Acórdão nº 2148/09.7TBCTB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Maio de 2013
Magistrado Responsável | MARIA CATARINA GON |
Data da Resolução | 14 de Maio de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.
A...
, residente na Rua (...), Lisboa, intentou a presente acção contra B...
(já falecido) e C...
, residentes em (...), Castelo Branco, alegando, em suma, que: é comproprietária, juntamente com os seus irmãos, de um prédio rústico (que adveio ao seu domínio por herança de seus pais) com árvores de fruto, sobreiros, olival, horta, mata e quatro pequenas construções; em 19/04/2006, venderam o referido prédio a uma imobiliária pelo preço de 250.000,00€, sendo que esta, após a aquisição do prédio, constatou que o prédio em causa estava desarborizado, alcatroado e dividido em parcelas, algumas das quais já se tinham casas de habitação edificadas; esse facto acabou por conduzir à anulação da compra e venda que havia sido efectuada, tendo sido devolvido o preço que havia sido pago pela compradora; a Autora desconhecia por completo essa situação, tal como desconhece desde quando a mesma se verifica, embora seja certo que não há mais de 4 ou 5 anos; embora desconheça a identidade dos demais terceiros que ocupam aquelas parcelas, apurou que os Réus ocupam uma delas, com cerca de 750m2, o que fazem sem qualquer título, de má fé e contra a vontade da Autora.
Com estes fundamentos, pede: - que se declare que prédio rústico sito no lugar do (...), (...), na freguesia e concelho de Castelo Branco, inscrito na matriz sob o nº (...), Secção X, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número (...), onde se inclui a parcela de terreno com cerca de 750 m2, identificada a vermelho na imagem retirada do google earth e na planta de localização 1/5000, da Secção de Topografia do Departamento Técnico Operacional da Câmara Municipal de Castelo Branco, onde o mesmo aparece delineado a laranja, é propriedade da Autora e dos seus irmãos, D (...), E (...)s, F (...)e G (...); - que os Réus sejam condenados a restituírem à Autora e restantes comproprietários essa parcela de terreno, no estado em que a mesma se encontrava antes da sua intervenção e sem qualquer construção e/ou vedação que tenha realizado; - que os Réus sejam condenados a absterem-se de praticar qualquer acto que impeça ou diminua a utilização, por parte da Autora, e dos restantes comproprietários, dessa mesma parcela de terreno.
A Ré – alegando ser viúva desde Agosto de 2008 – contestou, alegando que o prédio em causa foi sujeito a um plano especial de urbanização, através de protocolo celebrado entre os pais da A. e a Câmara Municipal de Castelo Branco que visava a recuperação de clandestinos e a construção existente de génese ilegal, obrigando-se esta última, entre outras, a edificar todos os muros e acessos necessários, recebendo em contrapartida uma parcela de terreno com a área de 23000 m2; nesta parcela, a Câmara Municipal de Castelo Branco veio a construir em 1995 um posto de transformação, procedendo então ao alargamento da Rua do Bonfim e passagem desnivelada do caminho-de-ferro, tendo ainda edificado um pavilhão desportivo que serve de sede à Associação do Bairro da Boa Esperança e dois campos de ténis, o que fez há cerca de 8 anos, tendo ainda instalado condutas para servir de águas e esgotos os diversos lotes de terreno e tendo pavimentado e asfaltado arruamentos; em 1970, a área restante de tal prédio, estava dividida materialmente em lotes e parcelas de terreno e a parte não compreendida no perímetro urbano, em quintinhas, sendo que tais lotes de terreno e quintinhas foram sendo vendidos pelos pais da Autora, entre os anos de 1970 a 1976; assim, por contrato não reduzido a escritura pública, a Ré e o marido, adquiriram em 20.2.1976 aos pais da Autora, um lote de terreno com a área de 10250 m2, que inclui uma casa de habitação de construção muito antiga, composta por cave, rés-do-chão e sótão, com a área de 139 m2 e, desde então e até hoje, há portanto mais de trinta anos, com exclusão de outrem, possuem materialmente tal lote de terreno, na firme convicção de exercerem um direito próprio, fazendo-o coisa sua, de tal ordem que desde logo, a casa lhes serviu de habitação e ali criaram os seus filhos; procederam à construção de 1 casa de banho, de 3 barracões e 1 canil, onde guardam, respectivamente, o tractor agrícola, os animais, os folhelhos de milho, as sementes e as alfaias agrícolas e os cães; vedaram tal parcela de terreno com rede, servida de portão de abrir e fechar, que deita para a Rua do Bonfim; procederam à plantação de árvores de fruto, oliveiras e videiras, fizeram horta, plantam batatas, milho, aveia, tudo para seu governo e das galinhas, dos patos e dos suínos; colheram as laranjas, azeitonas e uvas, as cebolas e batatas, que depois vendiam numa venda que tinham na praça municipal, actos que praticaram desde 1976 até hoje, à vista de toda a gente, ostensivamente e sem oposição de quem quer que seja, sabendo que não causavam dano ou prejuízo a outrem e sem interrupção no tempo; esse lote de terreno, com a área matricial corrigida de 10000 m2,compõe-se de uma casa de rés-do-chão e 1º andar, com logradouro, com as superfícies corrigidas, a coberta de 100,40 m2, a descoberta de 9899,60 m2 e encontra-se inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 10602 da freguesia e concelho de Castelo Branco.
