Acórdão nº 407/12.0JAPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 22 de Janeiro de 2014

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MARCOLINO
Data da Resolução22 de Janeiro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso 407/12.0JAPRT.P1*Acordam no Tribunal da Relação do Porto Nos autos de processo comum colectivo 407/12.0JAPRT, do 1º Juízo de Competência Criminal da Póvoa de Varzim, acusado pelo MP, foi submetido a julgamento o arguido: B…, solteiro, nascido a 15.11.1978, filho de C… e de D…, residente na Rua …, n.º .., Porto.

Era-lhe imputada a prática de quatro crimes de falsificação de documento, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 255º, al. a) e 256º, n.º 1, als. a), e d) e n.º 3, em concurso efectivo com um crime de uso de documento falso, na forma continuada, p. e p. pelos art.ºs 255º, n.º 1, al. a) e 256º, n.º 1, al. e) e nº 3, e com um crime de burla qualificada, na forma tentada, p. e p. pelos art.ºs 22.º, n.º 1 e 217.º, n.º 1 e 218.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e b), todos do Código Penal.

Efectuado o julgamento, foi proferido acórdão, que assim decidiu: 1. Condenou o arguido B… pela prática de cada um dos crimes de falsificação de documentos, p. e p. pelo artigo 256º, nº 1, als. a e d) e nº 3 do C.P. na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão.

  1. Condenou o arguido B… pela prática de um crime de uso de documento falso, na forma continuada, p. e p. pelo artigo 256º, nº 1, al. e) e nº 3 e 3º, nº 2 do C.P. na pena de 2 (dois) anos de prisão.

  2. Condenou o arguido B… pela prática de um crime de burla qualificada, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, nº 1 e 217º, n.º 1 e 218º, nº 1 do C.P. na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão.

  3. Em cúmulo jurídico das penas referidas em 1 a 3, condenou o arguido B… na pena única de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão, que declarou suspensa na sua execução por igual período, sujeita a regime de prova.

  4. Absolveu o arguido da prática dos restantes crimes que lhe eram imputados na acusação.

    Não conformado, o arguido interpôs recurso e, da respectiva motivação, extraiu as seguintes conclusões: 1. O presente recurso tem como objecto matéria de facto e de direito da sentença proferida nos autos que condenou o recorrente pela prática do crime de falsificação de documentos, p. e p. pelo artigo 256º n.º 1 als. a) e d) e n.º 3 do C.P., do crime de uso de documento falso, na forma continuada, p. e p. pelo artigo 256º n.º 1 al. e) e n.º 3 e 30º, n.º 2 do C.P., e do crime de burla qualificada, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 222º n.º 1 e 217º n.º 1 e 218º n.º 1 do CP.

  5. O tribunal “a quo” considerou, no ponto 2.1 do seu douto acórdão, como provados os seguintes factos: “Número 18 - Proposta de financiamento que foi aprovada tendo o arguido sido informado que tinha de proceder a uma entrega inicial de 7.500 euros a que acresceria o montante de 215,25 euros (montante global de 7.715,25 euros) relativo a despesas de contrato e o restante seria pago em 83 rendas mensais, proposta que foi aceite e assinada pelo arguido no dia 07.03.2012 bem como as livranças de fls. 128.” Número 20 - “A fim de levantar a viatura e pagar o montante de entrada inicial acordado e respectivas despesas o arguido deslocou-se no dia 09.03.2012 pelas 12 horas à E… da Póvoa de Varzim com um cheque desse montante já preenchido.” Número 26 - “Ao congeminar todo o esquema referenciado para adquirir junto da E… o veículo referenciado no valor de 40.000 euros o arguido visou criar como criou junto do vendedor a convicção de que se tratava de pessoa credível fazendo-se passar por advogado com alto rendimento e dessa forma conseguir não só que o veículo lhe fosse vendido como conseguir como conseguiu a aprovação do crédito para aquisição da referida viatura.” Número 28 - “Com efeito, no momento em que se aprestava para levantar junto da E… a viatura referenciada, o que aconteceu no dia 09.03.2012, pelas 12 horas o arguido foi surpreendido por agentes da PJ que o detiveram e dessa forma impediram que a viatura lhe viesse a ser entregue.” 3. Número 29 - “O arguido agiu com o propósito de enganar a firma E… através do seu gerente de vendas F…, criando neste e nas pessoas que analisaram o contrate de financiamento que assinou a convicção que era advogado de sucesso e credível e dessa forma obter um benefício patrimonial não permitido que só não aconteceu por razões estranhas à sua vontade.” 4. Tal convicção assentou nas declarações do arguido, nos depoimentos das testemunhas, nas diligências documentadas nos autos e nos documentos juntos aos mesmos (exames periciais, autos de busca, revista e apreensão de objectos).

  6. Acontece que, do depoimento espontâneo e credível da primeira testemunha de acusação, F… e da testemunha G…, indicado pelo arguido durante a audiência de julgamento, resulta de forma cristalina que o Arguido se dirigiu ao stand E… da Póvoa de Varzim para adquirir uma viatura.

  7. Sendo certo que para o efeito teria de contrair financiamento junto da H….

  8. Foi-lhe comunicado por F…, funcionário da E…, que não preenchia os requisitos necessários para a obtenção do supra referido financiamento, tendo o mesmo sido recusado.

  9. Facto esse que levou o Arguido a desistir do negócio.

  10. No entanto, e como resulta evidente do testemunho de F…, dias mais tarde, este informou o Arguido de que afinal aquele financiamento seria aprovado.

