Acórdão nº 435/13.9TJPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Novembro de 2013
Magistrado Responsável | CARLOS GIL |
Data da Resolução | 25 de Novembro de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
435/13.9TJPRT.P1 Sumário do acórdão proferido no processo nº 435/13.9TJPRT.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 3, do Código de Processo Civil: 1. À recusa de pagamento do cheque por parte do sacado, com fundamento na declaração do sacador de que o título foi furtado, durante o prazo de apresentação a que se refere a primeira parte do artigo 29.º da Lei Uniforme Relativa ao Cheque, não é aplicável o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 4/2008, publicado no Diário da República, Iª série, nº 67, de 04 de Abril de 2008.
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Face à comunicação do sacador de que lhe foram furtados todos os cheques, não tem o sacado o dever jurídico de averiguar se é exacta essa alegação do titular da conta sacada.
***Acordam, em audiência, os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório A 15 de Março de 2013, nos Juízos Cíveis da Comarca do Porto, B…, Lda.
instaurou acção declarativa sob a forma de processo experimental contra C…, SA, Sucursal em Portugal pedindo a condenação da ré ao pagamento da quantia de € 7.654,72, acrescida de juros, calculados à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Para fundamentar a sua pretensão, a autora alegou, em síntese, que em Outubro de 2011, para pagamento do preço de mercadorias fornecidas à sociedade D…, Lda. recebeu desta dois cheques com os nºs ………. e ………., no montante de € 3.827,36, cada um, emitido o primeiro com a data de 31 de Janeiro de 2012 e o segundo com a data de 13 de Fevereiro de 2012, cheques que apresentados a pagamento junto da ré, dentro dos oitos dias subsequentes à data constante em cada cheque como sendo a da sua emissão, não foram pagos com a menção de “furto”. Não obstante a ré ter sido advertida para a fraude cometida por D…, Lda. logo após o não pagamento do primeiro cheque, a mesma não procedeu a qualquer indagação no sentido de apurar a causa justificadora da posse do cheque e o modo da sua aquisição.
Efectuada a citação da ré, esta veio contestar impugnando alguns dos factos articulados pela autora, pugnando pela licitude da sua conduta, alegando que aceitou a ordem de revogação dos cheques por justa causa, por lhe ter sido entregue a declaração escrita e cópia da participação criminal, ao que acresce que nunca os referidos cheques seriam pagos dada a falta de provisionamento da conta sacada, o que se verificou, pelo menos, desde 01 de Janeiro de 2012 a 10 de Abril de 2012.
Foi proferido despacho admitindo a apresentação de um terceiro articulado a fim da autora se pronunciar, desde já, sobre as excepções invocadas pela ré.
A autora respondeu à contestação.
Seguidamente, entendendo-se que nenhuma das soluções plausíveis de direito podia levar à procedência da acção, proferiu-se decisão final julgando-se a acção totalmente improcedente e absolvendo-se a ré do pedido.
Inconformada com essa decisão, a autora interpôs recurso de apelação, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: “I. A revogação do cheque (“justificada” ou não), nunca produz efeitos, por força do disposto no art. 32.º da LUCh, durante o prazo de apresentação a pagamento previsto no art. 29.º da LUCh.
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Por conseguinte, o banco sacado que, dentro do prazo previsto no art. 29.º da LUCh, recuse o pagamento de cheque com fundamento em “ordem de revogação” responde “por perdas e danos perante o legítimo portador do cheque”, nos termos do art. 483.º/1 do CC.
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No caso dos autos, a apelada, com base na revogação declarada pela sacadora, recusou o pagamento de dois cheques apresentados a pagamento pela apelante dentro do prazo previsto no art. 29.º da LUCh.
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Devia, pois, o tribunal a quo ter condenado a apelada no pedido.
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Apenas constituem “justa causa” da “recusa de pagamento” os seguintes factos: “furto, roubo, extravio, coacção moral, incapacidade acidental ou qualquer outra situação ou vício da vontade”.
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No caso dos autos, nenhum desses factos se acha provado, pelo que a recusa de pagamento dos cheques apresentados a pagamento pela apelante é ilegítima.
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Sem prescindir, podemos, ainda assim, admitir que a legitimação da recusa de pagamento se funde na comunicação ao sacado, pelo sacador, da verificação de qualquer um desses factos, designadamente o furto do cheque.
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A admitir-se tal hipótese, sempre terá, contudo, de se fazer depender a eficácia legitimante (do não pagamento do cheque) da observância, pelo sacado, do dever de averiguação mínima da seriedade e credibilidade da comunicação, ou invocação, por parte do sacador, de qualquer daqueles factos.
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Um tal dever de averiguação, que sempre se apoiaria nas exigências implicadas pelo princípio da boa fé, resulta também do disposto no § único do art. 14.º do Decreto nº 13004, de 12/1/27.
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De outro modo, promover-se-ia o expediente arteiro, e o correspondente conluio entre sacador e sacado, de dissimular uma revogação ineficaz (durante o prazo previsto no art. 29.º da LUCh) com a mera alegação irresponsável de um certo facto abstractamente justificador do não pagamento do cheque.
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No caso dos autos, a apelada não cumpriu minimamente tal dever de averiguação, uma vez que não fez qualquer diligência nem promoveu qualquer indagação – nem junto da sacadora, nem, muito menos, junto da portadora, ora apelante.
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Diligências e indagações que, no caso, eram tanto mais exigíveis quanto é certo que os cheques cujo pagamento recusou se acham efectivamente emitidos à ordem da portadora (apelante) e a declaração de revogação da sacadora, que é genérica e indiferenciada, não os identifica especificamente.
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Ao julgar a acção improcedente, a sentença violou os arts 29.º e 32.º da LUCh, 14.º do Decreto nº 13004, de 12/1/27, e 483.º/1 do Código Civil.
” Dispensados os vistos com a concordância dos Excelentíssimos Juízes-adjuntos e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.
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Questões a decidir tendo em conta o objecto do recurso delimitado pela recorrente nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nº 3 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil, na redacção aplicável a estes autos[1]), por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil A única questão a decidir é a de saber se a recorrida, ao recusar pagar os dois cheques de que a recorrente era portadora, com fundamento na declaração da sacadora de que tais cheques haviam sido furtados, se constituiu na obrigação de indemnizar a recorrente, com base em responsabilidade por facto ilícito.
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