Acórdão nº 1718/13.3YIPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 18 de Novembro de 2013
Magistrado Responsável | MANUEL DOMINGOS FERNANDES |
Data da Resolução | 18 de Novembro de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo nº 1718/13.3YIPRT.P1-Apelação Origem-Tribunal Judicial de Estarreja-Juízo de Média e Peq. Instância Cível Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Caimoto Jácome 2º Adjunto Des. Macedo Domingues 5ª Secção Sumário: I- A presunção do cumprimento pelo decurso do prazo só pode ser ilidida, nos termos do artigo 313.º do C.Civil, por confissão do devedor originário ou daquele a quem a dívida tiver sido transmitida por sucessão.
II- Para estes efeitos, tem de se considerar como confissão, a carta que o Réu envia à Autora onde afirma que se propõe pagar de imediato metade do montante em dívida e a outra metade com o funcionamento do equipamento.
III- Acontece que aquela presunção de cumprimento supõe que tenha já decorrido o prazo previsto na lei para a prescrição presuntiva.
IV- Efectivamente, só nessa altura o devedor beneficia da presunção de cumprimento e, só então, o credor fica sujeito ao ónus de obter ou apresentar a confissão da dívida por parte do devedor, pela forma estipulada nos artigos 313.º e 314.º do Código Civil, para ter êxito na sua pretensão.
V- Portanto, a confissão eficaz para ilidir a presunção de cumprimento pelo decurso do prazo é somente aquela que é produzida quando já está verificada a respectiva facti-species da norma, ou seja, quando já está decorrido o prazo de dois anos.
*I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: A “B…, Lda”, pessoa colectiva nº………, com sede na …, nº.., em …, Aveiro, intentou o presente procedimento de injunção, previsto no Decreto-Lei n.º269/98, de 1 de Setembro, contra C…, com domicílio na Rua …, em …, neste município, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de € 4.488,00 (capital), acrescida de juros de mora vencidos entre 21.05.2009 e 05.01.2013 (data instauração da injunção), no valor de € 652,17, bem assim dos vincendos até efectivo e integral pagamento.
Para tanto alega que é uma sociedade comercial que se dedica à comercialização e instalação de elevadores e, no exercício dessa actividade, forneceu ao requerido, a pedido deste, os bens melhor identificados na factura n.º ….., de 21.05.2009, conforme contrato (proposta ………), outorgado entre ambos em 26.09.2006.
Acrescenta que tal factura, cujo valor ascende a € 4.488,00, deveria ter sido paga na respectiva data de emissão (pronto pagamento), o que até ao presente não sucedeu, apesar dos inúmeros esforços da requerente nesse sentido, tendo esta interpelado o R ao seu pagamento por diversas vezes, tanto por telefone, como por escrito.
*Válida e regularmente citado, este contestou, em síntese, alegando que já pagou à Autora o montante da factura dos autos, pelo que nada lhe deve.
Por outro lado, o elevador e acessórios a que se refere a factura destinaram-se à casa de habitação do Réu, e portanto ao seu uso pessoal e da sua família, não o tendo destinado, directa ou indirectamente, ao exercício de qualquer comércio, que aliás nunca exerceu.
Assim, e tendo passado mais de dois anos entre a data da emissão, envio e recepção daquela factura e vencimento do respectivo crédito, e a data em que o foi notificado da presente injunção, o crédito da Autora está prescrito, porque o pagamento sempre se há-de presumir, nos termos dos artigos 312º e 317º/b) CCivil, prescrição que invoca.
Notificada para se pronunciar quanto às excepções deduzidas pelo Réu, veio a Autora, a fls. 18 e ss., reafirmar a falta de pagamento da factura dos autos, bem ainda alegar que a prescrição invocada não ocorreu, desde logo, porque o Réu sempre reconheceu a dívida, nomeadamente através de cartas que lhe dirigiu–uma datada de 11.11.2009 e outra de 13.04.2011-, reconhecimento esse que interrompeu a prescrição. Sem prescindir, acrescenta que em causa está uma prescrição presuntiva, e não extintiva, sendo a respectiva presunção ilidível, mediante a apresentação de prova em contrário, incluindo a documental junta ao seu articulado.
