Acórdão nº 105/11.2IDCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelJORGE DIAS
Data da Resolução02 de Outubro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Processo nº 105/11.2IDCBR.C1, do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Cantanhede.

*** *Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal.

No processo supra identificado foi proferida sentença que julgou procedente a acusação deduzida pelo Mº Pº contra os arguidos: A...

, Lda., pessoa coletiva com o n.º (...), com sede social na (...), freguesia e concelho de Cantanhede, B...

, divorciado, empresário, filho de (...) e de (...), natural de Angola, nascido em 05.04.1971, residente na (...), Praia de Mira, Sendo decidido: a) condenar o arguido B... como autor material de um crime de fraude fiscal, previsto e punido pelos artigo 103, nº 1, alínea a) do Regime Geral das Infrações Tributárias, com referência ao artigo 14, alínea a) do Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias, e artigo 14, alínea a) do Código do IVA, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa à taxa diária de € 20,00 (vinte euros), perfazendo o montante global de € 3.000,00 (três mil euros), fixando-se desde já a pena de prisão subsidiária em 100 (cem) dias para o caso de o arguido não pagar a pena de multa, b) condenar a arguida A..., Lda. como autora material de um crime de fraude fiscal, previsto e punido pelos artigo 103, nº 1, alínea a) do Regime Geral das Infrações Tributárias, com referência ao artigo 14, alínea a) do Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias, e artigo 14, alínea a) do Código do IVA, na pena de 300 (trezentos) dias de multa à taxa diária de € 10,00 (dez euros), perfazendo o montante global de € 3.000,00 (três mil euros),***Inconformado com a decisão, interpôs recurso o arguido B...

.

  1. A arguida vendeu em 18.01.2010 à sociedade de direito espanhol C...

    , S.L.U 9013 peças de vestuário no valor global de 169.269,50€ sendo tal venda titulada pela fatura 090046 e a mesma contém a menção de «Isento de IVA ao abrigo do artigo 14 alínea a) do Código do IVA», sendo que tal indicação era totalmente verídica à altura dos factos.

  2. Em 02.07.2009, a sociedade arguida, representada pelo recorrente, pelas 15H35m52’’, apresentou a pertinente declaração de início de atividade, declaração essa que obteve a referência tributária (...) e o código eletrónico (...) (cfr. a respetiva tradução a fls.).

  3. A sociedade arguida na declaração de início de atividade requereu a sua inscrição como operador para efeitos do Registo das Operações Intracomunitárias (vide campo 582).

  4. Tal declaração foi recebida pela Autoridade Tributária Espanhola sem que fossem assinalados quaisquer erros (vide a tradução da respetiva comunicação a fls.).

  5. Igualmente resultou provado em Juízo que em 24.02.2010 – pouco mais de um mês passado sobre a emissão da discutida fatura – a Autoridade Tributária Espanhola enviou à sociedade arguida o respetivo cartão de contribuinte definitivo (cfr. tradução do documento a fls.).

  6. Só a partir da inspeção levada a cabo pela Autoridade Tributária e Aduaneira em Maio de 2011 é que se detetou que os Serviços Tributários Espanhóis não tinham levado a cabo a inscrição definitiva da C..., S.L.U. como uma operadora inscrita no VIES.

  7. O recorrente não tinha a noção de que tal inscrição não estivesse feita em definitivo tanto mais que em Portugal tal inscrição é automática dependendo apenas de requerimento.

  8. Os arguidos nunca ocultaram a transação, antes a comunicaram no tempo legalmente estatuído para tal efeito [alínea f) dos factos provados], pelo que, também por esta via, resulta reforçada a bondade da atuação dos arguidos.

  9. A compra e venda em crise seria sempre neutral do ponto de vista do IVA para a sociedade vendedora aplicando-se – ou não – as regras do RITI pois caso a operação estivesse sujeita a IVA este seria sempre devido pela sociedade de direito espanhol e não pela arguida, pelo que nenhuma vantagem adviria para esta independentemente da isenção aplicável à operação.

  10. Assim, e da ponderação dos elementos documentais juntos e dos depoimentos trazidos à colação neste articulado, transparece manifestamente que as conclusões vertidas nos factos dados como provados sob as alíneas l), n), o), r), s), t) e u) terão, e salvo o devido respeito, de soçobrar e serem, naturalmente, dados como “não provados” e, consequentemente, os arguidos absolvidos.

