Acórdão nº 2042/09.1IDLSB-A.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Março de 2013

Magistrado ResponsávelCRISTINA BRANCO
Data da Resolução07 de Março de 2013
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 9.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa I. Relatório 1. No âmbito dos autos de inquérito n.º 2042/09.1IDLSB, a correrem termos no G.I.N. Amadora – MP D.I.A.P. 8.ª Secção, da Comarca da Grande Lisboa-Noroeste – Ministério Público de Oeiras, em que está em investigação a prática de crime de fraude fiscal, p. e p. pelo art. 103.º do RGIT, foi determinada a inquirição do Sr. Dr. F(...), advogado, o qual se escusou a prestar declarações, em virtude de ser mandatário dos arguidos J(...), A(...) e Jo(...).

  1. Perante tal escusa, o Ministério Público, em douta promoção, considerando indispensável à investigação do crime em causa a inquirição da referida testemunha e ser de prevalecer o interesse público da descoberta da verdade sobre o da manutenção do segredo profissional, requereu que fosse suscitado o competente incidente de dispensa de sigilo junto do Tribunal da Relação.

  2. O Mmo. Juiz de Instrução Criminal solicitou à Ordem dos Advogados que se pronunciasse sobre a legitimidade ou ilegitimidade da escusa, vindo aquela a emitir Parecer no qual conclui pela respectiva legitimidade.

  3. Reconhecendo a legitimidade formal da escusa, por despacho proferido a fls. 1098-1099 destes autos, o Mmo. Juiz de Instrução Criminal suscitou a intervenção deste Tribunal, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 135.º, n.º 3, do Código de Processo Penal.

  4. Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo apreciar e decidir.

* II. Fundamentação A única questão que nos autos se suscita é a de apreciar se, no caso concreto, deve ou não ser determinada a quebra do sigilo profissional do Sr. Dr. F(...), a fim de o mesmo ser ouvido como testemunha.

Estabelece o n.º 1 do art. 135.º do CPP que «os ministros de religião ou de confissão religiosa e os advogados, médicos, jornalistas, membros de instituições de crédito e as demais pessoas a quem a lei permitir ou impuser que guardem segredo podem escusar-se a depor sobre os factos por ele abrangidos».

Por seu turno, dispõe o art. 87.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei n.º 15/05, de 26-01, sob a epígrafe “Segredo profissional”: «1 - O advogado é obrigado a guardar segredo profissional no que respeita a todos os factos cujo conhecimento lhe advenha do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços, designadamente: a) A factos referentes a assuntos profissionais conhecidos, exclusivamente, por revelação do cliente ou revelados por ordem deste; b) A factos de que tenha tido conhecimento em virtude de cargo desempenhado na Ordem dos Advogados; c) A factos referentes a assuntos profissionais comunicados por colega com o qual esteja associado ou ao qual preste colaboração; d) A factos comunicados por co-autor, co-réu ou co-interessado do seu constituinte ou pelo respectivo representante; e) A factos de que a parte contrária do cliente ou respectivos representantes lhe tenham dado conhecimento durante negociações para acordo que vise pôr termo ao diferendo ou litígio; f) A factos de que tenha tido conhecimento no âmbito de quaisquer negociações malogradas, orais ou escritas, em que tenha intervindo.

2 - A obrigação do segredo profissional existe quer o serviço solicitado ou cometido ao advogado envolva ou não representação judicial ou extrajudicial, quer deva ou não ser remunerado, quer o advogado haja ou não chegado a aceitar e a desempenhar a representação ou serviço, o mesmo acontecendo para todos os advogados que, directa ou indirectamente, tenham qualquer intervenção no serviço.

3 - O segredo profissional abrange ainda documentos ou outras coisas que se relacionem, directa ou indirectamente, com os factos sujeitos a sigilo.

4 - O advogado pode revelar factos abrangidos pelo segredo profissional, desde que tal seja absolutamente necessário para a defesa da dignidade, direitos e interesses legítimos do próprio advogado ou do cliente ou seus representantes, mediante prévia autorização do presidente do conselho distrital respectivo, com recurso para o bastonário, nos termos previstos no respectivo regulamento.

5 – Os actos praticados pelo advogado com violação de segredo profissional não podem fazer prova em juízo.

6 – Ainda que dispensado nos termos do disposto no nº 4, o advogado pode manter o segredo profissional.

7 – O dever de guardar sigilo quanto aos factos descritos no nº 1 é extensivo a todas as pessoas que colaborem com o advogado no exercício da sua actividade profissional, com a cominação prevista no nº 5.

8 – O advogado deve exigir das pessoas referidas no número anterior o cumprimento do dever aí previsto em momento anterior ao início da colaboração.» Daqui decorre, pois, que o advogado está legalmente obrigado a segredo profissional no que respeita a factos conhecidos no exercício das suas funções, seja qual for a origem da fonte.

O dever de sigilo dos profissionais do foro, mais concretamente dos advogados, está conexamente consagrado como uma das dimensões constitucionais do patrocínio forense, considerado como «um elemento essencial à administração da justiça» (cf. art. 208.º da CRP), sendo que o direito fundamental e constitucional de acesso ao direito (cf. art. 20.º da CRP) implica, para além do mais, o correspondente patrocínio judiciário, com a particular relação de confiança entre o advogado e o seu cliente, a defesa da dignidade, direitos e interesses legítimos do próprio advogado ou do cliente ou seus representantes.

A lei penal sanciona, no seu art. 195.º, «Quem, sem consentimento revelar...

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