido absolvido do crime que vem acusado.

    13) A sentença em crise viola ainda o princípio do “in dubio pro reo”.

    14) Para além da prova produzida ter sido contraria a imputação do arguido de qualquer facto que determine ter sido aquele que mandou proceder ao corte das oliveiras, impunha-se - como já se deixou alegado que o tribunal para descredibilizar os depoimentos arrolados pela defesa os únicos com conhecimento directo dos factos - a realização de outras diligencias probatórias, pois a prova realizada não foi suficiente para, sem qualquer dúvida, permitir a condenação do arguido, por todas as razões já supra expostas.

    15) A. convicção do tribunal “a quo” para dar tal facto como provado, baseou-se nas declarações das testemunhas arroladas pela acusação designadamente as testemunha C..., D...e E...- e ainda de F...- Agente da GNR - e G..., funcionário do arguido.

    16) Resulta claramente o contrário do depoimento de tais testemunhas. designadamente de G... - única testemunha presencial dos factos -. gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, prestadas no dia 29-09-2012 das 11.53.33 às 14.54.01, que o arguido não deu qualquer ordem à testemunha para cortar qualquer árvore ou oliveiras. Se a testemunha cortou foi por sua conta e risco, com o intuito de proceder à limpeza da estrema, conforme ordenado pelo arguido.

    17) Desta forma, o tribunal a quo violou entre outros os artigos 203º do CP e artigos 127º e 410º do CPP 18) A douta decisão recorrida deve ser substituída por outra que absolva o arguido do crime de furto e consequentemente do pedido cível nos termos em que foi condenado.

    19) O arguido deu conhecimento ao processo - através da junção aos autos de certidão de óbito a fls. que dá aqui por integralmente reproduzida - do falecimento do ofendido que ocorreu em data anterior à leitura da sentença condenatória. Pelo que, nos termos dos artigos 276º e segs do CPC o presente processo após a leitura da sentença deveria ficar suspenso em virtude do falecimento do ofendido, aguardando que o mesmo fosse impulsionado através do incidente da habilitação, o que não aconteceu, sendo a sentença omissa quanto a tal consequência Nestes Termos e sempre com o mui douto suprimento de Vossas Excelências deve a douta sentença aqui recorrida ser revogada por outra que absolva o Recorrente.

    Assim se fazendo a mais elementar e costumada Justiça! O Ministério Público respondeu ao recurso, concluindo que deve ser negado provimento ao recurso e, em consequência, confirmada a sentença recorrida.

    Nesta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.

    Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, não ocorreu resposta.

    Efectuado o exame preliminar e corridos os vistos teve lugar conferência.

    Cumpre apreciar e decidir.

    *** II. Fundamentos da Decisão Recorrida A decisão recorrida é do seguinte teor no que respeita à apreciação da questão prévia de ilegitimidade do Ministério Público e contém os seguintes fundamentos de facto: Cumpre assim, antes de mais, apreciar e decidir da suscitada questão prévia, aferindo da legitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal.

    Com relevo para a decisão a proferir cumpre salientar que: - Os presentes autos tiverem início com a denúncia junta a fls. 2 e 3 dos autos, por meio da qual C... reportou o furto de 57 oliveiras de grande porte na Quinta da ..., declarando desejar procedimento criminal contra os autores de tais factos; - A convite do Ministério Público, foram juntas pelo referido C..., a fls. 46, e em 12.12.2011, certidões prediais, de onde resulta que proprietário do imóvel de onde alegadamente foram subtraídas as árvores descritas nos autos é o seu pai H...

    ; - Por despacho proferido em 16.12.2011, o Ministério Público deduziu acusação contra o arguido, imputando-lhe a prática de um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203º, n.º 1 do Código Penal; - Já por requerimento entrado em juízo no dia 8 de Fevereiro de 2012, veio o ofendido H...ratificar a queixa oportunamente apresentada pelo...

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