Acórdão nº 165/11.6 PECBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Junho de 2013
Magistrado Responsável | BR |
Data da Resolução | 05 de Junho de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Precedendo audiência, acordam na 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.
* I.
Relatório.
1.1. Submetido a julgamento, sob a aludida forma de processo comum singular, isto porquanto acusado pelo Ministério Público, no uso da faculdade concedida pelo art.º 16.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, realizado o contraditório, viu-se o arguido A...
, entretanto já melhor identificado nos autos, e actualmente detido no E.P. de Paços de Ferreira, condenado, isto além do mais por ora irrelevante, pela prática, em autoria material e sob a forma consumada, de um crime de furto qualificado, p. e p. através das disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1; 204.º, n.º 2, al. e) e 202.º, als. d) e e), todos do Código Penal, na pena de três anos de prisão efectiva.
1.2. Inconformado com tal veredicto, veio o mesmo arguido interpor o presente recurso, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões: 1. No decurso da audiência de julgamento a única testemunha que depôs, directora do colégio queixoso/ofendido declarou que foi furtado uma quantia de € 125,00 a qual estava num cofre e pertencia à Associação de Pais.
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O Colégio (...) e a Associação de Pais são entidades juridicamente distintas.
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Porque alegadamente foi furtada uma quantia de € 125,00 em dinheiro da Associação de Pais, era esta que deveria ter apresentado queixa, através dos seus órgãos representativos, nos termos dos art.ºs 203.º, n.º 3 e 113.º, ambos do Código Penal.
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A omissão desta circunstância acarreta a nulidade de todo o processado nesta parte.
Sem prescindir, 5. Nem se apurou em sede de julgamento de que modo, porque razão de ciência a Directora do Colégio (...) sabia que o pequeno cofre fechado da Associação de País – cuja administração não lhe compete – tinha aquele montante em dinheiro e não outro.
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De resto os Dirigentes da Associação de Pais em nada intervieram nestes autos. Relativamente ao Colégio (...): 7. Da propriedade deste nada foi furtado.
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Únicamente ocorreram danos nas suas instalações.
Consequentemente, 9. Ao deparar-se com esta factualidade, s.m.o., deveria tribunal a quo ter, pelo menos, notificado o arguido para uma alteração substancial de factos, modificando a qualificação dos mesmos para um crime de dano, o que não ocorreu.
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Isto, acaso fosse de admitir que a mera existência de uma impressão palmar do arguido fosse suficiente para se concluir que foi ele o autor dos danos de que de resto nem acusado foi – e do alegado furto – de que nem existe queixa do titular dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação – a ofendida dona do dinheiro, Associação de Pais.
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O que se não concede.
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Ninguém viu o arguido dentro das instalações do colégio.
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Muito menos a danificar ou furtar o que quer que seja.
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As filmagens existentes nos autos não o identificam, sequer por semelhança.
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Ninguém identificou “o vulto” que fugia.
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No dizer da testemunha ouvida, das 18 horas em diante entrou na escola uma multidão de gente.
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Não podendo esta afirmar se para causar os danos entraram um ou mais.
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Sendo certo que quem entrou deveria conhecer minimamente o Colégio para chegar por onde chegou ao gabinete da directora.
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Sendo que o arguido nunca foi identificado como antigo aluno da instituição ou pessoa que lá estivesse estado em algum momento.
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A existência de uma impressão palmar de um arguido não significa que o mesmo tenha cometido o crime de que vem acusado, ou outro.
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Simplesmente que esteve em contacto com o objecto onde essa impressão apareceu.
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A decisão recorrida padece pois dos vícios de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, bem como de erro notório da apreciação da prova.
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Impondo-se, consequentemente, a absolvição do recorrente.
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Concedendo, e para a hipótese de assim não se entender, deve o recorrente beneficiar do regime penal destinado aos jovens delinquentes, atento os elementos constantes do relatório social elaborado e de os crimes praticados terem ocorrido numa determinada fase da sua vida, não se repetindo na actualidade.
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Decidindo pela forma em que o fez, a decisão recorrida violou o disposto nos art.ºs 113.º e 203.º, n.º 1, já citados; 359.º, 410.º, n.º 2, als. a) e c), ambos do Código de Processo Penal, bem como 32.º, n.º 2, este da Constituição da República Portuguesa.
Terminou pedindo que se decida em conformidade com o assim expendido.
1.3. O Ministério Público contra-alegou à motivação de recurso, pugnando pela sua improcedência.
1.4. Proferido despacho sobre a sua admissibilidade, cumpridas as formalidades devidas, foram os autos remetidos para este tribunal ad quem.
1.5. Aqui, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto limitou-se a ter vista dos autos para conhecimento do processo, uma vez que o recorrente requereu tempestivamente a realização de audiência (cfr. art.ºs 411.º, n.º 5 e 416.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Penal).
Impondo-se o prosseguimento do processo, na observância do regime constante no art.º 421.º, do Código de Processo Penal, foi determinada a abertura de conclusão ao M.mo Juiz Presidente desta Secção, a fim de que o mesmo designasse data para realização de audiência.