  11. Sendo certo que tal financiamento não passaria de uma simulação, a mando da PJ, com o intuito de engendrar um plano para atrair o Arguido às instalações da E….

  12. Todo o supra exposto foi corroborado pelos depoimentos do funcionário da E…, F…, conforme transcrições que se seguem: 11:29 - Procurador - “(…) Houve uma.... houve uma pessoa, portanto, na orgânica da ... da H1… ...” 11:31 – F… - “Exactamente, da marca. Exactamente. Que provavelmente saberi .... eu sei .... saberi .... posteriormente eu soube que já sabia mais do que eu...” 12:11 - Procurador - “ E portanto, com essa informação que .... que o financiamento.., eh... iria ser aprovado o ... o que é que o senhor fez?” 12:22 – F… - “Então, quando....quando saiu no simulador da H1… a aprovação.., eh.... aí foi quando eu tive já, efectivamente conhecimento do que é que .... da pessoa .... do que é que se passava efectivamente com o cliente, tanto que eu fiquei totalmente surpreendido ... hmm... mandaram-me fazer emissão do contrato, eu fiz emissão do contrato, disseram-me que eu tinha de dar ao cliente para o cliente assinar, eu chamei o cliente para assinar contrato, o cliente assinou o contrato, ficou logo no ... na nossa mão da concessão .... eh .... e agendou-se a entregada viatura.” 29:42 – Juiz - “Então, houve aprovação efectiva ou não, afinal? O que é que o senhor G… lhe disse?” 29:46 – F… - “Que a aprovação, era uma aprovação fictícia, para....” 29:49 - Juiz - “Ahhh. A aprovação ia ser fictícia.” 29:51 – F… - “Exactamente.” 29:51 - Juiz - “É isso que o senhor diz definitivamente?” 29:53 – F… - “É isso, é isso mes. .. .é isso que eu digo definitivamente.” 29:54 – Juiz - “E se não fosse a aprovação, os senhores nunca teriam vendido o...” 29:57 – F… - “Não, não, não...” 29:58 – Juiz – “...o carro ao senhor?” 29:58 – F… – “não, não.”.

  13. A testemunha G…, gerente da E…, a instâncias do mandatário, esclareceu: 14:31 - Mandatário - “então o senhor nunca lhe iria entregar o cheque o carro.... olhe... Meritíssima eu gostava de confrontar a testemunha....” 14:34 – G… - “Deixe-me que eu digo-lhe outra coisa, deixe-me acrescentar outra coisa, eu inclusivamente.., eh.... como tive medo que o processo não corresse bem, não sabia que tipo de pessoas é que estavam envolvidas no processo ou não, tive o cuidado de desligar o cabo da bateria do carro para que não fosse alguém tirar o carro e bater com ele na porta das instalações, porque não sabia que tipo de pessoas estavam envolvidas nisto.” 23:40 - Mandatário – “..não sabe porque é que foi aprovado o crédito. Muito bem, olhe diga 23:42 – G… - “Eu sei....espere aí...está a misturar aliás coisas...” 23:46 - Mandatário - “Estou?” 23:46 – G… - “Eu não pus dados novos no processo, no entanto sei que passou ao estado de aprovado porque havia claramente aqui, uma intenção de dizer “Epah, vamos apanhar este tipo para não continuar a vigarizar toda a gente, claramente.” 13. Assim, o facto que demonstra que o Arguido se dirigiu ao stand da E… com o intuito de, através de meios enganosos, adquirir uma viatura, causando àquele prejuízo patrimonial, foi incorrectamente julgado como provado.

  14. Conforme facilmente se afere dos depoimentos acima transcritos, o Arguido foi claramente instigado e induzido à compra da viatura, devido à aprovação fictícia do financiamento, resultante de um conluio entre a H… e a PJ.

  15. Pelo que estamos perante um erro notório na apreciação da prova nos termos do artigo 410º n.º 2 al. c) do C.P.P., devendo a mesma ser renovada.

  16. O tribunal “a quo” considerou ainda como provado, que o Arguido tinha no bolso um cheque já preenchido no valor de € 7.715,25, correspondente ao montante da entrada inicial, conforme acordado com o funcionário F….

  17. Tal cheque foi Junto aos autos por um inspector da PJ, com a menção: “Cheque entregue pelo arguido ao gerente do stand E…, no dia 09/03/2012”.

  18. Na verdade, e conforme resulta dos depoimentos do funcionário e do gerente da E…, o cheque nunca foi entregue a nenhum deles ou a quem quer que fosse.

    Senão vejamos: “14:24 - Juíza - “Tem ideia deste cheque? Conhece isto?” 14:26 – F… - “Esse cheque nunca teve na minha mão.” 14:28 - Juíza - “Nunca teve na mão?” 14:29 – F… - “Esse cheque nunca teve na minha mão.” 14:32 - Juíza - “Não lhe foi entregue?” 14:33 – F… - “Não, não chegou a ser entregue.” 14:34 - Procurador - “Na altura não o viu?” 14:35 – F… - “Não, não senhor. Esse cheque nunca chegou a ser entregue na minha mão.” 4:15 - Mandatário - “Olhe para esse cheque se faz favor, o senhor algum dia viu esse cheque?” 4:16 – G… - “Não.” 4:17 - Mandatário - “Esse cheque algum dia lhe foi entregue pelo arguido?” 4:20 – G… - “Nem teria que ser, porque eu não recebo cheques de cliente nenhum. Não percebo porquê a pergunta.” 4:45 - Mandatário - “Cento e sessenta e sete Oh senhor G…, isto é uma cópia do cheque...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT