Acórdão nº 559/12.0JACBR-A.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelCACILDA SENA
Data da Resolução25 de Setembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra: I - RELATÓRIO No processo supra identificado, os assistentes A…; B… e C…, completamente identificados nos autos, requereram o arresto preventivo dos bens do arguido D…, com os demais sinais nos autos, ao abrigo do disposto no artº 228º nº1 do CPP.

Este pedido veio a ser deferido por decisão judicial de fls. fls. 42, e em consequência decretado o arresto dos bens do requerido aí identificados.

Inconformado com esta decisão, veio o requerido interpor recurso despedindo a sua motivação com as seguintes Conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto do Douto Despacho da Mma. Juíza que entendeu aplicar ao Arguido, ora Recorrente, medida de garantia patrimonial de arresto preventivo, por entender existir “fundado receio de perda de garantia patrimonial”, nos termos do art.º 228.º do CPP.

  1. Tal Despacho encontra-se unicamente suportado, em termos probatórios, nos depoimentos das testemunhas E… e F… considerando que, de forma absolutamente, escorreita e categórica, por isso credível, propalaram os rumores que, pelo menos desde os finais de 2012, se vêm cristalizando na freguesia de Y..., concelho de Alvaiázere, de que, efectivamente, é intenção do arguido transferir a propriedade dos seus bens para os seus filhos, como forma de obviar ao pagamento de uma qualquer indemnização aos requerentes.

    Acontece, porém, que 3. O depoimento de E… (ouvida através do sistema CITIUS, produzido no dia 13 de Março de 2013, de 13-03-2013 10:17:29 a 13-03-2013 10:37:53) manifesta uma natureza vaga e indubitavelmente imprecisa, no entender do ora Requerente insuficiente para a determinação da medida de garantia patrimonial aplicada, de facto, a testemunha em momento algum consegue nomear a origem dos rumores, chegando a afirmar desconhecer a data da alegada reunião, declarando ainda desconhecer o respectivo conteúdo, acabando por nomear um seu funcionário (“caseiro”, nas palavras da Mma. Juíza.), depois de instada.

  2. O depoimento de F… (ouvida através do sistema CITIUS, produzido no dia 18 de Março de 2013, de 18-03-2013 10:46:21 a 18-03-2013 11:03:49) vem, a final, confirmar que se trata de testemunho “a pedido”, verdadeiramente contrafeito, instruído de forma a colmatar o malogro do primeiro depoimento, que se revelou insuficiente de justificar o “fundado receio de perda de garantia patrimonial” indispensável à aplicação de medida de garantia patrimonial, de facto, a testemunha, em momento algum, confirma saber de intenções de partilha do Arguido (nomeadamente dos seus filhos), não tendo em momento algum, confirmado ter falado com a testemunha E.... Acresce que a testemunha revela inúmeras dificuldades em precisar qualquer razão de ciência, remetendo sempre a justificação do seu depoimento para vozes públicas, cujos autores não conseguem, de modo algum identificar.

    Face ao exposto, 5. Nesse sentido, não pode o Recorrente deixar de manifestar o seu mais veemente repúdio pelo teor da fundamentação aduzida em sede de despacho recorrido, pois, após audição dos depoimentos realizados, se conclui que, na verdade, estes foram tudo menos absolutamente escorreitos e categóricos ou credíveis.

    Aliás, o Douto Despacho é manifestamente injusto e iníquo, totalmente desgarrado da realidade probatória produzida nos autos. Por esse motivo, face a toda a prova produzida em sede de audiência e discussão em julgamento, nunca poderia a Mma. Juíza chegar a tal entendimento.

    De facto, 6. O Douto Despacho recorrido, é fundamentado unicamente com prova baseada essencialmente em vozes públicas, ““(…) rumores na vila de Alvaiázere”, tal fundamentação é manifestamente insuficiente para determinar a verificação do requisito do “fundado receio de perda de garantia patrimonial”, violando de forma categórica o disposto no art.º 228.º do CPP, uma vez que, no caso concreto, se não demonstrou, de forma credível e suficientemente fundada e susceptível de demonstrar a aplicação ao arguido de uma medida de garantia patrimonial.

  3. Nesse sentido, a determinação de uma medida de garantia patrimonial baseada em “reprodução de vozes públicas ou rumores públicos”, constitui método proibido de prova e, por conseguinte, ilegal e nulo, não podendo, ao abrigo do disposto no art.º 130.º do CPP, ser utilizadas.

  4. Tal nulidade, pode ser conhecida em qualquer fase do processo, sendo que prejudica o despacho Recorrido, uma vez que a prova proibida foi utilizada como única fundamentação da decisão, pelo que tal Despacho fundando em provas nulas (provas insanavelmente nulas ou provas cuja nulidade é sanável, mas não deva considerar-se ainda sanada) é, também ele, nulo, nos termos do disposto no art.º 122.º, n.º 1 do CPP, devendo ser revogado.

