Acórdão nº 12/13.4GELSB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Setembro de 2013
Magistrado Responsável | CORREIA PINTO |
Data da Resolução | 11 de Setembro de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 5.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Coimbra: I) Relatório 1.
No 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Pombal, no âmbito do processo sumário n.º 12/13.4GELSB, foi julgado o arguido A...
, melhor identificado nos autos, a quem era imputada a prática de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punível pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, e de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punível pelos artigos 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal.
Na sentença, o tribunal proferiu decisão nos seguintes termos: «Em face de tudo o exposto: - Absolvo o arguido da pena acessória de inibição de conduzir que lhe vinha imputada nos termos do artigo 69.º, n.º 1, do Código Penal.
- Condeno o arguido A... como autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292.º, n.º 1 e 69.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa, à mesma taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos).
- Condeno o arguido como autor material de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.º 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos).
- Em cúmulo jurídico dessas penas parcelares, condeno o arguido na pena única de 250 (duzentos e cinquenta) dias, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos).» 2.
O Ministério Público veio apresentar recurso, por entender que deveria ter sido aplicada a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor prevista no artigo 69.º, n.º 1, do Código Penal.
Na respectiva motivação, formula as seguintes conclusões: 1. No caso em apreço, uma vez que o arguido foi condenado pelo crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292.º, n.º 1, do Código Penal, deveria ser-lhe aplicada a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, prevista no artigo 69.º, n.º 1, do mesmo Código.
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De facto, resulta do artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, que a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados é sempre aplicada ao agente que seja condenado por condução de veículo em estado de embriaguez, não fazendo a lei depender tal condenação da titularidade ou não de licença ou carta de condução.
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Para além disso, a imposição desta pena acessória justifica-se, também, pela necessidade de evitar um tratamento desigual dos condutores que conduzam em estado de embriaguez e a concessão de um injustificado privilégio a quem praticou um comportamento mais grave (por conduzir em estado de embriaguez e sem título de condução).
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Por, apenas assim, se respeitar o princípio constitucional da igualdade, estabelecido no n.º 1 do artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, inequivocamente obstativo da diferenciação jurídico-sancionatória.
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Ademais, o próprio legislador claramente assume, nos dispositivos normativos ínsitos nos artigos 126.º, n.º 1, alínea d), do Código da Estrada, e 4.º, n.ºs 1, al. e) e 4, al. f), do D.L. n.º 98/2006, de 06/06, a possibilidade de condenação de condutores não habilitados a tal pena acessória.
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Trata-se, pois, de uma ilegalidade da enunciada vertente decisória – omissão de imposição de pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados ao arguido.
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Com o devido respeito por diversa opinião, afigura-se-nos como incontornável e obrigatoriedade de cominação de pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados a qualquer (judicialmente) reconhecido agente dalgum dos crimes enunciados sob as diversas alíneas do n.º 1 do artigo 69.º do Código Penal, designadamente – no que ora importa – do de condução de veículo em estado de embriaguez (p. e p. pelo artigo 292.º, n.º 2, do Código Penal), encontre-se ou não legalmente habilitado à respectiva tripulação.
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Efectuando a pertinente ponderação da utilidade do adquirido quadro-fáctico, considerando a amplitude da respectiva moldura – de 3 meses a 3 anos –, sopesando o já significativo valor da taxa de alcoolemia registada, de 1,95 g/l/ 1,61 g/l – representativa de embriaguez nítida (em sentido técnico) –, já adequada à produção de perturbação da marcha e de diplopia, e, consequentemente, do exponencialmente acentuado agravamento do risco de acidente, crê-se como adequado impor-lhe a proibição de condução de veículos motorizados por período não inferior a 6 meses.
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Violou, assim, a Sentença recorrida os artigos 292.º, n.º 1, 69.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, e artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.
Termina sustentando que a sentença recorrida deverá ser revogada e substituída por outra que condene o arguido na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, pelo período de 6 (seis) meses.
3.1. O arguido, notificado, não respondeu.
3.2. Neste Tribunal da Relação, o Ministério Público, com vista nos autos, acompanha a motivação do recurso em 1.ª instância, emitindo parecer no sentido da procedência do interposto recurso.
Colhidos os vistos e remetidos os autos a conferência, cumpre apreciar e decidir.
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Face ao disposto no artigo 412.º do Código de Processo Penal e às conclusões da motivação do recurso apresentado pelo Ministério Público, importa apreciar a seguinte questão: ▪ Saber se o tribunal recorrido devia ter condenado o arguido na pena acessória prevista no artigo 69.º, n.º 1, do Código Penal pela prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, pese embora o facto do arguido não estar legalmente habilitado a conduzir veículos a motor.
II) Fundamentação 1.
Com interesse para a matéria que aqui se discute, importa considerar os seguintes factos que resultam dos autos: 1.1.
O arguido, A..., foi sujeito a julgamento, em processo sumário, sendo-lhe imputada a prática dos factos descritos no auto de notícia de fls. 3 e 4 e na acusação de fls. 14 a 16 e, por isso, de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punível pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, e de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punível pelos artigos 69.º, n.º 1, e 292.º, n.º 1, ambos do Código Penal.
1.2.
Realizada audiência de julgamento, foi proferida a sentença recorrida.
Com interesse, julgaram-se aí provados os seguintes factos (transcrição da matéria de facto provada, a partir do registo da gravação em sistema digital da sentença oral proferida em audiência de julgamento, no registo iniciado às 12:04:14, sensivelmente entre 00m:57s e 04m:12s do respectivo registo): 1 – No dia 12 de Janeiro de 2013, pelas 17h27, na EN1, ao quilómetro 154,1, Venda da Cruz, na área da comarca de Pombal, o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula JP..., sem para tal ser titular de título que permitisse habilitá-lo a estar a conduzir aquele veículo.
2 – O arguido, ao ser submetido ao exame de pesquisa de álcool através do ar expirado quando conduzia o veículo referido apresentou uma taxa de álcool no sangue de 1,95 e que, ao requerer exame de contra-prova através de novo exame no ar expirado apresentou uma taxa de álcool no sangue de 1,61 g/l.
3 – O arguido conduzia o ligeiro de passageiros com a matrícula JP... sem que fosse titular de carta de condução.
4 – Actuou de forma livre, voluntária e consciente, com intenção de conduzir aquele ligeiro de passageiros na via pública sem causa justificativa, não obstante saber que era imprescindível e necessário ser titular de carta de condução válida, que não possuía.
5 – Ademais, o arguido...
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