Aprontada e realizada esta diligência processual, cabe então ponderar e decidir.
* II.
Fundamentação de facto.
2.1. Discutida a causa, resultaram provados, com relevância para a decisão final, os seguintes factos: (Da audiência de discussão e julgamento): 1. No dia 8 de Setembro de 2011, entre as 18.00 horas e as 22.56 horas, o arguido, aproveitando a circunstância de ser a sessão solene de abertura do ano lectivo para os pais, entrou nas instalações do Colégio (...), sitas na cidade de Coimbra, onde permaneceu escondido.
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O arguido escondeu-se no edifício central do Colégio, onde se situam o gabinete da directora, a contabilidade, a secretaria e o gabinete de apoio aos pais, com intenção de procurar e apoderar-se de bens facilmente transportáveis com valor económico e de dinheiro que ali encontrasse.
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Pela altura em que todas as pessoas saíram das instalações do Colégio, com um objeto não concretamente apurado, o arguido forçou a porta da secretaria e da contabilidade que se encontravam fechadas á chave e acedeu a esses espaços, nos quais remexeu nas gavetas dos armários.
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Numa das gavetas do armário da secretaria o arguido encontrou um cofre móvel, que tinha no seu interior a quantia de € 125,00, que levou consigo, apoderando-se de ambos.
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Pelas 22.56 horas foi accionado o alarme do Colégio, que soou ao ser detectada a presença do arguido. 6. Com a actuação descrita o arguido causou um prejuízo patrimonial ao Colégio, equivalente ao valor dos bens que subtraiu do interior do estabelecimento de ensino e que levou consigo, e pelas portas e janela forçadas.
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O arguido agiu livre voluntária e conscientemente, com o propósito de fazer seu e integrar no seu património o cofre e o dinheiro supra referidos, de que se apoderou, sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que ao ficar com eles o fazia contra a vontade e sem autorização do seu legítimo dono.
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Sabia o arguido que não podia introduzir-se naqueles espaços fechados e vedados ao público.
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O arguido sabia ser a sua conduta proibida e punida por lei.
(Mais se provou que): 10. O arguido é solteiro, não aufere quaisquer rendimentos, tem dois filhos menores, com 4 e 2 anos de idade. Antes de estar detido, vivia com a companheira em casa arrendada e era feirante. Tem perspectivas de trabalhar como feirante. Possui o 4.º ano de escolaridade e encontra-se a frequentar a escola de novas oportunidades no estabelecimento prisional.
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O arguido foi condenado: - No processo n.º 1519/08.0 PCCBR, do 4.º Juízo Criminal de Coimbra, por sentença proferida em 3.06.2009 transitada em julgado em 14.09.2009, num crime de furto qualificado na forma tentada, p. e p. pelos art.ºs 23.º n.ºs 1 e 2, 73.º, 203.º e 204.º, n.º 2, al. e) do Código Penal, praticado em 9.6.2008, na pena de 10 meses de prisão suspensa na sua execução por um ano; - No processo n.º 326/08.5 PABCL, do 2.º Juízo Criminal de Barcelos, por sentença proferida em 26.10.2009 transitada em julgado em 25.11.2009, num crime de furto qualificado na forma tentada, p. e p. pelos art.ºs 23.º, 203.º e 204.º, n.º 2, al. e) do Código Penal, praticado em 16.6.2008; um crime de furto qualificado p. e p. pelos art.ºs 203.º e 204.º, n.º 2, al. e) do Código Penal, praticado em 16.6.2008 e dois crimes de furto qualificado p. e p. pelos art.ºs 203.º e 204.º, n.º 2, al. e) do Código Penal, praticado em 19.5.2008, na pena única de 18 meses de prisão, suspensa na sua execução por 18 meses tendo a suspensão sido revogada; - No processo n.º 862/08.3 PBGMR, da 2.ª Vara Mista de Guimarães, por sentença proferida em 12.11.2009 transitada em julgado em 7.12.2009, num crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, al. e) do Código Penal e um crime de burla informática e nas comunicações de forma tentada, praticados em 4.6.2008, nas penas de 1 ano e seis meses de prisão substituída por 480 horas de trabalho a favor da comunidade e pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, num total de € 500,00 de multa; - No processo n.º 1035/07.8 PGMTS, do 1.º Juízo Criminal de Matosinhos, por sentença proferida em 26.11.2009 transitada em julgado em 16.12.2009, num crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203.º e 204.º, n.º 2, al. e) do Código Penal, praticado em 15.1.2008, na pena especialmente atenuada, por aplicação do art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro e art.º 73.º, n.º 1, als. a) e b) do Código Penal, de 7 meses de prisão substituída por 210 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, num total de € 1050,00 de multa; - No processo n.º 762/08.7 PHVNG, da 1.ª Vara Mista de Vila Nova de Gaia, por sentença proferida em 23.11.2009 transitada em julgado em 8.01.2010, num crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, al. f) do Código Penal, praticado em 9.12.2008, na pena de 8 meses de prisão...
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