    Subsidiariamente, 9. À luz do disposto no art.ºs 191.º do CPP e em conformidade com o Acórdão datado de 22/05/2007 do Tribunal da Relação de Lisboa, o arresto preventivo é uma providência enxertada no processo penal, neste sentido, o arresto preventivo deve ser tramitado nos próprios autos e não por apenso – caso em que, a realizar-se autuação por apenso, se verificará uma violação do art. 191.º sancionável com nulidade nos termos gerias. Nesse sentido, o arresto preventivo tramitado por apenso, é nulo, determinando a invalidade de todos os actos que posteriormente tiverem sido realizados.

  5. Nos termos do art. 61.º, al.

    b), do CPP que o Arguido goza do direito de «Ser ouvido pelo tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que eles devam tomar qualquer decisão perante qualquer entidade», 11. À luz do vertido no art.º 194, n.º 3 do CPP, as medidas de garantia patrimonial não podem ser decretadas sem a precedência de prévio contraditório do arguido, sob pena de nulidade insanável [por força do art.º 119.º, n.º 1, al.

    1. e, ainda que assim não fosse, 120.º, n.º 2, al.

    d)], não podendo ser considerados para fundamentar a aplicação ao arguido de medida de garantia patrimonial, quaisquer factos ou elementos do processo que lhe não tenham sido comunicados.

    Acresce que, 12. O Ministério Público não foi ouvido quanto à aplicação da medida de garantia patrimonial requerida, em preterição do previsto nos art. 53.º e 194.º, n.º 1 do CPP. Em conformidade com o disposto no art.º 194.º, é da responsabilidade do Ministério Público a aplicação de qualquer medida de garantia patrimonial, a ausência deste pressuposto constitui uma nulidade insanável, nos termos do art.º 119.º b) do CPP.

    Em todo o caso e para além disso, 13. Conforme foi sufragado pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora, em acórdão datado de 20/09/2011 (processo n.º 322/04.4GBPSR-B.E1, relatado pela Exma. Senhora Juíza Desembargadora Ana Luísa Bacelar, acessível em www.dgsi.pt), «Não podem ser arrestados bens comuns do casal para pagamento de dívida da responsabilidade de apenas um dos cônjuges». Nestes termos, não poderia, deste modo, no caso vertente, a Mma. Juíza da primeira instância ter decidido no sentido de arrestar os bens comuns do casal.

    Deste modo, o Douto Despacho recorrido violou os artigos: 130.º, 228.º, 193.º n.º 1, 191.º, 194.º n.º 1, 61.º al.

    b), 86.º, 89.º n.º 4, 194.º n.º 3, 119.º al.

    c), 120.º n.º 2 al d), 194.º n.º 6, 119.º b), 53.º e 122.º do Código de Processo Penal; 18 n.º 2 e n.º 3 da Constituição da Republica Portuguesa; 12.º, 1692.º al.

    b), 1696.º n.º 1 e 1732.º do Código Civil.

    Termos em que E nos melhores de Direito que V. Ex.ª certamente suprirão, deve o Douto Despacho recorrido ser revogado e, em conformidade, substituído por outro que, considerando verificadas as nulidades arguidas nas conclusões e, bem assim, a impossibilidade de arresto preventivo dos bens sobre os quais incidiu o despacho recorrido (por serem bens comuns do casal), determine a revogação da medida de garantia patrimonial de arresto preventivo determinada ao arguido.

    * Os requerentes responderam ao recurso defendendo a inexistência dos vícios e contradições e dos depoimentos prestados, defendendo a manutenção da decisão recorrida.

    * O Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido apresentou-se também a responder, concluindo nos mesmos termos.

    * Recebido e instruído o recurso, foi enviado a este tribunal.

    * Já nesta instância, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto a quem os autos foram continuados, emitiu Parecer, defendendo, também a improcedência do recurso.

    * Corridos os vistos e realizada a conferência, cumpre agora decidir: * II – FUNDAMENTAÇÃO A decisão que decretou o arresto é do seguinte teor: (transcrição) “(…) O tribunal considera indiciariamente provados os seguintes factos, com relevância para a decisão de mérito a proferir nos presentes autos: 1 - No âmbito desse processo o requerido D…- aí arguido – foi acusado pela prática de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º, 132.º, n.º 1, aI. e), h) e c), ambos do Código Penal; um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86.º, n.º 1, aI. c) da Lei n.º 5/2006, de 23 de Junho, na redacção introduzida pela Lei n.º 17/2009, de 6 de Maio, por referência ao artigo 2.º, n.º 1, aI. az) e artigo 3.º, n.º 4, aI. a) do referido diploma legal, agravado pelo n.º 3 daquele primeiro normativo; e um crime de detenção de munições proibidas, p. e p. pelo artigo 86.º, n.º 1, aI. d) da Lei n.º 5/2006, de 23 de Junho, na redacção introduzida pela Lei n.º 17/2009, de 6 de Maio, por referência ao artigo 2.º, n.º 3, aI. p), do referido diploma legal.

    2 - A…, B… e C… foram admitidos a intervir na...

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