  11. Não pode autorizar-se a conclusão que os arguidos, em algum momento, tenham agido com dolo, nem direto, nem necessário, nem mesmo a título de dolo eventual, pois que, não tendo aqueles conhecimento dos factos em causa à data dos mesmos (a não conclusão do processo administrativo em território espanhol), não podem ter assumido o risco de, com o seu agir, produzir determinado resultado, ou seja, praticar o facto não permitido por lei.

  12. Aos arguidos, não tendo agido com dolo, só se lhes poderia imputar a alegada fraude a título de negligência, pois na verdade atuaram sempre convencidos da lisura do seu procedimento o que se veio a revelar não ser verdade, sem que qualquer responsabilidade lhes possa ser assacada, pelo que ocorreu um erro sobre as circunstâncias de facto.

  13. O crime de fraude fiscal é um crime doloso não estando a punição prevista para o seu cometimento sob a forma negligente, pelo que terão os arguidos de serem absolvidos sob pena de violação do princípio da legalidade.

  14. Sob pena de violação dos artigos 10 e 13 do CP, 103/1, 14, a) do RITI e 14/1, a) do CIVA deve o presente proceder revogando-se a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo e absolvendo-se os arguidos ou quando assim não se entenda, o que não se concede, devem os arguidos ser absolvidos atento o disposto nos artigos 2/1 do RGIT, 1/1 e 13 do CP.

    Responde o Magistrado o Mº Pº ao recurso do arguido, concluindo que o mesmo não merece provimento.

    Nesta Instância, o Ex.mº Procurador Geral Adjunto emite parecer no sentido da improcedência do recurso, porque o “crime imputado se mostra preenchido com a conduta realizada pelo recorrente”.

    Foi cumprido o art. 417 nº 2 do CPP.

    Não foi apresentada resposta. Foram colhidos os vistos legais.

    Cumpre decidir.

    ***Mostra-se apurada, a seguinte matéria de facto e fundamentação da mesma: II. Da discussão da causa e com interesse para a decisão resultaram provados os seguintes factos: Da acusação a)A arguida A..., LDA, pessoa coletiva com o n.º (...), com sede social na (...), freguesia e concelho de Cantanhede, tem como objeto social o exercício da atividade de “comércio a retalho de vestuário para adultos, estabelecimento especializado”, CAE 47711.

    b)No ano de 2010, era gerente da arguida A..., LDA. o arguido B..., cabendo a este os atos de gestão e de regularização tributária da pessoa coletiva, ou seja, era o mesmo quem lidava diretamente com os clientes da pessoa coletiva arguida, orientava os serviços prestados a terceiros e geria os movimentos de negócios da pessoa coletiva arguida, com acesso à documentação da estrutura organistico-financeira da contabilidade interna daquela.

    c)Durante o período temporal acima referido, a arguida A..., LDA., na qualidade de sujeito passivo de obrigações fiscais, encontrava-se enquadrada em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), no regime normal, com periodicidade trimestral, e estava tributada em Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), no regime geral de tributação, na área da Repartição de Finanças do Concelho de Cantanhede.

    d)Em 18 de Janeiro de 2010, os arguidos contabilizaram uma transmissão intracomunitária, titulada pela fatura n.º 090046, no valor de € 169.269,50, para o operador Espanhol C..., SLU, contribuinte n.º (...), na qual não tinha sido liquidado IVA, com a indicação de “Isento de IVA ao abrigo do artigo 14 alínea a do Código do IVA”.

    e)O acima referido operador espanhol não se encontra inscrito no cadastro VIES (VAT Informations Exchange System) como operador intracomunitário, nem declarou aquisições intracomunitárias provenientes do operador português “ A..., Lda”, contribuinte n.º PT (...).

    f)Os arguidos apresentaram declaração periódica de IVA, referente ao primeiro trimestre de 2010, inscrevendo no quadro 07 da declaração o montante de €169.270,00 como se de uma transmissão intracomunitária se tratasse.

    g)O valor mencionado, inscrito no quadro 07 da declaração periódica tinha por suporte a fatura n.º 090046, no valor de €169.269,50, na qual se encontra em causa a transmissão de 9.013 peças de vestuário.

    h)O pagamento desta fatura teve por base um documento interno, sem data, cujo recebimento foi efetuado em numerário, no montante de €169.269,50.

    i)A sociedade arguida também não declarou a verba atrás mencionada no respetivo anexo recapitulativo.

    j)Como a transmissão em causa não pode ser considerada isenta de IVA conforme consta da fatura, a operação em causa origina a...

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