Acórdão nº 1701/10.0TBLSD.P3 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 22 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO SILVA DIAS
Data da Resolução22 de Maio de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

(proc. n º 1701/10.0TBLSD.P3)* Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto: *I- RELATÓRIO 1. No 1º Juízo do Tribunal Judicial de Lousada, nos autos de recurso de contra-ordenação nº 1701/10.0TBLSD, na sequência de acórdão do TRP de 11.7.2012 (que declarou nula a sentença recorrida, determinando a sua substituição por outra que se pronuncie sobre os factos alegados pelo arguido nos artigos 4º a 7º, 11º a 24º, 27º, 28º, 29º e 31º e parte dos factos 8º a 10º da impugnação da decisão administrativa, podendo a 1ª instância reabrir a audiência para complementar a prova, se o achar conveniente para a boa decisão da matéria de facto - fls. 316 a 326 do 2º volume), foi proferida nova sentença, em 26.10.2012 (fls. 337 a 346 do 2º volume), constando do dispositivo o seguinte: Atento todo o exposto e ao abrigo das disposições legais citadas, julgo improcedente o recurso interposto pelo arguido, e em consequência, decido: - manter a decisão administrativa proferida pelo Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território - Inspecção-Geral do Ambiente e do Ordenamento do Território, assim condenando o arguido B…..

na coima de €20.000,00 (vinte mil euros), pela prática da contra-ordenação, p. e p. pelos artigos 81º, nº 3, alínea u), do Decreto-Lei nº 226-A/2007, de 31 de Maio, e 22º, nº 4, alínea a) da Lei nº 50/2006, de 21 de Agosto, na redacção dada pela Lei nº 89/2009, de 31 de Agosto - condenar o arguido nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal.

(…)*2. Não se conformando com essa decisão judicial, o arguido B…. interpôs recurso (fls. 353 a 387 do 2º volume) apresentando as seguintes conclusões: 1ª-) O Decreto-lei nº 226-A/2007, de 31 de Maio (Diploma fonte de condenação do arguido) padece de inconstitucionalidade orgânica, que ora aqui se invoca.

Cotejando a Lei de Autorização Legislativa desse mesmo diploma legal, a Lei 13/2007 de 8 de Março, verifica-se que a mesma omite o elenco sancionatório a fixar no diploma autorizado in casu o ora aqui invocado Dec. Lei nº 226.A/2007 de 31 de Maio.

Jurisprudência pacífica e uniforme do Tribunal Constitucional tem vindo a delimitar as competências da Assembleia da Republica e do Governo em matéria de ilícito de mera ordenação social.

Em obediência à imposição Constitucional do artº 164º da C.R.P o Governo está necessariamente vinculado aos limites do Regime Geral fixado na respectiva Lei Quadro, não lhe sendo consentido ultrapassar, na definição do montante das coimas, o limite mínimo inferior e o limite máximo ali balizados.

Assim, e por isso, a decisão ora em Recurso ao aplicar ao arguido ora recorrente coima que ultrapassa os limites impostos no artº 17º do Regime Geral das Contra-Ordenações (Lei Quadro) enferma de ilegalidade por inconstitucionalidade material que desde já se invoca com todas as consequências legais.

2º) Da decisão administrativa não consta nenhum facto em relação ao elemento subjectivo de onde se retire que o arguido/recorrente actuou com negligência ou com dolo. Naquela decisão/acusação são alegados tão só factos materiais, factos objectivos e de puro resultado; não são alegados quaisquer factos tendentes a demonstrar a forma de imputação dolosa ou negligente ao arguido, factos esses omitidos.

Efectivamente a acusação omite os factos atinentes à culpa, ou seja, dela não resulta que o arguido ora recorrente tivesse representado como possível a realização do facto integrador de uma contra-ordenação e, não obstante, tivesse actuado ou devesse ter actuado, independentemente de se conformar com essa realização e com a correspondente consciência da ilicitude.

Por isso, face ao preceituado no artº 58º, nº 1, da Lei-quadro das Contra-Ordenações e artºs 374º e 379º, nº 1 alº a) do C.P.Penal a decisão administrativa padece de nulidade, com todas as consequências; 3º) Mau grado a sobredita omissão na acusação da factualidade atinente à culpa, causa da nulidade invocada, o Tribunal “ a quo” considera provada tal factualidade ao referir: “ ao actuar da forma descrita, o arguido depositou águas residuais sem depuração prévia e sem tratamento no solo, sabendo que não podia fazê-lo, não tendo agido com cuidado e diligência com que podia e devia ter agido” Apesar de se incorrer no mesmo erro da acusação omitindo a consciência da ilicitude, o certo é que neste particular o Tribunal “ a quo” ao proceder daquela forma condenou o arguido por factos diversos dos descritos na acusação, pelo que assim sendo, a douta sentença, ora em recurso padece de nulidade nos termos das disposições conjugadas dos artºs 283º, nº 3 alº b) e 379º, nº 1 alº b) do C.P.Penal, nulidade esta que desde já se invoca com todas as consequências legais; 4º) O Tribunal “a quo” ao decidir pela não produção da prova complementar oportunamente apresentada pelo arguido recorrente, consistente no depoimento das testemunhas C….., Presidente da Junta de Freguesia de …. e D….. Secretário da Junta de Freguesia de …, sobre os factos alegados e dada como não provados, fulminou a douta sentença de nulidade nos termos das disposições conjugadas dos artºs 120º nº 1 alº a), 122º, 123º,340º, e 379º nº 1 alº c) e nº 2 do artº 66º da LQCO e artº 12º do Dec. Lei 244/95 de 14 de Setembro. nulidade ou irregularidade esta que desde já e para os devidos efeitos se invoca, com todas as consequências.

