Acórdão nº 785/11.9TBLRA-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Janeiro de 2014

Magistrado ResponsávelCATARINA GON
Data da Resolução14 de Janeiro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.

Nos autos de insolvência de A...

, o Sr. Administrador da Insolvência emitiu parecer sobre a qualificação da insolvência, propondo que a mesma fosse considerada fortuita e referindo não ter detectado qualquer facto que possa ser integrado no art. 186º, nº 2, do CIRE.

Na sequência de promoção do Ministério Público, o Sr. Administrador foi notificado para analisar os contratos de mútuo celebrados pela Insolvente, a aplicação dos capitais mutuados e a situação económica daquela durante o período em que se desenrolaram os actos que criaram a situação de insolvência e para apresentar novo parecer na sequência dessas diligências.

O Sr. Administrador veio apresentar exposição, dizendo que a Insolvente tem perto de setenta anos e aufere um rendimento proveniente de uma pensão por velhice no valor de 246,36€, tendo aproveitado as propostas das instituições financeiras que lhe ofereciam crédito para adquirir bens de consumo corrente que já não consegue identificar. Mais reafirma o seu parecer no sentido de a insolvência ser qualificada como fortuita dada a ausência de factos que permitam qualificá-la como culposa.

Ainda na sequência do que foi promovido pelo Ministério Público foram solicitadas informações às empresas financeiras que concederam crédito e à Segurança Social.

Realizadas essas diligências, o Ministério Público emitiu parecer no sentido de a insolvência ser qualificada como culposa, com fundamento no disposto no art. 186º, nº 1 e nº 2, alínea g), do CIRE, dada a circunstância de a Insolvente ter obtido diversos créditos ao consumo, acumulando um passivo de 8.700,00€, quando é certo que não tinha qualquer expectativa de que a sua situação económica melhorasse, sendo certo que não dispunha de outros rendimentos além da sua pensão de reforma, cujo valor actual é de 246,36€.

Notificada a Insolvente, veio a mesma responder, invocando uma situação de dificuldade económica e depressão, por ter sido abandonada pelo marido e por ter sido despedida do emprego que conseguiu arranjar; nessas circunstâncias e sempre na esperança de conseguir novo emprego, aceitou as propostas de empréstimos vantajosos que, telefonicamente, lhe eram oferecidos pela Cofidis e Cetelem. Mais alega que, apesar disso, foi cumprindo as suas obrigações – com a ajuda da filha e de duas amigas – mas a sua situação económica piorou, na medida em que não conseguiu arranjar emprego e ainda foi vítima de um furto de objectos em ouro e cheques e de um assalto por esticão, sendo que, apesar de ter tentado junto daquelas instituições, a redução do valor das prestações e a concessão de maior prazo para o pagamento, não obteve qualquer resposta.

Foi proferido despacho saneador e foi dispensada a selecção da matéria de facto assente e base instrutória.

Foi realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida decisão a fixar a matéria de facto provada e foi proferida sentença onde se decidiu qualificar a insolvência como fortuita.

Discordando dessa decisão, o Ministério Público veio interpor o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões: 1 - O Tribunal proferiu sentença no sentido de qualificar a insolvência de M A...como fortuita.

2 - O Tribunal deu como provados, entre outros, os seguintes factos: - A requerida nasceu em 9/12/1943.

- A requerida recebe pensão de velhice no valor mensal actual de 254,00 (actualizada em Janeiro de 2012) desde 25/09/1992, bem como complemento social de idoso desde 2009, no valor actual de 113,70, - A requereria, em datas não concretamente apuradas, mas entre, meados de Novembro de 2005 e pelo menos meados de Maio de 2007, obteve de cinco instituições financeiras créditos para consumo, tendo cessado o pagamento correspondentes prestações pelo menos desde Dezembro de 2010, totalizando o passivo relativamente a tais créditos à data da apresentação à insolvência a quantia de 8.176,52.

- A requerida não possui qualquer activo imobiliário.

- Em meados de 1999 o marido da insolvente abandonou a casa de morada de família, deixando de contribuir para as despesas da mesma, como até aí fazia.

- A partir dessa altura, foi a requerida, com a sua reforma, que passou a suportar todas as despesas.

- A insolvente entrou em depressão, não só por ter sido abandonada pelo marido, como por ficar com poucos recursos económicos.

- E foi mais ou menos nessa época, em que se encontrava extremamente fragilizada e deprimida, que começou a ser contactada telefonicamente pela Cofidfis e pela Cetelem a proporem-lhe empréstimos "altamente vantajosos".

- Tentou a arranjar emprego, mas era muito difícil, porque nunca tinha trabalhado por conta de outrem e não tinha quaisquer qualificações literárias ou experiência.

- Acabou por arranjar um serviço de limpeza em casa de um casal na (...).

- Em data não apuradas patrões da requerida que residiam na (...)foram-se embora de tal local.

- A insolvente ao ver-se abandonada, enganada, sem emprego e com despesas mensais superiores a sua reforma e sempre na esperança de conseguir novo emprego, acabou por ceder, "aceitando" as propostas da Cofidis e da Cetelem.

- Não conseguir arranjar mais algum emprego e para obter mais rendimentos arrendou um quarto da sua casa a uma senhora.

- Essa senhora desapareceu e levou consigo alguns pertences da insolvente, diversos objectos em ouro e quarto cheques em branco de uma conta de depósitos à ordem que a insolvente possuía no Millenium.

- Mas apareceram dois desses cheques, com a assinatura falsificada, no valor de 85,00 e 90,00 euros que a insolvente teve que pagar.

- Cada a vez com mais dificuldades e económicas e sempre com a esperança de arranjar um emprego e como continuava a receber "propostas" das referidas Cofidis e...

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