Assim, invocando a aquisição do respectivo direito de propriedade, por usucapião, conclui pela improcedência da acção, pedindo, em reconvenção que: - seja declarado que a Reconvinte e os filhos do seu extinto casal são donos e legítimos possuidores do referido lote de terreno; - a Autora seja condenada a reconhecer tal direito de propriedade.
A Autora replicou, impugnando os factos vertidos na contestação/reconvenção e reafirmando os factos alegados na petição inicial.
Foi apresentada tréplica, foi proferido despacho saneador e foi efectuada a selecção da matéria de facto assente e base instrutória.
Após realização da audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, onde se decidiu nos seguintes termos: 1. Julgar improcedente e não provada a pretensão formulada pela autora, dela absolvendo os réus; 2. Julgar procedente e provado o pedido reconvencional e, em consequência: - declara-se que a reconvinte e os filhos do seu extinto casal são donos e legítimos possuidores do lote de terreno, sito na Rua do Bonfim, n.º 1–A, em Castelo Branco, com a área matricial corrigida de 10.000 m2,compõe-se de uma casa de rés-do-chão e 1º andar, com logradouro, com as superfícies corrigidas, a coberta de 100,40 m2, a descoberta de 9899,60 m2, encontra-se inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 10602 da freguesia e concelho de Castelo Branco; - condeno a autora reconvinda a reconhecer tal direito de propriedade da ré reconvinte, bem como dos filhos do seu extinto casal e o pleno domínio do dito prédio.
Inconformada com essa decisão, a Autora veio interpor o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões: I. Não é perceptível da fundamentação genérica do Tribunal a quo quais as razões, os documentos e depoimentos de testemunhas concretas que formaram a convicção deste na prova de cada quesito, e que subjazem ao decidido, tornando a sindicabilidade da matéria de facto um puro exercício de adivinhação, que não se coaduna com o dever fundamentação das decisões judiciais.
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Tal configura uma nulidade da sentença, nos termos da al. b) do nº1 do artº668 e nº3 do artº659 do CPC.
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Para além da nulidade da sentença, são razões de facto e de direito que assistem à Recorrente para a interposição do presente recurso.
IV.
Não obstante a prova objectiva e factual, produzida pela A nos autos, suportada por documentos com força probatória plena corroborada na íntegra pelos depoimentos das testemunhas arroladas pela A., o Tribunal a quo, preterindo normas substantivas e adjectivas nível da prova, preferiu acolher a tese da negação da realidade alegada e provada pela A.
com base em depoimentos de testemunhas com interesse na causa.
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Os quesitos 12, 16, 18 a 25, 28 a 30 da base instrutória foram incorrectamente julgados pelo Tribunal a quo porque os elementos do processo impunham decisão diversa da recorrida.
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No quesito 12 o Tribunal a quo não fez a apreciação correcta da prova produzida nos autos sobre este quesito ao responder negativamente porque os depoimentos das testemunhas H (...) (depoimento gravado no CD com data de 18.05.2012, início às 10:06:12) e E (...) (depoimento gravado no CD com data de 18.05.2012, início às 10:34:51) lograram prová-lo e não houve quer outra prova testemunhal ou documental a contrariá-los.
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No quesito 16 o Tribunal a quo não fez a apreciação correcta da prova produzida nos autos sobre este quesito porque sobrevalorizou os depoimentos das testemunhas I (...)(depoimento gravado no CD com a data 18.05.2012, início às 11:44:30) e O (...)(depoimento gravado no CD com a data 18.05.2012, início às 11:18:34) e S (...) (depoimento gravado no CD com data de 05.06.2012, início às 14:41:21) em detrimento do depoimento de H (...) (depoimento gravado no CD com data de 18.05.2012, início às 10:06:12), E (...) (depoimento gravado no CD com data de 18.05.2012, início às 10:34:51) e T (...), (depoimento gravado no CD com data de 05.06.2012, início a 15:12:17), com fundamento em interesse na causa destes, quando as duas primeiras testemunhas são partes DIRECTAS interessadas na acção e o terceiro interessado indirecto.
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Para além da contra-prova testemunhal, a Recorrente apresentou 4 documentos (requerimento da A. de 17.05.2012), e o Tribunal a quo nem sequer os ponderou, sendo omissa a sua existência entre as provas produzidas nos autos.
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O contrato de arrendamento celebrado em 1963 e a declaração da R. C (...) e do seu marido, rendeiro, B (...), datado de 02.05.1995, a rescindir unilateralmente o contrato de arrendamento referente ao prédio sub judice, têm as assinaturas dos respectivos outorgantes reconhecidas presencialmente em notário, pelo que não tendo sido arguida a falsidade dos mesmos, nem qualquer vício de vontade, fazem prova plena das declarações...
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