Efectivamente o Legislador Ordinário na concepção do artº 66º da LQCO (Lei Quadro das Contra-Ordenações) teve em conta o principio constitucional da garantia do processo criminal, formalmente previsto no artº 32º, nº 10º da CRP, pelo que o Tribunal “a quo” ao decidir sem ouvir a prova testemunhal previamente indicada pelo arguido ora recorrente, praticou um acto invalido, nos termos das disposições conjugadas dos artºs 18º da CRP, 125º do C.P.Penal e 66º da LQ.C.O (Dec. Lei 244/95 de 14.09).

5º) A matéria factual constante do ponto 2 dos factos provados: « o arguido procedeu, nessas circunstâncias de tempo e lugar, pela retaguarda do reboque cisterna, ao dito despejo de matéria oriunda de esgotos de fossa de habitação, a pedido do respectivo proprietário mediante contrapartida monetária não concretamente apurada», é insuficiente face ao que dispõe os artºs 1178º, 258º, 268º, nº 1 e 269º do Código Civil e 1180º do Código Civil, para imputar sem qualquer duvida a responsabilidade contra ordenacional ao arguido ora recorrente, caso contrário, permanecerá dúvida insanável sobre a responsabilidade contra ordenacional do arguido ora recorrente, dúvida essa que deverá ser, face ao principio in dúbio pro reo, valorada e decidida a seu favor.

6º) Optando pela condenação do arguido ora recorrente, o Tribunal “a quo” podia e devia, nos termos do disposto no artºs 369º, nº 2 e 370º requerer a solicitação aos serviços competentes do relatório social com vista à aplicação das penas de admoestação, prevista no artº 51º da LQCO ( Lei Quadro das Contra-Ordenações), da suspensão da pena prevista no 39º da LQCA ( Lei Quadro das Contra-Ordenações Ambientais), ou mesmo com vista á atenuação especial da coima, na medida em que a aplicação de tais medidas substitutivas configura formal e materialmente um poder dever estritamente vinculado, pelo que a falta do relatório social não só configura o vicio de insuficiências de matéria de facto para a decisão, mas também, porque a matéria que nele consta é necessária à consequente tomada de decisão; configura igualmente a nulidade da sentença nos termos do disposto no artº 379º al a) e 374º, nº 2 do CPP 7º) A conduta/acção imputada ao arguido é para efeitos de Direito de Mera Ordenação Social material e formalmente atípica, na medida e pelo facto do Dec. Lei 226-A/2007 de 31.05, diploma fonte de condenação, estabelecer apenas e tão só o regime sobre a utilização dos recursos hídricos e respectivos títulos impondo correspondentes sanções pela prática das condutas tipificadas nos artºs 60º, nº 1 da Lei nº 1; 61º; 62º, nºs 1 e 2 da Lei nº 58/2005 de 29.12 (Lei da àgua), essas sim condutas que nos termos do disposto do no nº 2 do artº 1º da da Lei nº 50/2006 (Lei quadro das Contra Ordenações ambientais) constituem tipicamente contra-ordenações ambientais.

Melhor dizendo a tipicidade material e formal da conduta ambiental não se constitui com a falta ou abuso do título de utilização, mas sim com as próprias acções de utilizações dos recursos hídricos quer particulares quer públicos.

Por isso mesmo, a conduta imposta na norma do artº 81º, nº 3 alº u) do Dec. Lei nº 226-A/2007 de 31.05 (diploma e norma fonte de condenação) não pode configurar, sob pena de violação de lei, uma contra-ordenação ambiental.

8º) Como doutamente Doutrina o Acórdão da Relação de Coimbra de 16.12.2009, procº 2813/08.6 TALRA.C1, Relator Desembargador Paulo Guerra, publicado em www.dgsi.pt, a contra ordenação prevista no artigo 81º, nº 3 alínea u), do Decreto Lei nº 226-A/2007, de 31 de Maio, pelo qual o arguido vem punido, só se mostrará preenchida com o espalhamento no solo de rejeição ou descarga de águas residuais industriais, uma vez que o referido tipo contra ordenacional é integrado pelos os elementos normativos do Decreto Lei 152/97 de 19.07 ( artºs 1º e 2º nºs 1, 6 e 7) e Decreto Lei 236/98 de 1.08 ( artºs 1ºe 63º nº 1, 2, 3 als a) e b) os quais impõem que o espalhamento de águas residuais industriais no solo ou na água,« já não das águas residuais urbanas e domésticas que se exclui», só é permitido através de emissão de licença administrativa, previndo-se e punindo-se descargas de resíduos industriais não licenciadas ou efectuadas fora do local previsto.

9º) Face ao fim visado pela diploma incriminador, utilização dos recursos hídricos e respectivos títulos, e uma vez que o legislador incumbe à administração de definir critérios de acesso a actividades potencialmente agressoras do ambiente ou definir os valores limites dos factores poluitivos admitidos como toleráveis, o referido preceito normativo da alº u) do nº 3 do artº 81º do Dec. Lei nº 226-A/2007 de 31.05 apenas...

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