*Foi então designada data para a realização da audiência de discussão e julgamento, a que se procedeu com observância das formalidades legais, tudo conforme resulta de todo o consignado na respectiva acta.
*Fixada a matéria de facto foi, a final, proferida sentença que julgou improcedente, por não provada, a excepção de prescrição invocada pelo Réu e, procedente, por provado, o procedimento de injunção e, em consequência, condenou aquele a pagar à Autora “B…, Lda” a quantia de € 4.488,00, acrescida de juros de mora vencidos entre 21.05.2009 e 05.01.2013 (data instauração da injunção), no valor de € 652,17, e dos vincendos até efectivo e integral pagamento.
*Não se conformando com o assim decidido veio o Réu interpor o presente recurso, concluindo as suas alegações nos seguintes termos: 1ª- Na carta de 11.11.2009 [apenas seis meses após a data da factura], o Réu não confessa, nem reconhece, a existência da dívida, mas apenas manifesta desagrado pelo incumprimento do contrato de instalação do elevador, não aceita a factura, por não ter que pagar o resto do preço do equipamento antes da sua instalação e propõe-se pagar metade agora e a outra metade com o funcionamento do equipamento.
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- Também na carta de 13.04.2011, o mandatário do Réu limita-se a repetir o que consta da carta de 11.11.2009, não contendo qualquer confissão ou reconhecimento de dívida, para o que, aliás, nem sequer estava munido de poderes bastantes.
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- A confissão eficaz para ilidir a presunção de cumprimento pelo decurso do prazo é aquela que é produzida quando já está verificada a respectiva fatispécie, ou seja, quando está decorrido o prazo de dois anos.
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- Pois antes de completado o prazo, não existe pressuposto de facto (decurso do prazo) em que se apoie uma presunção de cumprimento e, portanto, ainda não há sequer prescrição.
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- O reconhecimento do devedor (e portanto antes de completado o prazo prescricional) opera a interrupção do prazo decorrido, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, igual ao prazo da prescrição primitiva.
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- Pelo que, ao contrário do que entendeu o Tribunal, a carta de 11.11.2009 não poderia valer como confissão que ilidisse a presunção de pagamento, porque não estava sequer decorrido o respectivo prazo.
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- Quando muito, valeria (e não vale) como reconhecimento, importando apenas que começasse a correr novo prazo igual ao da prescrição primitiva, mas nunca o prazo da prescrição ordinária.
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- E, nesse caso, a prescrição já se ter completado em 11.11.2011, e portanto antes da propositura da presente acção.
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- O AcRLisboa, de 24 de Outubro de 1978, que a sentença cita em apoio do decidido, distingue-se substancialmente do caso dos autos, porque ali houve um outro processo em que o demandado terá adoptado um comportamento processual incompatível com o pagamento.
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- Admitir a relevância da confissão (ou do reconhecimento) produzida em data anterior ao decurso do prazo prescricional, com a aplicação consequente do prazo de prescrição ordinária, seria o mesmo que admitir a renúncia antecipada à prescrição, e seria uma porta aberta a acordos que viriam modificar os prazos prescricionais.
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- Na sentença recorrida fez-se errada interpretação e aplicação dos artigos 300º, 302º/1, 303º, 311º, 313º/1 e 2, 315º, 325º, 326º/1 e 2, 352º e 357º/1 do Código Civil.
*Devidamente notificada contra-alegou a Autora concluindo pelo não provimento do recurso.
*Após os vistos legais cumpre decidir.
*II- FUNDAMENTOS O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. arts. 684º, nº 3, e 685º-A, nº 1 e 2, do C.P.Civil.
*No seguimento desta orientação é apenas uma a questão a decidir: -saber se se verifica ou não a excepção da prescrição presuntiva invocada pelo Réu.
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